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3. Revisão bibliográfica

3.3. Tumores mamários felinos

3.3.6. Prognóstico

As neoplasias mamárias felinas são normalmente associadas a um mau prognóstico, porém diversos estudos referem a existência de uma ampla gama de tempos de sobrevivência entre os felinos afetados (Mills et al., 2014). Um dos grandes desafios que a Oncologia Felina ainda enfrenta relaciona-se com a identificação de fatores de prognóstico que realmente permitam prever o comportamento clínico das neoplasias em cada caso individual ou que, pelo menos, possibilitem estratificar grupos de pacientes com padrões distintos de sobrevivência, consoante a agressividade biológica dos seus tumores (Preziosi et al., 2002; Matos et al., 2012).

A definição de um bom fator de prognóstico é um parâmetro independente, facilmente mensurado através de técnicas reprodutíveis e sensíveis, que expressa normalmente um fenómeno oncobiológico relacionado com o crescimento, invasão e metástase neoplásica, e que serve como preditor da evolução da doença e da sobrevida do paciente, podendo ser também de fundamental importância no planeamento dos protocolos terapêuticos a instituir. Tradicionalmente, os fatores de prognóstico mais significativamente associados com o TLD, TS e, inclusivamente, com a qualidade de vida dos felinos com TM malignos, tanto através de análise univariada como multivariada, são: o tamanho tumoral; a presença de metástases no momento do diagnóstico; o grau de malignidade; a permeação vascular e a extensão da cirurgia (Weijer & Hart, 1983; Lana et al., 2007; Hedlund, 2008; Zappulli et al., 2014). De seguida, será feita uma breve caracterização destes e de outros potenciais fatores de prognóstico, tradicionalmente referidos na literatura:

 Tamanho tumoral: alguns estudos indicam que TMF com diâmetros maiores do que 3 cm (elevado risco de doença metastática e de recidiva), entre 2 a 3 cm e menores do que 2 cm estão associados a TS médios de 4 a 12 meses, 15 a 24 meses e mais do que 3 anos se forem submetidos a cirurgia, respetivamente (MacEwen et al., 1984b; Viste, Myers, Singh & Simko,

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2002; Lana et al., 2007; Sorenmo, 2011a). Assim, quando mais cedo forem diagnosticados e tratados menor será a progressão tumoral e melhor será o prognóstico.

 Presença de metastização: as metástases regionais e sobretudo as distantes reduzem o TS, pelo que implicam um mau prognóstico (MacEwen et al., 1984b; Lana et al., 2007).

 Grau de malignidade: é um fator de prognóstico independente muito consolidado que permite identificar grupos de gatas com elevado risco de desenvolverem doença neoplásica metastática e de morrerem precocemente (Seixas, Palmeira, Pires, Bento & Lopes, 2011; Morris, 2013; Mills et al., 2014). De acordo com Castagnaro et al. (1998a), os felinos com TM de grau I e III (baixa e elevada malignidade) sobrevivem passado um ano da cirurgia em aproximadamente 100% e 0% dos casos, respetivamente.

 Permeação vascular: está associada a tumores de alta agressividade biológica, com mau prognóstico (Seixas, Palmeira, Pires & Lopes, 2007; Seixas et al., 2011; Sorenmo, 2011a; Zappulli et al., 2014).  Extensão da cirurgia: a cirurgia radical (mastectomia bilateral) reduz a percentagem de recidivas e aumenta o TS, comparativamente com a cirurgia conservativa (Weijer, K. & Hart, 1983; Ito et al., 1996; Morris, 2013). Num estudo, os felinos com TM submetidos a mastectomia bilateral sobreviveram 917 dias, a mastectomia regional sobreviveram 428 dias e aqueles que realizaram mastectomias unilaterais sobreviveram 348 dias (Novosad et al., 2006).

 Classificação Histológica: os TMF são quase exclusivamente adenocarcinomas (80% dos casos). Os carcinomas circunscritos ao epitélio do duto (“in situ”) têm um prognóstico razoável, enquanto os invasivos (p.ex. sólidos e sarcomas) têm mau prognóstico, que é ainda pior se revelarem permeação vascular ou linfática (Hedlund, 2008).

 Estadio clínico: está também associado significativamente com o TS dos felinos com TM (Morris, 2013). De acordo com Ito et al. (1996) os gatos com estadio clínico I, II, III e IV apresentam uma sobrevida média de 29, 12.5, 9 e 1 mês, respetivamente.

 Idade: gatos idosos têm um prognóstico mais desfavorável (Misdorp et al., 1999).

