• Nenhum resultado encontrado

Os bailes nas ruas e nos clubes e os blocos caricatos

2.1 Os primeiros anos da década de 1980 e suas principais manifestações

2.1.3 Os bailes nas ruas e nos clubes e os blocos caricatos

As inúmeras reportagens pesquisadas, referentes ao início da década de 1980, demonstram que não somente de escolas de samba e Zé Pereira vivia o carnaval ouro-pretano. Embora menos expressivas no conjunto total de fontes, outras manifestações se faziam presentes, como os bailes populares, os bailes em diversos clubes da cidade e outros blocos carnavalescos.

Por meio das diversas notícias veiculadas percebe-se que os bailes populares consistiam em apresentações de conjuntos musicais em alguns pontos da cidade, onde a população podia participar gratuitamente. No ano de 1980, algumas reportagens demonstram algumas de suas características.

[...] tome baile! Bailes populares por todo lado, à noite e de dia, que o povão gosta e ginga bonito nos salões. A orquestra do maestro Odilon Vilas-Boas inicia um sambão quente-fervendo e o povão, que vai sambar este ano até cair, responde de cá,

com um ritmo de deixar qualquer um abobalhado81.

Pelo trecho destacado pode-se perceber a sua abrangência, o público frequentador e o tipo de apresentação musical que acontecia no ano em questão. Segundo outra fonte, também do ano de 1980, os bailes aconteciam durante as tardes e as noites de carnaval, na

81

Praça Tiradentes e no Largo dos Contos, localizado à Rua São José, no centro da cidade 82. No ano seguinte, o maestro também era o responsável pela música, mas com a diferença de que a banda tocaria no Largo dos Contos seguindo até o Largo da Alegria, para “resgatar as festas que ali tanto rolaram em outros carnavais” 83.

Por esta fonte tem-se a impressão de que a banda não ficava em ponto fixo, mas andava pelas ruas das cidade. Segundo essa mesma reportagem, a Rua São José, “antigo quartel-general dos foliões do século passado” 84, era o principal lugar, onde, em um período anterior, aconteciam as festas de carnaval:

O carnaval de Ouro Preto era na Rua São José. Melhor dizendo, a Rua São José era o carnaval de Ouro Preto. Depois, a festa subiu para a Praça Tiradentes e lá está instalada com todas as suas cores e artifícios. A Rua São José ficou sendo o reduto de blocos e foliões autônomos que, aos desfiles da Praça, preferem o vaivém espontâneo entre o Largo dos Contos e o Largo da Alegria, assim batizado por ser o

ponto secular de começo e fim dos cortejos85.

Mas, com o apelo dos comerciantes da São José, no ano de 1981, os bailes se estenderiam até esta rua, havendo também a promessa de também as escolas de samba por lá passarem, “combinadas entre si para evitar o encontro das alas no meio do caminho”. A reportagem em questão trazia um exemplo das reivindicações a favor do deslocamento da festa: “É preciso acabar com esse carnaval na Praça! – exclama o comerciante Ramiro Neves, profundo conhecedor das tradições e dos brios da rua, sendo a São José, por excelência, a Rua de Ouro Preto” 86.

Já, no ano de 1982, havia alguns indícios sobre a não permanência dessa mudança na festa. Nenhuma das reportagens desse ano faz qualquer menção à realização dos bailes nos trechos entre o Largo dos Contos e o Largo da Alegria, na Rua São José. Ao contrário, todas voltam a referir-se à Praça Tiradentes como o lugar tanto dos desfiles das escolas quanto de realização dos bailes, com a mesma banda dos anos anteriores: “No sábado, dia 18, um grande baile animado pela orquestra do maestro Odilon Vilas Boas abre a folia total na Praça Tiradentes” 87. Outra, também enfatiza a continuidade da festa com a centralidade na Praça:

82

SERÃO filmadas as festas de Momo em Ouro Preto. Estado de minas, Belo Horizonte, 16 fev. 1980. 15.016, Caderno Pequenos anúncios, p.5.

83

OSWALDO, Ângelo. Estado de Minas, Belo Horizonte. Carnaval em Ouro Preto. 15.327, Caderno Turismo, p.1 84 Idem. 85 Idem. 86 Idem. 87

O carnaval de Ouro Preto e suas tradições. Estado de Minas, Belo Horizonte, 12 fev. 1982. 15.578, Primeiro caderno, p.5.

