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O Poder Judiciário brasileiro do século XXI: quem pode explica-lo?

CAPÍTULO III AS CONSEQUÊNCIAS PRÁTICAS DO INTERVENCIONISMO

3.3. O Poder Judiciário brasileiro do século XXI: quem pode explica-lo?

A evolução do Poder Judiciário ao longo de sua existência demonstrou que nem sempre uma teoria jurídica desenvolvida e adotada em um país vai dar certo em todos os outros. Para que se possa compreender o fenômeno do desenvolvimento jurídico de um país, deve-se levar em conta todo o aspecto social e econômico em que aquela sociedade se encontra. O Brasil, por exemplo, importou inúmeras teorias jurídicas e de Estado para tentar justificar sua própria existência, nem sempre fazendo a escolha mais adequada para si.

Inegavelmente que nossa Constituição é bastante social e à frente de seu tempo, se mostrando, na maioria das vezes, contemporânea, suscetível de pequenos ajustes que podem facilmente sanar qualquer necessidade de reparo. Isso se deve à adoção de inúmeros preceitos principiológicos, que permitem que a legislação seja flexível no momento de sua aplicação, para justamente evitar a necessidade de profundas modificações constitucionais, que desestabilizam econômica e politicamente um Estado, mas que também determinam de que forma as regras do jogo devem ser consideradas nos casos concretos, o que não se tem visto no Estado brasileiro atualmente, uma vez que essa abertura hermenêutica é utilizada para permitir a prevalência de certos pontos de vista pessoais de alguns juristas.

Nesse sentido, José Sérgio da Silva Cristóvam, em seu artigo Menos Princípios, mais Regras: a Teoria da Ponderação na Encruzilhada do Decisionismo (2019), também faz uma crítica ao exagero decisionista encontrado nos poderes judicantes dos Estados Democráticos. Para Cristóvam (2019), ao mesmo tempo em que as constituições carregadas de conceitos principiológicos vieram para balizar a normatividade existente, no sentido de garantir um melhor norteamento para a aplicação das regras estatais, acabou se mostrando um verdadeiro complicador para a manutenção da própria Democracia, ao permitir a abrangência da interpretação judicial, em suas decisões.

Cristóvam (2019) afirma também que, no âmbito da principiologia constitucional, o que mais seduziu a classe jurídica para essa nova maneira de agir, de forma inovadora, no que diz

80 respeito à normatividade, foi a teoria da ponderação de princípios, que permitiu um protagonismo maior do Poder Judiciário, com relação aos demais poderes estatais, uma vez que legitimou, através de seu aspecto genérico, a hermenêutica judicial desenfreada, que acabou por se mostrar viciada por moralismos e decisionismos por parte dos aplicadores da lei.

Entretanto, Cristóvam (2019) esclarece que a submissão das soluções jurídicas aos princípios constitucionais não são, por si só, os vilões da Democracia, pelo contrário, se aplicadas de maneira correta, são os maiores garantidores dessa forma de governo, principalmente na realidade brasileira, onde existe uma incompetência generalizada dos demais poderes estatais nessa garantia.

Do ponto de vista de Cristóvam (2019), o que prejudica a defesa do Estado Democrático é a tentativa de subsumir os casos apenas às intepretações partidas dos princípios constitucionais, sem se atentar à existência de normas específicas para alguns fatos, o que torna o Poder Judiciário ativista, ao produzir entendimento normativo completamente novo aos olhos da lei. Nesse sentido, defende Cristóvam (2019) que “Um autêntico Estado constitucional de direito não pode tolerar como legítimo o recorrente apelo a manobras jurídicas de exceção, veiculadoras de moralismos e decisionismos de ocasião quase sempre escamoteados por justificações principiológicas frouxas e até seletivas” (CRISTÓVAM, 2019, p. 999).

