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Olhando Abaixo da Superfície

No documento John Stott - A Cruz de Cristo (páginas 32-45)

Nos capítulos anteriores procurei estabelecer dois fatos acerca da cruz. Primeiro, sua importância central (para Cristo, para seus apóstolos e para a igreja mundial desde então), e, segundo, seu caráter deliberado (pois embora tenha sido devida à maldade humana, foi também por causa de um propósito determinado de Deus, voluntariamente aceito por Cristo, que se entregou a si mesmo à morte).

Mas por quê? Voltamos a esse enigma básico. O que há acerca da crucificação de Jesus que, apesar de seu horror, vergonha e dor, a faz tão importante ao ponto de Deus a planejar de antemão e de Cristo vir para suportá-la?

Uma construção inicial

Pode ser útil responder a essa pergunta em quatro estágios, começando com o claro e não controverso, e, passo a passo, ir penetrando mais profundamente no mistério.

Primeiro, Cristo morreu por nós. Além de ser necessária e voluntária, sua morte foi altruísta e benéfica. Ele a empreendeu por nossa causa, não pela sua, e cria que através dela nos garantia um bem que não poderia ser garantido de nenhum outro modo. O Bom Pastor, disse ele, ia dar a sua vida pelas ovelhas, em benefício delas. Similarmente, as palavras que ele proferiu no cenáculo, ao dar o pão aos seus discípulos, foram: "Isto é o meu corpo oferecido por vós". Os apóstolos pegaram esse simples conceito e o repetiram, às vezes tornando-o mais pessoal, trocando a segunda pessoa pela primeira:

"Cristo morreu por nós".1 Ainda não há nenhuma explicação e nenhuma identificação da

bênção que ele nos assegurou mediante a sua morte, mas pelo menos concordamos quanto às expressões "por vós" e "por nós".

Segundo, Cristo morreu para conduzir-nos a Deus (1 Pedro 3:18). O foco do propósito benéfico da sua morte é a nossa reconciliação. Como diz o Credo Niceno: "por nós (geral) e por nossa salvação (particular) ele desceu do céu. . ." A salvação que ele conseguiu para nós mediante sua morte é retratada de vários modos. Às vezes é concebida negativamente como redenção, perdão ou libertação. Outras vezes é positiva — vida

nova ou eterna, ou paz com Deus no gozo de seu favor e comunhão.2 No presente, o

vocabulário preciso não importa. O ponto importante é que, em conseqüência da sua morte, Jesus é capaz de conferir-nos a grande bênção da salvação.

Terceiro, Cristo morreu por nossos pecados. Nossos pecados eram o obstáculo que nos impedia de receber o dom que ele desejava darnos. De modo que eles tinham de ser removidos antes que a salvação nos fosse outorgada. E ele ocupou-se dos nossos pecados, ou os levou, na sua morte. A expressão: "por nossos pecados" (ou fraseado muito similar) é usada pela maioria dos escritores do Novo Testamento; parece que eles tinham certeza de que — de um modo ainda não determinado — a morte de Cristo e nossos pecados se relacionavam. Eis uma amostra de citações: "Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras" (Paulo); "Cristo morreu pelos pecados uma vez por todas" (Pedro); "ele apareceu de uma vez por todas. . . para desfazer o pecado mediante o sacrifício de si mesmo", e ele "ofereceu de uma vez por todas um sacrifício pelos pecados" (Hebreus); "o sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo o pecado" (João); "àquele que nos ama e nos libertou de nossos pecados através do seu sangue. . .

seja a glória" (Apocalipse).3 Todos estes versículos (e muitos mais) ligam a morte de Jesus

aos nossos pecados. Que elo é esse?

