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O RGANIZAÇÕES COMO E STRUTURA DE A UTORIDADES

Diferentemente das sociedades antigas, nas quais a autoridade tinha por base a tradição, lealdade e obediência àquele com poder, bem como no carisma pessoal do indivíduo, a sociedade moderna tem como base a supremacia da razão - a racionalidade, e o contrato social. Assim, a vida na sociedade moderna é regida por leis e normas impessoais que dirigem os comportamentos, não mais por tradições e carisma de líderes, conformando o modelo burocrático (CARVALHO e VIEIRA, 2007).

Os principais elementos de uma organização burocrática são as regras, as normas e a comunicação formal, instrumentos pelos quais o controle é exercido – e assim, o poder como ato, ação. Já a autoridade é o poder legitimado derivada da tipologia weberiana. E por legitimidade entende-a possibilidade de algum grupo de referência acreditar na validade do exercício de um determinado tipo de poder. Dessa forma, a legitimidade reveste o poder e se

torna autoridade, e é aceito. Normas e regras racionais asseguram eficiência e dessa forma a burocracia emerge como forma organizacional por excelência (CARVALHO e VIEIRA, 2007).

Carvalho e Vieira (2007, p.9) salientam que “Weber relaciona de forma indissociável os conceitos de legitimidade, autoridade, racionalidade e eficiência”. Assim, interpretando Weber, para Etzioni (1972) a eficiência da estrutura burocrática decorre do estabelecimento de uma organização contínua de funções ligadas por regras. Dessa maneira, a organização racional é a antítese das relações ad hoc, temporárias e instáveis. As regras facilitam a padronização e assim permitem a igualdade no tratamento de muitos casos sem necessidade de encontrar soluções caso-a-caso. Decorre daí a economia de esforço, parte da eficiência da estrutura burocrática da organização.

Na organização racional é essencial a divisão sistemática de trabalho, direitos e poder. Essa racionalidade também inclui a hierarquia na qual nenhum cargo fica sem controle, cada cargo inferior se submete à supervisão de um posto superior. E essa submissão é sistematicamente verificada e reforçada. O cargo também é delineado por regras ou normas técnicas. A racionalidade implica que o seu ocupante deva estar devidamente preparado. Embora o indivíduo tecnicamente preparado não signifique sua legitimação, o conhecimento e preparo está na raiz da autoridade do ocupante do cargo, o burocrata. Essa racionalidade também implica que as regras, decisões e atos administrativos sejam formulados e registrados por escrito (ETZIONI, 1972).

A forma de organização social burocrática é capaz de reunir os atributos que garantem a eficiência e dessa maneira exerce dominação sobre um grande número de pessoas. Entretanto, a perspectiva funcionalista destaca preferencialmente os elementos de consenso, harmonia e homogeneidade na organização e, assim, requer afastar-se dela para discutir as situações de conflitos como algo inerente às organizações. Interesses de indivíduos e grupos e a emergências de situações de conflito são fenômenos inerentes às organizações em que as relações de poder são assimétricas. A estrutura formal é a espinha dorsal que sustenta os agrupamentos sociais para realizarem suas missões, a razão de ser. E essa estrutura se organiza em divisão hierárquica de trabalho, níveis de autoridade e de controle, daí o relacionamento estreito entre fenômeno de poder e a estrutura formal (CARVALHO e VIEIRA, 2007).

Pela perspectiva da estratégia, a organização pode ser vista por dois ramos de poder: micro e macro. Enquanto o poder macro diz respeito ao uso do poder pela organização, o

poder micro lida com o jogo de política, de poder ilegítimo dentro da organização. Dessa perspectiva, o planejamento equivale a dizer política, em vez de análise, aprendizado e cognição. A política que emerge do processo de negociações e concessões entre indivíduos, grupos e coalizões com diferentes objetivos, diante de recursos escassos e incertezas ambientais (MINTZBERG, AHLSTRAND e LAMPEL, 2000).

A organização social, então, pode ser vista como indivíduos, grupos e coalizões que buscam defender seus interesses nem sempre alinhados com as estratégias ou objetivos da organização. Isso ajuda a compreender o “desvio de objetivos” (ETZIONI, 1972, p. 21) em que os meios substituem os objetivos ou a missão. Essa inversão de prioridades entre objetivos e meios é a forma mais comum e suave de substituição, e os meios podem substituir a própria organização, afirma Etzioni (1972). Segundo esse autor, grupos de interesses que se formam no interior da organização usam os objetivos organizacionais como meios para objetivos pessoais ou do grupo.

Por outro lado, a formação de coalizão pode estabelecer as bases para levar adiante a estratégia organizacional. Segundo Kim (2005) o estabelecimento de capacidades tecnológicas de empresas coreanas (o processo de catching up ou de aprendizado) teve como mola propulsora crises construídas pelo governo local e por lideranças corporativas. Embora tais crises possam surgir naturalmente criando uma defasagem entre o desempenho real e o desejado de uma empresa, essa discrepância pode não ser reconhecida. Para Kim (2005), a recusa em aceitar a sua existência pode originar-se de diferentes percepções das mudanças que ocorrem no ambiente, ou por uma resistência ativa para manter o status quo, além do apego a normas e práticas de sucessos do passado. Para esse autor, para enfrentar tais crises as empresas precisarão canalizar grande parte da energia de seus membros para formar coalizões e consensos entre os membros da organização.

