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As profundas transformações que vem ocorrendo no mundo do trabalho, que implicam em sua precarização e das condições para a sua realização, na flexibilização de suas relações e no desaparecimento dos postos de trabalho em função do avanço tecnológico, somadas a uma situação de “desemprego estrutural” (ANTUNES, 1997:.41), compõem uma moldura para o triste quadro da atualidade. “No fim do século XX, está em curso a globalização do capitalismo. As forças produtivas do

capitalismo como o capital, a tecnologia, a força de trabalho, a divisão do trabalho social, o mercado, o planejamento e a violência monopolizada pelo Estado, todas estas forças estão presentes ativas e agressivas em âmbito global” (IANNI, 1997: 138).

O processo de globalização do capital fortalece-se a partir da segunda Guerra Mundial, iniciando pelos países desenvolvidos e espraiando-se depois para os países em desenvolvimento ou periféricos. “Pode-se dizer que a globalização é um processo que se realiza sem solução de continuidade já há mais de cinqüenta anos” (SINGER, 1998:19). Inaugurando um novo ciclo, o capitalismo avança em busca da conquista de novos mercados, desconsiderando regimes políticos, religiões, etnias ou condições sociais, já que a possibilidade de ampliar seus lucros transcende qualquer barreira ou fronteira. “As transnacionais planejam, tecem, realizam e desenvolvem suas atividades por sobre fronteiras, regimes políticos, além das diversidades culturais e civilizatórias” (IANNI, 1997:37).

Os países periféricos, cuja política econômica é marcada pela dependência em relação aos países desenvolvidos, acabam constituindo-se nos parceiros ideais no processo de globalização do capital, pois seus governos endividados submetem-se aos mandos e desmandos do “FMI, BIRD e OMC, a santíssima trindade do capitalismo global” (IANNI, 1997:125). Seguindo as orientações dessas instituições financeiras, os países que dependem desses recursos (como é o caso do Brasil), passam a efetivar reformas em sua estrutura estatal, realizando privatizações de grandes e lucrativas empresas públicas; com a expectativa de reduzir gastos públicos promovem cortes nos investimentos destinados ao desenvolvimento de políticas sociais. Com essas e outras ações o Estado procura gradativamente retirar-se de cena, deixando que o próprio mercado busque sua auto-regulação.

comércio e privatização é aplicado simultaneamente a mais de cem países devedores. Estes perdem a soberania econômica e o controle sobre a política monetária e fiscal; seu banco central e ministério da fazenda são reorganizados. Um ‘governo paralelo’, que passa por cima da sociedade civil, é estabelecido pelas instituições financeiras internacionais. Os países que não aceitem as metas de desempenho do FMI são colocados na lista negra (CHOSSUDOVSKY, 1999:28). Os cenários se alteram rapidamente. A chamada crise do capital em escala global atinge em cheio os trabalhadores, principalmente aqueles cuja ocupação estava ligada ao trabalho repetitivo, rotineiro e alienante, que são substituídos por robôs eletrônicos comandados por cérebros cibernéticos. Há um clima de insegurança no mundo: é o pavor do desemprego. Essa política econômica, adotada pelos países periféricos, agudiza as questões sociais, em função da diminuição dos investimentos das políticas sociais públicas e da gradativa retirada do Estado das ações de atendimento às populações subalternizadas.

A classe trabalhadora sofre os efeitos diretos dessa política adotada pelo capital e pelas elites que o representam, com a redução dos postos de trabalho, as privatizações e as transferências contínuas de grandes indústrias para países onde os trabalhadores encontram-se desorganizados, o que dificultam ainda mais a manutenção de direitos sociais e garantias trabalhistas, que a cada dia vêm sendo abolidos. “É perigoso fingir que nada mudou, quando os fatos da desindustrialização e da transferência geográfica de fábricas, das práticas mais flexíveis de emprego, do trabalho e da flexibilidade dos mercados de trabalho, da automação e da inovação de produtos olham a maioria dos trabalhadores de frente” (ANTUNES, 1997: 22).

O grande “exército industrial de reserva”, ao qual soma-se a cada dia mais e mais trabalhadores, vai contribuindo diretamente para precarizar as condições de trabalho existentes, ampliando a taxa de exploração daqueles que para sobreviver submetem-se a toda e qualquer exigência do mercado.