Da mesma forma, Cristóvam (2019) aduz que a existência e aplicação dos princípios constitucionais sempre foi alvo de críticas, uma vez que a abrangência hermenêutica que seu próprio paradigma permite poderia acarretar numa incerteza jurídica, a partir da relativização de direitos, prejudicando a noção de legalidade e segurança jurídica. É nesse sentido que Cristóvam (2019) afirma que há uma usurpação desenfreada das funções do Poder Legislativo, por parte do Judiciário, já que as interpretações principiológicas estão cada vez mais subjetivas e moralistas, onde um Poder quer, mais do que impor seu entendimento técnico aos outros e à sociedade, de forma geral, como também se autoafirmar como o Poder mais poderoso e acima de todos. Dessa forma, ressalta Cristóvam (2019):

Com efeito, esse tal “Estado de ponderação” jamais pode ser convertido em um Reino do “tudo depende” ou do “vale tudo hermenêutico”. Não se pode entender como adequada a relativi-zação de conceitos e institutos jurídicos, que fundam as regras e princípios constitutivos da ordem jurídica vigente, abrindo espaços para práticas decisionistas dos poderes constituídos, em especial para a subjetividade da atividade judicial (CRISTÓVAM, 2019, pp. 1000-1001).

Ao citar Ferrajoli, Cristóvam (2019) explica que não se retira a importância da liberdade hermenêutica do Judiciário, tampouco a do próprio Legislativo. A crítica que se faz é com

81 relação ao excesso de decisionismos subjetivos, que são permitidos pela imensa gama de princípios existentes, e mesmo inventados para fundamentar as decisões judiciais, cada vez mais imbuídas de moralismos. Em verdade, Cristóvam (2019) aduz que mesmo a utilização dos princípios está sendo deturpada, pois estes são clamados às sentenças e acórdãos de maneira superficial para tentar legitimar seus fundamentos, sendo dessa forma interpretados a bel prazer, tomando significações diferentes conforme o juiz, a causa, e a finalidade que se pretende com aquela decisão. Nesse sentido, traduz Cristóvam (2019) que “Não que o Judiciário não seja legítimo intérprete da ordem constitucional, mas isso não o autoriza a funcionar como constante e onisciente legislador constituinte positivo” (CRISTÓVAM, 2019, p. 1003).

Ainda, Cristóvam (2019) afirma que uma teoria da ponderação, para se formar num sentido de convalidar os ideais democráticos do Estado, deve sempre se submeter à limites formais e materiais devidamente definidos nas legislações constitucionais e infraconstitucionais. Nesse sentido, de acordo com Cristóvam (2019), deve-se entender que os direitos e interesses a serem defendidos nas demandas levadas ao Poder Judiciário não devem ser olhados como conflitantes, mas sim como convergentes, uma vez que o próprio texto constitucional os defende de maneira equivalente. Para Cristóvam (2019), a problemática se traduz da seguinte forma:

[...] o espaço da mais efetiva aplicação do modelo ponderacionista é aquele que povoa as decisões judiciais de concretização de direitos, a partir da solução de conflitos entre direitos e interesses contrapostos (judicialização das colisões entre interesses públicos, coletivos, sociais, privados, individuais), além do amplo espectro de medidas relacionadas ao controle de constitucionalidade das leis e dos atos normativos em geral. É no palco do debate judicial entre direitos e interesses, em especial se amparados em princípios, que habita a mais preocupante face da ponderação proporcional, albergando tanto a produção legítima e racional da decisão judicial, como também toda sorte de excessos decisionistas e moralismos subjetivos usurpadores da autoridade do sistema normativo (constitucional e infraconstitucional) (CRISTÓVAM, 2019, p. 1006).

Nesta senda, Cristóvam (2019) defende que um sistema de ponderação somente pode existir de forma a não prejudicar o Estado Democrático, lembrando sempre de manter relação com as limitações da ordem constitucional, quando não houver uma norma constitucional imediatamente aplicável, e, na falha desta, através da tentativa de subsunção à legislação infraconstitucional, interpretada nos limites dos princípios constitucionais bem definidos, que sigam os ditames constitucionais, bem como, na inexistência ou ineficácia deste, através da fundamentação judicial, que deve seguir requisitos formais e materiais definidos em lei para efetivamente possuir validade perante a normatividade Estatal.

82 Dessa forma, ao afastar o subjetivismo da realidade das decisões judiciais, consegue-se fazer com que a convivência entre princípios, normas e decisões seja pacífica, considerando os fatores elencados anteriormente verdadeiros limitadores do decisionismo, recolocando em voga a força normativa das regras jurídicas, desvinculadas de moralidades ou aspectos políticos, que hodiernamente, são visíveis na produção de decisões pelo Judiciário.

