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Os partidos republicanos conservadores antecessores do Partido Republicano Nacionalista (1910-1921)

Capítulo I Partidos e Sistemas Partidários na Europa do pós guerra

1. A formação de um partido republicano conservador alternativo ao PRP Um longo caminho de dificuldades

1.1. Os partidos republicanos conservadores antecessores do Partido Republicano Nacionalista (1910-1921)

Praticamente logo após o 5 de Outubro de 1910, alguns velhos republicanos e ex-monárquicos, os chamados «adesivos», sentiram a necessidade de formar uma alternativa ordeira ao Partido Republicano Português (PRP) dentro do novo regime republicano. Primeiramente tentaram travar o radicalismo dentro do próprio PRP, mas cedo verificaram a sua impossibilidade, tendo de formar partidos alternativos de cariz conservador, moderado e institucionalista180.

O PRP que vinha da Monarquia era um partido-frente181 que aglutinava indivíduos com percursos sociais e políticos distintos e com ideias e sensibilidades muitas vezes contraditórias182. Desde logo homens como Sampaio Bruno defenderam que era necessário após o triunfo republicano construir uma verdadeira democracia nacional que ligasse a tradição com a revolução. Por isso, era necessário extinguir o Partido Republicano Português para a constituição de um Partido Republicano Conservador e um Partido Republicano Radical, ao mesmo tempo que se assegurava a existência de outras forças políticas, não excluindo a monárquica. No entanto, não foi esse o caminho escolhido. A constituinte foi quase um congresso do Partido Republicano Português, onde por sua vez se começaram a notar as grandes divergências internas que o partido enfermava, patentes nas inúmeras propostas constitucionais que se digladiaram. As discrepâncias acentuaram-se a 24 de Agosto de 1911 com a eleição do primeiro Presidente da República, Manuel de Arriaga, apoiado pelo “Bloco” constituído pelos amigos políticos de António José de Almeida, Brito Camacho e Machado Santos. No pólo oposto encontrava-se Bernardino Machado, apoiado pela facção política dos aliados de Afonso Costa183.

A constituição do Grupo Parlamentar Democrático, liderado por Afonso Costa no início de Setembro de 1911, a sua oposição ao I governo constitucional, liderado por João Chagas e a eleição de um Directório da confiança política de Afonso Costa durante o Congresso do PRP realizado entre 27 e 30 de Outubro de 1911 marcaram a ruptura

180

Ernesto Castro Leal, “O campo político dos partidos republicanos (1910-1915)” in AA.VV., O Tempo

de Manuel de Arriaga, Centro de História da Universidade de Lisboa/Associação dos Antigos Alunos do

Liceu da Horta, Colecção Coloquia, Lisboa, 2004, pp. 107-125.

181 Fernando Piteira Santos, “Na transição do «constitucionalismo Monárquico» para o

«constitucionalismo republicano»: a crise do Partido Republicano», Análise Social, vol. XVIII, n.º 72-73- 74, 1982, pp. 673-685.

182 Cunha Leal, Os partidos políticos na República Portuguesa, «os meus cadernos - n.º 2», Corunha,

Imprensa Moret, 1932, pp. 72-87.

183

Ernesto Castro Leal, Partidos e Programas. O campo partidário republicano português (1910-1926), Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2008, pp. 17-28.

com o resto do PRP associado no “Bloco”, que se tornaria definitiva durante o Congresso do Partido Republicano Português realizado em Braga entre 27 e 29 de Abril de 1912. Em resposta, o “Bloco” associou-se no Parlamento constituindo a União Nacional Republicana, embora sem o apoio de Machado Santos que iniciou um projecto político autónomo. A União Nacional Republicana, sem descurar o legado do Partido Republicano Português, queria corrigir os excessos de jacobinismo que a corrente radical tinha imprimido a este partido. No entanto, a União Nacional Republicana, enquanto aliança parlamentar, não iria evoluir para a constituição de um partido político, uma vez que as divergências internas levaram à formação de duas organizações partidárias em Fevereiro de 1912: o Partido Republicano Evolucionista184, liderado por António José de Almeida e a União Republicana, liderada por Brito Camacho. Estes dois partidos políticos desenvolveram a sua acção política entre 1912 e 1919, num campo ideológico e social muito próximo, uma vez que se consideravam conservadores e opositores do radicalismo do Partido Democrático. A nível eleitoral, nunca conseguiram retirar a hegemonia ao PRP que herdou a estrutura burocrática do Estado e a rede clientelar vinda da Monarquia, sendo, neste período, o Partido Republicano Evolucionista a segunda força política e a União Republicana a terceira força política185. O início da I Guerra Mundial vai propiciar uma evolução no sistema de partidos republicanos, em particular nos ordeiros. A constituição do governo da União Sagrada (15 de Março de 1916 a 25 de Abril de 1917) proporcionou uma aliança entre o Partido Republicano Português e o Partido Republicano Evolucionista no sentido de Portugal intervir na Guerra, ao lado dos aliados, na frente europeia. O consenso político com os outros partidos não foi atingido, acentuando-se ainda mais as divergências entre os republicanos186. Dentro do Partido Republicano Evolucionista também se acentuaram as discordâncias, levando à formação de uma facção liderada por Egas Moniz, que levaria à formação do Partido Centrista Republicano em 1917. Este partido reforçou um dos tópicos que marcava a direita republicana – a defesa dos poderes do Presidente da República, nomeadamente o poder de dissolução do Congresso187.

