• Nenhum resultado encontrado

5. EXPERIÊNCIAS QUE PROMOVEM A PAZ: AS FLAS DOS JOVENS

5.5 Escola Promotora da paz

5.5.1 O exercício da convivência

Os jovens apontam um caminho muito importante para a reflexão de todos sobre como construir a paz e a importante contribuição da escola na direção de uma educação voltada para a promoção da cultura de paz. “Ensinando a seus alunos não só conteúdos, mas ensinando-os a serem humanos, amigos, solidários” (Jovem, Educando - Oficina Escola VILA). É bastante significativa essa resposta do educando. Aprender a viver juntos, a conviver, este é o grande desafio atual, traduzido nas palavras do sujeito pesquisado. Como indica Serrano (2002, p.11), tal exercício de convivência é prioritário para o desenvolvimento das potencialidades do ser mais profundo e originário da pessoa. “Dessa ótica, podemos criar e recriar uma cultura genuína da paz, da tolerância e da democracia.”.

Para explicitar melhor a relação do que descrevo no parágrafo anterior com um suporte teórico refiro-me ao conteúdo do relatório da UNESCO sobre os quatro pilares da educação34

, organizado por Delors (1996), que chama atenção para um aspecto pertinente observado por mim na fala do sujeito pesquisado, a dimensão do aprender a conviver, que segundo o relatório

34

No século XXI as missões da educação fazem com que englobe todos os processos que levam as pessoas, desde a infância até ao fim da vida, a um conhecimento dinâmico do mundo, dos outros e de si mesmas, combinando de maneira flexível quatro aprendizagens fundamentais. Aprender a conhecer: Adquirir os instrumentos da compreensão. Aprender a fazer: Para poder agir sobre o meio envolvente. Aprender a viver juntos: A fim de participar e cooperar com os outros em todas as atividades humanas. Aprender a ser: Via essencial que integra as três precedentes.

consiste em aprender a viver com os outros desenvolvendo a compreensão do outro e a percepção das interdependências - realizar projetos comuns e preparar-se para gerir conflitos - no respeito pelos valores do pluralismo, da compreensão mútua e da paz.

Ressaltada a importância da convivência, necessário se faz apresentar uma definição para esse termo. Para tanto, recorro à contribuição de Boff (2006b, p.32) “como a filologia da palavra convivência claramente sugere, trata-se de uma vivência vivida sempre com os outros (con) e jamais sem os outros”. Implica na abertura respeitosa para o diferente, ou seja, ela só surge a partir da relativização das diferenças em favor de pontos em comum.

Sobre essa temática o autor acrescenta que devemos nos abrir para outras dimensões da convivência. O seu entendimento não pode ser restrito a uma visão antropocêntica. Dessa forma, o ser humano precisa construir um novo padrão de relacionamento com o planeta. “Os povos devem aprender a conviver entre si e com o planeta Gaia, com ecossistemas, com seu entorno mais imediato” (BOFF, 2006b, p.41).

A escola VILA organiza o seu currículo enfatizando a integração de todas as dimensões do ser humano. O cuidado com todos os seres vivos, incluindo nesse âmbito o planeta Terra. Acredito que esse movimento é uma importante iniciativa que precisa ter maior expressão, pois aprender a viver em paz é, basicamente, um exercício de transformação, de mudança. É uma mudança significativa na maneira de perceber o “outro” e de se perceber como elo de uma corrente interdependente. Viver humanamente é sempre con-viver (BOOF, 2002, p. 124).

O exercício da convivência inclui o desenvolvimento de valores que irão nortear a construção de habilidades como o diálogo com a diversidade, a tolerância com o diferente, ou seja, como essencialmente aprender a lidar com o outro pela prática do respeito mútuo. “Una cultura de paz tiene que recuperar para muchos ciudadanos, desarrollar para otros y cultivar para todas y todos, el valor del compromiso y la solidariedad” (JARES, 2007b, p. 121).

A partir do observado, reporto-me à contribuição de Jares (2007a) que sistematizou pontos elucidativos sobre o trabalho do professor, de acordo com a proposta da educação para a paz. Para o autor o(a) professor(a) possa deverá incluir em seu repertório profissional a habilidade de conduzir grupos., principalmente no que diz respeito ao trato dos possíveis conflitos oriundos da convivência grupal. Incentivar a convivência cooperativa e não negar a existência de conflitos. Saber enfrentar as

situações conflitivas de forma positiva, ou seja, de maneira não-violenta. “Aprender a conviver significa conciliar a igualdade e diferença” (JARES, 2007a, p. 179).

É importante ressaltar que “a aprendizagem da convivência não pode ser uma tarefa improvisada nem sujeita à mera intervenção verbal em determinado momento” (JARESa, 2007, p.177). O processo de educação para a paz deve ter o caráter de perenidade, ou seja, não pode ser uma iniciativa isolada e provisória. Para que se alcancem os resultados desejados há de se primar pela continuidade dos programas. “A Educação para a Paz é um processo permanente” (MATOS, 2007, p.66).

As dimensões interpessoal e afetiva são priorizadas na educação para paz, contudo não podem se restringir ao aspecto individual. O desafio da convivência é estar aberto para o outro. Dessa forma, é indicado que se tenha atenção para se evitar uma postura de ensimesmamento (JARES, 2006). Além disso, na perspectiva da construção da cultura de paz, concordo com o posicionamento de Matos (2007, p. 66) “Somos sujeitos que podemos instaurar esse processo, assumindo-o enquanto construtores coletivos, ou seja, não é possível pensar em paz individual”.

A dimensão da convivência nos desafia a ampliar nossa consciência do que existe ao nosso redor, sobretudo, pelo contato com o outro numa relação de interdependência. Nesse território vasto e incerto uma via se apresenta essencial para a concretização dos frutos da convivência. Reporto-me à prática do diálogo, peça fundamental na efetivação da convivência e na promoção da paz que descreverei com mais detalhes no próximo item.