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Demarca-se que, nas décadas de 1970 e 1980, a socie-dade brasileira vivenciou a intensificação dos movimentos populares em defesa dos direitos humanos de crianças e adolescentes. Nesse período, a sociedade civil lutava pela re-democratização do país e contra a ditadura militar instaurada e realizava o processo da Assembleia Nacional Constituinte.

Em 1988, com a promulgação da atual Constituição Federal, consagrou-se a Doutrina da Proteção Integral no Brasil, em seu artigo 227. Em seguida, reafirmou-se esse paradigma com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069, de 1990.

Portanto, é importante compreender que o reconheci-mento de crianças e adolescentes como sujeitos de direitos é uma conquista histórica no Brasil, efetivada no final do século XX, com a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Por isso, para ter políticas públicas asseguradas nessa perspectiva, é preciso um olhar e trabalho

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atentos e resistentes, pois ainda há incompreensão e discri-minações que recaem sobre o público infanto-juvenil como prioridade absoluta, principalmente quando consideramos adolescentes que são acusados do cometimento de algum ato infracional.

No Brasil, a lógica punitivista e criminalizadora, de cunho sobretudo racista, ainda é muito presente nas instituições e em diversos segmentos da sociedade, e esse traço tem se intensificado em consonância com o momento político atual, com maior apelo ao conservadorismo, com seus moralismos e discriminações.

Principais normas internacionais

Em aspectos normativos, podemos perceber que a déca-da de 1990 foi um marco para a construção do entendimento de que crianças e adolescentes precisam de proteção integral para poderem se desenvolver e viver com qualidade de vida.

No bojo dos direitos humanos, o Brasil ratificou o Pacto de San José da Costa Rica em 06 de novembro de 1992, pelo Decreto 678, que, de maneira geral, resguarda e consagra uma gama de direitos humanos, focando na justiça social para todos os países signatários.

O objetivo do Pacto foi consolidar um regime de liberdade pessoal e de justiça social, fundado no respeito dos direitos humanos essenciais; além de reconhecer que esses direitos não são definidos pelo pertencimento nacional e pelas defi-nições de cada Estado, mas por reconhecer os atributos da pessoa humana. Também por isso, esse documento justifica uma proteção internacional.

O Pacto reiterou que, de acordo com a Declaração Uni-versal dos Direitos Humanos, só pode ser realizado o ideal

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do ser humano livre, isento do temor e da miséria, se forem criadas condições que permitam a cada pessoa gozar dos seus direitos econômicos, sociais e culturais, bem como dos seus direitos civis e políticos.

Outro importante documento para assegurar direitos de crianças e adolescentes foi a Declaração dos Direitos da Criança, aprovado pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em novembro de 1959, constituída por dez princípios, os quais garantem:

1º Princípio – Todas as crianças são credoras destes direitos, sem distinção de raça, cor, sexo, língua, religião, condição social ou nacionalidade, quer sua ou de sua família.

2º Princípio – A criança tem o direito de ser compreen-dida e protegida, e devem ter oportunidades para seu desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, de forma sadia e normal e em condições de liberdade e dignidade. As leis devem levar em conta os melhores interesses da criança.

3º Princípio – Toda criança tem direito a um nome e a uma nacionalidade.

4º Princípio – A criança tem direito a crescer e criar-se com saúde, alimentação, habitação, recreação e assis-tência médica adequadas, e à mãe devem ser proporcio-nados cuidados e proteção especiais, incluindo cuidados médicos antes e depois do parto.

5º Princípio – A criança incapacitada física ou mental-mente tem direito à educação e cuidados especiais.

6º Princípio – A criança tem direito ao amor e à compre-ensão e deve crescer, sempre que possível, sob a pro-teção dos pais, num ambiente de afeto e de segurança moral e material para desenvolver a sua personalidade.

A sociedade e as autoridades públicas devem propiciar cuidados especiais às crianças sem família e àquelas

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que carecem de meios adequados de subsistência. É desejável a prestação de ajuda oficial e de outra natureza em prol da manutenção dos filhos de famílias numerosas.

7º Princípio – A criança tem direito à educação, para desenvolver as suas aptidões, sua capacidade para emitir juízo, seus sentimentos e seu senso de respon-sabilidade moral e social. Os melhores interesses da criança serão a diretriz a nortear os responsáveis pela sua educação e orientação; essa responsabilidade cabe, em primeiro lugar, aos pais. A criança terá am-pla oportunidade para brincar e divertir-se, visando os propósitos mesmos da sua educação; a sociedade e as autoridades públicas empenhar-se-ão em promover o gozo desse direito.

8º Princípio – A criança, em quaisquer circunstâncias, deve estar entre os primeiros a receber proteção e socorro.

