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3. RESULTADOS

3.2. Motivações para o sucesso acadêmico

3.2.2. O papel dos professores

Em geral, os indivíduos pesquisados demonstraram afinidade por professores que estabelecem o diálogo como principal instrumento de persuasão e que consideram a pessoa do aluno em sua totalidade, ou seja, não vêem os jovens somente como aprendizes, e sim como sujeitos únicos, com necessidades e desejos individuais.

[Esses professores que te marcaram positivamente. Que característi- cas eles têm/tinham para ficarem em um lugar bom na sua memória?]

Eles estavam preocupados com o indivíduo, sabe? Eu tive uma professora na 7ª e na 8ª série, de História, que se eu levantasse o dedo pra falar alguma coisa, ela dizia ‘dá sua opinião, o que você acha, como você enxerga? Você acha que o golpe de 64 foi um golpe ou uma revolução?’ Então se tinha a preocupação de fora da sala, a professora me perguntar como tinha sido o meu dia, me parar na porta e conversar comigo enquanto as pessoas entram... isso é importante demais. Na escola tem figuras que eu não me interesso nem um pouco pela matéria, mas... nem um pouco mesmo, por exemplo, Biologia não me interesso nada, no entanto passa o professor na porta e fala ‘salve!, bom dia, tudo bem? Você está melhor do que na semana passada? Tá tranqüila, algum problema em casa?’ Isso é essencial. Eu acho que o que eu sou hoje, o que eu vou ser daqui a dez anos, espero que seja também um profissional de sucesso, se deve muito aos professores que me levaram junto com eles, porque os professores que eu tenho melhor lembrança foram coincidentemente os professores de História, de Geografia, que é a área que eu tenho mais interesse. É claro que você tem uma propensão natural por uma área ou outra, segundo características pessoais, sociológicas, hereditárias, sei lá. Mas tem muita importância pra mim.

Vê-se, no exemplo, que a professora de História, em vez de oferecer uma defini- ção sobre revolução ou golpe, oferece à aluna a possibilidade de fazê-lo, o que possibilita a expansão de sua capacidade crítica e de seu envolvimento. Essa estratégia revelou-se marcante para a estudante, a ponto de ser lembrada quatro anos depois.

O exemplo anterior faz emergir também o valor do reconhecimento da estudante como pessoa. Ela reconhece naqueles que considera bons professores a capacidade de fazer aparecer, na aluna, a pessoa que ela é, algo que vai além da relação mecânica da transmissão de informações. Há subjetividade em operação: antes (e além) de desempenharem papéis sociais de professor e aluna, são sujeitos em pleno exercício de relacionamento interpessoal. A empatia mostra-se como condição básica – e valorizada pela entrevistada – à manutenção da harmonia dessa relação.

De forma geral são valorizados aqueles profissionais que mantêm um discurso direto e reflexivo e que primam pela organização didática, estabelecendo de forma clara e concisa a seqüência de tópicos explorados na aula. Essa sistematização proposta pelo professor parece contribuir para a organização mental do aluno, no sentido de orientá-lo para a compreensão da estrutura epistemológica da área de conhecimento em questão. A fala abaixo ilustra a assertiva.

[E do ponto de vista acadêmico, que influências os professores tiveram no seu bom desempenho?]

Academicamente falando, uns eu considero bons professores, e outros não tão bons. Quando eu estou nas aulas, aprendendo as matérias, eu gosto de tudo muito bem dividido: tópicos, subtópicos, gosto de tudo organizado pra eu saber onde eu estou, quando eu for estudar. E tem professores bons também que não fazem isso, e isso me atrapalha um pouco. Mas eu não reclamo deles, eu gosto.

L., 17 anos

Um defeito que eu acho no ensino brasileiro é que o professor passa a matéria sem fazer discussão sobre ela.

Professores que elogiam e que são disponíveis a atendimentos também são muito estimados. O reconhecimento do esforço eleva a auto-estima e motiva o estudante para novas aprendizagens. O testemunho abaixo ilustra a importância dada aos retornos positivos (elogios, pontos) e ao estabelecimento de situações-problema como desafios cognitivos.

Por exemplo, eu tive um excelente professor de matemática no primeiro grau. Ele atendia todos os alunos que procuravam. Se ele percebia que o aluno tinha facilidade, ele dava desafios pra ele resolver. E dava alguns pontos extras. Tinha também uma de português que também incentivava, elogiando. Eu acho até mais importante o de procurar desafios. Pra quem não se interessava tanto, ele dava o básico, e aprofundava aqueles que quisessem mais.

R., 17 anos

Entretanto a relação com os professores nem sempre foi estabelecida em palco de harmonia e diálogo. Surgiu até mesmo ambiente competitivo entre aluno e professor, como ilustrado no depoimento abaixo.

Já aconteceu de eu sentir rivalidade de professor em relação a mim, antipatia gratuita, sabe, eu não posso dizer isso porque eu tô dentro do problema, né, então é claro que se você for conversar com o professor, vai ver que tem motivo, uma resposta atravessada, porque eu sou mestre em fazer isso, né? Mas muitas vezes eu senti isso. Eu tive uma professora na sétima série dava pra sentir um lance de ódio naquela relação.

[E o que isso influenciou no seu estudo?]

Eu acho que me motivava. Eu desafiei muito até a minha oitava série. Então o quão mais eu estava preparada, mais putos eles ficavam, né... então eu acho que era um fator de... sei lá, pra eu produzir mais.

D., 17 anos

Esse fragmento explicita, além da competição estabelecida, um sentimento hostil que ela projetava no professor, numa relação de transferência. Esse sentimento gerava o estabelecimento de duelos, que alimentavam ainda mais o sentimento projetado, que era agente motivador de estudo levando a novas aprendizagens.

Com outros entrevistados, é nítida a tentativa de se evitar conflitos com professores, como estratégia de aprendizagem. O discurso abaixo ilustra essa tentativa de se afinizar com o docente por meio da aceitação.

Eu tento gostar do professor. Eu acho que se eu não gostar dele, toda vez que ele chegar eu vou dizer: nossa, eu não vou ouvir a aula desse cara chato. E aí eu não vou aprender a matéria dele. Não vou depois ser capaz de saber o que ele quer que eu saiba, na hora da prova.

G., 17 anos

Esse testemunho também expõe, mais uma vez, um detalhe bem evidente nos discursos e já abordado anteriormente, que é a necessidade de se atender às expectativas (“saber o que ele quer que eu saiba”), especialmente em momentos avaliativos.

De qualquer forma, embora a postura dialógica do professor seja a preferida, os discursos referem-se a esquemas expositivos de aula, ou seja, o ensino focado no discurso do professor e nas estratégias por ele estabelecidas. Caracteriza, principalmente, aprendizagem por recepção. As falas remetem também a uma preocupação em se “descobrir” os estilos e as estratégias avaliativas de cada um dos professores.

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