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O Flagrante na prática policial judiciária cearense

3 ASPECTOS PRÁTICOS DA PRISÃO EM FLAGRANTE NA POLÍCIA JUDICIÁRIA DO CEARÁ

3.2 O Flagrante na prática policial judiciária cearense

Antes da lei 11.113/2005 o auto de prisão em flagrante era lavrado do seguinte modo: O Condutor do preso apresentava o mesmo à autoridade policial, juntamente com as testemunhas e vítimas. A autoridade policial, após se inteirar dos fatos, determinava a lavratura do auto de prisão em flagrante, que era uma peça única. Um termo onde constavam o depoimento do condutor, das testemunhas, as declarações da vítima e o interrogatório do indiciado. Acostava-se a esta peça nota de culpa, nota de ciência das garantias constitucionais, auto de apresentação e apreensão, termo de restituição, ofícios de comunicação da prisão ao Juiz e ao Promotor de Justiça e comunicação de prisão à família.

Percebe-se que o modelo de flagrante descrito, em uma única peça, trazia algumas desvantagens para o “cliente” da Polícia Judiciária. O Condutor, muitas vezes um policial militar de serviço, passava várias horas aguardando na delegacia de polícia para serem tomados os outros depoimentos, declarações e interrogatórios e, somente depois de elaborado e impresso o auto, era que o Condutor poderia assinar, fato este que certamente causava prejuízo à população que ficava desprotegida, pois aquela área que era coberta por aquela patrulha, estava descoberta com a permanência dos policiais por várias horas na delegacia. Não obstante aos policiais, mesmo a permanência das testemunhas e vítima na delegacia de polícia, gerava um certo incômodo e transtorno, pois como é do conhecimento de todos, o ambiente policial não é dos mais salutar.

Com a entrada em vigor da lei 11.113/2005, houve a mudança do Art. 304, do Código de Processo Penal, bem como seu parágrafo terceiro. Anteriormente, a citada lei dispunha o seguinte:

Art. 304. Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e as testemunhas que o acompanharam e interrogará o acusado sobre a imputação que Ihe é feita, lavrando-se auto, que será por todos assinado.

§ 3o Quando o acusado se recusar a assinar, não souber ou não puder fazê-lo, o auto de prisão em flagrante será assinado por duas testemunhas, que Ihe tenham ouvido a leitura na presença do acusado, do condutor e das testemunhas.

Passou a vigorar agora desta maneira:

Art. 304. Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto.

§ 3o Quando o acusado se recusar a assinar, não souber ou não puder fazê-lo, o auto de prisão em flagrante será assinado por duas testemunhas, que tenham ouvido sua leitura na presença deste.

Constata-se que a mudança foi basicamente em liberar o mais rápido possível o Condutor do preso, para que o mesmo retorne logo às suas atividades. Em sendo um policial militar integrante de uma patrulha, será ele inicialmente ouvido e o depoimento reduzido a termo, impresso e assinado por este, pela autoridade policial e pelo Escrivão. Após ser entregue o Recibo de Preso ao Condutor, este será liberado para dar continuidade ao seu mister constitucional de polícia ostensiva. Nos mesmos moldes, serão tomados individualmente os depoimentos das testemunhas e declarações das vítimas, sendo as mesmas liberadas após a coleta de suas assinaturas nos respectivos termos de depoimentos e termos de declarações. Percebe-se que estas pessoas não mais terão de aguardar as oitivas de todos os envolvidos na ocorrência para, somente depois, assinar e serem liberados.

Decorrente das mudanças ora apresentadas, o novo auto de prisão em flagrante, será composto, tipicamente, das seguintes peças:

1) O Auto de prisão em flagrante propriamente dito, com uma breve narrativa da conduta do preso, mencionando data, local, hora e tipificação, em tese, da infração, bem como o nome da Autoridade Policial que presidiu o feito e do Escrivão de Polícia que o lavrou;

2) O Termo de Depoimento em Auto de Prisão em Flagrante do Condutor; 3) O Termo de Recibo de Entrega de Preso;

5) O Termo de Depoimento em Auto de Prisão em Flagrante da 1ª Testemunha; 6) O Termo de Depoimento em Auto de Prisão em Flagrante da 2ª Testemunha; 7) O Termo de Declarações em Auto de Prisão em Flagrante da Vítima: 8) O Termo de Restituição;

9) O Termo de Interrogatório em Auto de Prisão em Flagrante do Indiciado; 10) A Nota de Culpa passada ao Indiciado;

11) O Ofício comunicando a prisão ao MM. Juiz;

12) O Ofício comunicando a prisão ao Exmº. Promotor de Justiça; 13) O Boletim Individual do Indiciado;

14) A Folha de Antecedentes Criminais do Indiciado.

