• Nenhum resultado encontrado

Os primeiros países europeus a concluir a transição da TV analógica para a digital foram os Países Baixos, Luxemburgo, Finlândia, Suécia e Andorra. Já a cidade de Berlim, em agosto de 2003, foi a primeira do mundo a completar a passagem da TV analógica à TV digital terrestre (BALBONI; VENUTI, 2004). Em países como França, Espanha, Itália e Reino Unido, a transição ficou a cargo de autoridades regulatórias do setor de comunicações ou dos ministérios, dos seus respectivos governos. Para guiar o processo, foram publicados livros brancos sobre o digital terrestre e planos de ação para o switchover. Além disso, foram criados grupos de trabalho interinstitucionais, como foi o caso do Reino Unido e da Espanha.

A União Europeia estipulou o ano de 2012 como tempo limite para a conclusão da transição de seus países-membros, uma vez que o processo já estava atrasado devido "[...] a forte concorrência de outras plataformas digitais e às reduzidas prestações técnicas da TVDT frente aos seus competidores." (RUIZ, 2012, p. 482, tradução nossa). O seu maior interesse era liberar os espectros congestionados para aumentar a oferta de canais e serviços na plataforma digital e, principalmente, destinar o espaço para arquitetar a infraestrutura comunicacional necessária ao funcionamento dos dispositivos móveis de quarta geração. Segundo Ruiz (2012), a "neutralidade tecnológica nas atuações" e o "fomento do pluralismo" de canais durante o switchover, contemplando a inserção de novos radiodifusores no mercado de televisão terrestre, foram dois dos principais requisitos impostos pela UE aos seus membros.

No livro Cenários e objetivos da TV em tempos do digital terrestre, Lisa Di Feliciantonio e Michele Mezza (2004) contam que na Europa foram executados vários modelos de transição, conforme as necessidades e as características de cada um de seus países, condicionados pelos tipos de plataformas de transmissão de TV predominantes, pelo mercado vigente, pelas condições de recepção e envio do sinal, pela relação entre governo e iniciativa privada e pelos tipos de financiamentos disponibilizados – destinados à aquisição de terminais de recepção (STBs) ou à diminuição dos impostos –, favorecendo o setor de transmissão comercial vigente ou os investidores em novos canais no sinal digital. Em países

como Alemanha, houve o incentivo para o desenvolvimento de livre mercado e concorrência da indústria eletrônica com vistas à redução de custos dos conversores. Nos países nórdicos, alguns governos financiaram uma parte ou toda a transição. Na Noruega, por exemplo, as famílias que pagavam a taxa anual da TV receberam os conversores gratuitamente, com a condição de pagarem uma assinatura trienal do pacote de multicanais da TVD terrestre; assim também foi no Reino Unido, nos primeiros anos após o lançamento da TV digital terrestre. (DI FELICIANTONIO; MEZZA, 2004).

A mudança do sistema de TV analógico para o digital terrestre causou impacto principalmente na Espanha, na França, na Grécia, em Portugal, na Inglaterra e na Itália, países que possuem uma grande penetração das ondas terrestres em seus domicílios. Enquanto em países como Bélgica, Luxemburgo e Países Baixos, nos quais o meio de maior penetração é o cabo, o processo foi mais simples e acelerado (RUIZ, 2012). De acordo com Di Feliciantonio e Mezza (2004), na Alemanha e nos Países Baixos o digital terrestre foi lançado através de uma iniciativa público-privada, que também contou com políticas públicas para apressar a transição, a fim de que o processo fosse o menos oneroso possível. O fato de o sinal terrestre ter uma baixa taxa de penetração em seus domicílios não compensava vivenciar um processo demorado, pois não estavam em jogo os lucros dos fabricantes de equipamentos, nem tampouco do mercado publicitário. Na época da transição, somente 5% dos domicílios dos Países Baixos tinham uma recepção unicamente por TV terrestre, enquanto a Alemanha tinha em torno de 8%. A explicação para isso é que nesses territórios as plataformas pagas de TV a cabo e satélite são predominantes. No caso da Alemanha, o sinal terrestre era simplesmente uma recepção complementar, usada como segundo e terceiro receptor de televisão nos domicílios. Passados seis anos após o switch off do sinal analógico, esse número continua sendo muito baixo no país. Segundo o portal Statista, em 2014, na Alemanha, em se tratando de plataformas digitais, a recepção exclusiva por TVD terrestre abrangia apenas 3,87 milhões de lares, enquanto o satélite digital é o meio de maior penetração nos lares, presente em 17,78 milhões de residências, e o cabo digital em 11,23 milhões.102 Abaixo, trago uma tabela com as datas de lançamento da TV digital e do apagão analógico em alguns países europeus. Nela é possível observar, por exemplo, que o desligamento do sinal analógico na Ucrânia e na Grécia é recente, enquanto a Rússia apenas começou o processo, que está previsto para ser concluído em 2017.

