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2. Revisão da Literatura

2.1. Políticas de Avaliação

2.1.4. Prestação de Contas

A prestação de contas é, sobretudo, o resultado de um processo interno de recolha e de organização da informação, de discussão de resultados e de avaliação do desempenho orientado para os parceiros e para os cidadãos.

Nos últimos vinte e cinco anos, na opinião de Clímaco (2003), observou-se uma transformação profunda nas relações entre a Administração e os cidadãos, por força das políticas de descentralização, das reformas administrativas do Estado e dos sistemas de informação e comunicação. Esta autora considera que se o conceito de parceria, implica partilha de tarefas e de responsabilidade, o seu exercício implica duas condições básicas, o acesso à informação e à prestação de contas.

Lafond (1998) considera também que, a prestação de contas está associada à avaliação e que esta deve ser feita e divulgada à autoridade de tutela, aos pais e à opinião pública. Na mesma perspectiva encontramos a opinião de Clímaco (2005), que acrescenta que sem prestação de contas, não há responsabilização pelos resultados, nem pelas decisões tomadas. Refere ainda esta autora, que a prestação de contas pode resumir-se à publicação de um relatório anual de actividade, ou de um relatório financeiro, mas a publicitação é apenas a parte visível de um processo complexo. Também para Lucas (2008) os relatórios da avaliação externa das escolas, elaborados pela IGE, constituem um instrumento de prestação de contas e de retroalimentação do próprio sistema.

A prestação de contas, na perspectiva dos vários autores referidos, não corresponde apenas a um acto de gestão e de política de informação, mas antes a uma estratégia de desenvolvimento e de credibilização profissional, fundamental em educação. Este conceito também é referido por Broadfoot (2000) e corresponde à exigência que as diferentes organizações do sector estatal, por via indirecta fazem para prestarem contas do seu desempenho e dos seus resultados, em função do investimento que os cidadãos neles fazem. Este conceito é muitas vezes associado a um termo inglês, accountability que é referido por vários autores, entre os quais, Alaíz et al. (2003), Clímaco (2003; 2005), Rocha (1999) e Santos Guerra (2003b). Este termo para Clímaco (2003), corresponde a uma má tradução do original inglês, que sugere uma noção restrita de apresentação de relatório financeiro. Na verdade, o conceito de “accountable”, na perspectiva desta autora, refere-se àquele “que responde por algo por que foi responsabilizado”(p.122). Assim, “accountability” é o processo pelo qual cada um, ou cada organização, se torna “accountable”, credível por saber o que faz, como faz e porquê. Quanto melhor for a informação, mais credível se tornam os sistemas e a sua

administração e melhor, a sociedade pode exercer o seu direito de controlo sobre a gestão do bem público.

Para Alaíz et al. (2003) a pressão para a prestação de contas é mais forte em contextos marcados por um clima de alguma desconfiança face ao serviço público de educação e essa prestação de contas insere-se, numa filosofia de transparência da acção da escola, face aos poderes públicos que a suportam (o Estado e os cidadãos contribuintes) e aos utilizadores (pais e alunos). Esta perspectiva exige uma análise rigorosa dos resultados obtidos pelos alunos, dos processos desenvolvidos na escola e da utilização que é feita dos recursos. Deste modo os dados recolhidos associam-se ao desempenho e à eficácia da escola e permitem verificar se existe uma correspondência entre o investimento feito (recursos materiais, humanos, financeiros) e o produto (os resultados dos alunos). Na finalidade controlo, incluímos a “prestação de contas (Accountability), a avaliação sumativa e a comparação de instituições (Assessment)” (Rocha, 1999, p.52). Rocha (1999) afirma que a prestação de contas, visa avaliar a relação custo/eficácia, em ordem a justificar política, económica, social e tecnicamente o adequado gasto dos dinheiros públicos feitos por agentes externos ou pela própria escola. Ideias semelhantes podem ser encontradas em Santos Guerra (2003b), quando este refere que é necessário realizar accountability nas instituições, porque o funcionamento das escolas acarreta uma responsabilidade social e diz também que é fundamental prestar contas das suas actuações, à comunidade educativa e aos legítimos representantes dos cidadãos.

Chelimsky e Shadish, referidos por Alaíz et al. (2003), apresentam três perspectivas para a avaliação: a prestação de contas, a produção de conhecimento e o desenvolvimento da escola. Já Bosker e Scheerens (1999) apresentam critérios que presidem à análise da eficácia organizacional e que estão ligados ao input, ao processo e ao output. Considerando os resultados como uma forma de prestação de contas, enquadramos a opinião de Glatter (1999) e de Hutmacher (1999), que consideram que as pressões decorrentes de uma economia internacional competitiva exigem um papel central cada vez mais forte na definição de objectivos e na verificação de resultados.