No entanto, foi apenas com o “Sidonismo” e com o Partido Nacional Republicano que esta tendência presidencialista primeiramente se materializou. A revolução “Sidonista” teve o apoio inicial da União Republicana, de qual Sidónio Pais e outros conspiradores pertenciam, do Partido Reformista, do Partido Centrista Republicano e de alguns socialistas, católicos, integralistas e sindicalistas. Esta aliança precária desfez-se quando Sidónio Pais enveredou por um presidencialismo de cariz autoritário, tendo a União Republicana e o Partido Socialista deixado de apoiar o governo em Março de 1918. No entanto, alguns dos seus filiados continuaram a acompanhar Sidónio Pais, enquanto líder carismático, pelo que houve uma nova série de cisões dentro destes partidos. O grupo que ficou a apoiar Sidónio Pais formou o Partido Nacional Republicano composto por membros do Partido Reformista, do Partido Centrista Republicano, alguns unionistas e por neosidonistas. Contudo, dada a

184 Manuel Roque Azevedo, “Inquérito sobre o Partido Republicano Evolucionista (1912-1919) ”, Nova

História, n.º 2, Dezembro, 1984, pp. 74-122.

185 Ernesto Castro Leal, Partidos e Programas… op. cit., pp. 43-57. Ernesto Castro Leal, Partidos e

Identidade Política. A Construção do Sistema Partidário Republicano Português (1910-1926), Sumário

das Provas de Agregação, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 2008.

186 Filipe Ribeiro de Meneses, União Sagrada e Sidonismo. Portugal em Guerra (1916-1918), Lisboa,

Edições Cosmos, 2000.

187

Ernesto Castro Leal, Partidos e Programas. O campo partidário republicano português (1910-1926), Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2008, pp. 62-63.

heterogeneidade dos elementos que o compunham e o cariz presidencialista e corporativo do regime, estava reservado um papel mitigado para este partido188.

O Partido Nacional Republicano não sobreviveu ao assassinato do seu líder. Porém, surgiram diversos agrupamentos políticos seguidores das correntes ideológicas do “Sidonismo”, onde se refugiaram alguns sidonistas (casos de João Tamagnini Barbosa, Feliciano da Costa Júnior, Teófilo Duarte e Eurico Cameira que viriam em 1925 a ingressar no PRN), como o Partido Republicano Conservador (1919-1920), Partido Nacional Republicano Presidencialista (1921-1925) e a Acção Nacionalista (1922-1925)189.

O fim da “Nova República” marcou o restabelecimento do sistema de partidos anterior ao “Sidonismo”. O presidente do executivo, José Relvas (27-01-1919 a 30-03- 1919), ainda tentou unificar o partido unionista, evolucionista e centrista antes das eleições, no sentido de afastar o PRP do poder. Contudo, as negociações não chegaram a bom porto, pelo que as eleições realizadas a 11 de Maio de 1919 ditaram uma nova maioria absoluta para o Partido Republicano Português (86 deputados dos 163 que compunham a Câmara dos Deputados), ficando o Partido Republicano Evolucionista e a União Republicana numa posição secundária. Não obstante, houve uma renovação da elite máxima destes partidos, uma vez que Afonso Costa ficou a viver em Paris, António José de Almeida foi eleito Presidente da República em 1919 e Manuel de Brito Camacho foi nomeado Alto-Comissário de Moçambique em 1920. A derrota eleitoral acentuou a necessidade de haver uma convergência entre as forças republicanas conservadoras, pelo que em Outubro de 1919 foi possível formar o Partido Republicano Liberal (PRL) que aglutinava o Partido Republicano Evolucionista, a União Republicana, o Partido Centrista Republicano e a Conjunção Republicana da Beira. A constituição do PRL abria a esperança de o regime republicano encontrar uma solução de alternância pacífica dentro do quadro constitucional. Contudo, nem todos os evolucionistas aceitaram a criação do PRL. Donde, os elementos mais à esquerda do PRE criaram no Congresso o Grupo Parlamentar Popular (1919), que se converteria no Partido Republicano Popular (1920-1921)190.

