SUMÁRIO
MODOS VERBAIS INDICATIVO SUBJUNTIVO
3 a hipótese, quer possível, quer impossível, é irreal, duas regras podem ser aplicadas:
3.4.3 O período hipotético no português arcaico
Em relação ao português arcaico, Huber (1986) apresenta os seguintes tipos de períodos hipotéticos:
a. presente do indicativo na oração principal e na condicional:
Eu nada non desejo se non vos, eu vos non vejo (CV)15;
b. imperativo na oração principal e presente do indicativo na oração condicional:
Se te praz morar connosco, di-me como é teu nome.( Eref. 310);
c. futuro do presente na oração principal e presente do indicativo na oração condicional:
E gran pecado farpa, se me non Val. (CA,7370);
d. futuro do pretérito na oração principal e o presente do indicativo na oração condicional:
Se outr’amor a sigo, querria morrer (CV, 301);
e. futuro do presente na oração principal e futuro do conjuntivo na oração condicional:
E eu convoco, se vos quiseres (CV);
15
Os exemplos utilizados pelo autor foram retirados do Cancioneiro da Vaticana (CV), Cancioneiro da Ajuda (CA). Algumas siglas, contudo, não estão identificadas, assim como alguns exemplos.
f. presente do indicativo na oração principal e futuro do conjuntivo na oração condicional:
E alguém non renunciar o padre e a madre, non pode ser meu decipolo (EREF 360);
g. presente do conjuntivo na oração principal e futuro do conjuntivo na oração condicional:
E ssi este for morto sen sem mel, o maior filio... Agia o reino (1214);
h. imperativo na oração principal e presente do subjetivo na oração condicional:
E ejades prazer de quanto no mund’amades, levade-me vose’amigo;
i. futuro do pretérito na oração principal, imperfeito do subjuntivo na oração condicional:
Gran razon seria, se en prazer vus caesse de quererdes prender dôo de min, mas faria bem quand’eu viss’ela pois, que lhu jurasse...(CA 4950);
j. imperfeito do indicativo na oração principa,l imperfeito do conjuntivo na oração condicional:
Se m’ora Deus gran sen fazer quisesse, nom m’avia mais de tant’a fazer (CA5242);
k. mais-que-perfeito simples na oração principal, imperfeito do conjuntivo na oração condicional (no sentido do mais-que-perfeito composto do conjuntivo)
Se eu marte prendesse aquel primeiro dia em que vus vi, fora meu bem (CA996);
l. imperfeito do indicativo na oração principal, mais-que-perfeito simples na oração condicional:
Se lhe eu nom dera o mango, ele non avia poder de me fazer o dằapno que me faz (Fab 39)
Leão (1961, p.149-151) analisa os exemplos apresentados por Huber – “bastante numerosos e bem explicados” –, entretanto, observa que o mencionado autor não indica a frequência de cada um dos tipos apresentados, o que, ainda segundo Leão pode “induzir-nos em erro, fazendo crer que é corrente um caso isolado e excepcional.” Outro fato que a autora observa, fato que muito interessa à presente pesquisa, é a omissão do período “construído com o mais-que-perfeito simples do indicativo (forma em -ra) em ambas as orações, tipo corrente no português arcaico e único recurso de então para se exprimir a irrealidade no passado.”.
Em sua pesquisa intitulada “O período hipotético iniciado por se” (1961), a autora analisa textos do português arcaico (que vai dos primeiros documentos galego-portugueses até meados do século XVI), do português moderno (que vai da segunda metade do século XVI ao século XX), subdividindo-o nas fases clássica (XVI, XVII e XVIII) e hodierna (XIX e XX). Para o português arcaico, Leão identificou vinte e um tipos de períodos hipotéticos, os quais classifica em três grupos, a partir da forma verbal:
I – uso do indicativo na prótase (exceto a forma em –ra) II – uso de subjuntivo
III – uso do mais- que-perfeito simples do indicativo.