Quarto, Cristo sofreu a nossa morte, ao morrer por nossos pecados. Isso quer dizer que se a sua morte e os nossos pecados estão ligados, esse elo não é efeito de mera conseqüência (ele foi vítima de nossa brutalidade humana), mas de penalidade (ele suportou em sua pessoa inocente a pena que nossos pecados mereciam). Pois segundo a Escritura, a morte se relaciona com o pecado como sua justa recompensa: "o salário do pecado é a morte" (Romanos 6:23). A Bíblia toda vê a morte humana não como um evento natural, mas penal. E uma invasão alienígena do bom mundo de Deus, e não faz parte de sua intenção original para a humanidade. É certo que o registro fóssil indica que a pilhagem e a morte existiam no reino animal antes da criação do homem. Porém

parece que Deus tinha em mente um fim mais nobre para os seres humanos portadores de sua imagem, fim talvez semelhante ao traslado que Enoque e Elias experimentaram,

e à "transformação" que ocorrerá com aqueles que estiverem vivos na volta de Jesus.4

Através de toda a Escritura, pois, a morte (tanto física como espiritual) é vista como juízo

divino sobre a desobediência humana.5 Daí as expressões de horror com relação à morte,

a sensação de anomalia de que o homem se tivesse tornado como as bestas que

perecem, uma vez que o mesmo destino aguarda a todos.6 Daí também a violenta

indignação de que Jesus foi alvo em seu confronto com a morte ao lado do túmulo de

Lázaro.7 A morte era um corpo estranho. Jesus resistiu-lhe; ele não pôde aceitá-la.

Se, pois, a morte é a pena do pecado, e se Jesus não tinha pecado próprio em sua natureza, caráter e conduta, não devemos dizer que ele não precisava ter morrido? Não poderia ele, em vez de morrer, ter sido trasladado? Quando o seu corpo se tornou translúcido durante a transfiguração no monte, não tiveram os apóstolos uma previsão do seu corpo da ressurreição (daí a instrução de a ninguém contarem acerca desse acontecimento até que ele ressurgisse dentre os mortos, Marcos 9:9)? Não podia ele naquele momento ter entrado no céu e escapado à morte? Mas ele voltou ao nosso mundo a fim de ir voluntariamente à cruz. Ninguém lhe tiraria a vida, insistia ele; ele ia dá-la de sua própria vontade. De modo que quando o momento da morte chegou, Lucas a representou como um ato autodeterminado do Senhor. "Pai", disse ele, "nas tuas mãos entrego o meu espírito".8 Tudo isso significa que a simples afirmativa do Novo Testamento: "ele morreu por nossos pecados" diz muito mais do que aparenta na superfície. Afirma que Jesus Cristo, sendo sem pecado e não tendo necessidade de morrer, sofreu a nossa morte, a morte que nossos pecados mereciam.

Necessitaremos, em capítulos posteriores, penetrar mais profundamente na razão, moralidade e eficácia dessas afirmativas. Por enquanto devemos contentar-nos com esta construção quádrupla preliminar, que Cristo morreu por nós, para o nosso bem; que esse "bem" pelo qual ele morreu era a nossa salvação; que a fim de no-la assegurar, ele teve de enfrentar os nossos pecados; e que, ao morrer por nossos pecados, foi a nossa morte que ele sofreu.

A pergunta que desejo fazer agora, e à qual procurarei responder no restante deste capítulo, é se os fatos se encaixam nesta construção teológica preliminar. Será ela uma teoria um tanto complexa imposta sobre a história da cruz, ou será que a narrativa dos evangelistas lhe supre evidência e até mesmo permanece ininteligível sem ela? Ar- gumentarei em favor do último caso. Além do mais, procurarei demonstrar que o que os evangelistas retratam, embora seja testemunho deles, não é de sua invenção. O que estão fazendo é permitir que entremos um pouco na mente do próprio Cristo.

De modo que olharemos para três das cenas principais das últimas vinte e quatro horas de Jesus na terra — o cenáculo, o jardim do Getsêmani, e o lugar chamado Gólgota. Ao fazermos esse exame, seremos incapazes de nos limitar ao mero relato de uma história pungente, visto que cada cena contém ditos de Jesus, os quais exigem explicação e não podem ser deixados de lado. Algo mais profundo do que meras palavras e ações estava acontecendo abaixo da superfície. A verdade teológica continua a aparecer, mesmo quando desejamos que ela nos deixe em paz. Em particular, sentimo-nos obrigados a fazer perguntas acerca da instituição da Ceia do Senhor no cenáculo, sobre a "agonia" no jardim do Getsêmani, e acerca do "grito de desespero" na cruz.