Sabe-se que com a autuação em flagrante, obrigatoriamente inicia-se o inquérito policial, sendo que em seguida a autuação do conduzido, poderá o presidente do inquérito policial determinar a realização de demais diligências, como perícias, exames de corpo de delito, oitiva de outras testemunhas, reinquirições, acareações, reconstituição de crime, escutas telefônicas autorizadas pela justiça, ou qualquer outro meio de prova admitida pelo Direito. No final, deverá a Autoridade Policial que preside o inquérito, fazer um relatório das diligências realizadas, apontar os indiciados e remeter o inquérito ao Poder Judiciário. Na Capital, o inquérito policial é entregue na Central de Inquéritos, onde será submetido ao crivo do Representante do Ministério Público, que poderá denunciar o indiciado, arquivar o inquérito, ou devolvê- lo para diligências que este entender relevantes.

Por muitas vezes, a autoridade policial se depara com ocorrências onde se suscita a inimputabilidade do conduzido. Conforme explicação de Tourinho Filho (2009, p. 64): “Assim, podemos afirmar serem causas biológicas que excluem a imputabilidade: a) doença mental; b) desenvolvimento mental incompleto; c) desenvolvimento mental retardado; d) embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior”. Sabe-se que a inimputabilidade exclui a culpabilidade, por conseguinte, será o agente “isento de pena” (Arts. 26 e 28 do CP). Embora isento de pena, que somente poderá ser declarado pela Autoridade Judiciária, a Autoridade Policial não deixará de aplicar as medidas legais que estão ao seu alcance. Se a inimputabilidade sobrevém de doença mental, a Autoridade Policial lavrará o competente auto de prisão em flagrante do conduzido, em seguida, representará junto do Juízo competente pela instauração do incidente de insanidade mental do indiciado, nos moldes do §1º do Art. 149 do CPP, in

verbis:

Art. 149. Quando houver dúvida sobre a integridade mental do acusado, o juiz ordenará, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, do defensor, do curador, do ascendente, descendente, irmão ou cônjuge do acusado, seja este submetido a exame médico-legal.

§ 1º O exame poderá ser ordenado ainda na fase do inquérito, mediante representação da autoridade policial ao juiz competente.

Sendo a inimputabilidade decorrente de menoridade, os adolescentes, amparados que estão pelo Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990), não podem ser presos, nem mesmos em flagrante delito. Por disposição expressa no Art. 106 do ECA: “Nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente”.

Apesar de não ser preso em flagrante, o adolescente infrator poderá ser “apreendido” em flagrante e depois levado à presença da Autoridade Policial competente (Art. 172 do ECA). No caso do Ceará, na Capital existe a Delegacia da Criança e do Adolescente - DCA, vinculada ao Departamento de Polícia Especializada. De acordo com a natureza do ato infracional praticada pelo adolescente a Autoridade Policial da DCA, não lavrará o auto de prisão em flagrante e sim, o auto de apreensão em flagrante ou o boletim de ocorrência circunstanciada, atendendo o disposto no Art. 173 do ECA, in verbis:

Em caso de flagrante de ato infracional cometido mediante violência ou grave ameaça a pessoa, a autoridade policial, sem prejuízo do disposto nos arts. 106, parágrafo único, e 107, deverá: I - lavrar auto de apreensão, ouvidos as testemunhas e o adolescente;

II - apreender o produto e os instrumentos da infração;

III - requisitar os exames ou perícias necessários à comprovação da materialidade e autoria da infração.

Parágrafo único. Nas demais hipóteses de flagrante, a lavratura do auto poderá ser substituída por boletim de ocorrência circunstanciada.

