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3. Fundamentação teórica e principais conceitos

3.5. Mobilização na saúde pública

Um ponto que também precisamos abordar é o tipo de mobilização social que é empregada na área de saúde pública. Para Henriques (2008), a utilização do termo mobilização social na área de saúde encerra vários sentidos. Na acepção mais comum e que é a comumente utilizada no campo da epidemiologia, tem um significado de movimentação para evitar os fatores que possam causar a expansão de uma epidemia ou a ocorrência de casos de uma doença.

Henriques e Mafra (2006) ressaltam que os processos de mobilização que têm por objetivo resolver questões, que dependam de um envolvimento coletivo dos atores sociais, como é o caso do controle das epidemias, se diferenciam daqueles que visam promover discussões mais amplas e formular políticas ou ações de longo prazo. Assim, esse tipo de ação mobilizadora, que precisa ganhar escala rapidamente, por se tratar de uma situação de perigo iminente, é marcada por estratégias massivas e dinâmicas. Neste caso, a mobilização,

precisa ganhar imediatamente significados fortes, para os quais não há muito tempo disponível para uma construção compartilhada: os sujeitos envolvidos devem sentir-se participantes de uma verdadeira “cruzada” em que está em jogo a sua própria vida e o bem estar coletivo. O aprendizado sobre o problema deve dar-se muito rapidamente, de forma simplificada, de tal modo que permita a ação numa direção minimamente eficaz. (HENRIQUES e MAFRA, 2006, p.105-106).

As questões epidêmicas muitas vezes cobram iniciativas constantes de vigilância, que seriam as mais imediatas, de curto prazo, mas também as de longo prazo, que envolveriam as questões culturais e sociais, o que reflete nas mudanças de comportamentos, que em grande parte das vezes são necessárias para evitar ou acabar com alguma doença. Ao se pensar em ações de longo prazo, entendemos que a mobilização social tem um papel ainda mais importante, pois por meio dela é possível articular ações perenes de prevenção e de mudança de comportamento, entre aos atores sociais e as instituições.

Assim, nesta perspectiva da mobilização social em situações de epidemia, a idéia de mobilização social tem um sentido bélico, pois a movimentação remete à imagem de deslocamento de tropas envolvidas em um conflito e também à urgência de se tomar atitudes para evitar um problema. Além disso, os vetores das doenças, como é o caso do Aedes aegypti, são apresentados como inimigos públicos a serem combatidos. Assim,

a comunicação para esse processo de mobilização social é entendida tradicionalmente em termos instrumentais, como campanha – palavra que também evoca o sentido bélico, de esforços concentrados e intensivos de combate. Reveste-se do caráter de exceção – como na guerra a suspensão de rotinas da vida ordinária, para fazer convergir atenções e ações – e utiliza-se de técnicas de propaganda à

semelhança da propaganda de guerra, que alimenta e justifica a excepcionalidade. (HENRIQUES, 2008, p. 1).

Apesar de ainda hoje essa noção tradicional de comunicação ser a mais comum nas ações de comunicação relacionadas à saúde pública, em especial as referentes às doenças epidêmicas, o que muitas vezes se justifica, dada a urgência necessária para debelar os surtos, acreditamos, assim como Henriques (2008), que esse tipo de comunicação não é suficiente para abarcar toda a complexidade do papel das ações de comunicação social nas situações críticas de saúde pública.

Henriques (2008) ressalta, que para o entendimento ampliado do termo mobilização social é necessário uma mudança de compreensão sobre a comunicação e suas funções, o que é um desafio, porque ao mesmo tempo em que a comunicação deve prover informações, também precisa criar ambientes que possibilitem a participação e cooperação das pessoas, de modo a contribuir e manter os vínculos entre essas pessoas, e buscar a coesão, necessária para o processo mobilizador.

A partir dessas definições do termo mobilização social, concluímos que para uma ação mobilizadora ocorrer, precisamos considerar não apenas a existência de objetivos comuns, mas também que seja estabelecida uma responsabilidade compartilhada entre os participantes em relação ao problema a ser solucionado e que a questão seja compreendida como sendo de interesse público. Somado a essas pré- condições, também se deve considerar que para uma estratégia de mobilização tentar alcançar a adesão das pessoas, os envolvidos devem se sentir fazendo parte do movimento, abraçando a causa. Além disso, os grupos precisam estar engajados de tal forma que produzam uma identidade, que garanta um vínculo ou co-responsabilidade em relação ao problema.

A ação comunicativa, em projetos de mobilização, tem a função de criar e manter vínculos, por meio do compartilhamento de sentidos e valores. Henriques et al. (2004) propõem e descrevem uma escala na qual os públicos podem ser comparados a partir do nível de vinculação que estabelecem com os projetos de mobilização. São propostos níveis que caracterizam a natureza e a força da vinculação: localização espacial, informação, julgamento, ação, continuidade, coesão, co-responsabilidade e participação institucional. Os critérios são colocados numa linha progressiva, para indicar que a vinculação dos públicos é um processo que pode ser construído a partir da

intervenção da comunicação. As ações co-responsáveis estabelecem vínculos fortes, assim será o sentimento de co-responsabilidade que vai garantir que cada pessoa se sinta beneficiária de sua própria ação.

A vinculação ideal dos públicos encontra-se no nível da co-responsabilidade, que ocorre quando o público gerador age por se sentir responsável pelo sucesso do projeto, entendendo sua participação como essencial. É importante que um projeto de mobilização permita o desencadeamento de ações concretas de cooperação e colaboração, onde os cidadãos se sintam efetivamente envolvidos no problema e compartilhem a responsabilidade pela sua solução.

Para Henriques e Mafra (2006), o processo de mobilização é algo bem amplo, porque busca reunir recursos dos atores sociais que participam do processo e criar vínculos. Por fim, Henriques (2008) pondera que a mobilização social é um processo comunicativo, marcado por um alto grau de incerteza, já que depende de níveis de interação, entendimento e interlocução para que ocorra. Neste sentido, a comunicação é inerente ao processo mobilizador e configura-se como um grande desafio para os gestores públicos e para a sociedade, porque o processo de comunicação para a área de saúde requer tanto ações comunicativas mais simples, quanto as mais especializadas.