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3. O ESTADO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS

3.2 O CONFRONTO IDEOLÓGICO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS

À guisa de trazer os conceitos teóricos para a atual discussão e, ao mesmo tempo, relacioná-los mais diretamente ao tema pesquisado, é curial verificar o posicionamento dos neoliberais. Com este fito será utilizado o estudo de Cláudio Gonçalves Couto.

O posicionamento liberal defende que o estatuto das decisões do governo e o estatuto das normas constitucionais são coisas distintas. Em outras palavras, que a Constituição deve limitar-se aos direitos fundamentais, sem interferir no jogo político. Seguindo essa teoria, tal diferenciação se concretizaria em três dimensões: polity, a carta constitucional conte ndo a estruturação do Estado, equivalentdo à política constitucional; politcs, a política competitiva, o jogo político propriamente; e policy, as políticas públicas, condicionadas pelas duas anteriores, que devem obedecer aos parâmetros constitucionais, mas também sujeitarem-se ao jogo político. 213

Sobre a primeira dimensão, após analisar as argumentações sobre as possibilidades de afronta à democracia do conteúdo da carta constitucional, o autor conclui que não seria antidemocrático uma Constituição conter assuntos e questões que:

Versassem sobre temas situados fora do campo dos direitos fundamentais e das regras do jogo democrático; ou, mesmo versando sobre temas incluídos nesse campo, pudessem ser tratados sem o risco de que, com as decisões tomadas, tais direitos ou regras fossem violados.214

Assim, de acordo com a política constitucional (ou com os princípios constitucionais), a fixação de restrições que atentem contra a democracia, ou ao menos contra seus aspectos essenciais, representados pela manutenção do jogo político, da própria

213 COUTO, Cláudio Gonçalves. Constituição, competição e políticas públicas. Revista Lua Nova, São Paulo, n. 65: p. 95-135, 2005. p. 95-96.

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democracia e dos direitos fundamentais, vincula-se a uma questão lógica de sobrevivência da própria democracia.215

A partir desse raciocínio, exemplificando o pensamento liberal, Cláudio Gonçalves aponta que as políticas públicas estariam fora das mencionadas restrições, uma vez que se relacionam à policy devem fazer parte do jogo político, devem sujeitar-se a maiorias eventuais sob pena de sua previsão constitucional amarrar a condução do governo, podendo gerar uma crise de governabilidade.216 A disposição programática de políticas públicas caracterizaria, portanto, um rebaixamento da Constituição a meras leis constitucionais antidemocráticas. Para sustentar esse ponto de vista, o autor faz referência aos ensinamentos de Carl Schmitt em oposição à idéia de

Constituição Dirigente, de Canotilho, e considera que esta tem caráter

antidemocrático ao retirar de uma determinada maioria, de um dado povo em um dado momento, sua capacidade de decidir como governar-se. Couto contesta também a associação, de José Joaquim Gomes Canotilho, da Constituição Dirigente a uma ordem socialista ou social-democrática, e uma não-dirigente como sendo apropriada a uma ordem liberal, enfatizando que certos conteúdos normativos, caso constitucionalizados, diminuem o grau de democracia em vigor.217

Ainda com o intuito de contrapor a argumentação neoliberal, é importante indicar as contradições desse tipo de discurso. Primeiramente, como informado pelo autor, sua análise tem como pressuposto “um tipo ideal de Estado democrático, que seja um veículo à consecução de vontades majoritárias, cambiantes ao longo do tempo”218. Esse ponto de partida justifica a análise empreendida por Couto e, ao mesmo tempo, o afasta da legitimação das comparações mostradas, pois desconsidera as especificidades do caso brasileiro, que está bastante distante de uma sociedade cujo equilíbrio de grupos sociais admitiria uma discussão democrática mais efetiva, ao vincular seu estudo a uma situação ideal, universal.