Convém esclarecer também que, muitas vezes, alguns bandidos aproveitam-se do tratamento especial que o Estatuto da Criança e do Adolescente reserva aos menores infratores, e praticam crimes em concurso com adolescentes, para quando forem flagrados, atribuírem toda ação ao adolescente, apostando numa aparente impunidade. Quando a prisão é realizada pela polícia militar ou pelo particular, por exemplo, no caso de dois conduzidos, sendo um maior de 18 anos e o outro adolescente, devido ao princípio da especialidade proveniente do ECA, primeiramente o adolescente será levado à DCA para ser lavrado o procedimento adequado a este e, somente depois, o maior será apresentado à Autoridade Policial competente para lavrar o auto de prisão em flagrante em desfavor deste, onde serão acostadas cópias do auto de apreensão em flagrante ou do boletim de ocorrência circunstanciado do adolescente.

Alguns Estados da Federação contam com as centrais de flagrante, que é uma delegacia de polícia onde são centralizados todas as autuações em flagrante de uma determinada região, onde várias equipes compostas por Delegados, Inspetores e Escrivães, fazem a autuação em flagrante e dão continuidade nas investigações até conclusão do inquérito policial e remessa ao Poder Judiciário. O Estado do Ceará não trabalha desta maneira. Existem aqui os pólos plantonistas, que são delegacias com funcionamento ininterrupto de 24 horas. Os pólos plantonistas atualmente são: 2º Distrito Policial, endereço na rua Silva Paulet, 495 - Meireles – Fortaleza-CE; 5º Distrito Policial, endereço na Av. Osório de Paiva, 181 - Parangaba – Fortaleza-CE; 7º Distrito Policial, endereço na rua Macílio Dias, 436 - Pirambu – Fortaleza-CE; 8º Distrito Policial, endereço na Av. João Araújo Lima, 561 – José Walter – Fortaleza-CE; 12º Distrito Policial, endereço na rua 602, s/nº – Conjunto Ceará – Fortaleza-CE; 30º Distrito Policial, endereço na Av. Castelo de Castro, 155 – Conjunto São Cristóvão – Fortaleza-CE; 34º Distrito Policial, endereço na rua Princesa Isabel, 1236 – Farias Brito – Fortaleza-CE; Delegacia Defesa da Mulher, endereço na rua Manuelito Moreira, 12 – Centro - Fortaleza-CE; Delegacia de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente, endereço na rua Osvaldo Studart, 241 – Fátima - Fortaleza-CE; Delegacia Metropolitana de Caucaia, endereço na rua José da Rocha Sales, 155 – Centro - Caucaia-CE; Delegacia Metropolitana de Maracanaú, endereço na rua 40-A, s/nº – Conjunto Jereissati I – Maracanaú-CE e a Delegacia da Criança e do Adolescente, endereço na rua Tabelião Fabiano, 91 – Presidente Kennedy - Fortaleza-CE, delegacias estas que atendem a região metropolitana da Grande Fortaleza. Por tanto, caso ocorra alguma prisão em flagrante no horário fora do expediente normal, ou seja, depois das 18:00h, e nos finais de semana ou feriados, os conduzidos serão encaminhados para as delegacias plantonistas, onde será lavrado o auto de prisão em flagrante pelo Delegado de Polícia plantonista, e no próximo dia útil, o preso e os autos serão encaminhados para a delegacia da área circunscricional competente ou especializada, onde será dado andamento no inquérito policial até conclusão.

No interior do Estado do Ceará, a atuação da polícia judiciária pode ser considerada muito aquém do que deveria ser, tendo em vista o reduzido efetivo e a estrutura precária das instalações. Por incrível que pareça, nem todas as comarcas contam com um Delegado de Polícia de carreira para apurar as infrações penais, apesar de contar com um Promotor de Justiça e um Juiz de Direito. Para abranger todas as áreas circunscricionais, um Delegado de Polícia fica responsável por três, quatro, até cinco municípios, certamente a atuação deste profissional estará comprometida com tantas áreas para responder, saindo vitoriosa com isso a criminalidade.