“Domingo, segunda e terça de carnaval, os desfiles começam às 19h na Praça Tiradentes e vão até às 2h da manhã, seguindo-se a orquestra do maestro Odilon88”.

No ano seguinte, 1983, a única menção que se tem sobre os bailes populares é a confirmação de que aconteceriam na Praça Tiradentes após os desfiles das escolas, de sábado à terça- feira. Não há quaisquer referências às características desses bailes, como descrito com mais ênfase nos anos anteriores, o que pode demonstrar um enfraquecimento dessa manifestação ao longo da década de 1980 ou confirmar o lugar secundário que ela ocupava no carnaval da cidade de Ouro Preto no período em questão, mais preocupado com as escolas de samba e o Zé Pereira dos Lacaios.

Além dos bailes populares também era comum na cidade a realização de bailes em diversos clubes. Os mais citados pelas reportagens foram o Aluminas, o XV de Novembro e o Centro Acadêmico da Escola de Minas (CAEM), com destaque para os dois últimos. O CAEM, como o nome já evidencia, promovia bailes para os estudantes da Universidade Federal de Ouro Preto. O nome faz menção a uma das escolas mais antigas da Universidade, criada em 1876, antes mesmo da inauguração da UFOP em 1969 e da posterior incorporação da escola a essa instituição (CARVALHO, 2002). O XV de Novembro foi assim descrito por uma das reportagens do Estado de Minas:

Neste carnaval, Ouro Preto vai recuperar outro ponto tradicional, com a volta dos famosos bailes do Clube XV de Novembro, fundado em 1924, que há dez anos não eram organizados. O presidente Antônio Quilão, Cardoso, Chicão e Tofaneto, da diretoria do XV, cuidam de todos os detalhes para que o clube, restaurado no ano passado, possa reviver seus bailes, que varam a madrugada de Ouro Preto após o desfile das escolas89.

Outra reportagem do ano de 1982 demonstra a importância desses clubes para o carnaval da cidade: “O carnaval de Ouro Preto promete muita animação nas ruas e nos clubes. O tradicional Clube XV de Novembro está anunciando bailes, bem como o Centro Acadêmico da Escola de Minas” 90.

O clube Aluminas, fundado em 1941 pela empresa de nome “Alumínio Minas Gerais”, existente ainda hoje na cidade,91 teve maior destaque recebido quando foi associado

88

AS CIDADES históricas em ritmo de carnaval. Estado de Minas, Belo Horizonte, 8 jan. 1982. 15.548, Caderno Turismo, p. 3.

89

LACAIOS, cem anos de animação. Estado de Minas, Belo Horizonte, 22 fev. 1981. 15.327, Caderno Turismo, p.1.

90 Idem. 91

Informações obtidas no site da empresa: <http://www.clubealuminas.com.br>. Acesso em: 04 de maio de 2011.

à escola de samba Sinhá Olímpia, que ao que indica a reportagem abaixo possuía relação com o clube:

A Aluminas também torce para o êxito do carnaval de rua e quer ver a escola de samba ‘Sinhá Olímpia’, campeã do ano passado, repetir o grande feito. Não é menor a confiança de um de seus fundadores, Jésus Mazoni, bem como de seu presidente, Jefferson Oliveira, além do presidente da Associação Atlética Aluminas, Anselmo Pereira.92.

Além dos bailes nos clubes e dos bailes populares, outros blocos caricatos também eram retratados nas diversas fontes consultadas. Os mais citados eram a Charanga do Carlota, a Bandalheira, o Balanço da Cobra, Quem não é não entra, o Zé Pereira do Palácio Velho e o Banjo de Prata.

A Charanga do Carlota esteve presente na maior parte das fontes referentes ao início da década de 1980. Com “características de verdadeira escola” e “famosa pelo ritmo de sua bateria” 93, era considerada um bloco, pois não participava do concurso. Assim, percebe- se um critério que a diferenciava das outras escolas de samba neste período: o desfile sem a vinculação à avaliação de critérios definidos, visando à eleição de um vencedor: “A Charanga do Carlota, fundada por Carlos Lisboa, é uma história à parte, já que não participará do concurso, sem deixar por menos em matéria de garra na valente bateria comandada por Chica” 94.