Contudo, antes que possamos fazer essas perguntas, há um fato digno que nos diminuirá o passo, e que tem de ver com a perspectiva de Jesus através de todos esses eventos. Nossa história tem início na noite de Quinta-Feira Santa. Jesus tinha visto o sol se pôr pela última vez. Dentro de mais ou menos quinze horas seus membros seriam estendidos na cruz. Dentro de vinte e quatro horas ele estaria morto e enterrado. E ele sabia disso. Contudo, o extraordinário é que ele estava pensando a respeito de sua missão como ainda no futuro, não no passado. Comparativamente, ele era jovem, por certo entre os trinta e trinta e cinco anos de idade. Ele nem bem tinha vivido metade da

vida humana. Ele ainda estava no auge de seus poderes. Na idade dele a maioria das pessoas tem seus melhores anos pela frente. Maomé viveu até os sessenta, Sócrates até os setenta, e Platão e Buda tinham mais de oitenta anos quando morreram. Se a morte ameaça encurtar a vida de uma pessoa, o sentimento de frustração lança-a na tristeza. Mas não a Jesus, por este simples motivo: ele não considera a morte que estava prestes a sofrer como o fim último de sua missão, mas como necessária à sua realização. Somente alguns segundos antes de ele morrer (e não antes) ele foi capaz de gritar: "Está terminado!" De modo que, então, embora fosse a sua última noite, e embora tivesse poucas horas de vida, Jesus não olhava para trás, para uma missão que havia completado, muito menos pensando ter falhado; olhava para frente, para uma missão que estava prestes a cumprir. A missão de uma vida de trinta ou trinta e cinco anos haveria de ser realizada em suas últimas vinte e quatro horas, deveras, suas últimas seis.

A Última Ceia no cenáculo

Jesus estava passando sua última noite na terra em reclusão tranqüila com os apóstolos. Era o primeiro dia da festa dos Pães Asmos, e haviam-se reunido para tomar a refeição pascal juntos na casa de um amigo. O lugar é descrito como "um cenáculo grande, mobiliado e preparado", e podemos imaginá-los ao redor de uma mesa baixa, reclinados sobre almofadas no chão. Evidentemente não havia criados que os servissem, de modo que ninguém lhes lavou os pés antes da refeição. Nem um dos apóstolos, tampouco, foi humilde suficiente para se desincumbir de tão vil tarefa. Foi para intensa consternação deles, portanto, que durante a ceia Jesus vestiu um avental de escravo, despejou água numa bacia e lavou os pés aos apóstolos, realizando assim o que nenhum deles estivera disposto a fazer. A seguir ele lhes disse como o amor autêntico sempre se expressa mediante o serviço humilde e como o mundo os identificaria como discípulos somente se amassem uns aos outros. Em contraste com a prioridade do amor sacrifícial e serviçal, ele os advertiu de que um membro do grupo iria traí-lo. Ele também falou muito da sua iminente partida, da vinda do Consolador que tomaria o seu lugar, e do variado ministério de ensino e testemunho desse Espírito da verdade.

Então, continuando a refeição, eles observaram encantados quando ele pegou um pão, abençoou-o (isto é, deu graças), quebrou-o em pedaços e passou-os aos discípulos, dizendo: "Este é o meu corpo, que é dado por vós; fazei isto em memória de mim". Da mesma forma, terminada a ceia, ele tomou um cálice de vinho, deu graças, entregou-o aos discípulos e disse: "Este é o cálice da nova aliança em meu sangue"; ou: "Este é o meu sangue da nova aliança, que é derramado por muitos para o perdão de pecados;

fazei isto, sempre que o beberdes, em memória de mim".9

Essas são ações e palavras tremendamente significativas. E pena que, por estarmos tão familiarizados com elas, tendam a perder o seu impacto. Pois lançam inundações de luz sobre a visão que o próprio Jesus tinha a respeito da sua morte. Através do que fez com o pão e com o vinho, e mediante o que disse a respeito desses elementos, ele estava dramatizando visivelmente sua morte antes que acontecesse e dando a sua própria autorizada explicação acerca do seu significado e propósito. Ele ensinava pelos menos três lições.