O que ocorre na prática é que, como um Delegado, sozinho não pode ficar 24 horas por dia de plantão todos os dias da semana, a noite fica sem este serviço. A praxe então é, quando ocorre uma prisão em flagrante à noite, o conduzido é colocado no xadrez da delegacia e somente pela manhã a Autoridade

Policial vai analisar a ocorrência. Isto pode gerar muitas injustiças, já que apenas o Delegado de Polícia é quem decide pela lavratura do auto de prisão em flagrante e encarceramento cautelar do autuado, por tanto, deverá esta análise ser feita o mais rápido possível. Este também é o entendimento de Tourinho Filho (2009, p. 484):

Instante para a lavratura do auto. O auto de prisão em flagrante deve ser lavrado no instante

mesmo em que o conduzido é apresentado à Autoridade Policial. É certo não existir preceito expresso. Entretanto, pela redação do art. 304 do CPP, notadamente com a redação que lhe foi dada pela Lei n. 11.113/2005, subentende-se tenha sido essa a vontade do legislador. Não teria cabimento que o condutor, acompanhado do conduzido e das testemunhas, se apresentasse à autoridade e esta os dispensasse para, no dia imediato, lavrar o flagrante. Manifesto seria o incomedimento da autoridade. Haveria infringência ao art. 5º, LXVI, da Magna Carta. (grifo original)

Entende-se que esta forma ilegal de trabalhar, explica-se pelo reduzido efetivo da polícia judiciária cearense. Os governantes já deveriam ter entendido, que uma das maiores prioridades de uma nação é a segurança pública, tão solicitada pela sociedade, mas ainda não atendida.

Quando a legislação fala em Autoridade Policial, na grande maioria das vezes está se referindo ao Delegado de Polícia, que é o encarregado da presidência do inquérito policial. Como já foi dito, é o Delegado de Polícia quem analisa a ocorrência que lhe é apresentada, verificando se esta se coaduna a algum fato típico e se as condições de flagrante estão presentes. Somente depois desta análise, é que decide pela ratificação da prisão em flagrante com a lavratura do auto.

No seu labor, geralmente, o Delegado sofre pressões para lavrar ou deixar de lavrar o auto de prisão em flagrante, na maioria das vezes, quando são os conduzidos pessoas influentes, com poder econômico ou político. Há de ser ressaltado, no entanto, que cabe apenas ao Delegado de Polícia, naquele momento, decidir pela confirmação da prisão em flagrante.

Apesar do Delegado ter superiores hierárquicos, estes o são apenas para atividades administrativas e organizacionais dentro da estrutura policial, não podendo um chefe de polícia, ou o Superintendente da Polícia Civil, no caso do Ceará, ordenar que seu subordinado lavre ou não um flagrante, pois seria uma ordem manifestamente ilegal.

A imprensa também é um veículo que muitas vezes pressiona o trabalho policial, quando apresentadores e repórteres, leigos em Direito, criticam a atuação da polícia judiciária. Por exemplo, quando comentam que tal Delegado deixou de autuar em flagrante alguém que praticou um crime, mas que foi conduzido somente dias depois do fato, fora das condições de flagrante, ou quando depreciam uma autuação em flagrante de alguém que furtou uma lata de leite em pó de um supermercado. Não sabe o

jornalista, ou omite que sabe, que o Delegado não pode fazer juízo de valor, pois, se o fato é, em tese, típico a lei deve ser aplicada, cabendo apenas ao Poder Judiciário, julgar com base nos princípios de bagatela ou outro que se encaixe ao caso.

Há ainda aqueles que entendem que o Delegado de Polícia pode deixar de fazer a autuação em flagrante quando a coisa furtada é insignificante, já que a bagatela exclui a tipicidade conglobante, sendo este um fato ainda polêmico e poucos Delegados se aventuram no mesmo.

Analisando de perto o trabalho da polícia civil do nosso Estado, consta-se a desvalorização dos servidores públicos que compõem este tão importante órgão público. Pouco efetivo, más condições de trabalho, qualificação profissional insuficiente, salários baixos e nenhum reconhecimento pessoal, são apenas algumas das reclamações feitas pelas pessoas ocupantes de cargos públicos da estrutura da polícia civil cearense.

Ouve-se falar também da criada Corregedoria dos Órgãos Públicos de Segurança Pública, instituída para apurar as infrações administrativas dos servidores públicos da pasta da Segurança Pública Estadual. Alegam muito servidores, que a Corregedoria instaura procedimentos com qualquer tipo de denúncia, muitas vezes sem fundamento jurídico ou provas mínimas que justifiquem o procedimento. Com isso, ocorre muitas vezes o desestimulo no afinco no trabalho policial.