A flexibilização, desregulamentação ou precarização do trabalho divide o montante de trabalho economicamente compensador de forma cada vez mais desigual: enquanto uma parte dos trabalhadores trabalha mais por uma remuneração horária declinante, outra parte crescente dos trabalhadores deixa de poder trabalhar (SINGER 1998:30). Quando ANTUNES (1997:42) alerta para o “desemprego estrutural”, que segundo ele afeta o mundo em “escala global”, refere-se não somente ao desaparecimento de algumas funções, mas principalmente ao “trabalho precário e ao assalariamento no setor de serviços”. A estratégia passa, portanto, pela elevação da taxa de desemprego a níveis significativos, sendo que a taxa “desejável” para HAYEK, se situaria entre 15% a 20% da massa de trabalhadores ativos. Além disso, deve ser considerada ainda a inserção das mulheres no mercado formal de trabalho, enquanto força de trabalho útil e historicamente subvalorizada. Para Antunes (1997:45) “essa mudança na estrutura produtiva e no mercado de trabalho, possibilitou também a incorporação e o aumento da exploração da força de trabalho das mulheres em ocupação de tempo parcial, em trabalhos domésticos subordinados ao capital”.

Os trabalhadores são levados a especializarem-se e a qualificarem-se cada vez mais. No entanto, seu poder de negociação do valor de sua força de trabalho (única mercadoria que possuem), ficou a partir desse processo global ainda mais prejudicado.

A “crise” tão propagada na atualidade tem suas bases nas transformações que aconteceram e ainda estão em curso, em meados dos anos sessenta intensificando– se nos anos setenta, quando se colocaram em cheque os padrões Fordista de produção, bem como o modelo Keynesiano de regulamentação econômica. Essas mudanças vão repercutir diretamente na divisão internacional de trabalho, levando a uma urgente reorganização não só das economias mundiais, mas uma nova regulamentação das relações de trabalho.

Em substituição ao modelo anterior há uma incorporação do modelo japonês (toyotismo), que se popularizou em alguns outros países, propondo um operário

coletivo e flexível, agradecido à empresa que o acolheu e lhe “deu” um emprego, criando a idéia de “empresa mãe ou empresa família”. Segundo IANNI (1997:11) “o fordismo, como padrão de organização do trabalho e produção, passa a combinar-se com ou ser substituído pela flexibilidade dos processos de trabalho e produção, combinando produtividade, capacidade de inovação e competitividade”.

CAPÍTULO 2

2.1 “GLOBALIZAÇÃO” OU ESTRATÉGIA DE REORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO CAPITALISMO?

Tem dias que a gente se sente, como quem partiu ou morreu. A gente estancou de repente ou foi o mundo então que cresceu. A gente quer ter voz ativa, no nosso destino mandar. Mas eis que chega a roda viva e carrega o destino pra lá. (Chico Buarque- 1967/1968).

Durante toda a última década do século XX, a palavra de ordem foi “Globalização”, tomada e defendida ideologicamente como sinônimo de modernidade, apresentada à população brasileira como a grande alternativa para sair do atraso e emergir a outra condição no cenário mundial.

No entanto, definir ou conceituar o termo globalização não se constitui em uma tarefa fácil, pois sua resposta não é possível de imediato e nem tampouco encontrar uma única definição.

Em uma primeira aproximação, é possível pontuar, junto com Chesnais (1996), que a globalização é uma forma de expressão do capital, que desencadeia um complexo processo de produção e circulação de mercadorias, ganhando força máxima a partir da década de 1970, impulsionada pela chamada terceira revolução industrial.

Contudo, essa internacionalização da produção e de circulação não se refere simplesmente ao aumento de transações econômicas em termos geográficos, pois esse não é um fenômeno novo na história. Quanto a isso MARX e ENGELS já trataram em 1848, no “Manifesto do Partido Comunista” (1995:3-7), em que procuravam informar e instrumentalizar o proletariado para a revolução. Os autores afirmaram que:

“A grande indústria criou o mercado mundial (...)”, sendo que esse mercado acelerou o desenvolvimento do comércio, da navegação e dos meios de comunicação. Segundo Marx e Engels, a burguesia só poderia existir com a condição de revolucionar incessantemente os instrumentos de produção, as relações sociais e de produção. Neste sentido, todas as formas antigas de relações sociais se dissolvem e “tudo que era sólido e estável se esfuma (...)”, impelindo a burguesia a buscar novos mercados, invadindo todo o globo. A burguesia “necessita estabelecer-se em toda parte, explorar em toda parte, criar vínculos em toda parte”. Imprime-se um caráter cosmopolita à produção e ao consumo em todos os países; indústrias já não mais utilizam matéria prima nacional; criam produtos que não se consome somente em seu país, mas em toda parte do globo; as criações intelectuais de uma nação tornam-se propriedade comum de todas”.

A partir dessas considerações acerca da organização do modo de produção capitalista do século XIX, sob as análises atentas de Marx e Engels, constata-se que, o que se apresenta hoje como um fenômeno novo e completamente revolucionário é um processo antigo e já largamente utilizado pela burguesia, reapresentado em nova roupagem e em um novo contexto histórico, mas que reedita velhas formas de acumulação e exploração.

