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4 A PRODUÇÃO CAPITALISTA DA MORADIA EM JUATUBA

4.4 O papel da (des)regulação urbana

Os funcionários da PMJ e os representantes das construtoras A e B entrevistados apontaram alguns fatores que contribuem para despertar o interesse do mercado imobiliário formal/legal voltado para o “segmento econômico” por Juatuba (informação verbal):

1) Disponibilidade e preço dos terrenos;

2) Localização estratégica de Juatuba na malha rodoviária e em relação aos municípios vizinhos;

3) Facilidade de acesso ao crédito imobiliário;

4) Facilidade e agilidade na aprovação dos projetos arquitetônicos; 5) Legislação pouco restritiva.

A questão institucional contemplada especialmente no quinto item merece atenção. De acordo com o macrozoneamento e o zoneamento que integram o Plano Diretor Municipal – Lei Complementar nº 94/2008 –, Juatuba é dividida em 04 macrozonas – área urbana, área de expansão urbana, área de urbanização específica e área rural –, sendo que as duas primeiras podem ser subdividas em 03 zonas – residencial I e II, comercial I e II, e especial I, II, III, de interesse social (ZEIS) e de interesse de preservação ambiental, cultural, histórico, arquitetônico e/ou paisagístico (ZEIP). 103

Conforme mencionado anteriormente, os bairros Santo Antônio e Samambaia,

localizados na região chamada “Francelinos”, inserem-se na ZEIS, enquanto os bairros

Canaan, Cidade Nova III, Cidade Nova IV, Granjas Alvoradas e Cidade Satélite inserem-se na Zona Residencial. A ZEIS “corresponde aos espaços a serem adensados visando à recuperação de investimentos públicos e a instalação de habitação de interesse social” (JUATUBA, 2008, Art. 7º, §2º). Esta definição não condiz com a realidade da região de

“Francelinos” que, de acordo com os técnicos da Secretaria Municipal de Infraestrutura e

Meio Ambiente, possui infraestrutura urbana e ambiental precária, carecendo de investimentos públicos. Segundo os entrevistados, boa parte da região é ocupada por loteamentos e habitações clandestinos e/ou irregulares, para os quais são necessárias medidas de regularização fundiária e urbanística (informação verbal). Parte da região é ocupada por sítios e chácaras.

De acordo com o Plano Diretor Municipal, os parâmetros de parcelamento e de uso e ocupação do solo deveriam ser regulamentados na atualização das leis de Parcelamento e de Uso e Ocupação do Solo, o que não aconteceu: permanece em vigor a Lei Complementar nº 345 de 25 de novembro de 1998 – que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano – e a Lei Complementar nº 358 de 16 de dezembro de 1998 – que dispõe sobre o uso e a ocupação do

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O macrozoneamento e o zoneamento são estabelecidos nos artigos 4º e 6º, respectivamente, do Plano Diretor Municipal. O mapa que sobrepõe as informações referentes ao macrozoneamento e ao zoneamento encontra-se no ANEXO C.

solo. Os técnicos da Secretaria Municipal de Infraestrutura e Meio Ambiente afirmaram que a análise e a aprovação dos projetos arquitetônicos seguem os parâmetros dispostos na Lei Complementar nº 358/1998 e ressaltaram que o ordenamento territorial definido no Plano Diretor Municipal não corresponde àquele especificado anteriormente na Lei de Uso e Ocupação do Solo, o que acarreta prejuízos à política territorial do município (informação verbal). O problema é agravado pelo fato de que o macrozoneamento e o zoneamento estabelecidos no Plano Diretor aparecem sobrepostos no mapa que integra seus anexos, o que compromete a legibilidade dos princípios que deveriam reger o ordenamento territorial do município.

Dentre os prejuízos acarretados pelo descompasso da legislação urbanística apontados pelos técnicos das secretarias de Educação e de Infraestrutura e Meio Ambiente, destaca-se o adensamento da ocupação urbana em desconformidade com a capacidade da infraestrutura urbana e ambiental de Juatuba, além da crescente demanda por serviços públicos – em especial, saúde e educação – que extrapolam o planejamento do executivo municipal.