Sendo assim, Cristóvam (2019) aduz que o Estado brasileiro moderno se encontra assim formatado por uma crise de legitimidade de seus órgãos, uma vez que para o povo, e para as grandes mídias e grupos econômicos, aqueles estão completamente sucumbidos à corrupção e aos interesses privados. Para Cristóvam (2019), tal situação somente pode começar a ser amenizada a partir da retomada da legalidade e de um sistema poderacionista limitado pela supremacia da Constituição e pela defesa dos direitos fundamentais.

Nesse mesmo sentido, a partir de outro ramo jurídico, destaca-se as reflexões de Matheus Felipe de Castro, em seu artigo O Martelo Moro: a “Operação Lava Jato” e o Surgimento dos Juízes Partisans no Brasil (2017), onde o autor critica a atuação do Judiciário na esfera do Direito Penal, no qual nitidamente, e como se verificou no tópico anterior, o órgão jurisdicional atua de maneira subjetivista e interventiva, desencadeando em relativizações de preceitos fundamentais, que acabam por remontar aos tempos dos Estados de Exceção.

Como bem aduz Castro (2017), a esfera penal brasileira tem sofrido profundas alterações em sua forma de existir, contudo não de maneira progressiva, e sim retornando aos antiquados métodos inquisitoriais e punitivistas, que buscam a autolegitimação do Estado como detentor de todo o poder e dominador da sociedade, aspectos estes que passaram a ser reprovados após a Criminologia Crítica dos anos 70 verificarem que se tratava de um modelo fracassado que só gerava mais problemas sociais. Nas palavras de Castro (2017), o direito penal, considerado em sua forma medieval, é:

Um ramo jurídico de profundas raízes religiosas, fundado em maniqueísmos ou binarismos que opõem o lícito ao ilícito, o permitido ao proibido, remontando ao velho esquema medieval do bem e do mal, de Deus e do Demônio, da moral e do pecado, da dignidade e da criminalidade, da culpa e da expiação. Elementos que foram desenhados com acuidade no mais importante tratado de demonologia, direito e processo penal da inquisição católica: o Malleus Maleficarum, ou Martelo das Feiticeiras. Em suma, um padrão comportamental das sociedades cristãs ocidentais reprodutor de uma cultura de medo e repressão que não deveria ser aperfeiçoado, mas, como intuía Radbruch, superado (CASTRO, 2017, pp. 295-296).

Desse modo, Castro (2017) critica o retorno a esses preceitos de Estado de polícia firmados dentro da esfera penal, ainda que de forma velada, com o surgimento de atores

83 jurídicos que defendem uma Teoria dos Direitos Fundamentais completamente voltados a propagar uma ideia de defesa social a todo custo, utilizando o Estado de Direito como ente de convalidação a essa ideologia. Nesse sentido, segundo se depreende da ideia de Castro (2017), o Direito, que deveria ser o garantidor da sociedade contra o poder excessivo do Estado, acaba se tornando o legitimador desse poder, tudo graças aos agentes aplicadores deste Direito, que o utilizam da maneira que acham mais conveniente conforme suas próprias convicções pessoais, seja de cunho político, seja religioso, ou qualquer outro.

Para Castro (2017), o maior problema dessa autonomia exacerbada do Judiciário, dentro da esfera penal, reside no fato de que, mesmo que formalmente, a figura do julgador e do acusador estejam separadas, na prática verifica-se a permissividade do próprio sistema em delegar determinadas produções probatórias ao juiz, de forma a retificar o sentido inquisitorial do sistema penal brasileiro. É levando essas questões em consideração que, de acordo com Castro (2017), “[...] nosso sistema processual penal leva à criação de verdadeiros ‘juízes justiceiros’ que não raras vezes passam a crer firmemente nessa missão de combate ao crime e ao mal social” (CASTRO, 2017, p. 301).