A primeira lição se referia à centralidade de sua morte. Solene e deliberadamente, durante sua última noite com os discípulos, ele dava instruções concernentes ao seu próprio culto memorial. Contudo, não devia ser uma única ocasião, como nossos cultos memorais modernos, o tributo final pago por amigos e parentes. Pelo contrário, devia ser uma refeição regular ou culto, ou ambos. Ele lhes disse especificamente que o repetissem: "fazei isto em memória de mim". O que deviam fazer? Deviam copiar o que ele tinha feito, tanto os seus atos como suas palavras, isto é, tomar, quebrar, abençoar, identificar e partilhar o pão e o vinho. O que significavam o pão e o vinho? As palavras que ele proferira tinham a explicação. Acerca do pão ele dissera: "Este é o meu corpo que é dado por vós", e do vinho: "Este é o meu sangue que é derramado por vós". De modo

que sua morte falava aos discípulos de ambos os elementos. O pão não representava seu corpo vivo, enquanto ele se reclinava com eles à mesa, mas seu corpo que em breve seria dado por eles na morte. Da mesma forma, o vinho não representava o seu sangue que lhe corria nas veias enquanto lhes falava, mas seu sangue que em breve seria derramado por eles na morte. A evidência é clara e irrefutável. A Ceia do Senhor, que foi instituída por Jesus, e que é o único ato comemorativo autorizado por ele, não dramatiza nem seu nascimento nem sua vida, nem suas palavras nem suas obras, mas somente a sua morte. Nada poderia indicar mais claramente a significação central que Jesus atribuía à sua morte. Era por sua morte que ele desejava, acima de tudo, ser lembrado. Portanto, é seguro dizer que não há Cristianismo sem a cruz. Se a cruz não for o centro da nossa religião, a nossa religião não é a de Jesus.

Segunda, Jesus estava ensinando a respeito do propósito da sua morte. De acordo com Paulo e Mateus, as palavras de Jesus acerca do cálice referiam-se não somente ao seu sangue mas também à nova aliança associada com o seu sangue, e Mateus acrescenta que o sangue de Cristo devia ser derramado pelo perdão dos pecados. Aqui temos a afirmação verdadeiramente fantástica de que por intermédio do derramamento do sangue de Jesus, na morte, Deus estava tomando a iniciativa de estabelecer um novo pacto ou "aliança" com o seu povo, na qual uma das maiores promessas seria o perdão dos pecadores. Que quis ele dizer?

Muitos séculos antes Deus tinha feito uma aliança com Abraão, prometendo abençoá-lo com uma boa terra e uma posteridade abundante. Deus renovou essa aliança no monte Sinai, depois de tirar a Israel (descendentes de Abraão) do Egito. Ele prometeu ser o seu Deus e fazê-los o seu povo. Além disso, essa aliança foi ratificada com o sangue do sacrifício: "Então tomou Moisés aquele sangue e o aspergiu sobre o povo, e disse: Eis aqui o sangue da aliança que o Senhor fez convosco a respeito de todas estas

palavras."10 Passaram-se centenas de anos, durante os quais o povo se esqueceu de

Deus, quebrou a sua aliança e provocou o seu juízo, até que um dia no sétimo século a.C. a palavra do Senhor veio a Jeremias, dizendo:

Eis aí vêm dias, diz o Senhor, e firmarei nova aliança com a casa de Israel e com a casa de Judá. Não conforme a aliança que fiz com seus pais, no dia em que os tomei pela mão, para os tirar da terra do Egito; porquanto eles anularam a minha aliança, não obstante eu os haver desposado, diz o Senhor. Porque esta é aliança que firmarei com a casa de Israel, depois daqueles dia, diz o Senhor. Na mente lhes imprimirei as minhas leis, também no coração lhas inscreverei; eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo. Não ensinará jamais cada um ao seu próximo, nem cada um ao seu irmão, dizendo: Conhece ao Senhor, porque todos me conhecerão, desde o menor até ao maior deles, diz o Senhor. Pois, perdoarei as suas iniqüidades, e dos seus pecados jamais me lembrarei.