Segundo Carvalho e Vieira (2007) as investigações de relações de poder nas organizações endereçam aquelas estabelecidas na diferenciação vertical da divisão de trabalho. Para eles, as relações de poder também acontecem no plano da diferenciação horizontal. E nos conflitos que emergem nesse plano envolvem grupos e departamentos com diferenciação em status, comportamentos de desigualdade, dependência e aquiescência, podendo levar ao recrudescimento de normas de controle.

Essas categorias assimétricas de poder são adotadas por grande parte dos cientistas sociais. O foco numa relação de desigualdade são as capacidades diferenciais dos atores dentro do sistema em assegurar vantagens e recursos escassos e assim valiosos. Visto dessa

forma, o poder é exercido sem necessariamente a aquiescência ou dependência do receptor do ato de poder. O predomínio da vontade de uns sobre a de outros é enfatizado pelo poder interpretado pelo enfoque da aquiescência, o poder como controle social. Esse caso implica invariavelmente em resistência e conflito, prevalecendo a vontade daquele que detém o poder. Já o poder sob a perspectiva de relação de dependência há a conformidade entre os atores. Sem quaisquer ameaças ou ações entre eles, um se conforma com a vontade ou interesses do outro pela relação existente entre as partes. Os tipos e as formas de conquista e sustentação das relações de dependência entre o sujeito e o objeto de poder e o que leva este último a se submeter são enfatizados na análise do poder sob enfoque da dependência. (CARVALHO e VIEIRA, 2007).

A autoridade atribuída a cada cargo da estrutura formal é exercida mediante os determinantes de poder (ou bases, ou fontes de poder), que “são os recursos que os indivíduos ou grupos controlam e que os tornam capazes de exercitar poder sobre outrem” (CARVALHO e VIEIRA, 2007, p. 12). Esses autores trazem uma variada gama de determinantes ou bases de poder. Com base em French e Raven: coerção, recompensa, legitimidade, referência, especialização; de Bacharach e Lawler citado por Hall ao qual recorrem, acrescentam um sexto a esses cinco determinantes: a informação ou o acesso ao conhecimento.

O poder de recompensa é a possibilidade de alguém – o influenciador - recompensar outro – o influenciado. Em outras palavras, é a habilidade do gerente controlar e administrar recompensas por um comportamento pretendido. O poder de coerção é capacidade de alguém punir o outro em decorrência de exigências não cumpridas. O poder de legitimidade é a crença de um indivíduo ou grupo de que alguém tem o direito de agir com autoridade. Poder de referência tem base na vontade de o primeiro imitar e se identificar com o segundo, pode ser a admiração e o desejo do subordinado se identificar com o gerente e dele querer ganhar a aprovação. Por último, o poder de especialização tem como base o reconhecimento da competência do influenciador. Como exemplo, a crença do subordinado de que o gerente tem conhecimento, expertise, habilidades, ou capacidades em uma determinada área (CARVALHO e VIEIRA, 2007; LIAO, 2008).

As organizações que lidam com situações de instabilidade necessitam de renovação. A burocracia para ser eficiente requer comportamento metódico, prudente e disciplinado por parte de seus membros. Necessitando de confiança em alto grau de que a conduta de seus membros esteja dentro de padrões estabelecidos (previsibilidade), a burocracia exerce pressão

sobre os funcionários. Assim a eficiência da burocracia está relacionada com o grau de inculcação de atitudes e sentimentos que lhe são adequados (MOTTA, 1993).

Para Motta (1993), isso leva à diminuição de relações personalizadas pois o grau em que a inculcação de sentimentos se dá tende a ir além do necessário, sendo substituídas por apego excessivo aos procedimentos burocráticos e desenvolvimento do sentimento de autodefesa do grupo burocrático – o espirit de corps. Ainda segundo Motta, os funcionários são estimulados – pela própria burocracia – a ajustar seus pensamentos, sentimentos e ações às perspectivas oferecidas pela carreira. Isso estimula o conformismo, o conservadorismo e tecnicismo, enfim, ao formalismo dos pequenos procedimentos, pois a obediência cega a regulamentos acena com a segurança e o conforto – sentido oposto ao do comportamento inovador. Dessa forma, continua Motta (1993), a identificação passa a ser com os meios – com as condutas exigidas pelas normas. Essa submissão à normas dá origem ao deslocamento de objetivos, em vez de ser um meio, a norma passa ser fim em si mesma, a substituição de objetivos de que fala Etzioni (1972).

O modelo tradicional de organização que enfatizava o equilíbrio e estabilidade ficou superado com a transição para “[...] uma sociedade baseada em grandes movimentações de capital, tecnologia e trabalho, no qual inovação é um valor central e informação é um recurso fundamental” (MOTTA, 1993, p. 87).

Contudo, a política de poder dentro da organização é uma das razões para que uma aptidão estratégica se torne uma limitação estratégica. Inovação equivale dizer novos conhecimentos, novas competências que podem trazer implicações para o status quo, como afirma Leonard-Barton (1998).

A alteração das aptidões vigentes pode desalojar as “realezas” organizacionais de seus tronos, encastelados em feudos funcionais, de mercados ou outros. Como tais revoluções podem atingir até o topo da escala organizacional, os gerentes mostram- se compreensivelmente relutantes em abrir mão de seu poder político. (LEONARD- BARTON, 1998, p. 53)

Diante desse novo quadro, as organizações - a grande corporação multinacional - não exercem o poder diretamente, elas agora podem ser instrumentos de mediação de poder, como discutido na sequência.