Descrita também como bloco pela maioria das reportagens, a Charanga do Carlota parece ter vigorado como uma das principais manifestações desse tipo no carnaval de Ouro Preto. Este fato pode ser constatado pelo grande número de menções a ela no conjunto total das reportagens sobre os blocos e as escolas e, também, por uma homenagem recebida pela Prefeitura da cidade no ano de 1980, juntamente com o Zé Pereira: “Em Ouro Preto, a Secretaria de Turismo e Cultura entregará um troféu aos Lacaios, assinalando sua participação no carnaval desde 1867, além de marcar, também com um troféu, o décimo aniversário da Charanga do Carlota” 95.

Outro bloco que também tinha a característica de não participar de nenhuma forma de concorrência era a Bandalheira, conforme apontado na seguinte reportagem: “Há,

92

EM SARAMENHA o melhor programa para o Rei Momo. Estado de Minas. Belo Horizonte, 09 fev. 1983. 15.823, p.16.

93

SERÃO filmadas as festas de Momo em Ouro Preto. Estado de Minas, Belo Horizonte, 1980. 15.016, Caderno Pequenos anúncios, p.5.

94

CIDADES históricas em ritmo de carnaval. Estado de Minas. Belo Horizonte, 8 jan.1982. 15.548, Caderno Turismo, p.3.

95

SERÃO filmadas as festas de Momo em Ouro Preto. Estado de Minas, Belo Horizonte, 1980. 15.016, Caderno Pequenos anúncios, p.5.

ainda, as agremiações que não concorrem, porque preferem a descontração total, como é o caso da famosa Charanga do Carlota e da Bandalheira” 96. Este bloco também figurava como um dos mais importantes em Ouro Preto nos anos iniciais da década de 1980, com inúmeras reportagens que abordavam sua presença na programação geral da festa:

Entre os blocos, destaca-se a Bandalheira, da qual o Carnaval ouro-pretano não abre mão. Um grupo de rapazes arregimenta-se sob o comando de Virgílio do Rosário, enverga uniforme com penicos como capacetes e sai para as ruas no infernal alarido de velhos instrumentos buscados nos sótãos e porões da cidade. Depois vem o Balanço da Cobra, fundado pela professora Cida, serpenteando uma cobra colossal na frente dos mais divertidos foliões da cidade97.

Outras reportagens também destacam o bloco e suas características: “[...] a Bandalheira faz a alegria do povo ao satirizar uma banda marcial furiosamente tocando velhos e desajeitados instrumentos” 98. Em praticamente todas as outras reportagens, ela é citada junto aos demais blocos que compõem o carnaval ouro-pretano da época.

Dez agremiações participam da grande festa. Após os Lacaios, vem o Zé Pereira do Palácio Velho, a Charanga do Carlota e a Bandalheira, seguindo-se as escolas de samba Império do Morro de Sant’Ana, que está comemorando seu jubileu de prata, a Imperial de Ouro Preto, Unidos do Padre Faria, Sinhá Olímpia, Inconfidência Mineira e Acadêmicos de São Cristóvão. Mas há, ainda, uma novidade: o tradicional Banjo de Prata, um dos blocos mais famosos do velho carnaval ouro-pretano, volta

apresentar-se após quase trinta anos de ausência99.

Neste trecho, dois pontos se destacam. O primeiro é a junção de todas as escolas que participariam do carnaval de 1982 com os principais blocos da época, como se fizessem parte de um mesmo conjunto. Interessante constatar que não havia uma separação exata entre blocos e escolas - embora já constatada a diferença entre eles em relação à participação no concurso - e nem uma programação estruturada com divisões rígidas do que era uma coisa e outra. Nesta reportagem supracitada, o critério que parecia valer para classificar todas estas manifestações como “agremiações que participam da grande festa” é o desfile que realizavam nas ruas da cidade, o que parecia ser o ponto alto do carnaval pela ênfase percebida nas fontes.

96

MUITA gente procura hotéis de Ouro Preto. Estado de Minas. Belo Horizonte, 17 fev. 1982. 15.582, 1982, Primeiro caderno, p.14.

97 Idem. 98

O CARNAVAL de Ouro Preto e suas tradições. Estado de Minas. Belo Horizonte, 12 fev. 1982. 15.578, Primeiro caderno, p. 5.

99

O outro ponto a ser destacado é o retorno do Banjo de Prata, que segundo a reportagem, estava há quase trinta anos sem desfilar no carnaval ouro-pretano. Em outras reportagens esse retorno é também evidenciado: “Outra apresentação tradicional ficará por conta do Banjo de Prata, um velho cordão que já fez a glória do velho carnaval ouro-pretano e retornou no ano passado, graças ao esforço do Sr. Pedro Marambaia e dos jovens da Rua Nova e da Rua do Chafariz” 100; “O Banjo de Prata, uma das mais famosas sociedades do velho carnaval ouro-pretano, voltou a desfilar, relembrando os tempos de corso na Rua São José” 101.