102 STATISTA. Anzahl der digitalen TV-Haushalte in Deutschland nach Übertragungsweg von 2009 bis 2014 (in Millionen). Disponível em: <http://de.statista.com/statistik/daten/studie/302145/umfrage/anzahl-der- digitalen-TV-aushalte-nach-uebertragungsweg/>. Acesso em: 26 nov. 2014.

PAÍSES EUROPEUS LANÇAMENTO TVD SWITCH OFF Reino Unido 1998 2012 Bélgica 2002 2012 Itália 2004 2012 Espanha 2000/2005 2010 Países Baixos 2003 2006 Noruega 2007 2009 Grécia 2006 2014 Dinamarca 2006 2009 Luxemburgo 2006 2006 República Tcheca 2005 2011 França 2005 2011 Ucrânia 2008 2014 Estônia 2006 2010 Lituânia 2006 2012 Croácia 2007 2010 Eslovênia 2007 2011 Rússia 2012 2014-2017 Áustria 2006 2010 Alemanha 2002 2008 Suíça 2001 2008 Suécia 1999 2007 Portugal 2009 2012 Polônia 2009 2013 Eslovênia 2006 2010 Irlanda 2011 2012 Hungria 2008 2013 Finlândia 2001 2007 Letônia 2009 2010 Andorra 2004 2007 Malta 2005 2011

Figura 18 – Datas do switch off de alguns países europeus Fontes: DVB.ORG (2015); DiGiTAG (2015); RUIZ (2012)

A tabela ainda indica que a Espanha teve duas datas de lançamento da TVD terrestre, em 2000, considerado o ano do "lançamento comercial", introduzido pelo grupo de TV paga Quiero TV (Onda Digital S.A.) – que recebeu concessão do governo para iniciar as suas transmissões através de 14 canais em sinal digital –, e 2005, o ano do "lançamento tecnológico", ou "relançamento" do sistema no país, uma vez que a primeira etapa não obteve êxito. Se considerarmos o ano 2000, o país foi o terceiro da Europa a lançar o serviço. Os radiodifusores nacionais espanhóis, por sua vez, somente deram início ao simulcast em 18 de junho de 2002, utilizando o único multiplex (RGN – Rede Global de Cobertura Nacional) à sua disposição. Conforme Ruiz (2012), o plano de marketing da Quiero TV centrou-se em divulgar, através de uma "agressiva estratégia comercial", vantagens da TVD na prestação de

serviços, como a interatividade e o acesso à internet103. O projeto alcançou o seu auge em 2001: "Com o lema 'A TV com internet' e a emissão de conteúdos premium como Big Brother ou a Liga de Futebol, Quiero TV alcança o máximo de abonados em maio de 2001, com 164.828 domicílios, que em termos de penetração representa 1,16%." (RUIZ, 2012, p. 315, tradução nossa). Nem por isso o modelo de negócio da emissora foi bem-sucedido. Logo em 2002, interrompeu as suas transmissões por dificuldades em atender às demandas do mercado (seja de equipamentos, como conversores, seja de equipe de suporte e instalação) e seus altos compromissos financeiros com o operador de rede Retevisión, seu maior acionista para transmissão nacional. O governo espanhol conheceu os fracassos e resolveu intervir e colaborar com o processo de switchover, elaborando em 2003 o "Plano Estratégico de Transição da TV Analógica à Digital"; a partir de 2004 iniciou a sua execução, e investiu em novas estratégias para expansão e adoção da tecnologia pelas famílias, conseguindo, enfim, chegar ao switch off em 2012. A proposta era completamente diferente da anterior, pois oferecia um serviço de transmissão aberta com a finalidade de universalizar a tecnologia. Ruiz (2012, p. 320) grifa que: "A nova concepção do serviço de TVDT provoca mudanças significativas na estrutura do processo de DI104, pois altera o órgão responsável pela mudança e os seus assistentes, os potenciais adotantes, o sistema social, os atributos de inovação e tipo de decisão sobre essa." Dentre as ações destinadas a promover essa nova fase, pode-se destacar a aprovação, em 2003, do primeiro "Plano Técnico para a Transição para a TVDT" – que indicou as estratégias para levar a tecnologia aos cidadãos, por meio de um plano de comunicação dedicado a informá-los e fazê-los entender melhor a tecnologia e os serviços oferecidos por ela – e a criação, em 2005, da "Associação para a implantação e desenvolvimento da televisão digital terrestre" (Impulsa TDT105) – formada por representantes