Destaca que, dos vinte e um tipos documentados, doze não são citados por Huber (1986), esclarecendo que são “omissões compreensíveis, já que a sua obra procura dar uma visão de conjunto do português arcaico, e não, fazer um inventário exaustivo dos fatos isolados.”.
Em relação ao uso do mais-que-perfeito, a autora apresenta duas estruturas, por ela denominadas de sistemas, em que esse tempo verbal é utilizado:
1. SE + mais-que-perfeito simples do indicativo / mais-que-perfeito simples do indicativo
“— Gram mingoa nos fezerom hoje êste dia aqui os boõs cavaleiros da Távola Redonda, ca certamente, se eles aqui
foram, nós tomáramos este logar”. (Fernão Lopes, p.
100).
“— O Meestre, que mais voontade tiinha de o matar que d’estar com ele em razões, tirou logo uu cuitelo comprido e enviou-lhe uǔ golpe aa cabeça; porém nom foi a ferida tamanha que dela morrera, se mais nom ouvera”. (Fernão Lopes, p. 29).
2. SE + forma em “-RA”, composto16 / mais-que-perfeito simples do indicativo:
“Seede çertos que, se alguum de vós de my fora partido, que eu cuidara que fora descuberto por elie; e assy ouvera a minha sanha contra sy sem merecimento!” (Port. Mon. Hist., Scriptores, ap. L. VASC., p. 38).
A autora observa que o uso dos sistemas formados por SE + mais- que-perfeito simples do indicativo / mais-que-perfeito simples do indicativo, assim como SE + imperfeito do indicativo / imperfeito do indicativo, podem ser “o único recurso de que dispunha a língua para situar a hipótese irreal no passado, negando-a implicitamente; aquêle, por ser usado em descrições no passado, servindo a estrutura hipotética para realçar uma relação entre dois fatos”. Leão também destaca a ausência do mais-que-perfeito do subjuntivo nas orações condicionais, que para ela é “compensada” pelos sistemas acima apresentados e ainda pelo imperfeito do subjuntivo.
Barreto (1999) analisando textos do português arcaico – O Foro Real (séc. XIII), Demanda do Santo Graal (séc. XIII), Lenda do rei Rodrigo (séc. XIV), Crônica de D. Pedro e a Carta de Caminha (séc. XV) – encontrou dez tipos de período hipotético; alguns dos quais citados por Leão:
• presente do indicativo / presente do indicativo
• presente do indicativo / pretérito imperfeito do subjuntivo
• pretérito perfeito do indicativo / presente do indicativo
16
• pretérito mais-que-perfeito do indicativo / pretérito mais-que-perfeito do indicativo
Outros, porém, não são apresentados por Leão:
pretérito imperfeito do indicativo / futuro do pretérito do indicativo
futuro do presente do indicativo / futuro do subjuntivo
futuro do pretérito do indicativo / pretérito imperfeito do subjuntivo
presente do subjuntivo / presente do indicativo
presente do subjuntivo / pretérito mais-que-perfeito do indicativo
presente do subjuntivo / futuro do subjuntivo
Cabe destacar que Leão (1961) trabalhou, exclusivamente, com os períodos hipotéticos iniciados por se, enquanto Barreto (1999) analisou os mencionados períodos com diferentes conjunções condicionais.