Nesse sentido, defende Castro (2017) que a conjuntura sócio-política atual do Brasil não se explica mais somente com as teorias da judicialização da política e do ativismo judicial, mas sim trata-se de um fenômeno inédito, muito mais complexo que a definição dessas teorias. Para Castro (2017), quem melhor trouxe uma definição do que está ocorrendo no país na atualidade foi Carl Schmitt, ao introduzir o conceito de juízes partisans, que vão além da figura de um juiz combatente, no sentido anteriormente referido como justiceiro, mas sim um verdadeiro partidário, militante de suas ideologias, que foge das regras do jogo para defender aquilo que ele acredita ser o mais adequado para efetivar a persecução contra um inimigo específico, que contrarie aquilo que sua própria moral lhe confira como correto.

Denota-se, portanto, que a atuação hodierna do Judiciário vai além de um ativismo puro e simples. Recorrem nossos magistrados às implicações moralistas e conservadoras de velhas políticas que não mais tinham chances de ocorrer numa Democracia social implantada a partir da Constituição de 1988. Notadamente que o Judiciário deixou-se levar por interesses pessoais, na solução dos conflitos que lhe são submetidos, se postando como um verdadeiro poder soberano do Estado, que nada lhe atinge e nada lhe contém. Talvez o excesso de confiança depositado em sua experiência e conhecimento técnico tenham feito com que o órgão jurisdicionado acreditasse poder fazer aquilo que lhe conviesse no exercício de suas funções, até mesmo passar por cima do ordenamento jurídico para defender aquilo que achavam ser

84 correto, de acordo com suas consciências. O fato é que a jurisdição se tornou um super poder capaz de ditar as regras do jogo sem ele mesmo observá-las, deixando a própria população a mercê de seus caprichos. Contudo, essa posição não poderá ser mantida para sempre, pois uma hora ou outra os erros virão à tona e a conta será cobrada de todos, mais cedo ou mais tarde.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Constata-se do levantamento apresentado que a discussão sobre a tomada de decisões numa sociedade de Direito não é tarefa contemporânea. Desde o nascimento das sociedades se discute de que forma o Estado será organizado, e quem deterá tais prerrogativas. Compreende- se que, nas sociedades modernas, principalmente nas Democráticas, a regência do Estado não compete à uma figura isolada, ou a um conjunto de pessoas apenas, como ocorria antes do fenômeno da constitucionalização. Verifica-se que a evolução das formas de governo procura acompanhar o próprio desenvolvimento das sociedades, que não se satisfazem com modelos governamentais antiquados, e necessitam de renovação política de tempos em tempos.

Para entender essa necessidade de mudança, e como ela se relaciona com a estabilização dos Estados é que se retomou, no primeiro capítulo deste estudo, a formação dos Estados

85 Democráticos com relação à sua abrangência legal, de que modo esses Estados passaram a se organizar após a queda do absolutismo, e qual a influência da teoria desenvolvida por Montesquieu sobre a tripartição dos poderes sobre tal formação.

Depreende-se deste resgate inicial que a teoria da tripartição dos poderes, inicialmente descrita por Locke, desenvolvida por Montesquieu e aprimorada pelas novas formas de Estado, surgiu como uma rota de fuga para as populações que sofriam com as tiranias dos governos despóticos. É na tripartição dos poderes que se vê a possibilidade de controlar e limitar o poder do soberano, uma vez que as funções do Estado de punir, legislar e administrar não estão concentradas na figura de uma única pessoa, ou um único ente.

Entendemos também que a política e o direito estão intimamente conectados, partindo- se do pressuposto de que o primeiro cria o segundo, e se legitima como articulador de normas a partir de sua submissão à própria norma que fabrica. Dessa forma, a política e o próprio direito se mostram como limitadores do poder do governante, principalmente após a passagem do absolutismo para a democracia, e o desenvolvimento desta a partir da constitucionalização do Estado Democrático, que assegurou garantias à sociedade, e que colocou a lei acima de todos, inclusive acima do próprio Estado, restringindo sua atuação, e, portanto, evitando novos despotismos. Essa limitação do Estado e também o advento da representatividade de classes perante o Estado é que justifica o Legislativo como Poder legítimo para atuar diretamente em prol das pessoas que escolhem seus representantes, e, dessa forma, podem controlar e trocar, de tempos em tempos, as figuras que lá reclamam suas necessidades, na formação direta da normatividade que regerá todo a conjuntura estatal.