9º Princípio – A criança gozará proteção contra quais-quer formas de negligência, abandono, crueldade e exploração. Não deve trabalhar quando isso atrapalhar a sua educação, o seu desenvolvimento e a sua saúde mental ou moral.

10 º Princípio – A criança deve ser criada num ambiente de compreensão, de tolerância, de amizade entre os povos, de paz e de fraternidade universal e em plena consciência que seu esforço e aptidão devem ser postos a serviço de seus semelhantes.

Como está pressuposto na Declaração, para garantir o bem-estar das crianças, é necessário atentar para a melhoria na saúde das mães e dos filhos, combater a desnutrição e o analfabetismo, além de a erradicar doenças que dizimam milhares de crianças em todo o mundo.

A Convenção sobre os Direitos da Criança foi adotada pelo Brasil por meio do Decreto 99.710, de 21 de setembro de

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1990, ratificado pelo Congresso Nacional em 14 de setembro de 1990, pelo Decreto Legislativo 28.

No 8º Congresso das Nações Unidas, foram estabeleci-das, por meio da resolução 45/113, de dezembro de 1990, as medidas excepcionais quanto à privação de liberdade do/a adolescente autor/a de ato infracional. O objetivo de tais regras expressava a “preocupação com o fato de mui-tos sistemas não diferenciarem adulmui-tos e jovens nos vários estágios da administração da justiça e com o fato de os/as jovens serem assim detidos em prisões e outros estabeleci-mentos com adultos”.

A partir dessa resolução, foram definidas algumas ques-tões de grande importância para garantir a proteção aos jovens autores de atos infracionais, e foi estabelecido que a privação de liberdade será medida de último recurso e pelo menor espaço de tempo possível e que devem ser as-seguradas proteção e assistência a esses jovens durante e depois do período em questão privados de liberdade.

Outro documento importante para situar a garantia de direitos para adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas1 são as Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinquência Juvenil – Diretrizes De Riad, apresentadas e aprovadas em dezembro de 1990, no 8º Congresso das Nações Unidas. Seus princípios fun-damentais são:

1 O Sistema Socioeducativo reúne vários órgãos e instituições públicas res-ponsáveis por gerir a execução das medidas socioeducativas, que inclui os órgãos do Poder Judiciário: Varas da Infância, Ministério Público e Defensoria Pública. Envolve os governos estatuais, municipais e federal; conselhos tu-telares; Centro de Referência Especializado de Assistência Sociais (CREAS) e outros.

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1) Prevenir a delinquência juvenil como parte essencial da prevenção do delito na sociedade;

2) Propiciar investimentos objetivando o bem-estar das crianças e dos adolescentes.

3) Aplicar medidas políticas e progressistas de preven-ção à delinquência.

4) Desenvolver serviços e programas com base na comunidade para a prevenção da delinquência juvenil.

As Regras Mínimas das Nações Unidas para a Admi-nistração da Justiça e da Juventude – Regras Mínimas De Beijing também se inserem nesse bojo. É importante ressaltar que tal tratado serviu de base para o Estatuto da Criança e Adolescente. Em 1980, no 6º Congresso das Na-ções Unidas sobre Prevenção dos Delitos e Tratamento dos Delinquentes, realizado em Caracas (Venezuela), foram formulados vários princípios básicos que deveriam refletir em um conjunto de regras que colaborassem para a admi-nistração da justiça de adolescentes a fim de proteger os direitos humanos fundamentais dos/as jovens que cometem atos infracionais.

Outro importante elemento normativo foi construído a partir da X Cúpula Ibero-Americana de Chefes de Estado e de Governo – Declaração Do Panamá – “Unidos pela Infância e Adolescência, base da Justiça e da Equidade no Novo Milênio”. Os chefes de Estado e de Governo dos 21 países Ibero-americanos reuniram-se na Cidade do Pana-má, República do PanaPana-má, nos dias 17 e 18 de novembro de 2000 para garantir desenvolvimento humano sustentável, a consolidação democrática, a equidade e a justiça social, com base nos princípios de universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos humanos, considerando de

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importância estratégica dedicar especial atenção à infância e à adolescência.

Principais normas nacionais

No Brasil, a Constituição Federal de 1988 é fundante para legitimação e reconhecimento de crianças e adoles-centes como sujeitos de direitos. Por essa legislação, em seu artigo 227, tem-se a previsão que as pessoas com idade inferior a 18 anos são consideradas inimputáveis. Outra le-gislação importante para a garantia de direitos de crianças e adolescentes é o Estatuto da Criança e do Adolescente, que é o principal instrumento normativo para esse assunto e estabeleceu a Doutrina da Proteção Integral.