Conclui Barreto (1999, p.235) que “as orações condicionais contêm o verbo no modo indicativo, quando se trata de uma realidade, e no modo subjuntivo, quando se referem a uma possibilidade ou hipótese”. Para ela, a instabilidade no emprego dos tempos e modos verbais no português arcaico permite concluir, assim como Leão (1961) que, no tocante aos períodos hipotéticos, até 1500, “a correlação entre os tempos e modos verbais da prótase e da apódose não era fixa, podendo as sentenças, quer hipotéticas, quer reais, ter os verbos no indicativo ou no subjuntivo e em diversos tempos”
3.4.4 O período hipotético no português clássico
Leão (1961, p.188) destaca que no português clássico (séculos XVI a XVIII), houve o aumento do uso do mais-que-perfeito simples do indicativo, empregado tanto na prótase como na apódose. A autora afirma que esse uso “deve ter sido corrente”, pois aparece em todos os gêneros por ela pesquisados, inclusive, em peças teatrais que refletem melhor a linguagem
coloquial da época. O emprego desse tempo verbal em períodos hipotéticos, para a autora, “parece ter o seu apogeu no século XVII”, sendo utilizado para expressar:
a) hipóteses improváveis relativas ao presente e ao futuro (em concorrência com o imperfeito do subjuntivo, na prótase, e o futuro do pretérito, na apódose);
b) hipóteses irreais em relação ao passado (forma única, pelo menos na prótase).
Esse fato já havia sido apontado por Pereira (1923, p. 580) ao afirmar que:
Entre os classicos era mais commum empregar-se na proposição condicional e na hypothetica o mais-que-perfeito do indicativo, que por isso é considerado em nossas conjugações como a 2. fórma do imperf. do condicional, e a 2ª. fórma do imperf. do conjunctívo. Exemplos: Não teve resistencia, e se a tivera, mais damno resistindo recebera (Lusiadas. 2. 69) — Se a vira o caçador.., nunca os famintos galgos o mataram (Lusiadas. 2, 35).
A autora afirma que esse uso vai diminuindo no século XVIII, restringindo-se o seu uso aos casos de hipóteses que se formulam em relação a momento anterior ao da fala, com negação implícita da sua realização.
O mais-que-perfeito do subjuntivo, para exprimir um fato hipotético que não se verificou no passado, também foi encontrado pela autora no poema “O Hissope” (1768) de Antonio Diniz da Cruz e Silva:
E de novo começa: “Oh! Se eu lograsse A grande dita de nascer em Roma, E ali, na tenra idade, me TIVESSEM,
Qual mísero e novel frangão, CASTRADO; [...]
Para Leão, “essa forma composta vai substituir, aos poucos, a forma em -ra, estendendo-se o seu uso na língua literária, durante o século XIX” (1961, p.189).
Observa, contudo, que, embora só tenha sido documentado esse uso em períodos hipotéticos, nos fins do século XVIII, “na língua corrente,
deveria ser muito mais antigo”, possivelmente de existência multissecular, antes de passar à língua literária.
Barreto (1999) também pesquisou períodos hipotéticos, em textos do português clássico que denomina como Português moderno. Para o século XVI, pesquisou nas cartas da corte de D. João III e, para o século XVII, em quatro Sermões do Padre Antonio Vieira. E nesses textos, ela identificou as seguintes estruturas:
Século. XVI
Presente do Subjuntivo / Presente do Indicativo Presente do Indicativo / Futuro do Subjuntivo
Presente do Subjuntivo / Pretérito Mais que Perfeito do Indicativo Pretérito Imperfeito do Indicativo / Pretérito Imperfeito do
Subjuntivo
Pretérito Mais que Perfeito do Indicativo / Pretérito Mais que Perfeito do Indicativo
Futuro do Pretérito do Indicativo / Pretérito Imperfeito do Subjuntivo Presente do Subjuntivo / Futuro do Subjuntivo
Pretérito Imperfeito do Indicativo / Pretérito Mais que Perfeito do Indicativo
Futuro do Presente do Indicativo / Futuro do Subjuntivo
Século. XVII
Pretérito Mais que Perfeito do Indicativo / Pretérito Mais que Perfeito do Indicativo
Futuro do Pretérito do Indicativo / Pretérito Mais que Perfeito do Indicativo
Presente do Indicativo / Pretérito Imperfeito do Subjuntivo
3.4.5 O período hipotético no português contemporâneo
Analisando textos dos séculos XIX e XX, Leão afirma que a expressão da relação condicional se faz, em português, pelos seguintes meios:
1. por um contexto, no qual a hipótese fica implícita ou é expressa com o auxílio de um verbo de conteúdo semântico apropriado, como imaginar, supor, etc. Neste caso, não há necessidade de uma oração iniciada por um item condicional:
“Nesses momentos angustiosos outra mulher não penetre no recinto sem primeiro defumar-se ao fogo, nem traga na mão caça ou peixe: a criança morrerá pagã”. (Monteiro Lobato, p. 289). (O contexto sugere uma hipótese provável: ‘se isso acontecer, a criança morrerá pagã’.). “Ajoelhado, ao pé da cama, com as mãos dela entre as minhas, fiquei mudo e quieto, sem ousar falar, porque cada palavra seria um soluço e nós temíamos avisá-la do fim”. (Machado de Assis, p. 154).