Contudo, como se tem visto na atuação dos poderes do Estado atualmente, a teoria tripartite não tem sido respeitada, nos moldes definidos por Montesquieu, uma vez que se percebe cada vez mais a usurpação de funções por parte dos poderes entre si, principalmente no que tange ao Judiciário perante o Legislativo.

É inegável que vivemos uma crise institucional, onde os poderes estatais não estão mais bem definidos, e verifica-se uma constante queda de braços entre os poderes para ver quem tem mais poder. Esqueceu-se da harmonia e da independência (ou autonomia) entre os poderes estatais, para a ideal convivência em sociedade. É fato que as comunidades modernas de hoje necessitam de respostas mais contundentes e atuações mais céleres e eficazes por parte do Estado em cumprir sua função de governar e manter sua prosperidade, contudo, essa busca incessante pela satisfação popular tem afetado diretamente os próprios entes estatais.

86 Nota-se que os vários anos de ineficácia dos poderes perante os problemas sociais, e, no caso brasileiro, os constantes desequilíbrios no cenário político fizeram com que a sociedade desacreditasse dos poderes do Estado, o que fez com que estes passassem a buscar novamente sua legitimidade constantemente, demonstrando atuações inovadoras, céleres, rígidas, principalmente por parte do Judiciário, que passou a ser encarado como válvula de escape para a constituição da ética no poder. O que o senso comum não imagina é que o próprio Judiciário não possui em sua plenitude essa ética almejada. Pudemos observar isso no segundo capítulo deste levantamento bibliográfico, onde discutimos o intenso decisionismo praticado pelo Judiciário em sua atuação moderna.

Descobrimos que dentro da separação dos poderes, onde o Legislativo é incumbido de produzir as normas, o Judiciário tem por objetivo aplicar as normas fabricadas por aquele poder aos casos concretos, subsumindo o fático ao abstrato. Contudo, é natural que existam lacunas a serem preenchidas nas leis, uma vez que o Legislativo não possui conhecimento técnico para efetivamente produzir normas. É aqui que entra a função hermenêutica do Judiciário, que deve ser criativo no sentido de sanar essas lacunas, sempre observando o que determina a lei e a principiologia definida na Constituição, não podendo, portanto, essa interpretação ser feita de qualquer modo.

Mesmo o controle de constitucionalidade exige tal criatividade de interpretação, pois deve-se observar o que a legislação e os princípios permitem, para saber se uma nova norma pode existir ou não. E depreendemos do estudo realizado que o controle de constitucionalidade feito pelo Judiciário, principalmente no tocante às Cortes Superiores não contradiz o princípio da separação dos poderes, e se constitui num objetivo fundamental do órgão, na medida em que, pela teoria dos freios e contrapesos, o poder jurisdicionado possui legitimidade para averiguar quando a atuação do Legislativo perpassa os limites legais que ele próprio instituiu.

O real problema que encontramos na atuação do Judiciário não é, portanto, a utilização da hermenêutica avançada na solução de conflitos entre pessoas, ou entre normas. O grande problema é a interferência que os juristas têm sofrido de fatores externos aos Direito e à principiologia constitucional, quais sejam interesses políticos, filosóficos, morais, subjetivos. Deixou-se de julgar demandas pela letra da lei para se fundamentar as razões de decidir naquilo que o jurista acha o mais correto, naquilo que ele acredita dever ser a lei, mesmo que sua crença vá diretamente de encontro com a norma expressa.

As decisões judiciais sucumbiram às influências externas. Os “juízes” populares de redes sociais passaram a influenciar diretamente nas decisões dos juízes oficiais. A mídia

87 passou a ter relevante papel na formação do convencimento dos juristas. A opinião popular sobre o certo e o errado passou a fundamentar as sentenças. Se tudo está dessa forma, até que ponto, então, necessitamos de juízes com altíssimos salários, se a solução dos conflitos pode ser facilmente e gratuitamente debatida nos comentários do Facebook?

Toda a formação filosófica, doutrinária e legal do Direito não possui mais o devido