Não se justifica que um policial deva temer a atuação da Corregedoria, pois trabalhando de forma diligente e com o conhecimento da legislação que norteia sua profissão, no caso de instauração de procedimentos infundados, poderão estes ser analisados e ajustados pelo Poder Judiciário, pois o órgão correcional não está acima da lei, nem da doutrina e nem da jurisprudência do país. Para ilustrar, veja-se o julgado do Superior Tribunal de Justiça, no tocante à inviolabilidade de domicílio:

E M E N T A

PENAL. PROCESSUAL PENAL. INVASÃO DE DOMICÍLIO. PROVA ILÍCITA. "HABEAS CORPUS".

1. Não é ilícita a prova colhida em observância com as determinações legais pertinentes.

2. O direito à inviolabilidade de domicílio (CF, art. 5º, XI) não pode ser tido como absoluto. As hipóteses de flagrante delito, desastre, prestação de socorro ou, durante o dia, determinação judicial autorizam o ingresso. Precedentes.

3. "Habeas Corpus" conhecido; pedido indeferido.

(ACÓRDÃO: HC 10305/MG (199900686047) DATA DA DECISÃO: 14/09/1999 ÓRGÃO JULGADOR: - QUINTA TURMA . H ABEAS CORP US. FONTE: DJ DATA: 04/10/1999 PG: 00071)

O policial deve sim, ser mais valorizado pelos governantes e pela sociedade, haja vista que quase toda aplicação da lei penal depende destes. É o policial que chega no calor da ocorrência, na rua, quem tem o contato direto com a criminalidade. Naquele momento não tem Juiz, nem Promotor, o policial é quem decide o que fazer. Muitas vezes, põe a prova seus princípios éticos e valores pessoais, quando se expõe a situações em que pode conquistar, ainda que ilicitamente, coisas materiais que nunca conseguiria com seu salário. Apesar das contingências já explanadas, a grande maioria dos policiais que compõem o quadro da polícia civil cearense, são excelentes profissionais, que dedicam suas vidas na proteção dos interesses da comunidade.

Um outro fator que pode ser citado com relação às prisões em flagrante, é a histórica rivalidade entre as polícias civil e militar, que, aliás, não é exclusiva do Estado do Ceará. Embora, cada uma das polícias tenha sua missão constitucional definida, sabe-se que compete à polícia civil a autuação em flagrante (excetuando a competência da Polícia Federal), pois é quem tem a função de polícia judiciária. Como também se pode dizer que a grande maioria das prisões em flagrante são realizadas pela polícia militar, tendo em vista vários fatores, como ostensividade, maior efetivo, presença nas ruas, etc. Um fato corriqueiro no cotidiano policial é que, muitas vezes, quando policiais militares levam a ocorrência para a delegacia para ser submetida ao crivo da Autoridade Policial, o Delegado de Polícia e, sendo percebido por este que não cabe a prisão em flagrante naquelas circunstâncias, pois faltam os requisitos legais necessários para tanto, surgem desentendimentos e discussões inflamadas entre ambas as forças. Nascem daí, até lides judiciais entre as polícias, alegando-se que o Delegado de Polícia incorreu em crime de prevaricação, capitulado no Art. 319 do Código Penal, pelo fato de ter deixado de fazer a lavratura do auto de prisão em flagrante, ou mesmo que “estragou” o trabalho policial em ter “soltado” o conduzido. Fato que este que pode ser evitado.

Age corretamente o Delegado de Polícia, que, em chegando a ocorrência, faça todos os registros necessários e formalize as oitivas das testemunhas, vítimas e possíveis infratores, não querendo dizer com isso que deva lavrar o auto de prisão em flagrante indiscriminadamente. Se a prisão, como medida cautelar, naquele momento, é inoportuna ou ilegal, não tirará o mérito do trabalho policial da milícia, em se iniciando o inquérito policial por portaria, nem mesmo a lavratura do Termo Circunstanciado de Ocorrência, se couber ao caso. Este também é o entendimento da jurisprudência nos tribunais pelo Brasil, porque, para se caracterizar o delito de prevaricação, o Delegado tem de deixar de realizar seu ato de ofício com interesse ou sentimento pessoal. Examinem-se os julgados neste sentido:

TACrimSP - PREVARICAÇÃO - Descaracterização - Delegado de polícia que, pelas

de furto - Ato de ofício, no entanto, consistente na instauração do devido inquérito

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