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1.2 A Gramática da Palavra e da Frase no mundo greco-latino

1.2.3 Os pronomes pelos gramáticos gregos

1.2.3.1 Os pronomes segundo Apolônio

Apolônio, também gramático grego, faz uma revisão crítica da concepção e classificação dos pronomes proposta por Dionísio. Considera que o relativo não pode estar incluso na classe dos artigos, na medida em que ele é usado no lugar do nome; logo, a questão não se circunscreve à sua colocação após o nome, ou seja, ele não é um artigo hipotático. Nesse sentido, o relativo se qualifica pela flexão de caso e de número, expressos por outras formas claramente definidas e, quando se flexiona um gênero (cujo, cuja), este também se define pela forma (masculina e feminina).

Assim, os relativos, à semelhança dos pronomes pessoais se opõem ao nome, na medida em que “indicam” apenas a existência, mas não a qualidade, ou seja, o atributo do sujeito corpóreo. Essa indicação, quando a pessoa já foi apresentada pelo nome, se faz pela “anaphórikon” e, em caso contrário, quando ela está presente, pelo diktikón ou demonstrativo, ou pelo homoiomatikon, ou seja, pela relação de semelhança. Tal distinção faculta Apolônio postular que o pronome relativo é um “anafórico” fundado na relação de semelhança com o nome que ele substitui, para demonstrar a pessoa do discurso por ele substituída e/ou referida. Já os demonstrativos podem ser considerados como dêiticos, pois apenas apontam para essas pessoas, mas não as substituem.

Para esse gramático é preciso atribuir relevo ao fato de a pessoa não ser uma categoria designativa, visto não expressar “qualidade”, mas apenas “apontar para a coisa ou ser designado” – relação dêitica. Chama a atenção para o fato de as designações nominais, ou seja, o que é designado pelo nome - a concepção ou noção pré-existente, o já dito e, por isso determinado - não ter a possibilidade de indicar senão apenas uma pessoa do discurso: mas uma por vez. Já os pronomes indicam várias delas de uma só vez: nós = eu +tu+ vós, por exemplo. Apolônio parece postular a necessidade de se diferenciar pessoas do discurso de classes gramaticais, ou seja, as pessoas do discurso são representadas em língua, pelos pronomes pessoais propriamente ditos. O fato de eles exercerem funções sintáticas

diferenciadas se deve a outra dimensão lingüística: como as pessoas do discurso são representadas, em língua, no enunciado.

Essa dificuldade de revisão dos estudos de Dionísio não o impede de apresentar uma nova concepção de pronome, em que se atribui relevo ao fato de ser essa uma classe de palavras por meio da qual se faz a “indicação” de pessoa do discurso e de ela poder ser empregada no lugar do nome da pessoa indicada. Assim, o pronome, por manter relações de significação com o nome e com o verbo, é uma paranomásia: na classe que só tem identidade em relação a esses dois outros e, nesse sentido também é uma semiósis, pois arrasta consigo as significações dessas duas classes. Contudo, embora idêntico, diferencia-se do nome e do verbo e, nesse sentido é uma antonomásia, na outra forma de outra forma de antonímia. (ROBINS, 1983)

No caso de eles serem concebidos como “antonomásia” por Dionísio, a explicação estaria justificada por Apolônio, segundo o qual a substituição do nome pelo pronome assegura entre ambos relações qualificadas por um certo grau de identidade. Contudo, essa identidade se inscreve nas diferenças já apontadas, o que faz dos pronomes uma classe contrária à dos nomes, mas não contraditória a ele e, nesse sentido, elas não se opõem. Observa Apolônio haver um alto grau de identificação entre os pronomes e os nomes próprios, mas não entre os nomes comuns, ressaltando o fato de os pronomes pessoais expressarem apenas a idéia de substância: o que é substantivo, essencial do ser, da pessoa. Já os pronomes de terceira pessoa têm maior grau de identidade, tanto com os nomes próprios, quanto com os nomes comuns, na medida em que se referem àquilo de que se fala. Trata- se de uma forma pronominal não indicativa das pessoas do discurso, aquelas que representam em língua os interlocutores: eu ou tu; nós ou vós. Por essa razão, apenas a terceira pessoa pode se fazer substância – o assunto. Logo, não se trata de antonímia regida pelo princípio da contradição, em que a afirmação de um pressupõe a negação do outro, mas de complementação, em que o pronome reafirma o nome, contudo enquanto substância, e não enquanto qualidade. A qualidade é transitória e é sempre da pessoa, designada pelo nome próprio – para afirmar a essência, a individualidade de cada ser. (NEVES, 1987).

Pode-se considerar nas gramáticas de Dionísio e de Apolônio, que o primeiro focaliza os pronomes na dimensão da palavra; o segundo trata não só da palavra, mas também busca focalizá-la pelas suas funções, na dimensão da frase. Logo, Apolônio desenvolve os primeiros estudos sobre a gramática da frase-grega. Nesse sentido, embora tenha mantido as 8 classes das partes do discurso, propostas por Dionísio, redefiniu o pronome não só como palavra que substitui o nome, mas também como sendo a representação da substância nominal por ele retomada no fluxo da fala, ou seja, “ousía”. (NEVES, 1987).

Observa-se ainda que os seus estudos não só apontam ser o nome e o verbo os elementos constitutivos da frase, mas também elabora a primeira descrição sintática, tendo por ancoragem a relação entre essas duas classes primitivas. As demais classes são definidas pela relação nome verbo. Embora não se ocupe com as relações entre o verbo e os casos oblíquos das palavras, atribui relevo à construção do particípio e o considera como elemento que participa do lugar ocupado pelo verbo, pelo nome e pelo pronome no espaço da formalização lingüística da linguagem. O esforço de Apolônio é apontar que o pronome não só participa do lugar ocupado pelo nome pelo verbo, mas também para o fato da dupla função que ele exerce. Essas funções explicitam-se pela retomada do nome ou pela indicação das pessoas por meio das categorias morfológicas e sintáticas da língua grega, registradas ou reiteradas pelas formas morfológicas da flexão verbal. (ROBINS, 1983).