• Nenhum resultado encontrado

2.1 TRANSMISSÃO DE ENERGIA ELÉTRICA: CARACTERÍSTICAS E

2.1.3 Modelos Regulatórios sob Assimetria de Informação

Neste setor que se caracteriza como um monopólio natural, demonstrou-se que a solução que otimiza o ganho social é a regulação da atividade, emanada pelo estado, e gerenciada por um órgão regulador. Deste modo, o ambiente de relações envolve três atores relevantes – as empresas reguladas, que objetivam o lucro; o governo, que representa a sociedade, e objetiva a modicidade das tarifas e a garantia de fornecimento dos serviços de energia; e o órgão regulador, que operacionaliza os objetivos do governo. Além disso, o órgão regulador tem como função objetivo a maximização do excedente total do mercado regulado, ou seja, da soma dos excedentes do consumidor e do lucro das empresas, por meio da determinação da estrutura de preços e do desenho de incentivos.

Uma fonte de complexidade da atividade da regulação é a assimetria de informação existente entre as empresas reguladas e o órgão regulador. O regulador não tem como conhecer completamente as atividades das reguladas, mas necessita cumprir seus objetivos sociais, distintos do objetivo da empresa regulada, que é o lucro. Independente do grau de esforço para reduzir as assimetrias, por diversos mecanismos de obtenção de informações, auditorias, relatórios periódicos, a assimetria é inerente à situação de regulação. Esta situação pode ser caracterizada como uma variação do Problema Agente (empresa transmissora) - Principal (Agência Reguladora). (BERG; TSCHIRHART, 1988)

Existem vários efeitos desta situação. Uma delas é o já citado efeito verificado por Averch e Johnson (1962) no setor de telefonia e telégrafos dos EUA em meados

do século XX. As empresas reguladas por custo do serviço tende a aplicar mais capital que o socialmente ótimo para a ampliação dos serviços regulados, uma vez que a remuneração é dada pela base de capital aplicada. Isso não significa que a empresa emprega os recursos com ineficiência absoluta, mas pode empregar uma tecnologia, ou combinação de recursos (capital e trabalho), eficiente do ponto de vista técnico, porém ineficiente do ponto de vista social, principalmente quando o custo de oportunidade é maior para o fator capital.

O efeito da assimetria de informação nas ações dos regulados tem resultados diversos a depender do estágio em que um setor se encontra. Na sequencia são apresentados, conforme Berg e Tschirhart (1988), efeitos relevantes na estrutura de uma indústria que resultam em arranjos específicos de atuação regulatória:

Mudanças Tecnológicas: O arranjo regulatório influencia a dinâmica tecnológica do setor a que está aplicado, ao mesmo tempo em que é afetado por inovações tecnológicas. Estruturas regulatórias que gerem barreiras à entrada limitam a competição e inibem o estímulo à inovação tecnológica. O efeito Averch-Johnson atua no sentido que as inovações são acompanhadas, sob uma regulação de tarifação pelo custo do serviço, na medida em que emprega capital adicional, passível de remuneração. Entretanto, o efeito não é suficiente para compensar o potencial de inovação de um mercado perfeito.

Outra forma encontrada para estimular a inovação é a definição de metas com base no desenvolvimento de outros mercados (externos). Esta opção tem como limite um efeito de assimetria de informação ainda maior, dada a complexidade da comparação entre diferentes mercados. Por outro lado, em uma estrutura de tarifação por price cap, os incentivos à inovação constante são maiores, devido ao mecanismo de apropriação temporária inerente ao modelo, conforme exposto. Porem, conforme Berg e Tschirhart (1988), a limitação dos estímulos está no grau de competição efetiva do setor.

Resumindo, a regulação tem como objetivo coordenar a operação de um setor de monopólio natural, e se limita a, artificialmente, criar um ambiente de competição que favoreça a inovação. Finalmente, mudanças tecnológicas drásticas tem o poder de transformar um setor de monopólio natural em um mercado competitivo, ou mesmo ampliar o escopo das atividades. Um exemplo deste último efeito é a atual complementaridade das redes de

transmissão elétrica com cabeamento de dados do setor, também regulado, de telecomunicações.

Contratos Incompletos: Existem custos de transação advindos do fato de que os contratos de concessão são incompletos. Ou seja, eles não conseguem prever todas as situações possíveis e a incerteza em relação a possíveis alterações das condições iniciais. Os consequentes conflitos e custos de transação são crescente em relação ao período de vigência do contrato, o que no setor elétrico tem consequências relevantes, uma vez que os contratos de concessão possuem longo período de vigência.

Em um ambiente de assimetria de informação e incompletude de contratos de longo prazo, a questão que se coloca é qual o modelo mais eficiente de regulação.

Posto de outra forma, o objetivo do regulador é definir as regras que gerem o comportamento esperado das empresas reguladas, que gerem otimização na aplicação de recursos e da garantia dos serviços em quantidade e qualidade requerida. Segundo Church e Ware (2000), a regulação por incentivos é uma opção de regulação que atende, principalmente, os requisitos de otimização de recursos, mesmo ao longo do contrato de concessão. Uma vertente amplamente utilizada em mercados de transmissão de vários países é a combinação de Tarifação por Price/Revenue Cap (a primeira aplicada à distribuição de energia, e a segunda à transmissão) com mecanismos diversos de regulação, como a Regulação por Comparação (Yardstick Competition) e a Regulação por Qualidade.

Na Regulação por Comparação (Yardstick Competition), o regulador, com base nos balanços e informações de custos e serviços prestados, compara as diversas concessionárias do mesmo setor, de diferentes áreas de atuação, e simula uma competição por eficiência operacional. Com base nas estimativas de eficiência verificadas, fixa os preços/receitas do ciclo tarifário seguinte com base nas mais eficientes, com algumas penalizações às mais ineficientes. A lógica deste mecanismo é reduzir o risco moral e seleção adversa da atuação das empresas reguladas, pois reduz a assimetria de informação e o próprio custo da regulação, visto que incentiva a divulgação de informações corretas, e condizentes com a realidade da empresa. O ponto fraco deste desenho de incentivo é a possibilidade de conluio entre os participantes do mercado, de modo a manterem o padrão de

eficiência baixo, e consequentemente manterem a receita inicialmente definida.

(SHLEIFER, 1985)

A Regulação por Qualidade é um mecanismo que premia/pune a qualidade dos serviços prestados, definidos por comparação a padrões estabelecidos pelo agente regulador.

Neste desenho, a competição entre as empresas ocorre em dois momentos:

(i) no momento do leilão da concessão, com lances por menor preço/receita, em que as empresas concorrem pela exploração do ativo na medida da sua capacidade estimada de executar a implantação (obras) do empreendimento em questão, e da expectativa da sua estrutura de custos ao longo do período de operação deste ativo;

e (ii) ao longo do período de concessão, em que a receita advinda do ativo varia de acordo com a sua eficiência relativa ao “mercado” (artificialmente criado pelas regras regulatórias), ou seja, a ativos similares e comparáveis do restante do sistema elétrico em que o agente regulador atua. Em teoria, esta estrutura tem como resultado o incentivo ao ganho de eficiência, à incorporação eficiente de inovações tecnológicas, e à garantia da qualidade dos serviços.