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A linguagem é dinâmica, marcada pelos seus usos e pela evolução nos processos de comunicação das pessoas. Isso significa que novos aparatos tecnológicos introduzem práticas de leitura e escrita características dos meios e suportes de circulação dos textos digitais. Nesta perspectiva, torna-se necessário incluir nos programas de ensino propostas pedagógicas que integrem, além da cultura impressa, a multimodalidade e a hipertextualidade presentes nos ambientes digitais.

No Brasil, as avaliações em larga escala, tais como Prova Brasil e SAEB, têm contribuído, embora nem sempre de modo satisfatório, para repensar os currículos e os processos de ensino e aprendizagem. Essas avaliações são baseadas em matrizes de referência que descrevem as competências e habilidades que os alunos devem dominar em cada

série/ano, os chamados descritores. Estes preveem a associação dos conteúdos curriculares às operações mentais e constituem a referência para a elaboração dos itens que vão compor as avaliações.

O SAEB, “um exame amostral nacional com baixo nível de responsabilização”

(Becker, 2012) ecoou em outros sistemas educacionais como os estaduais e municipais, resultando em modelos para avaliar o nível de proficiência leitora nos vários segmentos. Com o objetivo de traçar um diagnóstico da qualidade da educação básica, o SAEB deu origem à Prova Brasil, que possibilitou o cálculo por escolas e a nível individual. A Prova Brasil expande o alcance do SAEB, pois permite um “olhar ampliado sobre as redes de ensino e gera

accountability” (BECKER, 2012).

Tendo como referência a Matriz de Língua Portuguesa das avaliações nacionais, autores como Coscarelli; Ribeiro (2010), Dias; Novais (2009) e Rosa; Dias (2012) têm publicado ensaios para a criação de uma matriz que inclua descritores baseados no letramento digital.

Segundo Coscarelli; Ribeiro (2010), a matriz de referência da Prova Brasil e SAEB tem como foco a leitura e busca aferir o conhecimento dos leitores em “diferentes níveis de

compreensão, análise e interpretação”. Ainda de acordo com as autoras, “a configuração atual

da matriz enfoca elementos do processamento leitor e pouco ou nada dedica aos modos de circulação dos textos, aos seus suportes ou a sua relação com ambientes de leitura, muito menos os digitais.” Ela não contempla, por exemplo, aspectos referentes à hipertextualidade ou à multimodalidade, tão próprios de suportes como tablet, smartphones, computadores e tantos outros artefatos que usam a tela para disponibilizar textos.

Apesar de as matrizes de avaliação não darem conta de abarcar toda a complexidade envolvida na leitura, elas podem servir de guia para diagnosticar, monitorar e responsabilizar as instituições educativas para a promoção da qualidade e do letramento de seus alunos.

Coscarelli; Ribeiro (2010) alertam para as diferenças entre as matrizes de avaliação e as matrizes de ensino. Elas argumentam que as limitações impostas pelos modelos da avaliação, tempo de realização, número de descritores, tratamento estatístico não podem ser aplicadas às matrizes de ensino. De acordo com as autoras,

as matrizes de ensino devem ser propostas como metas a serem alcançadas por alunos e professores nas práticas pedagógicas das escolas. Essa matriz deve ser completa e envolver não apenas habilidades de leitura, mas também de escrita, fala e escuta de textos de diversos gêneros, incluindo nelas habilidades relativas ao exercício dessas competências em ambientes digitais e considerando a recepção de textos como atividades que acontecem em uma situação comunicativa determinada, em um suporte, em um contexto. (COSCARELLI, RIBEIRO, 2010, p. 331)

Diante dessa realidade, que se configura com a perspectiva de envolver o letramento digital nos currículos da educação básica, Dias; Novais (2009) e Rosa; Dias (2012) apresentam uma proposta de matriz que introduz a descrição de competências e habilidades necessárias para lidar com textos que circulam nos ambientes mediados pelas tecnologias digitais.

