• Nenhum resultado encontrado

3.2. O mercado de trabalho enquadrado no regime jurídico português

3.2.2. Na actualidade

Em Portugal, as preocupações de carácter jurídico com o trabalho começaram como já foi referido no séc. XIX, com a aplicação das primeiras leis sociais de protecção ao trabalho de menores e do trabalho feminino. Com o passar das décadas, várias mudanças políticas assomaram o nosso país, mas a que mais contribuiu para o direito do trabalho actualmente em Portugal, foi a revolução de Abril de 1974.

44

Essa revolução derrubou o regime ditatorial presidido por Marcelo Caetano que estava em vigor há mais de 40 anos, e que tinha sido presidido na sua maioria por António de Oliveira Salazar. Durante essa ditadura, os trabalhadores tiveram a vida muito difícil no nosso país, pois, além de viverem em condições de pobreza, não tinham quem os pudesse representar livremente, dado que a forte censura não permitia as associações de patrões ou trabalhadores. De resto, estavam proibidas todas as associações. Com a subida de Marcelo Caetano ao poder, verificou-se uma ligeira abertura na legislação relativa ao trabalho e ao trabalhador, todavia, a forte censura e vigilância apertada continuavam. Com a revolução de Abril, e nas décadas subsequentes, a legislação portuguesa, no tocante ao trabalho, mudou bastante e chegou aos moldes em que se apresenta hoje. Dado o carácter bastante abrangente da legislação portuguesa relativamente ao trabalho, vão apenas ser referidos os aspectos mais importantes. (Leite, sd: 26-40).

Antes de mais nada, é importante referir o que é o direito do trabalho. É, pois, um conjunto de normas que regem e abrangem as matérias relativas ao trabalho. O direito do trabalho é de âmbito jurídico e social e abarca as relações entre os empregadores e entidades patronais e os trabalhadores. Mas abrange apenas o domínio do trabalho assalariado, ou seja, o trabalho que uma pessoa desenvolve mediante uma retribuição ou o que se designa por salário.

Esta relação entre empregador e trabalhador é marcada pela desigualdade, pois o trabalhador está sujeito à vontade e determinações do empregador, pelo que o direito do trabalho é uma área deveras importante para tentar pôr alguma justiça nessa realidade. Com o passar dos tempos e com a constante evolução e revoluções de vária ordem que os últimos séculos trouxeram, o direito do trabalho passou a abranger várias áreas como os direitos e deveres do empregador e do trabalhador, a greve, o despedimento, a retribuição ou a liberdade sindical. Sem o direito do trabalho o super- capitalismo distorceria os princípios democráticos das sociedades e desequilibraria ainda mais a balança em desfavor dos trabalhadores.

Estes artigos dizem respeito a aspectos como o direito ao trabalho, à greve, os direitos dos trabalhadores ou a liberdade sindical. No entanto, para uma maior protecção do trabalho e para uma maior fiscalização e regulação desta área, existe o Código do

Trabalho que constitui a legislação adequada para tratar das questões relativas ao

trabalho, aos seus intervenientes e às relações daí decorrentes. Em Portugal, o código do trabalho e a Constituição são duas das fontes mais importantes do direito do trabalho em

45

termos internos. Internacionalmente, temos, por exemplo, a Organização Mundial do trabalho (OIT) ou num âmbito mais continental, a União Europeia que, depois de tantas mudanças, de assinatura de vários tratados, como o de Nice ou o de Maastricht, consigna as preocupações com o emprego e protecção social. (Leite, sd: 1-8).

Na Constituição da República Portuguesa, a protecção ao trabalhador está consignada no seu Capítulo III (Direitos, Liberdades e Garantias dos trabalhadores), mais precisamente o artigo 53º ao artigo 59º. (AAVV 2006: 20-23).

O código do trabalho é, no entanto, a melhor base de apoio no que toca ao trabalho, pois abrange tudo o que é importante, desde o despedimento e modalidades deste, passando pela retribuição até à parentalidade. Um dos aspectos mais importantes é a noção de contrato de trabalho que, de acordo com o artigo 11º, reside no seguinte: “ Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas.”.

Esta definição é deveras importante para fixar o que um contrato de trabalho representa, no sentido de evitar situações ilegais ou más interpretações por parte dos intervenientes na relação de trabalho. Saliente-se a importância e relevância neste, mesmo contrato, dos elementos essenciais. São eles, o trabalho, a retribuição e a subordinação jurídica.

O trabalho é a actividade realizada pelo subordinado, que se supõe que seja uma actividade produtiva. A retribuição é a prestação que deve ser paga ao sujeito que realiza a actividade, e que pode ser paga em dinheiro ou géneros. Esse pagamento pode ser efectuado de várias formas: por período de tempo, por exemplo, o salário ao fim ou ao início do mês, ou ainda em função do rendimento como, por exemplo, a percentagem numa venda automóvel.

