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3. NARRATIVA SOBRE O MÉTODO: POSTURAS E INCLINAÇÕES

4.2 Professora Santilia de Oliveira da Silva

A entrevista com a professora Santilia foi realizada no dia 25 de abril de 2016, em sua casa, na cidade de Dom Pedro/MA. Nosso diálogo com ela teve inicia às 9 horas e 46 minutos da manhã e durou 36 minutos e 9 segundos. Quem nos indicou o nome da professora Santilia foi a professora Adelícia. Quando a questionávamos – em uma conversa informal, que antecedeu a entrevista, sobre quais foram seus professores no período em que estudou no Lago Grande, Adelícia mencionou as professoras Maria e Zuleide Freitas, o professor Damião e a professora Santilia. Quanto a esta última, a professora Adelícia nos informou que morava na cidade de Dom Pedro, mas que não sabia o endereço dela.

A professora Santilia é a mais idosa de nossas colaboradoras, ela mora com uma filha e duas netas. Nosso primeiro contato com a professora foi diferente do contato com todos os professores, foi delicado e tenso. Com seu jeito manso – mas, assustado – ela nos recebeu em sua casa, mas, não nos convidou para entrar. Conversamos, separados por uma grade de ferro que protegia a porta de entrada de sua casa - eu do lado de fora e ela do lado de dentro da casa -, sobre minha pesquisa e sobre a possibilidade de ela colaborar com nosso estudo. No fim de nossa conversa ela pediu que voltássemos outro dia, pois ela estava muito ocupada com os afazeres da casa. Assim o fizemos.

Depois de seis visitas à casa da professora conseguimos realizar a entrevista. Ao longo de nossas visitas à professora, ela sempre nos advertiu que não se lembrava de muita coisa, que sua memória era “muito ruim”. Por essa razão e por razões metodológicas, na antevéspera da entrevista deixamos as fichas-roteiro com ela.

Realizamos a entrevista sob os olhos vigilantes e inquisidores da filha e das netas da professora. Acreditamos que numa tentativa de se sentir um pouco mais segura na hora de entrevista, a professora escreveu em várias folhas de papel sua resposta às perguntas contidas nas fichas-roteiro. Ao longo de uma pequena parte da entrevista a professora se pôs a ler – com dificuldade – as respostas que ela mesma (ou outra pessoa) havia colocado no papel.

Ao fim da entrevista conversamos novamente sobre os procedimentos que a nossa pesquisa seguiria: gravação, transcrição, textualização, conferências do texto editado e cessão de carta para uso desses documentos produzidos.

Segue, abaixo, a narrativa da professora Santilia de Oliveira da Silva.

(...)

Eu me chamo Santilia de Oliveira da Silva, nasci em 23 de outubro de 1952 no município de Valença do Piauí, no estado do Piauí. Moro na cidade de Dom Pedro26, Maranhão. Meus pais eram pobres, mas eram unidos. Minha família era grande, mas aos poucos foi diminuindo. Quando eu tinha 13 anos de idade perdi minha mãe, desse ano em diante começaram as minhas maiores dificuldades. Ao longo da minha juventude eu tive muitas tribulações, fiquei de um lado para outro, de casa em casa e passei por muito sofrimento. Mas, também conseguir realizar muitos sonhos, por exemplo, já na minha adolescência conseguir arrumar um trabalhando e isso foi muito importante para mim. Os outros sonhos que eu tinha demoraram a serem realizados, mas foram realizados.

Meu pai se chama José Rodrigues de Oliveira e minha mãe Maria Rodrigues dos Santos, os dois são piauienses. Eu cheguei aqui no Maranhão com quatro anos de idade, quando chegamos aqui fomos morar no povoado chamado Santana que hoje pertence ao município de São José dos Basílios. Eu só vim morar aqui em Dom Pedro depois de 1980. Eu não me lembro bem em que ano chegamos aqui no Maranhão, só sei que eu tinha uns quatro anos de idade. Depois que eu casei sai da Santana e fui morar em uma fazenda também no município de São José dos Basílios.

Depois que minha mãe morreu meu pai se casou com outra mulher e a gente não se dava bem com ela. Por causa disso, ele me levou para Teresina e me deixou lá, quando ele voltou para o Maranhão já foi morar em Imperatriz com a nova esposa dele – ele acabou morrendo lá mesmo, em Imperatriz. Eu fiquei três anos em Teresina e quando voltei de lá fui morar com meu irmão, lá na Mata Velha, depois fui morar em uma fazenda que era do tio do rapaz que acabou sendo meu marido.