215 COUTO, C. G. Constituição, competição e políticas públicas, p. 100-109. 216 Ibid., p. 110-118.

217 Ibid., p. 110-118. 218 Ibid., p. 117.

Em dada passagem do texto, Couto afirma a importância dos direitos fundamentais como “condições externas necessárias à sua preservação [da democracia]”219,

porém no momento de exemplificar quais são esses direitos, restringe-se à liberdade e aos direitos políticos, esquecendo-se por completo da igualdade, que sequer é mencionada em todo o artigo, fato corriqueiro na postulação neoliberal. Compara o direito de propriedade e os direitos sociais aos direitos de liberdade ou de exercício de poder político, mencionando que todos são igualmente benéficos a quaisquer pessoas, entretanto assevera que os últimos são direta e inerentemente necessários à democracia, ao passo que os outros não, sem, contudo, esclarecer essa hierarquia. E segue sem voltar a mencionar os direitos sociais relacionados ao Estado de bem-estar.

A primeira menção a Carl Schimitt lembra que tratava-se de um “teórico da Constituição que muito pouco apreço tinha pelo regime democrático”220. Todavia, à despeito dessa observação, Couto usa diversas passagens do referido autor para fundamentar seu ponto de vista.

Apesar de contestar a associação de Canotilho, Cláudio apresenta em seu trabalho, do título à conclusão, um pensamento condizente com a lógica de mercado, afinado com a ideologia liberal, voltado para a competitividade política. O maior problema que pode ser apontado nesse tipo de análise é justamente seu pressuposto: um ambiente de igualdade plena, onde a teoria da escolha racional, que permeia boa parte do discurso liberal, possibilitasse uma evolução social, tanto política quanto economicamente.

Pode-se dizer que esses apontamentos são impressões a serem confrontadas com o uso das teorias questionadas por Couto e por outros teóricos do Estado e das políticas públicas. Sendo assim, torna-se apropriado verificar o posicionamento de José Joaquim Gomes Canotilho, com a finalidade de encontrar parte do respaldo para essas observações iniciais, bem como para avaliar a colaboração de sua teoria constitucional para a presente pesquisa.

219 COUTO, C. G. Constituição, competição e políticas públicas, p. 106. 220 Ibid., p. 112.

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Logo no início de sua obra, Canotilho já demonstra uma preocupação com o aspecto científico de seu estudo, ressalta ndo nesse sentido a metodologia a ser seguida, e adverte sobre a necessidade de despir-se de preconceitos.

Dir-s e-ia que a Constituição dirigente está morta se o dirigismo constitucional for entendido como normativismo constitucional revolucionário capaz de, só por si, operar transformações emancipatórias. Também suportará impulsos tanáticos qualquer texto constitucional introvertidamente vergado sobre si próprio e alheio ao processo de abertura do direito

constitucional ao direito internacional e aos direitos supranacionais. Numa

época de cidadanias múltiplas e de múltiplos de cidadania seria prejudicial aos próprios cidadãos o fecho da constituição, erguendo-se à categoria de “linha Maginot” contra invasões agressivas dos direitos fundamentais.221

O autor deixa consignada a premissa básica que, exatamente ao contrário da abordagem liberal, prevê como necessário o delineamento constitucional das políticas públicas.

Alguma coisa ficou, porém, da programaticidade constitucional. Contra os que ergueram as normas programáticas a “linha de caminho de ferro” neutralizadora dos caminhos plurais da implantação da cidadania, acreditamos que os textos constitucionais devem estabelecer as premissas materiais fundantes das políticas públicas num Estado e numa sociedade que se pretendem continuar a chamar de direito, democráticos e sociais.222

E indica claramente sua oposição à linha liberal, e o risco inerente ao jaez desse estudo.

Todavia, opor democracia a Estado de Direito Material, pensando-se que basta assegurar as regras do “jogo democrático” – o processo – para, posteriormente, se conquistar a “justiça”, ou identificar democracia com liberdade incondicional do legislador, é abrir o caminho para a redução das leis a simples produtos da organização de domínio.223

Aproveitando para indicar a motivação de uma abordagem com vistas à realidade, ao mesmo tempo que expõe a fragilidade do “idealismo” democrático-liberal, Canotilho assevera:

221 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição dirigente e vinculação do legislador. 2. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2001, p. XXIX.