da radiodifusão nacional e regionais, pelo principal operador de transmissão da Espanha, Abertis Telecom, e pela Federação de Organismos de Rádio e Televisão Autônoma (FORTA) –, destinada a incentivar a adesão dos cidadãos à nova tecnologia através de campanhas em todo o território nacional, como a UK digital e a BBC realizaram no Reino Unido. E assim como o Reino Unido, a Espanha optou por adotar estratégias de divulgação nacional, regional e local, segundo as necessidades de cada lugar, como contam Josefina Martínez e Isabel Andúgar (2011), no artigo "O papel ativo do cidadão no processo de transição para a televisão digital terrestre na Espanha". Em 2007, finalmente, foi aprovado o Plano Nacional de

103 A solução encontrada para o canal de retorno foi conectar os conversores à internet usando a linha telefônica. 104 DI – Difusão de Inovações

105 IMPULSA TDT. Observatorio. Disponível em: <http://www.impulsatdt.es/home/observatorio>. Acesso em: 3 dez. 2014.

Transição para a Televisão Digital106, que ficou a cargo do Gabinete de Transição, criado para: "[...] coordenar as ações do Estado e as várias administrações regionais." (MARTÍNEZ; ANDÚGAR, 2011, p. 38, tradução nossa). Segundo eles, o plano previa uma migração escalonada, feita por áreas territoriais em três fases.

Vale ressaltar aqui o modelo adotado por países como Suécia, Finlândia e França, onde os governos, através de ministérios competentes ou órgãos regulamentadores, empregaram políticas para estabelecer uma divisão de canais dentro de cada multiplex. As concessões foram dadas por meio de seleções que se baseavam em meritocracia, cujos critérios eram: "[...] diversidade, pluralismo, proteção da identidade nacional, legitimidade do plano editorial e engajamento de novos sujeitos." (DI FELICIANTONIO; MEZZA, 2004, p. 53, tradução nossa). Em muitos casos, o mesmo multiplex era gerido por mais de uma emissora de conteúdos, ampliando os serviços de radiodifusão gratuita e dando a novos

broadcasters a possibilidade de ingressar no mercado televisivo, apesar de um percentual

menor das concessões ter sido atribuído à pay TV. O que não ocorreu nos EUA, por exemplo, onde, assim como no Brasil, cada emissora ficou responsável por seus 6 MHz de espaço na banda, ocupados pelo sinal analógico, e um multiplex para transmiti-los e usá-los a seu critério, para: multiplicidade de canais, transmissão em alta definição, transmissão de serviços e sinal para a telefonia móvel. Na Itália, a divisão de canais ocorreu "em parte", e foi estabelecida, pela primeira vez, pela Legge 66/2001, que determinou que os operadores nacionais, com mais de uma concessão de TV, deveriam reservar no mínimo 40% do seu multiplex a novos operadores de TV, como veremos com detalhes no próximo item, que também trará os detalhes do switchover e switch off no país, um processo permeado de polêmicas, principalmente pelo fato de o governo da época, comandado pelo então primeiro- ministro Silvio Berlusconi, ter sido acusado de adotar políticas destinadas a atender "interesses escusos" e de ferir a política de livre mercado, fato que resultou numa condenação por parte da Comissão Europeia.

106 TELEVISIONDIGITAL.GOB.ES. Acuerdo del consejo de ministros por el que se aprueba el Plan Nacional de Transición a la Televisión Digital Terrestre. Disponível em:

Documentos relacionados