As lembranças que tenho do meu tempo de escola não são boas, eu não gosto nem de falar delas. Minha alfabetização começou por volta do ano de 1957, lá mesmo no povoado Santana. Eu estudava com o objetivo arrumar um emprego para poder sair das casas alheias, mas aí casei e não tive mais como seguir os estudos. Quando eu estudei a gente só via o ABC, a Cartilha e fazia algumas contas; a gente tinha só um professor para todas as matérias, mas o primário era só um professor mesmo, hoje é que cada matéria tem um professor né. Eu comecei minha alfabetização lá na Santana aí quando fui para Teresina eu já estava na 2ª série; lá em Teresina, eu terminei a 2ª série e fiz a 3ª e a 4ª série, depois voltei para o Maranhão e não estudei mais - fiz só até o primário. Eu não consigo lembrar o nome de nenhum dos meus professores daqui do Maranhão, mas lembro que lá na Santana eu estudava pela manhã e em

Teresina erra pela tarde. Eu fui para Teresina em 1965 ou 1966 - não lembro bem -, só sei que eu voltei para o Maranhão em 1969...

Se tinha argumento quando eu estudei? Não, não tinha esse negócio de argumento, palmatória não, mas se tinha eu não me lembro.

As lembranças que tenho do tempo que fui professora são muito boas lembranças. Lembro que quando chegava na sala de aula eu esquecia de todos os meus problemas. Eu comecei a ensinar no ano de 1970, no povoado Lago Grande. Eu não tinha uma formação adequada para ser professora, mas mesmo assim fui ensinar - eu ensinava a alfabetização. Foi um amigo da família chamado Zezinho Fiscal, que chegou com essa proposta para eu ser professora então, como precisava de um emprego, aceitei logo a proposta e gostei. Eu não tinha um planejamento específico para dá aulas, pois, eu ensinava só o básico que era a cartilha e o ABC. No Lago Grande, eu ensinei só seis meses porque o Zeca Doca - que era um representante político de lá -, apoiava a candidatura de um político lá e a gente apoiava outro, aí teve a eleição e o lado dele ganhou e ele mandou tirou a gente - eu e a Zuleide, que não era do lado dele. Depois disso, o Sebastião Paé - que era outro político -, ajeitou para eu ensinasse num povoado chamado Lagoa Bonita, lá eu fiquei ensinei um bom tempo. Aí eu casei e depois que casei fiquei ensinando lá mesmo onde eu morava - em uma fazenda meio isolada. Aí quando foi em 1980 eu vim embora para cá, para Dom Pedro e deixei de ensinar.

Quando eu ensinava não trabalhei com a matemática, pois eu trabalhava era só com a alfabetização e não tinha essa coisa de matemática. Quando eu estava em sala de aula eu ensinava para os meninos, mas também brigava com eles porque menino é danado mesmo né (risos)...

Eu não tive nenhuma formação própria para ser professora, mas depois que eu estava sendo professora eu fazia uns treinamentos, onde a gente aprendi a ensinar melhor; esse treinamento a gente ia fazer lá em Presidente Dutra. Eu não lembro se a gente recebia materiais para dá aula; só lembro que a gente tinha só o quadro, o giz, o ABC e a Cartilha. Na época, não tinha fardas na escola - nem para os professores nem para os alunos -, se tinha merenda eu não lembro, mas, fardas eu lembro que não tinha.

A primeira escola em que eu trabalhei foi lá no Lago Grande; eu não lembro o nome da escola, mas sei que foi lá que eu comecei a ensinar. Depois do Lago grande, eu fui ensinar lá na Lagoa Bonita, mas lá as aulas não era uma escola mesmo, era em uma casa de uma pessoa de lá. No Lago Grande as aulas eram uma escola mesmo já toda construída. Na Lagoa Bonita, eu ficava hospedada na casa de uma pessoa lá e só voltava para minha casa no final de semana. Naquele tempo o professor era muito respeitado e querido por todo mundo.

Quem me chamou para ser professora no Lago Grande foi o Zezinho Fiscal, ele morava no povoado do Olho D’Água que pertence ao município de São José dos Basílios, aliás, naquele tempo ele era do município de Presidente Dutra. O Zezinho foi embora lá do Olho D’Água, acho que ele está morando em Imperatriz, mas nem sei se ele ainda é vivo. Ele me chamou para dá aula aí eu aceitei, mas a gente não assinou nenhum documento foi só um acordo de palavra.

Naquele tempo não tinha evasão escolar, e se tinha eu não lembro. No Lago Grande eu ensinei só uns seis meses, mas na Lagoa Bonita eu ensinei um bom tempo - ensinei até 1977, quando eu casei. Depois que eu casei fiquei ensinando apenas lá na fazenda onde eu fui morar; lá nessa fazenda eu ensinava as crianças pela manhã e os adultos à noite - na época, era o MOBRAL. Nesse tempo, eu não fazia avaliação dos alunos só dava aula mesmo, como era só alfabetização não tinha por que fazer prova; hoje, acho que até no Jardim eles fazer uma prova né, mas naquela época a gente não fazia...