Segundo os técnicos da Secretaria Municipal de Infraestrutura e Meio Ambiente, ao analisar os projetos de empreendimentos de maior porte, o Conselho Municipal de Meio Ambiente (CODEMA) estabelece algumas condicionantes à sua aprovação, como, por exemplo, a abertura e pavimentação de vias ou mesmo a execução de redes de drenagem (informação verbal). É preciso destacar a fragilidade da atuação do CODEMA e dos benefícios dela provenientes face à regulação urbanística e ambiental. Não existem instrumentos legais que amparem o estabelecimento de condicionantes à aprovação de novos empreendimentos pelo Conselho, ou mesmo que determinem quais são os empreendimentos passíveis de recebê-las. Tais condicionantes são definidas caso a caso, sem critérios orientadores.

De acordo com o proprietário da CONSTRUTORA B, o projeto das 156 unidades residenciais construídas no bairro Cidade Satélite foi aprovado mediante uma condicionante: a execução da infraestrutura da gleba em que seria implantado o empreendimento. Os empreendedores entendem, no entanto, que os serviços básicos de pavimentação de vias e saneamento básico são de competência do poder público municipal (informação verbal).

Desde 1979, quando foi instituída na esfera federal a Lei 6766/79 que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano, é de responsabilidade dos empreendedores a execução de infraestrutura básica. Neste sentido, observa-se em Juatuba o descumprimento histórico desta obrigação, tornado senso comum para “maior conveniência” dos empresários do setor imobiliário. A expansão urbana do município a partir de sucessivos processos de

parcelamento do solo remete às décadas de 1970 e 1980, quando Juatuba ainda era um distrito de Mateus Leme. Conforme informações dos técnicos da Secretaria Municipal de Infraestrutura e Meio Ambiente, 54 dos atuais 58 bairros que integram a área urbana do município já existiam quando o distrito de Juatuba foi emancipado em 1992 (informação verbal). A execução de loteamentos à revelia da legislação federal e sem a devida fiscalização dos gestores municipais contribuiu para a formação de um estoque de lotes desprovidos de infraestrutura básica – que hoje se presta à expansão imobiliária, traduzida na expansão e no adensamento da ocupação urbana.

À luz do Estatuto da Cidade – Lei Federal nº 10.257/2001 – o princípio das funções sociais da propriedade e da cidade estabelece as bases de um novo paradigma jurídico-político no país a respeito do controle e da regulação do uso, da ocupação e do parcelamento do solo. Neste contexto, o desenvolvimento urbano – expresso principalmente na expansão territorial das áreas urbanas e no adensamento das áreas já urbanizadas – deve subordinar-se ao reconhecimento do direito à cidade sustentável, ou seja, à cidade socialmente justa e ambientalmente equilibrada.

Sob este aspecto, a expansão e o adensamento da ocupação urbana verificados em Juatuba não obedecem ao cumprimento da função social da propriedade e da cidade, princípio que conceitualmente rege o Plano Diretor Municipal. Existe aí uma lacuna entre os princípios estabelecidos no plano e a implementação dos instrumentos que deveriam garantir sua materialização, como a falta de definição e detalhamento em torno do ordenamento territorial proposto através do macrozoneamento e do zoneamento municipal, e a desatualização dos parâmetros de uso, ocupação e parcelamento do solo urbano. Além disso, destaca-se o descumprimento das diretrizes referentes ao saneamento básico, dentre as quais figura

“condicionar o adensamento e o assentamento populacional à prévia solução dos problemas de saneamento local” (JUATUBA, 2008, p.20). A ausência de regulamentação específica dos

instrumentos de política urbana arrolados no Estatuto da Cidade e previstos no Plano Diretor Municipal é outro aspecto negativo, pois inviabiliza a aplicação de instrumentos como o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), extremamente importante no licenciamento ambiental e urbanístico de empreendimentos econômicos e residenciais de grande porte. Por fim, o município não possui um órgão de gestão colegiada com atribuições legais que lhe assegurem condição de avaliar e deliberar sobre questões de ordem urbanística no município. Cabe observar que o a atuação do CODEMA, mencionada anteriormente, configura-se apenas como uma medida paliativa. A criação do Conselho Municipal de Políticas Urbanas (COMPUR) está prevista no Plano Diretor Municipal, mas ainda não foi efetuada.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS: A AMPLIAÇÃO DO MERCADO DA MORADIA E A