Este período também ficou marcado por conflitos internos e dissidências dentro do PRP. Por um lado, havia diferenças ideológicas profundas a nível interno, como ficou patente na revisão constitucional de 1919, e por outro lado, a falta de coesão do grupo parlamentar acarretava um fraco apoio aos governos do PRP. Assim, em Março de 1920 mais de três dezenas de parlamentares, liderados por Álvaro de Castro, formaram o Grupo Republicano de Reconstituição Nacional, mais tarde transformando em Partido Republicano de Reconstituição Nacional (PRRN). A maioria dos membros deste grupo provinha da cisão do PRP, embora alguns tivessem vindo do PRL e de grupos independentes191. Simultaneamente houve outra cisão no PRP, denominada

188 Armando B. Malheiro da Silva, “A República e o Reformismo democrático autoritário (1890-1926).

Uma proposta interpretativa” in AA.VV., Portugal – Brasil. Uma Visão Interdisciplinar do Século XX, Coimbra, Quarteto, 2003, pp. 21-62; Armando B. Malheiro da Silva, Sidónio e Sidonismo, 2 volumes, Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2006; Ernesto Castro Leal, Partidos e Programas. O

campo partidário republicano português (1910-1926), Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra,

2008, pp. 63-71.

189 Armando B. Malheiro da Silva, “A República e o Reformismo… op. cit., pp. 21-62; Ernesto Castro

Leal, Partidos e Programas. O campo partidário republicano português (1910-1926), Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2008, pp. 73-80.

190 Ernesto Castro Leal, Partidos e Programas… op. cit., pp. 80-88.

191 João Manuel Garcia Salazar Gonçalves da Silva, O Partido Reconstituinte: Clientelismo,

faccionalismo e a descredibilização dos partidos políticos durante a Primeira República (1920-1923),

Grupo Parlamentar Dissidente, liderada por Domingos Leite Pereira. No Porto, no início de Janeiro de 1921, também surgiu uma facção, denominada Núcleo Republicano Regionalista do Norte. Estes dois grupos eram reduzidos e acabaram por regressar ao PRP no final de 1921 no rescaldo da “Noite Sangrenta”192.

O PRP perdeu a partir de Março de 1920 a maioria na Câmara dos Deputados e no Senado e o país deixou de ter um partido que suportasse executivos sólidos. O Presidente da República teve de nomear governos de concentração ou minoritários que tiveram vida curta. Entre Março de 1920 e Maio de 1921 houve oito governos com as mais variadas combinações. Todos começaram a pensar que a única solução passava pela dissolução do Congresso.

O Partido Republicano Português estava empenhado na dissolução parlamentar para tentar obter uma nova maioria parlamentar, esmagando as suas cisões nas urnas e na mesa das negociações. O Partido Republicano Liberal, também estava interessado na dissolução uma vez que se conseguisse que o Presidente da República nomeasse um governo liberal e dissolvesse simultaneamente as Câmaras, poderia «fazer» as eleições de forma a obter uma maioria parlamentar que lhe permitisse suportar um governo consistente. Por sua vez, a GNR e algumas forças militares, lideradas pelos republicanos radicais tinham-se revoltado a 21 de Maio de 1921 contra o governo de concentração de Bernardino Machado e também exigiam a dissolução parlamentar. O Presidente da República optou por aceitar a demissão do governo para evitar um banho de sangue. O PRP decidiu então abdicar do poder, facilitando a nomeação de um governo liberal, liderado por Tomé de Barros Queirós, a 23 de Maio de 1921 e votou posteriormente a favor da dissolução do Congresso no Conselho Parlamentar. Só o representante dos socialistas votou contra, abstendo-se os reconstituintes e o representante dos democráticos dissidentes. A ascensão do PRL poderia permitir a construção de um novo quadro político partidário, com dois partidos de governo que se poderiam revezar no poder, à maneira do rotativismo e enfraqueceria certamente os populares e os reconstituintes.