Nesse tempo, eu não tinha nem diários para colocar notas para os alunos. Eu não lembro bem quantos alunos tinha nas minhas turmas, mas lembro que eram muitos alunos. A maioria dos meus alunos tinha uns cinco ou seis anos de idade, aqui na cidade é que as crianças começam a estudar até com três anos né, mas, lá no interior, principalmente naquele tempo, as crianças iam para escola só quando estavam um pouco maiores; mas tudo é diferente hoje né! Eu não sei informar muita coisa sobre a fundação da escola, mas acho que o primeiro nome dele não era esse nome “Escola Hipólito da Costa”. Eu lembro que ela era construída de alvenaria, rebocada e pintada e tinha duas salas de aula. A escola era perto de algumas casas e o Lago Grande era um povoado com muitos moradores, tinha muitas casas lá, mas não tinha água e nem energia. Lembro também que quem dava aulas lá era eu e a Zuleide, que morava lá na Santana também, e se tinha outros professores eu não sei, não lembro. Eu e a Zuleide ensinávamos no mesmo horário - pela manhã -, por isso a gente ia junto para o Lago Grande. Nessa época, eu não lembro se a escola funcionava também à tarde e a noite, mas lembro que a gente fazia desfile para comemorar o sete de setembro (risos); lembro até, que uma vez a gente foi desfilar lá no povoado da Morada Nova27. Eu acho que nesse tempo a escola não tinha diretora ou se tinha eu não me recordo.

Durante esse tempo que dei aula lá no Lago Grande eu ficava hospedada lá mesmo durante a semana e só vinha para minha casa - na Santana-, no sábado. Na Lagoa Bonita, o dono da fazenda que eu morava lá me deu um cavalo, aí no inverno eu ia de cavalo para o colégio e no verão - eu tinha comprado uma bicicleta -, eu ia de bicicleta. Era só uma meia

légua de distância para a escola, mas era longe demais para gente ir e vim todo dia, por isso eu ficava lá a semana toda e volta no final da semana.

Lá no Lago Grande eu ficava hospedada na casa de um homem chamada Enoque - ele é o pai no Nego Vei. Eu ficava lá durante o dia e ia dormir na casa do Divino, por que na casa dele só tinha um quarto ou era dois, aí ele dormia em um quarto com a mulher dele e o filho dormia em outro, aí não tinha onde eu dormir. Por isso, eu ia dormir na casa do Divino. A Zuleide ficava lá mesmo na casa do Divino - durante o dia e a noite. A casa do Divino era grande, mas ele tinha muitos filhos também. A casa tinha um quartão grande e ficava todo mundo dormindo junto nesse quartão. Eu não tinha nenhum parentesco com nenhum deles nem o Enoque e nem o Divino, mas eles me ajudaram muito.

Nesse tempo os meninos e as meninas estudavam juntos, não tinha separação. Na escola não tinha uniforme para os alunos, mas na época dos desfiles os pais compravam a roupa própria para fazer o desfile e essa roupa não era usada na escola.

Pois é assim, eu trabalhei lá no Lago Grande só uns seis meses mesmo aí o Zeca Doca mandou a gente ir embora e a gente foi, era ele que mandava lá mesmo... né!

Muito obrigado a você, espero ter lhe ajudado.

4.3 Professora Adelícia Calisto do Nascimento

Nosso contato com a professora Adelícia se deu através da professora Silza Rocha Mendes. A professora Adelícia tem uma relação muito forte com essa escola: ela foi aluna, zeladora, professora e diretora na escola Hipólito da Costa e, além disso, sempre esteve politicamente engajada nas questões de interesse da comunidade. Ela é uma pessoa muito comunicativa e alegre, estas características a colocam como uma líder naquele povoado.

No dia 21 de abril de 2016 fui à casa da professora a fim de agendar uma entrevista – na nossa cabeça, para o dia seguinte, mas a professora Adelícia estava com uma viagem agendada para esta data e só voltaria ao Lago Grande no dia 25 de abril. Com o seu jeito ativo e alegre a professora sugeriu que a entrevista fosse realizada no dia 07 de maio, pois era um sábado de véspera do dia das mães e ela certamente estaria em casa e com tempo livre. Quando falei do objetivo e intenções de nossa pesquisa a professora ficou empolgada e feliz, pois, segundo ela, contar um pouco da história das pessoas e do povoado Lago Grande era muito importante, era algo que ela mesma pensou/pensa fazer um dia. Assim, ficamos acertados que a entrevista ocorreria mesmo no sábado – dia 07/05/16 – e que na sexta-feira voltaria a casa dela para entrega a ela as fichas-roteiro da entrevista.