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O meio é a mensagem

No documento Autoria sob a materialidade do discurso (páginas 55-59)

Cap 2 – O meio é a mensagem

2.4 O meio é a mensagem

Numa cultura como a nossa, há muito acostumada a dividir e estilhaçar todas as coisas como meio de controlá-las, não deixa, às vezes, de ser um tanto chocante lembrar que, para efeitos práticos e operacionais, o meio é a mensagem. Isto apenas significa que as conseqüências sociais e pessoais de qualquer meio - ou seja, de qualquer uma das extensões de nós mesmos - constituem o resultado do novo estalão introduzido em nossas vidas por uma

nova tecnologia ou extensão de nós mesmos. (MCLUHAN, 1999, p. 21).

Para exemplificar esse conceito – o meio é a mensagem – Mcluhan compara a automação12 das indústrias americanas com as tecnologias mecânicas (MCLUHAN, 1999).

Enquanto a máquina projeta um modelo de estruturação da associação e do trabalho humanos baseado na fragmentação e centralização, a automação fornece um modelo integral e descentralizado, porque, embora tenha eliminado funções exercidas pelos homens, criou novas tarefas e renovou a forma de associação humana no trabalho e reestruturou as relações sociais.

Para McLuhan, não é o que se faz com a máquina ou o sistema de automação que constitui o seu significado ou mensagem, ou seja, o significado não se encontra na finalidade ou no produto de seu uso, mas na metáfora que o meio (enquanto signo) representa na ordem das estruturas de organização das relações do homem no mundo. O importante não é o que faz, mas como faz.

Ao assimilar um meio como prolongamento ou extensão de si mesmo, o homem cria esquemas mentais que organizarão sua atuação no meio ambiente. “Pois a ‘mensagem’ de qualquer meio ou tecnologia é a mudança de escala, cadência ou padrão que esse meio ou tecnologia introduz nas

coisas humanas” (MCLUHAN, 1999, p. 22).

O século XX contemplou a criação de meios que revolucionaram o modo como os homens passaram a se relacionar com a informação, como a televisão e o computador. E a abordagem moral dos efeitos provocados por esses meios está sempre presente. Muito já se discutiu sobre a influência da

12 McLuhan se refere à automação elétrica programada pelo computador. Interessante notar que esse

autor refere-se com muita freqüência às tecnologias elétricas e algumas vezes à eletrônica, referindo- se ao computador. Mcluhan não faz distinção entre as tecnologias elétrica e eletrônica. Vale lembrar que ele arrola como tecnologias elétricas, por exemplo, o telefone, o rádio e a televisão que hoje também são tecnologias eletrônicas. É importante lembrar que a automação – enquanto aplicação dos estudos de Robótica - era incipiente à época dos escritos de McLuhan e que o primeiro computador pessoal, o Altair, foi criado em 1975 e não era em nada parecido com os microcomputadores que

televisão na educação das crianças. Questões relacionadas à censura, à violência social, aos hábitos culturais. Formularam-se hipóteses sobre o comportamento das crianças e adolescentes na escola, a perda do hábito de leitura, o nível vocabular utilizado nas conversações e outras preocupações que ainda rondam as mesas de debates.

“Quando confrontados com uma situação inteiramente nova, tendemos a ligar-nos aos objetos, ao sabor do passado mais recente. Olhamos o

presente através de um espelho retrovisor.” (MCLUHAN, 1969, p. 102-103).

Na falta de parâmetros, tendemos a analisar o novo com os valores e critérios do que já é conhecido.

As questões morais acerca das mudanças provocadas pela televisão e agora sobre o uso do computador, especialmente da internet, já fazem parte de nosso dia a dia. Nunca se discutiu tanto a questão dos direitos autorais, a atuação dos hackers, crackers13 e outras denominações que se dão aos “invasores” que perscrutam nossas páginas na internet e vasculham nossos computadores. O fato é que, na maioria das vezes, o enfoque dado a essas questões é equivocado, porque nem sempre se tem clara a origem dos problemas, ou a sua natureza.

Nesse aspecto, a análise de McLuhan pode representar uma grande contribuição: pode iluminar os problemas acarretados pelas mudanças que uma nova tecnologia pode provocar na vida dos homens, na forma como pensam e agem.

Se o individualismo que alimenta a produção na cultura tipográfica se modifica sob os efeitos dos novos meios, o conceito de autoria muda e a relação com o conhecimento se transforma. Assim como os pesquisadores precisaram compreender o significado da aprendizagem na cultura oral africana para ensinar os africanos não alfabetizados (MCLUHAN, 1972, p. 64-

13 Hacker

é um termo que designa o indivíduo especializado em desvendar códigos de acesso a computadores. Pode ser “do bem” e, nesse caso, informa os responsáveis pelo sistema invadido, para que providenciem a correção. Mas também pode ser “do mal” e, então, provocar estragos nos sistemas que invadem. (Cf. http://www.bpiropo.com.br/em20021003.htm).

O cracker é conhecido como um hacker “do mal”, que torna públicas as falhas de segurança que descobre. Por isso, o termo designa também os programas que desbloqueiam senhas e outras travas de aplicativos.

69), hoje precisamos compreender os efeitos da cultura digital na aprendizagem de nossos alunos. Se o meio é a mensagem e isso significa que uma tecnologia é capaz de provocar mudanças de ordem perceptiva e sensorial e que essa mudança de percepção pode alterar a forma como interagimos no mundo, como pensamos e como organizamos o nosso conhecimento, não nos resta outra alternativa senão estudar os meios para conhecer sua mensagem.

2.5 Considerações finais do capítulo

Nesse capítulo procuramos analisar e desenvolver a concepção de meio a partir dos estudos realizados por Marshall McLuhan. A compreensão do meio como mensagem tornou-se fundamental para refletirmos sobre como a autoria se configura sob diversas condições de materialidade do discurso.

No próximo capítulo, vamos nos deter na análise das possibilidades de autoria sob as culturas oral, escrita e impressa e observar como a mudança do status material do discurso pode determinar procedimentos de autoria diversos.

No documento Autoria sob a materialidade do discurso (páginas 55-59)