O Presidente da República, assessorado pelo Conselho Parlamentar, decidiu dissolver as Câmaras no dia 1 de Julho de 1921, uma vez que se tinha tornado praticamente impossível nomear um Governo que tivesse um apoio maioritário no órgão legislativo. Faziam parte do Conselho Parlamentar representantes de todas as correntes de opinião do Congresso, segundo um princípio de representação proporcional. A legislatura de 1921 surgiu devido ao novo quadro constitucional do pós-guerra, que permitia que o Presidente da República, António José de Almeida, dissolvesse as Câmaras legislativas, após consulta do Conselho Parlamentar, sempre que assim o exigisse os interesses da Pátria e da República193.

As eleições realizadas a 10 de Julho deram, como era norma, a vitória ao partido que as liderou no Ministério do Interior. O Partido Republicano Liberal estabeleceu acordos com o Partido Republicano Português em vários círculos para a distribuição dos votos e dos mandatos. Estas negociações foram estabelecidas não só entre os directórios dos dois partidos como entre candidatos e notáveis individualmente, havendo por isso diversos acordos sem lógica ideológica ou política, prevalecendo unicamente a distribuição de lugares e de poder194. Daí estas eleições terem sido das menos concorridas (em Lisboa a abstenção chegou aos 79%), mas das que levantaram mais

192

Ernesto Castro Leal, Partidos e Programas. O campo partidário republicano português (1910-1926), Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2008, pp. 47-50 e 97-102.

193 Lei n.º 89 de 22 de Setembro de 1919 que reviu a Constituição. 194

Cf., José Adelino Maltez, Tradição e Revolução. Uma biografia do Portugal Político do século XIX

celeuma e acusações de fraude e violência. Os Liberais elegeram 79 deputados, os Democráticos 54 e os Reconstituintes 12. Os restantes 18 lugares da Câmara dos Deputados foram distribuídos por pequenas formações que poderiam desempenhar um papel importante dada a maioria clara, mas não absoluta, que os liberais tinham conseguido. Os monárquicos que finalmente tiveram condições para ir às urnas obtiveram 4 deputados, os independentes 5, Católicos 3, Dissidentes 3, Regionalistas 2 e Populares 1195.

O novo Parlamento, dividido por nove agrupamentos partidários, tinha uma árdua tarefa pela frente. Tinha de resolver o problema da carestia de vida, provocada por uma inflação galopante, e o deficit das contas públicas num Parlamento profundamente dividido por questões político-partidárias e por questões pessoais, sem nenhum partido ter maioria. Como reconheceu Bernardino Machado, a dissolução parlamentar tinha tido por objectivo criar dois fortes partidos de governo, mas tinha-se ficado sem nenhum196. O Partido Republicano Liberal, à semelhança do Partido Republicano Português, também se encontrava dividido por várias facções, de ex-unionistas, ex-evolucionistas e ex-centristas. A fragmentação partidária e a indisciplina partidária foram dois problemas que marcaram esta legislatura, bem como toda a I República. Tanto os pequenos partidos, como os grandes não conseguiam apoiar maiorias estáveis para suportar executivos duradoiros. Dentro das próprias maiorias nasciam os germes que levavam à destituição dos governos.

No Parlamento a maioria de direita apoiou o governo liberal de Tomé de Barros Queiroz com a expectativa benévola dos democráticos e dos católicos e a oposição das outras bancadas. O governo iniciou a sua acção tentando enfrentar os problemas constantemente adiados do deficit público, da inflação, da desvalorização do escudo, dos abastecimentos dos produtos essenciais, do regime cerealífero e da reforma fiscal. No entanto, qualquer tentativa de enfrentar estes problemas encontrava no Parlamento uma maioria de bloqueio que inviabilizava qualquer acção governamental. O Governo apresentou a declaração ministerial (isto é, o programa do governo) no dia 1 de Agosto na Câmara dos Deputados, tendo Tomé de Barros Queiroz chamado a atenção dos deputados para a sua responsabilidade: “Apesar dos esforços individuais de todos os parlamentares cujo patriotismo está acima das melhores referências, apesar dos bons desejos de cada um dos grupos do Congresso dissolvido, o facto incontestável é que não foram votados os orçamentos de 1919-1920, 1920-1921, 1921-1922, como votados não foram as propostas de carácter permanente criando receitas reputadas indispensáveis por toda a gente”. Posteriormente fez o diagnóstico da situação do país: “O encarecimento dos produtos que o País é obrigado a importar; a política financeira seguida depois do começo da guerra, não se criando as receitas correspondentes ao aumento da despesa ordinária, nem se contraindo empréstimos para a cobertura dos encargos extraordinários resultantes da guerra; o alargamento da circulação fiduciária não só para ocorrer às necessidades económicas do País, mas muito especialmente para cobrir os deficits de gerência; as dificuldades crescentes para a colocação dos poucos produtos exportáveis e o afrouxamento daquele rigor na aplicação dos dinheiros públicos, que constituiu um dos melhores títulos de glória dos primeiros anos da administração republicana, conduziram o nosso meio circulante a uma desvalorização tal que a vida se tornou um tormento para as classes menos abastadas da sociedade portuguesa, agravando em muito as condições já precárias das nossas finanças”. Perante esta situação era imperioso que o Governo tomasse medidas para “um mais favorável abastecimento da população” e para