Para Dias; Novais (2009), o uso do computador (ou outros suportes digitais) modificam as ações dos leitores e produtores de textos que não se restringem, exclusivamente, à escrita. Essas ações agregam outras, tais como escutar músicas, assistir filmes, conversar com amigos, jogar. A leitura na tela vai exigir dos leitores selecionar links, utilizar sites de busca, fazer comentários em blogs, identificar ícones em menus, acessar informações confiáveis, além de utilizar ferramentas computacionais presentes em computadores e dispositivos móveis, apenas para citar algumas ações envolvidas na cultura digital.

Para tanto, nas propostas de matrizes apresentadas pelos autores observa-se uma ampliação das matrizes já existentes, pois abarcam além das habilidades próprias do ambiente impresso, as habilidades técnicas e operacionais para utilizar os suportes digitais.

A matriz de letramento digital14 elaborada por Dias; Novais (2009) utiliza quatro categorias, chamadas de ações de usuários competentes, a partir das quais foram definidos os descritores. São elas:

a) Utilizar diferentes interfaces: representa a possibilidade de usar autonomamente o sistema de signos utilizado para prover a relação entre usuário e máquina em ambientes digitais;

b) Buscar e organizar informações em ambiente digital: representa as habilidades de navegação, de selecionar e buscar informação, de transitar eficientemente pelo “mar” de informações disponíveis nos meios ligados à rede mundial de computadores;

c) Ler hipertexto digital: para além das competências de leitura exigidas pelos diversos textos sejam eles impressos ou digitais, aqui a habilidade se refere à capacidade de construir múltiplos sentidos pelas ações de navegação e integração de novas linguagens;

d) Produzir textos (orais ou escritos) para ambientes digitais: as habilidades previstas para esta ação se referem à compreensão, aos limites e às possibilidades dos meios e suportes materializados pela tecnologia digital.

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A Matriz de Letramento Digital proposta por DIAS; NOVAIS (2009) está disponível em

A matriz de letramento digital15 proposta por Rosa; Dias (2012) foi composta a partir de duas dimensões, quais sejam:

a) Técnico operacional em TIC: representam os conhecimentos para manusear e utilizar as ferramentas próprias do ambiente digital;

b) Informacional em TIC: inclui as capacidades de relacionar, integrar e avaliar as informações e conteúdos disponíveis em ambiente digital, de acordo com a necessidade e intenções dos indivíduos.

Se a escola, importante agência de letramento, precisa incluir as tecnologias digitais em seus programas, como forma de acompanhar a evolução da linguagem, há que se elaborar maneiras de avaliar como os alunos têm se apropriado das práticas de leitura e escrita neste ambiente. Também é fundamental que se estabeleçam as habilidades a serem desenvolvidas a fim de que, a partir delas, as instituições educativas planejem como e quando ensiná-las.

15

A Matriz de Letramento Digital proposta por ROSA; DIAS (2012) está disponível em <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/10143/DISSERTA%C3%87%C3%83O_FINAL.p df?sequence=1>

CAPÍTULO 3

“O professor propõe o conhecimento, não o transmite [...]. Ele propõe o conhecimento aos estudantes como o artista propõe sua obra potencial ao público. Isto significa ‘modelar os domínios do conhecimento como espaços conceituais onde os alunos podem construir seus próprios mapas e conduzir suas explorações, considerando os conteúdos como ponto de partida e não como ponto de chegada no processo de construção do conhecimento’”. (SILVA, 2010, p. 227).

3 METODOLOGIA

O propósito deste capítulo é apresentar as opções metodológicas que fundamentaram a elaboração desta pesquisa e explicitar os critérios e as concepções que nortearam a definição dos objetos de análise. Para tanto, apresentaremos o Portal do Professor do MEC, ambiente utilizado para a investigação, suas características, sua forma de organização e funcionalidade, bem como o detalhamento do Espaço da Aula, objeto deste estudo.

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