É possível perceber que, apesar de terem sido menos retratados em relação às escolas de samba e ao Zé Pereira, estes blocos eram também considerados importantes para a festa, como demonstraram algumas reportagens que procuravam retratar a sua participação em cada ano.

Os blocos são organizados por jovens estudantes e artistas. A Charanga do Carlota, uma verdadeira escola, famosa pelo ritmo de sua bateria, a Bandalheira, o Balanço da Cobra e o Quem não é não entra estão entre os melhores e, todos os anos, a população aguarda, com expectativa, aquilo que irão inventar para o carnaval. No sábado, eles estarão na Praça Tiradentes e nos outros dias apresentam-se antes do desfile oficial das escolas, indo depois para a tradicional Rua São José, onde no

passado funcionava o quartel-general carnavalesco”102.

O bloco Balanço da Cobra aparece com mais expressão no ano de 1983, com destaque para a sua possível criadora: “[...] a professora de Botânica da UFOP, Maria Aparecida Zurlo já fez a sua convocação geral para a organização do ‘Balanço da Cobra’, um bloco que já tornou tradição na terça-feira gorda” 103. As reportagens não oferecem mais detalhes acerca de sua constituição e formas de participação, ele é apenas noticiado como “o mais animado e colorido” daquele ano.

O outro bloco supracitado, o “Quem não é não entra”, é apenas descrito junto aos outros blocos104. No ano de 1982, a sua animação foi destacada como no caso do Balanço da Cobra em 1983, mas nenhuma outra característica foi ressaltada: “Saem ainda pela cidade o Zé Pereira do Palácio Velho da Encardideira, a Charanga do Carlota, com sua famosa bateria

100 Idem. 101

MUITA gente procura hotéis de Ouro Preto. Estado de Minas, Belo Horizonte, 17 fev. 1982. 15.582, Primeiro caderno, p.14.

102

OS LACAIOS, cem anos de animação em Ouro Preto. Estado de Minas, Belo Horizonte, 08 fev. 1980. 15.009, Caderno Turismo, p.8.

103

E O ZÉ Pereira abre a grande folia em Ouro Preto. Estado de Minas, Belo Horizonte, 07 jan. 1983. 15.795, Caderno Turismo, p.2.

104

SERÃO filmadas as festas de Momo em Ouro Preto. Estado de Minas, Belo Horizonte, 1980. 15.016, Caderno Pequenos anúncios, p.5.

e a Bandalheira, além de inúmeros blocos caricatos, dos quais o mais animado é o ‘Quem não é, não entra’” 105.

Nesta reportagem, outro bloco é apresentado, o Zé Pereira do Palácio Velho, criado a partir do antigo Zé Pereira dos Lacaios. O clube “inspirou um grupo de jovens do Palácio Velho da Encardideira a criar um novo Zé Pereira, que pelo segundo ano se apresentará na Praça Tiradentes” 106. O nome do bloco refere-se a uma localidade em Ouro Preto que abriga ruínas de uma construção do que teria sido, no período colonial, um palácio. Uma reportagem do ano de 1983 também evidencia essa relação dos dois blocos e algumas de suas características: “[...] a tradição não corre risco, porque o Zé Pereira do Palácio Velho reúne crianças e jovens do bairro da Encardideira, sob o comando de Adão, ex-integrante dos Lacaios, que decidiu fundar um Zé Pereira infantil, a fim de assegurar a continuidade do clube”.

Pelas fontes apresentadas, pode-se concluir que as principais manifestações presentes no carnaval ouro-pretano no início dos anos 1980 eram as escolas de samba e o Zé Pereira dos Lacaios, seguidos dos bailes populares, dos bailes nos clubes e de outros blocos caricatos que também desfilavam pelas ruas da cidade.

No próximo subitem será apresentada a coluna “Carnaval etc. e tal”, responsável em divulgar as principais manifestações carnavalescas das cidades mineiras. O carnaval ouro- pretano foi noticiado em várias de suas produções, que também se mostraram importantes para compreender as mudanças posteriores na festa e a própria veiculação da mesma pelo jornal Estado de Minas.