222 Ibid., p. XXX. 223 Ibid., p. 21-22.

Eis outra “proposição” ou “tese” nuclear deste trabalho: a programática de uma constituição dirigente, democraticamente fixada e compromissoriamente aceite, aspira tornar-se a dimensão visível de um projecto de justo comum e de direcção justa. A especificação da tarefa normativo-constitucional possibilita melhor o conhecimento da dignidade material da constituição do que um “não dito”, qualquer que seja o motivo indicado para a ocultação deliberada de princípios ou directivas.224

A obra de Canotilho é bastante complexa e abrangente e configura-se como referência obrigatória para a pesquisa sobre a teoria constitucional. Contudo, o restrito objetivo de avaliar a validade de distintas abordagens sobre políticas

públicas, impede o aprofundamento neste estudo, sendo preferível evidenciar o

conflito ideológico que permeia os distintos posicionamentos e, mais que isso, verificar qual dessas abordagens se coaduna à possibilidade de diminuição da desigualdade. O próprio autor chama atenção para o antagonismo entre as abordagens:

Quem defende uma perspectiva democrático-social do Estado (socialista ou social-democrática), aceita que na constituição venham traçados os princípios fundamentais, socialmente conformadores; quem visualiza “o problema da justiça” sob uma óptica liberal-individualista contestará o “paternalismo social” da lei fundamental e a extensão dos “efeitos externos” nela consagrada, apelando para uma “constituição da liberdade”, para uma “cura da elegância do Estado” e para os perigos de “sobrecarga” do governo.225

Reafirmando a premissa que deve ser levada em conta :

Entende-se, como já foi dito, que os problemas da constituição dirigente não podem ser equacionados se os “arquétipos” paradigmáticos continuarem a ser os do Estado Liberal e os da compreensão imperativística do direito.226

Pode-se conferir que a abordagem de Canotilho é mais atual, além de pautar-se mais profundamente na preocupação com os problemas que a sociedade enfrenta e refutar a “lógica de confirmação do status quo”227 liberal, busca ultrapassar a

questão conflitual, postulando a autonomia do direito, advinda da comentada complexidade que a evolução do Estado alcançou. O autor põe em relevo o fato de que não é mais possível a redução de todos os fenômenos, principalmente os

224 CANOTILHO, J. J. G. Constituição dirigente e vinculação do legislador, p. 22-23. 225 Ibid., p. 55-56.

226 Ibid., p. 65. 227 Ibid., p. 41.

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jurídicos, a elementos delimitados à superestrutura do fundo econômico. Nesse possível deslocamento, ou desvinculação, do foco do Estado no interesse minoritário para um panorama aberto, o direito pode transmutar-se, ainda que parcialmente, de ferramenta de legitimação do Estado burguês para instrumento de conformação e direcionamento da atividade estatal para as finalidades democraticamente estabelecidas.

Certo: (1) a “instância política e a “instância jurídica” são “determinadas em última instância” pela instância económica; (2) a superestrutura jurídica “retroage” sobre a base económica. Todavia, a “activa efectividade do direito”, em geral, e a força conformadora-normativa do direito constitucional, em particular, pressupõem a sua “relativa autonomia”, pois se o direito se identificasse ou fosse sempre “congruente” com as relações de produção ou com outras relações sociais sobre as quais vai actuar, então ele próprio não se poderia considerar como fenómeno social autónomo nem ter eficácia socialmente conformadora. Quer dizer: a relação de “condicionalidade” e a “reciprocidade de efeitos” não justifica uma “economicização do direito” e, muito menos, uma determinação económico monocausal. Este é o ponto de partida adequado à compreensão da constituição dirigente – uma lei fundamental com “aspirações rectoras”, logicamente não dissolvidas nas “relações económicas” existentes no momento da sua génese. Em termos estruturalistas: o sistema jurídico é um

sistema de mediação com um “espaço de jogo” relativamente autónomo.228

Este avanço em relação à dicotomia ideológica na teoria do Estado, já podia ser notado em Hermann Heller229, desde 1968, quando este autor aponta que Engels,

nos últimos trabalhos, havia se tornado cauteloso na associação necessária do Estado como aparato da dominação de classe, enxergando a possibilidade de um Estado autônomo diante de classes próximas do equilíbrio. Heller observa que “em todo caso deve considerar-se inadmissível a relativização do Estado à economia, quer se trate da do povo dividido em classes, quer da do povo economicamente solidário”230. Além disso, conclui também, após analisar os vários caracteres da

formação histórica do Estado moderno, que “nem em conjunto nem, muito menos, isoladas, podem tais condições revelar-nos a lei substantiva do Estado”231.