195 A. H. de Oliveira Marques, A Primeira República Portuguesa (Alguns aspectos estruturais), 3.ª

edição, Lisboa, Livros Horizonte, 1980, p. 127

uma “melhoria da situação financeira do País” que se obtém “pela valorização da nossa moeda, e essa valorização tem de conseguir-se por factores de ordem moral e de ordem material: de ordem moral, fazendo uma administração modelar, defendendo os dinheiros públicos com energia e decisão; de ordem material, equilibrando o orçamento, aumentando a produção para se intensificar a exportação e diminuir a importação, regularizando a dívida flutuante, pondo o País em condições de poder recorrer vantajosamente às operações de crédito que forem reputadas úteis e essenciais”197

. O Governo pretendia restabelecer o equilíbrio orçamental e diminuir a dívida pública por meio da redução das despesas e de um aumento das receitas.

Não era a primeira vez que propostas deste tipo eram apresentadas no Parlamento. O desequilíbrio nas contas públicas, a desvalorização do escudo e a inflação galopante tornavam prementes medidas de austeridade e de rigor e uma reformulação profunda do sistema de impostos. No entanto, não foram aprovadas as várias propostas que foram surgindo, nomeadamente de Rego Chaves, em Dezembro de 1919, de Inocêncio Camacho Rodrigues em Agosto de 1920 e de Cunha Leal em Dezembro de 1920. Estas propostas não chegaram a ser aprovadas, e algumas nem discutidas foram, devido à grande instabilidade política e à falta de maiorias coesas no Congresso198.

As propostas de Barros Queirós expostas durante a apresentação do governo a 1 de Agosto foram devidamente explicitadas no Parlamento no dia 3 de Agosto de 1921, aquando da apresentação do orçamento rectificado para 1921-1922199. As propostas revelavam um plano ambicioso e articulado e reflectiam o pensamento da corrente republicana conservadora há longos anos na oposição para resolver os problemas nacionais. No referente ao aumento das receitas os liberais avançaram para a reformulação do sistema de impostos, propondo alterações e remodelações no real de água, na tabela do imposto de selo, contribuição de registo e introdução de um imposto para a assistência pública. Propunham ainda a criação de um imposto geral sobre o rendimento que iria substituir uma série de impostos200. A diminuição das despesas seria feita à custa de suprimir serviços públicos dispensáveis e reduzindo-se os imprescindíveis. Os funcionários do Estado, incluindo as forças armadas, consumiam mais de 50 por cento das despesas, e por isso, seriam limitados aos estritamente necessários e seriam proibidas novas admissões enquanto houvesse excesso nos quadros. Propunha-se por isso, um programa de redução e de transferência de funcionários públicos, recorrendo, se necessário, à aposentação antecipada. Em relação à dívida pública previa-se o lançamento de novos empréstimos internos e externos com condições mais vantajosas e medidas contra o aumento da circulação fiduciária. Para além destas medidas previa-se ainda um conjunto alargado de investimentos e de

197 Tomé de Barros Queiroz, Diário da Câmara dos Deputados, 01-08-1921, pp. 7-9. Cf., Nuno Valério,

“os Orçamentos do Estado” in Nuno Valério (Coord.), As Finanças Públicas no Parlamento Português.

Estudos preliminares. Porto, Edições Afrontamento/Assembleia da República, 2001, pp. 45-64. Ana Bela

Nunes, “Os Debates Orçamentais durante a Primeira República” in Nuno Valério (Coord.), Os

Orçamentos no Parlamento Português, Lisboa, Dom Quixote /Assembleia da República, 2006, pp. 121-

159.

198 Luís Farinha, Estudo sobre a acção política Parlamentar de Francisco Pinto Cunha Leal como

deputado ao Congresso da República (1918-1926), Vol. I, Assembleia da República/Edições

Afrontamento, 2002, pp. 10-14; Luís Farinha, Francisco Pinto Cunha Leal, intelectual e político: um

estudo biográfico (1888-1970), Tese doutoramento, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas -

Universidade Nova de Lisboa, 2003, pp. 163-218; “Álvaro Ferreira da Silva; Luciano Amaral, “A

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