A partir disso, pode-se afirmar que a globalização expressa um “novo” ciclo de expansão do capitalismo. “Um modo de produção e processo civilizatório de alcance mundial, envolvendo nações, regimes políticos, projetos nacionais, grupos e classes sociais, economias, culturas e civilização” (IANNI,1997:07). Isso não é diferente do processo vivenciado no século XIX quando se deu a grande expansão da forma de produção capitalista pelo mundo.

ideologia quanto a palavra “globalização”, pois o destino econômico das sociedades se coloca como “inevitável e inexorável”, imposto pelo jogo livre das leis de mercado. Estaríamos, pois, frente a um processo em relação ao qual a sociedade mundial contemporânea (países e população) não teria opção a não ser adaptar-se? Parte-se do pressuposto, portanto, que toda e qualquer tentativa de reversão ou controle do processo é “inútil”, pois o slogan que acompanha a globalização é que ela representa a expressão máxima da modernidade, sendo o resultado das “forças do mercado”, finalmente liberadas das correntes nocivas com que o Estado lhes manietou durante meio século.

Ainda perseguindo a linha de pensamento de CHESNAIS (1996) ao tratar da globalização, destacam-se os traços característicos de um novo regime mundial de acumulação, quais sejam: baixas taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), conjuntura mundial instável, marcada por sobressaltos monetários e financeiros cada vez mais freqüentes; alto nível de desemprego não conjuntural, marginalização de regiões inteiras em relação ao sistema de trocas e uma concorrência internacional cada vez mais intensa, geradora de conflitos comerciais entre as grandes potências.

Se realizarmos uma breve incursão em busca da reconstrução histórica desse processo de internacionalização da produção e da circulação de mercadorias, poderemos partir do final dos anos 1960 até a atualidade.

Segundo COSTA (1994), após as duas grandes guerras mundiais os países capitalistas vencedores (EUA, França, Inglaterra), passaram a incrementar as relações internacionais e a proteger seus mercados.

De acordo com COSTA (1994), LAUREL (1997) BEHRING (1998), a crise que afetou o Estado de Bem Estar terá como um dos grandes protagonistas a crise do petróleo em 1973/1974 que, paradoxalmente, obrigou os países a financiar a sua

própria produção e a promover mudanças tecnológicas e /ou a buscar combustíveis alternativos26, como no caso do Brasil. Além disso, para desarticular e desmobilizar o forte movimento sindical, sobretudo dos países centrais e baratear os custos de produção, se intensifica a internacionalização da produção, o que as autoras destacam como uma das bases que impulsiona o processo de “globalização”.

A partir de então o que se vivenciou foi um novo surto de universalização do capital que se intensificará com a desagregação do bloco soviético e redução das barreiras às intervenções na China, Vietnã e outros países de regimes socialistas, impulsionando e fortalecendo a idéia de “regime único”: criam-se novos produtos, altos investimentos em tecnologia, recria-se a divisão internacional do trabalho, pois a abertura das nações socialistas representa uma excepcional oportunidade para criação de novos nichos de acumulação do capital.

O fordismo27, como padrão de organização do trabalho e da produção, passa a combinar-se ou mesmo a ser substituído pela flexibilização dos processos de trabalho e produção, combinando produtividade, capacidade de inovação e competitividade. O

26 Pró-álcool ou Programa Nacional do Álcool: Criado em 1975 foi um programa de substituição em larga escala

dos combustíveis veiculares derivados do petróleo por álcool. Idealizado pelo físico José Walter Bautista Vidal e pelo engenheiro Urbano Ernesto Stumpf consiste em produzir etanol a partir da cana de açúcar. A decisão pela cana de açúcar se deu pelo baixo custo de produção na época.

Biodiesel: Atendendo a um compromisso previsto no protocolo de Kioto, em que as nações se comprometem a redução de gazes poluente na atmosfera, o Brasil aprova em 13 de setembro de 2005 a Lei nº 11.097 que introduziu o biodiesel na matriz energética brasileira, definindo-o como: “Biocombustível derivado de biomassa renovável para uso de motores e combustão interna com ignição por compressão ou, conforme algum tipo de regulamento para geração de algum outro tipo de energia que possa substituir parcial ou totalmente combustível de origem Fóssil”( www.biodisel.gov.br- acessado em 22/01/2008 as 10 h e 19’)