Relativamente à necessidade de avaliar, Casanova citado por Dias (2005), afirmou que a avaliação era o único processo válido, para certificar a qualidade escolar e refere que a pressão exercida pela sociedade, gera a concorrência entre as escolas, através da

publicitação dos resultados dos alunos e da seriação dos estabelecimentos de ensino em rankings. Hargreaves e Fink (2007) são da opinião que todos os estabelecimentos de ensino deveriam definir as suas próprias metas de melhoria e salienta que “este processo pode ser

integrado nas práticas de auto-avaliação, nos planos de desenvolvimento e nos programas de sucessão adoptados pela escola” (p. 327).

A politização da educação, na opinião de Venâncio e Otero (2003) corresponde à pressão que os indivíduos e as próprias escolas têm que realizar no sentido de prestarem contas, do modo como usam os recursos de que dispõem e dos resultados que alcançam. A avaliação das escolas na perspectiva de Lafond (1998), tornou-se numa exigência com duas leituras, por um lado as escolas são responsáveis pela sua acção e têm a obrigação de apresentar resultados, isto é têm contas a prestar à tutela e à comunidade, sendo confrontadas periodicamente com uma avaliação externa ditada pela autoridade administrativa. Por outro lado, as escolas sendo as unidades de base de um sistema educativo, são o local onde se decide o sucesso das modificações implementadas pelas autoridades nacionais. É importante reconhecer-lhes uma real autonomia de acção, uma capacidade de reflexão, de iniciativa e de inovação e motivá-las para aperfeiçoar o seu funcionamento e os seus resultados pela implementação de um projecto educativo de acordo com as suas características. É necessário aprender a partir das avaliações e todos poderemos aprender, os gestores que determinam a avaliação, os avaliadores e os avaliados. Porém, “só aprenderemos se reflectirmos de forma rigorosa e sem paixões sobre os processos e os resultados” (Santos Guerra, 2003b, p.49).

Em Portugal e após a publicação da Lei nº 31/2002 de 20 de Dezembro, surge o carácter obrigatório da auto-avaliação e como referem vários autores (Clímaco, 2005; Correia, 2008; Santos Guerra, 2003b), a escola foi impelida a aderir a uma cultura de avaliação que lhe permitisse a prestação de contas. Perspectivando o futuro do nosso país, relativamente ao papel das avaliações das nossas escolas e a respectiva prestação de contas, poderemos fazer um paralelismo com o que se tem passado nos Estados Unidos da América. Na opinião de Herman e Haertel (2005), desde 1964 que se pratica neste país a prestação de contas nas suas escolas, “that education should produce measurable results”(p.28) e tal como referem estes autores, as escolas e os distritos americanos estão actualmente a fazer uso pleno de todos os seus dados. Inicialmente houve um grande investimento quer em capital humano e quer ao nível económico,

tendo começado pelo investimento em hardware, software, e "pump-priming" indispensável na introdução dos dados de cada escola. Posteriormente foi feito um investimento no capital humano necessário para o desenvolvimento da avaliação, alfabetização e análise dos dados. Sendo este um projecto a longo prazo, exigiu mudanças consideráveis no seu serviço e sobretudo na educação do pré-serviço.

Actualmente, fazem-se nos EUA avaliações anuais dos alunos dos graus 3-8 e de dois em dois anos estabelecem-se metas por Estado, para o seu desempenho escolar. Pretendem que no ano 2014, todos os seus alunos apresentem competências ao nível da leitura e da matemática. O programa nacional americano “No Child Left Behind” (NCLB) exige que todas as escolas cumpram nos seus Estados, metas anuais de desempenho. As escolas e os distritos que não conseguirem cumprir a sua realização ao longo do tempo, ou seja aquelas cuja prestação de contas não apresentarem os resultados desejados, são sujeitos a planos de melhoria e serão sujeitas a medidas correctivas que poderão levar à sua reestruturação ou a reconstituição para que entrem novamente no bom caminho em relação às metas deste programa. Aos pais dos alunos destas escolas são dadas opções para enviarem os seus filhos para outras escolas especiais ou de serviços suplementares, financiadas pelo seu distrito escolar local. Será que o percurso da educação portuguesa, irá ser idêntico ao americano?

Desde 2006 que os relatórios das avaliações externas das escolas portuguesas, têm sido publicados pela IGE e tal como já se referiu esta é uma das formas de prestação de contas das nossas escolas. Prevê-se que no próximo ano lectivo 2009/2010, a avaliação externa esteja concluída e todas as nossas escolas terão os seus resultados publicados, mas será que a partir desse ano, o papel das avaliações e da prestação de contas, passará a ser uma prática habitual, e conduzirá a planos de melhoria? Ficaremos a aguardar a história de Portugal na área da avaliação das escolas e da sua prestação de contas…