 Índice mitótico: um índice mitótico baixo está associado a melhor prognóstico comparativamente a um índice mitótico elevado (TS médio de 22 meses versus 12 meses, respetivamente) (Preziosi et

al., 2002; Hedlund, 2008; Morris, 2013).

 Múltiplos TM: gatos com múltiplos TM, segundo alguns autores, têm sobrevidas mais curtas do que aqueles com um único tumor (Hedlund, 2008).

 Necrose: a presença de necrose está associada a pior prognóstico (Misdorp et al., 1999).

 OVH no momento da mastectomia: em TMF ainda é um fator que gera muitos debates entre os investigadores (Matos et al., 2012).

 Raça: os felinos de Pêlo Curto (Shorthair) parecem ter um melhor prognóstico (Sorenmo, 2011a). Entretanto, nas últimas décadas, tem sido exercido um enorme esforço no sentido de investigar

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potenciais marcadores moleculares que ajudem no estabelecimento de um prognóstico mais assertivo, tanto em Oncologia Humana como em Oncologia Veterinária. Entre os mais conhecidos nos TMF, destacam-se os seguintes:

 AKT: a sua forma ativa p-AKT está associada a uma maior malignidade dos TMF e a menores TLD (Maniscalco et al., 2012).

 Alvo da rapamicina em mamíferos (mTOR): é uma serina-treonina quinase (proteína quinase citoplasmática) envolvida na via PI3K, que regula o crescimento, a proliferação, a motilidade e a sobrevivência celular (Eroles et al., 2012). Maniscalco et al. (2013) detetaram a sobreexpressão deste marcador em 33 dos 58 (56,9%) carcinomas mamários felinos que analisaram. Verificaram uma associação da mesma com os TMF que subexpressavam RE, RP e HER-2 (22/31, p=0,03), que eventualmente estão associados a pior prognóstico.

 Ciclina A: a sua sobreexpressão tem sido detetada em TMF malignos, pelo que poderá ter implicações na avaliação prognóstica destas neoplasias (Murakami et al., 2000a e 2000b). Porém, são necessários estudos que correlacionem esta sobreexpressão com o TS.

 Citoqueratinas (CK): são uma subclasse de filamentos intermediários do citoesqueleto das células epiteliais. Podem ser divididas em dois grupos consoante o seu pH: as do tipo I, ácidas, que incluem as CK 9 a 23; e as do tipo II, básicas, CK 1 a 8. A sua importância reside na especificidade da expressão de CK de acordo com o tipo de células envolvidas. As células luminais epiteliais tendem a expressar as CK 7, 8, 18 e 19 (de baixo peso molecular); enquanto as células mioepiteliais expressam as CK 5, 6, 14 e 17 (de alto peso molecular), além de actina, calponina, vimentina e p63 (Sorenmo, Rasotto, Zappulli & Goldschmidt, 2011b; Zaha, 2014). Peñafiel-Verdu et al. (2012) observaram uma associação significativa entre a expressão de CK 5 e 6 (basais) e a presença de metástases regionais em TMF. M.J. Soares verificou uma correlação entre a malignidade dos TMF e a expressão de CK 5 e 6, pelo que estas parecem estar associadas, nestes tumores, a um pior prognóstico (comunicação pessoal, 3 de abril, 2014).

 Claudina-2: a sua subexpressão nos TMF foi significativamente associada com elevado grau de malignidade (p=0,011) e presença de metastização (p=0,0027) (Flores, Rema, Carvalho, Faustino & Dias Pereira, 2014).

 COX-2: a sua sobreexpressão foi associada, em TMF, a uma imunorreatividade negativa para os RE-α, positiva para os RP e VEGF, bem como a pior prognóstico (Millanta et al., 2006c).

 E-caderina: esta molécula de adesão celular parece encontrar-se subexpressa ou ausente nos TMF malignos e nas respetivas metástases, mas sobreexpressa nos tecidos mamários normais, pelo que a sua avaliação poderá ajudar a definir o prognóstico (Pereira & Gärtner, 2003; Peñafiel-Verdu et al., 2012; Zappulli et al., 2012).

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estruturais e funcionais nucleolares associados a proteínas argirofilicas, que estão envolvidas na transcrição e processamento de RNA ribossomal (Hughes & Dobson, 2012). Um baixo índice de AgNOR está associado a um prognóstico mais favorável do que um elevado índice de AgNOR (TS médio de 22 meses versus 14 meses, respetivamente) (Preziosi et al., 2002).