(O contexto sugere a hipótese que não se verificou no passado, irreal: ‘se falasse, cada palavra seria’...)
2. pela entoação ou justaposição de duas orações não subordinadas, que tenham sentido, respectivamente: interrogativo + declarativo, imperativo ou optativo + declarativo, ou declarativo + declarativo:
a) interrogativo + declarativo:
“Eu preciso, eu “quero” viver a minha vida. Há óbices no caminho? Afasto-os. . .“ (Monteiro Lobato, p. 189). ( = ‘Se há óbices no caminho, afasto-os’.)
“Estava com dor de cabeça? Uma cafiaspirina me daria alívio”. (Ernesto Ribeiro, p. 200). (= ‘Se eu estava com dor de cabeça, uma cafiaspirina me daria alívio’.)
b) imperativo ou optativo + declarativo
“ — Não falta mais nada. Quer a sege, quer o boleeiro, quer a prata, quer tudo. Olhe, é muito mais sumário citar-nos a juízo e provar com testemunhas que Sabina não é sua irmã, que eu não sou seu cunhado, e que Deus não é Deus. Faça isto, e não perde nada, nem uma colherinha”. (Machado de Assis, p. 183). (‘Se fizer isto, não perde nada’... A ultima frase de Cotrim a Brás Cubas, na discussão sobre a
herança, tem um tom de desafio que não teria o período hipotético comum.)
c) declarativo + declarativo
“— Parece que não gostou, seu Carlos!
— Gostei, Dôres. Mas acho que é uma pena você casar já, tão moça. E depois: por causa dos seus estudos que vão tão bem.
— Seu Carlos não quer eu não caso!” (Mário de Andrade, p. 67). ( = ‘Se Seu Carlos não quer, eu não caso’. A resposta da aluna, que inventara um casamento para provocar o professor, é expressiva pelo uso da justaposição e pelo emprego do presente, que torna a promessa em certeza.)
3. pela compensação da ausência do nexo condicionante por uma inversão, colocando-se o verbo no início da oração que exprime a hipótese. Nesse caso, a ordem das palavras pode também compensar a falta do índice hipotético. A idéia de condição ou hipótese é expressa pelo tempo e modo dos verbos. Para a autora é “com o subjuntivo (futuro ou imperfeito) que melhor se revela o caráter duvidoso da suposição” (1961, p. 62).
“Era [anedota de um inglês] a derradeira esperança do facínora, seu último cartucho. Negasse fogo e, estava resolvido, metia duas balas nos miolos”. (Monteiro Lobato, p. 119).
“Fôsse possível ler nos cérebros claro como se lê no papel e a humanidade crispar-se-ia de horror ante si própria.. (Monteiro Lobato, p. 188).
“O patrão é porque não tem fôrça. Tivesse êle os meios e isto virava um fazendão”. — (Monteiro Lobato, p. 236).
“Se a Inglaterra brotou das ilhas novoentas da Caledônia, é que lá não medrava a mandioca. Medrasse, e talvez os víssemos hoje, os inglêses, tolhiços, de pé no chão, amarelentos, mariscando de peneira no Tâmisa”. (Monteiro Lobato, p. 284)
“Morresse eu com o meu segrêdo, ninguém me acharia formidável”. (Carlos Drummond de Andrade, p. 23).