Relativamente à subordinação jurídica, há a dizer que o contrato de trabalho esta regulado por normas, leis. Essas normas estão presentes, por exemplo, no código do trabalho. Esta relação de trabalho é fiscalizada, além das normas, por instituições e por isso está subordinada a nível legislativo. Nesse mesmo contrato, os seus intervenientes principais (empregador e trabalhador) têm que respeitar certos aspectos. Existem direitos e deveres que cada uma das partes tem de cumprir.

Assim no código do trabalho, de acordo com o artigo 127º, dos deveres do empregador, este deve em conformidade com a alínea a):

46

b) “Pagar pontualmente a retribuição, que deve ser justa e adequada ao trabalho;” c) “Proporcionar boas condições de trabalho, do ponto de vista físico e moral;”

Estes são, portanto, alguns dos aspectos mais importantes que o empregador deve respeitar.

No artigo 128º, referente aos deveres do trabalhador, encontra-se exposto na alínea a) que o trabalhador deve:

“Respeitar e tratar o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as pessoas que se relacionem com e empresa, com urbanidade e probidade;” b) “Comparecer ao serviço com assiduidade e pontualidade;

c) “Realizar o trabalho com zelo e diligência;”

Como se pode pois verificar o código do trabalho é abrangente e fiscalizador quanto aos direitos, deveres e garantias dos trabalhadores e dos empregadores. Surge o

código do trabalho como um instrumento de defesa de certos princípios, tais como, o

direito ao trabalho e à segurança no emprego, o direito a uma retribuição suficiente, à prestação de serviços em condições dignas quer de segurança, higiene ou saúde.

Também aspectos como o direito à limitação à jornada de trabalho, à assistência material no desemprego, ou à participação são preocupações que se querem defendidas, para se poder falar de uma sociedade mais pluralista.

Em todo o mundo, um dos mais correntes conflitos entre empregador e trabalhador gira à volta da questão da retribuição ou salário. Ora, em Portugal, o caso não foge à regra.

No código do trabalho, no artigo 258º, considera-se retribuição:

1- “…A prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho.”

A retribuição tem tendência a ser analisada do ponto de vista económico, sendo esta o preço do esforço dispendido por parte do trabalhador no exercício da sua actividade. A retribuição é, pois, necessária para garantir ao trabalhador a fonte de rendimento que lhe permita satisfazer as suas necessidades básicas de aquisição de bens através do incremento de capital.

Do ponto de vista social, a retribuição é igualmente importante, pois permite ao trabalhador manter a dignidade, enquanto indivíduo auto-sustentável, pois a falta de

47

retribuição causa falta de independência económica, o que agride o trabalhador na sua dignidade.

Do ponto de vista jurídico, a retribuição é a prestação paga pelo empregador ao trabalhador pela actividade prestada. É uma obrigação que está consignada na relação de trabalho. São estes os vectores mais importantes acerca dos quais as preocupações com a retribuição deve incidir.

O não pagamento da retribuição acarreta consequências para o empregador que podem englobar pena de prisão, conforme o disposto no ponto 3 do artigo 324º do contrato de trabalho. (Rocha, Pimenta 2010: 44; 85; 136; 11).

A retribuição ou salário deve ter três componentes chave: são eles os seguintes: a

obrigatoriedade, pois o empregador deve pagar pelo serviço prestado. De resto, a

obrigatoriedade está bem presente na noção de contrato de trabalho que já foi acima referida.

O segundo componente é a patrimonialidade, isto é, o salário deve acrescentar valor económico à realidade do trabalhador, quanto mais não seja se for usado para adquirir património. O salário contribuirá sempre para enriquecer o património do trabalhador.

O terceiro e último parâmetro será a correspectividade ou seja, a retribuição deve ser feita se houver prestação do serviço. Deve portanto haver uma correspondência entre a retribuição e o serviço prestado. A retribuição pode ainda ser de carácter certo ou seja paga em função de um período temporal (hora, semana ou mês), variável ou o mesmo é falar, em função do rendimento como uma comissão, por exemplo, ou mista que engloba esses dois parâmetros.

Portanto resumidamente, o direito do trabalho, tanto em Portugal como fora, constitui-se como uma área que visa tentar compensar de alguma maneira a desigualdade de forças que constitui a relação de trabalho entre empregador e trabalhador. Essa desigualdade é na maior parte dos casos, desfavorável ao trabalhador, pois é este que se encontra numa posição de dependência relativamente ao empregador. Porque o trabalho ocupa uma boa parte da vida de cada um de nós, porque ele é um factor de estruturação social, porque é necessário para o homem ou para o trabalhador adquirir os bens necessários a uma boa qualidade de vida, porque isso em muitos casos só é conseguido mediante uma relação de dependência perante outrem, é essencial uma área como o direito do trabalho que, acima de tudo, fiscalize e zele pelo trabalho e seus intervenientes. (Leite, sd: 107-110).

48