(Jeremias 31:31-34)

Passaram-se mais seis séculos, anos de espera paciente e expectativa crescente, até uma noite num cenáculo de Jerusalém, em que um camponês galileu, carpinteiro de profissão e pregador por vocação, ousou dizer, com efeito: "Esta nova aliança, profetizada por Jeremias, está prestes a ser estabelecida; o perdão de pecados prometido como uma das bênçãos distintivas está prestes a ficar disponível; e o sacrifício para selar esta aliança e assegurar este perdão será o derramamento do meu sangue na morte." Será possível exagerar a natureza espantosa dessa reivindicação? Aqui está a visão que Jesus tinha da sua morte. É o sacrifício divinamente ordenado pelo qual a nova aliança com a sua promessa de perdão será ratificada. Ele vai morrer a fim de levar o seu povo a um novo relacionamento de aliança com Deus.

A terceira lição que Jesus estava ensinando referia-se à necessidade de apropriarmo-

nos pessoalmente da sua morte. Se tivermos razão em dizer que, no cenáculo, Jesus

estava apresentando uma dramatização de sua morte, é importante que observemos a forma que ela tomou. Não consistia em um ator num palco, e doze pessoas no auditório.

Não; envolveu a todos como também a ele, de modo que tanto eles como ele participaram do drama. É verdade que Jesus tomou o pão, abençoou-o e o quebrou, mas então, enquanto comiam, ele explicou a significação do seu gesto. Novamente, ele tomou o cálice e o abençoou, mas então, enquanto bebiam, explicou a significação do seu gesto. Assim, não eram meros espectadores deste drama da cruz; eram participantes dele. Não poderiam ter deixado de entender a mensagem. Assim como não era suficiente que o pão fosse quebrado e o vinho derramado, mas que tinham de comer e beber, da mesma forma não era suficiente que ele morresse, mas eles tinham de se apropriar pessoalmente dos benefícios da sua morte. O comer e o beber eram, como ainda o são, uma parábola viva de recebermos a Cristo como nosso Salvador crucificado, e nos alimentarmos dele, pela fé, em nossos corações. Jesus já havia ensinado essa mensagem em seu grande discurso sobre o Pão da Vida, o qual veio logo depois da alimentação dos cinco mil:

Em verdade, em verdade vos digo: Se não comerdes a carne do Filho do homem e não beberdes o seu sangue, não tendes vida em vós mesmos. Quem comer a minha carne e beber o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia. Pois a minha carne é verdadeira comida, e o meu sangue é verdadeira bebida (João 6:53-55).

As palavras de Jesus naquela ocasião, e suas ações no cenáculo testemunham a mesma realidade. Dar ele o seu corpo e o seu sangue na morte era uma coisa; apropriarmo-nos nós das bênçãos da sua morte é outra muito diferente. Contudo, muitos ainda não aprenderam essa distinção. Posso ainda lembrar-me da grande revelação que foi para mim, na juventude, quando me disseram que era necessário uma ação de minha parte. Eu costumava imaginar que, por haver Cristo morrido, o mundo tinha sido corrigido automaticamente. Quando alguém me explicou que Cristo havia morrido por mim, res- pondi um tanto altivamente: "Todo mundo sabe disso", como se o fato em si ou o meu conhecimento do fato me houvesse trazido a salvação. Mas Deus não força as suas dádivas sobre nós; temos de recebê-las mediante a fé. A Ceia do Senhor permanece como o sinal externo perpétuo tanto da dádiva divina como da recepção humana. Tem o propósito de ser a comunhão do corpo e do sangue de Cristo (1 Coríntios 10:16).

Portanto, eis as lições do cenácúlo acerca da morte de Cristo. Primeira, ocupava o centro do pensamento que ele tinha acerca de si mesmo e de sua missão, e ele desejava que fosse o centro do nosso. Segunda, aconteceu a fim de estabelecer a nova aliança e assegurar o seu perdão prometido. Terceira, precisa ser apropriada individualmente, se quisermos desfrutar os seus benefícios (a aliança e o perdão). A Ceia do Senhor instituída por Jesus não tinha o propósito de ser um "não-me-esqueça" piegas, mas, antes, um culto rico de significação espiritual.

O que torna os eventos do cenácúlo e a significação da Ceia do Senhor ainda mais

No documento John Stott - A Cruz de Cristo (páginas 32-45)