 Índice de Ki-67: o Ki-67 é uma proteína nuclear expressa nas fases ativas do ciclo celular (G1, S, G2 e especialmente durante a M) (Preziosi et al., 2002). Elevados índices deste marcador de proliferação celular em TMF sugerem um pior prognóstico (Castagnaro et al., 1998b; Pereira, Carvalheira & Gartner, 2004; Lana et al., 2007; Morris et al., 2008; Seixas et al., 2011).

 Índice de antigénio nuclear de proliferação celular (PCNA): este antigénio é uma proteína expressa em todas as fases do ciclo celular (principalmente na fase S), que funciona como co-fator da ADN polimerase delta e está envolvida na reparação do ADN (Hughes & Dobson, 2012). Um índice de PCNA elevado foi associado significativamente com TMF malignos, logo com pior prognóstico (Preziosi, Sarli, Benazzi & Marcato, 1995).

 HER-1: a sua expressão em TM humanos está associada a tumores basais de pior prognóstico (Eroles et al., 2012). Wiese et al. (2013) identificaram imunomarcação deste recetor em 15 dos 24 (62,5%) TMF que analisaram, mas o seu valor prognóstico ainda não é consensual.

 HER-2: nos TM humanos o recetor HER-2 é um importante fator de prognóstico e alvo terapêutico (Slamon et al., 1987; Soares et al., 2013). Em TMF, um estudo de Millanta et al. (2005b) verificou uma correlação da sobreexpressão deste recetor com TS curtos (p=0,02), mas o seu papel no prognóstico em gatos mantem-se controverso (Rasotto et al., 2011).

 MMP-9: um estudo de Akkoc et al. (2012) sugere que a metaloproteinase de matriz-9 (MMP-9) é um importante indicador de prognóstico, na medida em que permite avaliar a capacidade de progressão e de metastização dos TMF.

 P-caderina: também é uma molécula de adesão celular pertencente à família das caderinas (Figueira

et al., 2014). Figueira et al. (2012) detetaram uma imunoexpressão deste biomarcador restrita a células

mioepiteliais de GM normais (n=4), de hiperplasias mamárias (n=12) e de TMF benignos (n=6). No entanto, nos TMF malignos (n=45) verificaram uma imunomarcação epitelial aberrante estatisticamente significativa (p=0,0001), inclusivamente correlacionada com elevado grau de malignidade (p=0,0132), pelo que parece estar associada a pior prognóstico.

 PTEN: tem sido detetada uma elevada ausência de expressão de PTEN em TMF, mas são necessários mais estudos para comprovar a correlação desta subexpressão com um pior prognóstico (Ressel et al., 2009; Maniscalco et al., 2012).

 Recetores hormonais (RE-α e RP): a imunoexpressão destes recetores não é atualmente considerada como um fator de prognóstico definitivo em TMF, apesar da sua subexpressão estar frequentemente associada a neoplasias mais agressivas, estadios avançados e recidivas precoces (Mulas et al., 2000b;

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Millanta et al., 2005a e 2006a).

 RON: o único estudo sobre este recetor em TMF revelou uma sobreexpressão do mesmo em 29,4% dos casos analisados (10/34) e relacionou-o com um fenótipo tumoral agressivo, mas são necessários mais investigações para discernir o seu real valor prognóstico (De Maria et al., 2002).

 STAT3: estudos de Petterino et al. (2006, 2007a e 2007b) referem que a imunoexpressão positiva de STAT3 em TMF está significativamente associada a elevados graus de malignidade, pleomorfismo, atividade mitótica e formação tubular, sugerindo o seu potencial valor prognóstico.  Telomerase: a atividade e a expressão desta enzima foram demonstradas em TMF, mas são necessários mais estudos para confirmar o seu valor prognóstico (Muleya et al., 1998; Uyama et al., 2005; Fusaro et al., 2009).

 TopBP1: a sua expressão em TMF foi correlacionada positivamente com o grau de malignidade, existindo a possibilidade de que mutações no seu gene induzam a sua sobreexpressão e estejam associadas a pior prognóstico (Morris et al., 2008; Giménez et al., 2010).

 TP53: mutações neste gene supressor de tumores conduzem à sobreexpressão de TP53, sendo em princípio significativamente mais frequente nos TMF malignos do que nos benignos (Nakano et al., 2006; Giménez et al., 2010). Ainda assim, a associação desta sobreexpressão com um pior prognóstico nos TMF é atualmente questionável (Hughes & Dobson, 2012).

 VEGF: a elevada expressão deste fator angiogénico está associada a um pior prognóstico em carcinomas mamários felinos (Millanta et al., 2002b, 2006b e 2006c; Islam et al., 2012).