Portanto, deve-se entender a Constituição Dirigente como a opção mais apropriada à tentativa de diminuição da desigualdade econômica e social, na trilha de

228 CANOTILHO, J. J. G. Constituição dirigente e vinculação do legislador, p. 50-51. 229 HELLER, Hermann. Teoria do Estado. São Paulo: Mestre Jou, 1968. p. 203-210. 230 Ibid., p. 210.

ultrapassagem dos resquícios históricos de dominação, como base de uma grande tarefa a ser realizada, conforme pode-se depreender da análise de Canotilho, que resume sob o tópico Constituição e constituição dirigente: a realidade como tarefa, a possibilidade da consecução dessa vontade majoritária, através da efetivação de políticas públicas, tendo como ponto de partida uma base realística da necessidade de diálogo entre sociedade e mercado:

Uma irredutível dualidade parece marcar as discussões em torno da constituição: a ideia de sociedade civil e liberdade dos homens, assente no “mercado”; a ideia de sociedade e igualdade, assente no “Estado”. A

perspectiva que se vai adoptar parte, pelo contrário, da ideia de conformação da sociedade, numa determinada situação histórica, como um problema aberto. Mais do que apurar uma ontologia do “ser do Estado” ou

do “ser do mercado” e considerar esses “seres” como “pontos” e “limites” absolutos, importa inseri-los num processo dialéctico em que o problema da constituição social é um problema de transformação da realidade a realizar pelos homens.232

Não se trata de uma preferência pessoal, mas da constatação de que o entendimento da Constituição Dirigente é mais coerente com a necessidade de mudança, a considerar que traz como característica, essencial, a necessidade de transformação da realidade, como nos confirma Gilberto Bercovici:

Para a Teoria da Constituição Dirigente, a Constituição não é só garantia do existente, mas também um programa para o futuro. Ao fornecer linhas de atuação para a política, sem substituí-la, destaca a interdependência entre Estado e sociedade: a Constituição Dirigente é uma Constituição estatal e social. No fundo, a concepção de Constituição Dirigente para Canotilho está ligada à defesa da mudança da realidade pelo direito. Seu sentido, seu objetivo é o de dar força e substrato jurídico para a mudança social. A Constituição Dirigente é um programa de ação para a alteração da sociedade.233

Bercovici identifica essa característica na Constituição Federal brasileira:

Neste sentido, a Constituição de 1988 é, claramente, uma Constituição Dirigente, como podemos perceber da fixação dos objetivos da República no seu art. 3º: “Ar. [sic] 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Os princípios

232 CANOTILHO, J. J. G. Constituição dirigente e vinculação do legislador, p. 69. 233 BERCOVICI, G. Constituição Econômica e Desenvolvimento, p. 35.

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constitucionais fundamentais, como os mencionados no art. 3º, têm a função, entre outras, de identificação do regime constitucional vigente, ou seja, fazem parte da fórmula política do Estado, que o individualiza, pois esta diz respeito ao tipo de Estado, ao regime político, aos valores inspiradores do ordenamento, aos fins do Estado etc. Também define e delimita a identidade da Constituição perante seus cidadãos e a comunidade internacional. Em suma, a fórmula política é a síntese jurídico- política dos princípios ideológicos manifestados na Constituição. O que contraria essa fórmula política afeta a razão de ser da própria Constituição.234

Entretanto, o próprio Bercovici alerta para o risco que pode advir de uma leitura extrapolada da teoria constitucional postulada por Canotilho:

Para resistir às críticas e às tentativas de enfraquecimento e desfiguração da Constituição de 1988 é necessário sair do instrumentalismo constitucional a que fomos jogados pela adoção exageradamente acrítica da Teoria da Constituição Dirigente, que é uma teoria da Constituição autocentrada em si mesma. Ela é uma teoria “auto-suficiente” da Constituição. Ou seja, criou-se uma Teoria da Constituição tão poderosa, que a Constituição, por si só, resolve todos problemas. O instrumentalismo constitucional é, desta forma, favorecido: acredita-se que é possível mudar a sociedade, transformar a realidade apenas com os dispositivos constitucionais. Conseqüentemente, o Estado e a política são ignorados, deixados de lado. A Teoria da Constituição Dirigente é uma Teoria da Constituição sem Teoria do Estado e sem política. E é justamente por meio da política e do Estado que a Constituição vai ser concretizada.

[...]