A autora destaca que a eficácia desse recurso é tão grande que se verifica até com o presente do subjuntivo, que, por exigência gramatical, não se usa com se.
É justamente a eliminação do índice hipotético que vai tornar necessária a presença do modo subjuntivo.
Conspire eu contra o regime, e estarei bem arranjado (Carlos Drummond de Andrade).
4. por um adjunto adverbial que resuma condição já expressa ou que implique condição a ela contrária.
“Sem a mulher o mundo voltaria ao caos e a Razão não se distinguiria da cegueira do nada”. (João Ribeiro, p. 81).
“Sem aquelas duras provações que exaltaram os primeiros mártires, difícil e talvez impossível fôra o triunfo da grande verdade moral revelada pelo meigo Jesus”. (João Ribeiro, p. 171).
“Por felicidade nossa — e de D. Antônio de Mariz — não os viu Alencar; sonhou-os qual Rousseau. Do contrário, lá teríamos o filho de Araré a moquear a linda menina num bom braseiro de pau brasil, em vez de acompanhá-la em adoração pelas selvas como o Anel benfazejo do Paquequer”. (Monteiro Lobato, p. 277).
5. pela subordinação indicada por uma forma nominal do verbo (orações adverbiais condicionais reduzidas):
a) orações com o verbo no infinitivo:
“A ser isso verdade, seria preferível a sua morte” (de uma redação escolar).
“... bem pode ser que o caso, a dar-se, fosse mera visualidade do velho”. (Camilo Castelo Branco, p. 98).
b) orações com o verbo no gerúndio:
“Saindo tudo a contento, tenho esperança de inda êste ano beijar-te”. (Monteiro Lobato, p. 186).
“Dando para passar fome, sem virem a morrer disso, êle, a mulher e o cachorro — está tudo muito bem”. (Monteiro Lobato, p. 275).
c) orações ultra-reduzidas, representadas pelo particípio que restou do gerúndio composto:
[...] “cada um que ali estava podia contar sua memória particular de. Landucci, e recompor um traço que, somado a outros, reconstituiria a figura inteira...”(Carlos Drummond de Andrade, p. 237/8).
6. pela subordinação indicada por uma conjunção subordinativa (orações adverbiais condicionais)
“Disse-me que, onde quer que eu levasse o cheque, me pagariam em cruzeiros, a menos que eu fôsse a New York receber na Matriz”. (Carlos Drummond de Andrade, p. 88).
Nos textos pertinentes aos séculos XIX e XX, período denominado como “português hodierno”, Leão destaca “o desaparecimento do mais-que- perfeito simples do indicativo, no período hipotético” (1961, p.210), afirmando que, com valor de futuro do pretérito, na apódose, não se usa hoje em nenhum caso. Cita, como exceção, um exemplo de Alexandre Herculano, mas o considera um arcaísmo característico do estilo do autor.
A autora também afirma que o mais-que-perfeito simples do indicativo, com valor de imperfeito ou de mais-que-perfeito do subjuntivo, na prótase, ocorre raramente, justificando o uso em João Ribeiro como influência de autores clássicos, e, em Monteiro Lobato, como influência do dialeto caipira, que conserva se havera (por se houvera). Leão conclui que, além do desaparecimento progressivo da forma em - ra e sua substituição pelo mais- que-perfeito do subjuntivo, nas hipóteses relativas ao passado, “o que impressiona nesses textos dos séculos XIX e XX é a variedade dos esquemas hipotéticos e a liberdade das estruturas sintáticas” (1961, p. 211).