27 A data inicial simbólica do fordismo deve por certo ser 1914, quando Henry Ford introduziu a jornada de

trabalho de oito horas e cinco dólares como recompensa para os trabalhadores da linha automática de montagem de carro. GRAMSCI (apud HARVEY, 1996: 121), em Cadernos do Cárcere, ao se referir ao americanismo e ao fordismo, dizia que equivaliam ao “maior esforço coletivo até para criar, com velocidade sem precedente, e com uma consciência de propósito sem igual na história, um novo tipo de trabalhador e um novo tipo de homem(...) inseparáveis de um modo específico de viver e de pensar e sentir a vida. “Em 1916, Ford enviou um exército de assistentes sociais aos lares de seus trabalhadores ‘privilegiados’ (em larga medida imigrantes) para ter certeza de que o ‘novo homem’ da produção de massa tinha o tipo certo de probidade moral, de vida familiar e capacidade de consumo prudente (isto é, não alcoólico) e ‘racional’ para corresponder as necessidades e expectativas da corporação. A experiência não durou muito tempo, mas sua própria existência foi um sinal presciente dos profundos problemas sociais, psicológicos e políticos que o fordismo iria trazer” (HARVEY, 1996: 122). Essa questão também foi tratada por Elaine Rossetti Behring e Ivanete Boschetti no livro Política

que, segundo IANNI (1997), levaria a uma nova divisão transnacional do trabalho e produção, transformando o mundo em uma fábrica global, sendo que o exército industrial de trabalhadores ativos e de reserva modifica-se e movimenta-se, formando contingentes de desempregados mais ou menos permanentes ou subclasses, em escala global.

Toda essa situação vivenciada em escala global tem na verdade servido de estratégia para alguns governos isentarem-se de sua responsabilidade pelas questões negativas que acontecem nas economias, alegando estar fora do seu controle, pois dependem de forças “supranacionais”. De acordo com HIRST e THOMPSON (1998), a globalização virou “pau para toda obra”. Constituiu fácil desculpa, poupando esforços de explicação e, sobretudo, de reflexão em torno de sua complexidade. Um exemplo disso é o caso do aumento do desemprego, imediatamente há aqueles que o justificam pelo fenômeno da globalização.

O que se tem percebido concretamente é que essa reorganização do capital, em que o mercado financeiro dita as normas obtendo o comando sobre a produção, provoca uma crescente precarização das relações formais de trabalho, contribuindo para ampliar a exploração sobre a classe dos que vivem do trabalho (ANTUNES, 1997). Esta classe vivencia em seu cotidiano a dura realidade do desemprego, trabalho informal, a desregulamentação das leis de proteção social ao trabalho e a instabilidade quanto a sua própria condição de continuar a manter-se a si e a sua família.

O Estado passa a ter neste contexto um papel fundamental, pois será chamado para agir sobre esta nova realidade, reconfigurando um Estado que atenda aos clamores de um mundo “globalizado”, e aceite as inexoráveis leis do mercado, uma vez que essa realidade se coloca como a única possível. Os governos se vêem

pressionados a tornarem suas economias mais competitivas em relação a outrem. Quanto a isso COSTA (1998:54) confere:

A supressão das distâncias entre tempo e espaço criou o mundo globalizado da informação contínua, dos mercados financeiros interligados ao tempo todo. É o mundo on line que impera. Nesta nova paranóia globalizada a pressa é o comando de todas as esferas sociais. Quem não está inserido na linha do mercado fica marginalizado do mundo. O mercado é o mundo. O mercado é a força suprema a qual todos os indivíduos, todos os governos, todos os partidos políticos devem se curvar. Não podemos ficar de fora do mundo global.

Diante das grandes transformações sociais ocorridas no decorrer do século XX, as relações vão ficando mais complexas a partir do avanço das forças produtivas e do desenvolvimento tecnológico. Neste contexto, a retomada do pensamento político e ideológico baseado em uma concepção liberal, agora sob a denominação Neoliberal, ganha força, colocando-se como condição sine qua non para que o processo de internacionalização da economia se intensifique e se consolide.

Na esteira dos acontecimentos mundiais ocorridos ao longo das três ultimas décadas do século XX, o Estado brasileiro fortemente atingido por defensores da perspectiva minimalista, vê-se obrigado a encarar não apenas uma reforma administrativa, mas vinculá-la a uma reforma ampla em todos os setores do Estado.

Entende-se que é fundamental a compreensão do modo como o neoliberalismo se particulariza no Brasil. Neste sentido, a partir de algumas temáticas que apresentamos a seguir, explicitamos nosso entendimento dessa perspectiva teórico- doutrinária, que vem fundamentando a base de organização de muitos Estados no mundo e no Brasil a partir dos anos 1990.

2.2. O NEOLIBERALISMO NO CONTEXTO DE REORGANIZAÇÃO DO

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