Embora sua juridicidade seja essencial, a Constituição não pode ser entendida isoladamente, sem ligações com a teoria social, a história, a economia e, especialmente, a política.235

Com o intuito de verificar a autonomia e a importância do direito na história estatal, encontra-se no estudo de Carlos Miguel Herrera, a análise do desenvolvimento do Estado social sob a perspectiva jurídica da relação deste com os direitos sociais. O autor lembra que o Estado Social é relativamente recente, encontrando na Alemanha do final do século XIX o primeiro modelo, vindo, em seguida, o Estado intervencionista do entre-guerras e o Estado do bem-estar após a segunda guerra. Busca analisar, ao contrário de uma visão evolucionista que contrapõe os direitos sociais aos direitos fundamentais individuais, uma possível descontinuidade nesses tipos de Estado, e que essas variações não se vinculam diretamente aos direitos sociais.

234 BERCOVICI, G. Constituição Econômica e Desenvolvimento, p. 36. 235 Ibid., p. 40-41.

O primeiro modelo, segundo Herrera, o Estado liberal, pode ser visto como resultado de um duplo fracasso: dos liberais, quanto à forma constitucional, e dos socialistas franceses, que reivindicavam um direito ao trabalho.236 O autor destaca que nessas circunstâncias preferiu-se não assegurar um direito ao trabalho contra o Estado, mas dividí-lo em assistência aos necessitados, e um “direito de trabalho para todos”, pelo qual o Estado deveria ajudar os cidadãos desempregados a procurarem trabalho

dans les limites de ses ressources237.

Sobre essa primeira forma de Estado social, o autor conclui:

Ce n’est donc pas étonnant de constater que dans les Etats qui présentaient la politique sociale la plus avancée de l’époque (Allemagne mais aussi la Belgique et l’Angleterre), la question se posait en termes législatifs et non constitutionnels. La coïncidence stricte entre l’État social et la reconnaissance de droits sociaux ne se produira que dans l’entre-deux- guerres. C’est à ce moment que l’on commence à penser à un "État de droit" d’un type particulier, dont les fondements de son action sociale se trouveraient dans des droits sociaux sanctionnés dans la constitution.238

A segunda forma se manifesta na Europa, sob a influência da Revolução Russa, com as corporações ganha ndo força, equilibrando o conflito com os empresários, fazendo prevalecer a necessidade de uma colaboração entre classes, e os direitos sociais exigindo a relativização dos direitos individuais, gerando a ruptura do Estado liberal para sobressair um Estado integral, totalitarista, intervencionista no plano econômico e social, e que buscava uma harmonização das forças produtivas e não igualdade.239

A terceira forma, o welfare state, será estudada adiante. Por enquanto, vale destacar as observações de Herrera240 sobre as características desse Estado: a queda dos

regimes totalitários; a universalização do particular, não protegendo somente os setores desfavorecidos; o fim do divórcio entre os direitos sociais e a cidadania; o desequilíbrio entre os fins estabelecidos e o investimento nos meios para alcançar

236 HERRERA, Carlos Miguel. État et Regulation Sociale – Comment penser la coherence de

l’intervention publique? Disponível em: <http://matisse.univ-paris1.fr/colloque- es/pdf/articles/herrera.pdf> Acesso em: 02 nov. 2007. p. 3.

237 Ibid., p. 4. 238 Ibid., p. 6. 239 Ibid., p. 6-8. 240 Ibid., p. 8-10.

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esses fins; a integração das massas trabalhadoras ao capitalismo, através de uma transferência de rendimento , entre outras. A conseqüência disso:

Le problème du changement social par la transformation du régime de propriété privée, qui était encore au coeur du premier constitutionnalisme social, avait perdu sa centralité du moment où la social-démocratie réduisait son programme à l’intégration de la classe ouvrière dans cet État.241

A constatação de Carlos Miguel Herrera, de que não se trata de uma evolução do Estado, mas de momentos de ruptura, não se mostra desprovida de fundamento, e ajuda a explicar, sob o viés do reformismo capitalista, os problemas enfrentados pelos atuais Estados de bem-estar, que, tendo favorecido a possibilidade da constitucionalização de políticas sociais, não chegaram a equiparar os direitos sociais aos direitos fundamentais individuais:

Car la question constitutionnelle du social se resserre davantage en termes