Câmara Júnior (1976, p. 185) também analisa o período hipotético no português contemporâneo (século XX), afirmando que são usadas, normalmente, três tipos de correlações condicionais:
a) a correlação permanente, incluindo o momento em que se fala, na qual os verbos da prótase e da apódose são empregados no indicativo presente:
De nada vale ter livros, se não sabemos ler.
b) a correlação condicional futura em referência ao momento em que se fala, de modo que na prótase tem-se o futuro do subjuntivo e, na apódose, o futuro do indicativo:
Se fizermos bem o trabalho, seremos recompensados.
c) a correlação condicional pretérita em referência ao momento em que se fala, na prótase, emprega-se o pretérito imperfeito do subjuntivo e, na apódose, o futuro do pretérito:
O autor destaca ainda que é frequente o uso do presente do indicativo substituindo o futuro do presente na correlação condicional futura e do pretérito imperfeito do indicativo, substituindo o futuro do pretérito, na correlação condicional pretérita:
Se eu o vir conto-lhe o ocorrido.
Se eu o conhecesse, pedia-lhe, logo, ajuda.
Quatro tipos de correlações foram encontrados também por Barreto (1999, p.238) em sua pesquisa no corpus referente à língua falada do Brasil. São elas:
futuro do pretérito do indicativo / pretérito imperfeito do subjuntivo presente do indicativo / futuro do subjuntivo
presente do indicativo / presente do indicativo
pretérito imperfeito do indicativo / pretérito imperfeito do subjuntivo
Já no corpus de língua falada de Portugal, a autora afirma que a correlação mais utilizada foi “presente do indicativo / presente do indicativo”, seguida por “presente do indicativo / futuro do subjuntivo”.
Como pode ser observado, o pretérito mais-que-perfeito, no português contemporâneo, não aparece em nenhuma das correlações apresentadas pela maioria dos autores pesquisados, chegando mesmo a ser considerado por Leão (1961, p.210), como “desaparecida”. Entretanto, Neves (2006, p. 852-854), em corpus de língua escrita do Centro de Estudos Lexigráficos da UNESP, apresenta três ocorrências de período hipotético com o mais-que-perfeito. São elas:
a) pretérito mais-que-perfeito do indicativo/ pretérito mais-que- perfeito do indicativo
SE Sílvio imaginara diferente do que era, SE se apaixonara, SE lhe
pusera sobre a cabeça uma qualquer auréola de martírio e destino, mesmo sabendo-a amante de Sérgio,fora porque o quisera, porque fizera questão de imaginá-la vítima de Sérgio. (Ângela ou Areias do Mundo)
Neves considera estes períodos como “construções condicionais factuais”, pois têm o verbo no modo indicativo em ambas as orações.
b) pretérito mais-que-perfeito do indicativo/ futuro do pretérito do indicativo
SE não fora o apelo à figura exótica do “Poder Moderador”, na
República Presidencial, por ele preconizada, seria uma das mais notáveis lições de direito constitucional e de pol(tica, daquela hora. (Correio do Povo)
Neves classifica esta construção como condicional eventual.. Esta construção, segundo a autora, permite uma grande “variedade de combinações modo-temporais”, pois o verbo da oração subordinada pode ser do modo Indicativo ou Subjuntivo (passado, presente ou futuro) e o da principal em forma de presente, passado e futuro. Neves ressalta que as construções mais frequentes são as que têm, na oração condicional, o futuro do subjuntivo, “forma exclusiva” das condicionais eventuais.
Não foram encontradas ocorrências das construções condicionais contrafactuais – verbo da subordinada no modo Subjuntivo, e o da principal em uma forma passada (pretérito imperfeito e pretérito mais-que-perfeito) – .
Estudar os períodos hipotéticos fez com que se avaliasse “mais de perto” as trilhas percorridas pelo pretérito mais-que-perfeito ao longo dos séculos. Por conta dessa indiscutível relevância, serão analisadas, no capítulo, 5, as construções encontradas no corpus da presente pesquisa.
Com este subitem conclui-se a revisão da literatura, sempre tão fundamental para a realização de uma pesquisa. No capítulo seguinte, serão