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II. NOVOS EXPERIMENTOS, NOVAS INCERTEZAS, NOVAS QUESTÕES

6. POR QUE EXISTIMOS?

já dissemos que Louis de Broglie introduziu a tese audaciosa segundo a qual a todo objeto material pode ser atribuída uma onda com um comprimento bem definido. A grandeza desse comprimento de onda é dada pelo assim chamado princípio de de Broglie. Obtém- se o comprimento de onda dividindo a constante de Planck h pelo momentum da partícula (o momentum da partícula é o produto da massa pela velocidade). O comprimento de onda de de Broglie é, portanto, igual à constante de Planck dividida pelo produto da massa pela velocidade de uma determinada partícula. Esse princípio encontrou múltiplas confirmações experimentais. Isso foi bastante discutido em relação aos fulerenos.

Há uma aplicação interessante das ondas de de Broglie em relação à estrutura dos átomos. A questão da estrutura interna dos átomos é um dos capítulos mais fascinantes da física, e essa questão teve papel importante no desenvolvimento da teoria quântica moderna. Primordialmente, o átomo consiste de um núcleo atômico e dos elétrons que circulam ao seu redor. Em uma primeira abordagem, muito ingênua, pode-se comparar isso ao movimento dos planetas em torno do Sol. O núcleo atômico está carregado positivamente, e os elétrons, negativamente. Por meio dessa atração entre carga positiva e negativa, os elétrons são forçados a girar em orbitas em torno do núcleo atômico. No entanto, por investigações experimentais correspondentes, sabe-se já há muito tempo que, em relação aos elétrons, nem todas as orbitas em torno do núcleo são possíveis, mas somente algumas poucas e bem determinadas.

A questão agora é saber como imaginar o aparecimento de orbitas bem-definidas. E aqui que entra a hipótese ondulatória de de Broglie. Imaginemos, bem ingenuamente, um elétron se movendo em uma orbita circular em torno de um núcleo atômico. A esse elétron se pode atribuir uma determinada onda. Ou seja, podemos imaginar uma onda que se move em forma circular e, por assim dizer, se alcança a si mesma por trás. Se essa onda for estável — e átomos são estáveis, então ela não poderá se extinguir a si mesma.

Isto é, a onda, se ela percorreu o circuito uma vez, não pode oscilar em oposição à maneira como começou a oscilar de início. Portanto, é preciso que, após uma orbita fechada — em torno do núcleo atômico —, a onda oscile exatamente no mesmo sentido do começo. Porém, isso não significa senão que a orbita de um elétron em torno de um núcleo atômico só pode ter o comprimento de um múltiplo inteiro do comprimento de onda de de Broglie. Naturalmente o próprio comprimento de onda de de Broglie depende ainda da distância em que o elétron se encontra em relação ao núcleo atômico. Pode-se visualizar isso imaginando que um elétron que se aproxima cada vez mais do núcleo atômico obtém uma velocidade maior e, por isso, um comprimento de onda de de Broglie menor. A rigor, porém, todas essas imagens são apenas recursos mentais.

A determinação exata das orbitas dos elétrons ou, expresso de maneira mais precisa, a determinação do estado dos elétrons em um átomo só é possível em virtude da solução da já mencionada equação de Schrödinger. A equação de Schrödinger fornece uma função de onda para o elétron, de modo que há diversas soluções da equação de Schrödinger, isto é, diversas funções possíveis de onda, correspondendo às diversas orbitas de um elétron em torno do átomo. Essas orbitas foram introduzidas por Niels Bohr como uma imagem ilustrativa. Hoje, elas só podem ser mantidas para elétrons que se encontram relativamente longe do núcleo atômico. Para elétrons na proximidade do núcleo atômico, a situação é um pouco mais complicada. No melhor dos casos, ela pode ser comparada aos estados de vibração do diafragma de um tambor, por exemplo. Os estados

quânticos dos elétrons no átomo próximos do núcleo são estados de vibração semelhantes, desta vez não os estados de uma superfície bidimensional do tambor, mas estados de vibração tridimensionais. Nesse contexto diz-se frequentemente que o elétron estaria “ligado” ao percurso de sua orbita, os estados ligados. No entanto essa descrição é errônea, uma vez que o elétron, dada uma medição, é sempre encontrado em um determinado local. Na realidade, trata-se aqui de ondas de probabilidade, como veremos mais tarde. E esses estados de vibração tridimensionais só descrevem a probabilidade de encontrar o elétron em certos locais, caso seja efetuado um experimento. Não se trata, portanto, de uma vibração representável de maneira realista e de modo algum de orbitas de elétrons.

Um ponto importante, porém, é que por meio dessa imagem é possível uma determinação exata das diversas energias possíveis dos estados dos elétrons no interior do átomo, o que possui consequências imediatamente observáveis, experimentais. Se a luz é emitida do átomo, então isso não é nada mais que a passagem dos estados dos elétrons de uma energia para uma outra energia, ou seja, a passagem entre diversos estados excitados dos elétrons ou entre diversos estados da onda de probabilidade. Essas transições energéticas podem ser determinadas então de maneira muito precisa com a ajuda da equação de Schrödinger. Por sua vez, é possível examinar isso com exatidão por meio de experimentos, medindo-se de maneira exata a luz emitida por uma espécie determinada de átomos. Uma semelhante medição energética de luz não significa senão uma medição de sua cor, isto é, de sua frequência ou de seu comprimento de onda. Essa transição entre diversos estados excitados dos elétrons na emissão simultânea de luz é designada de transição quântica. Essa transição quântica é inteiramente espontânea, isto é, está sujeita às leis de uma probabilidade objetiva, não mais explicável, da mesma maneira que havíamos discutido até aqui. Uma transição quântica, portanto, não é, em oposição à expressão usual na vida cotidiana, algo de grandioso, que leva a uma nova qualidade ou a algo de particularmente interessante e novo, mas, pelo contrário, é algo bem minúsculo, que transcorre de maneira totalmente espontânea e de modo algum pode ser influenciado.

Um outro ponto importante diz respeito à questão de saber por que os elétrons não colapsam no núcleo atômico, já que são atraídos por ele. Qualquer um poderia pensar que eles simplesmente continuam a liberar sua energia. A razão se encontra, em última instância, no princípio de incerteza de Eleisenberg. Pois, para poder colapsar no núcleo atômico, o elétron precisa ser localizado na dimensão do núcleo atômico, isto é, sua incerteza de posição seria muito, muito pequena. Desse modo, ele tem uma grande incerteza de momentum, quer dizer, ele terá, com uma grande probabilidade, também um grande momentum e, por isso, será repelido pelo núcleo atômico.

Um outro ponto importante concerne à diferença de diversos elementos químicos. Trata-se de uma consequência do princípio de exclusão de Pauli, segundo o qual não pode haver dois elétrons que concordem em todas as suas propriedades quânticas. Assim, garantimos que nem todos os elétrons consigam ocupar o nível de energia mais baixo, ou seja, que diversos estados dos elétrons sejam preenchidos, dependendo do elemento químico.

Por fim a física quântica é responsável por existirem, de modo geral, átomos de diversos elementos químicos e que estes sejam estáveis, ou seja, que os elétrons não colapsem no núcleo atômico. Isto é, a química só é possível por meio da física quântica, e só através da química somos possíveis de modo geral, com todos os processos químicos que decorrem em nossos corpos, abstraindo que outras matérias consistem igualmente em átomos e, dessa maneira, são impensáveis sem a física quântica.

No documento A Face Oculta Da Natureza - Anton Zeilinger (páginas 65-67)