Essas mudanças puseram fim à Política Nacional do Bem-Estar do Menor e à doutrina da situação irregular – po-lítica de caráter repressivo, consolidada durante a ditadura militar. Os sistemas de internatos e as políticas direcionadas ao “menor” foram questionados, principalmente pelos mo-vimentos sociais. Outro aspecto importante desse debate foi o reconhecimento das crianças e adolescentes como tal, incluindo o abandono do uso do termo “menor”, que está associado às articulações políticas, de forças policiais, da visão higienista, das associações de caridade e filantropia e da concepção da defesa nacional decorrente do Código de Menores de 1927.

Pode-se afirmar que a categoria “menor” é uma síntese das representações sociais de crianças e adolescentes que incidem sobre as classes marginalizadas, empobrecidas e vulnerabilizadas na história social brasileira. Até o início do século XX, tal categoria era concebida no âmbito jurí-dico para classificar as pessoas que não haviam atingido

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a maioridade. Entretanto, a partir do século XX, com o advento dos Códigos de Menores de 1927 e 1979, “menor”

passou a ter uma característica eminentemente discrimi-natória e estigmatizante contra crianças e adolescentes marginalizados. Nesse sentido, compreende-se que a ca-tegoria “menor” é utilizada como caca-tegoria classificatória de crianças e adolescentes invisibilizados da sociedade (Pinheiro, 2006).

Assim, a garantia do direito à educação de socioedu-candos privados de liberdade é fruto de lutas sociais tra-vadas por movimentos e organizações da sociedade civil que visam à luta para efetivação dos direitos humanos.

Historicamente, as políticas públicas destinadas à in-fância e à adolescência estavam direcionadas ao controle da pobreza, instituídas num contexto social de relações complexas e contraditórias, no âmbito de conflitos, aspectos moralistas e conservadores. Buscou-se, através das políticas legitimadas pelo Estado, o controle social da população po-bre, vista como perigosa, e a manutenção da ordem social vigente (Rizzini, 2009).

A organização popular, os movimentos sociais, organiza-ções não governamentais, grupos religiosos e quadros pro-gressistas desencadearam o processo de reivindicação dos direitos de cidadania para a infância e adolescência. Então, a Constituição Federal de 1988 incorporou ao ordenamento jurídico nacional os princípios fundantes da Doutrina na Proteção Integral (Faleiros, 2009).

Essa doutrina norteou o Estatuto da Criança e do Ado-lescente de 1990, fundamentada no princípio de que toda criança e adolescente são sujeitos de direito e estão sujei-tos a obrigações compatíveis com a peculiar condição de

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pessoa em desenvolvimento (Saraiva, 2013). Dessa forma, o ECA/1990 revogou o Código de Menores de 1979 e a lei de criação da FUNABEM, instituição à época responsável pelo atendimento de crianças e adolescentes.

A Doutrina da Proteção Integral passou a reconhecer a criança e o adolescente como cidadãos, garantindo a efe-tivação de seus direitos com absoluta prioridade (Faleiros, 2009). A CF/1988 incluiu novos direitos sociais: o direito à educação e os direitos da criança e do adolescente, a fim de possibilitar a maior participação daqueles que foram historicamente excluídos. Mesmo que a efetivação desses direitos ainda esteja aquém do esperado, trata-se da prote-ção dos direitos conquistados contra as forças capitalistas e conversadoras (Cury, Horta e Fávero, 2005).

A Constituição Federal de 1988 reservou os artigos 227 e 228 para tratar do dever do Estado e da sociedade para com a infância e a adolescência. A criança e o adolescente foram colocados a salvo de toda forma de negligência, dis-criminação, exploração, violência, crueldade e opressão. A inimputabilidade penal ficou definida até os dezoito anos, e o trabalho, proibido até quatorze anos, salvo em condições de aprendiz.

A partir desse momento, constituiu-se o Sistema de Ga-rantias dos Direitos (SGD)2, seguido da implementação do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), Conselhos Tutelares, das Varas da Criança e

2 Concebido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o SGD re-presenta uma articulação e uma integração de várias instâncias do poder público na aplicação de mecanismos de promoção, defesa e controle para efetivação dos direitos humanos da criança e do adolescente em todos os níveis, desde federal ao municipal. O SGD se materializa com as políticas públicas, realizando o controle social por meio da sociedade civil.

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do Adolescente, das delegacias especializadas, organizações não governamentais, do Executivo e do Legislativo, favore-cendo a realização de fóruns, conferências, leis específicas, entre outros.

O adolescente passou a ser concebido pelo ECA como indivíduo na faixa de 12 a 18 anos e, excepcionalmente, até os 21 anos. Crianças e adolescentes passaram a ser compreen-didas a partir da ideia de uma pessoa em desenvolvimento com significativas mudanças físicas, psíquicas e sociais, que culminarão na maturidade e na organização de seu sistema de valores e crenças, parte de sua subjetividade. De acordo com o ECA, existem medidas socioeducativas que visam à

“responsabilização do sujeito”, pois menores de 18 anos são inimputáveis3, segundo o artigo 23 do Código Penal. Por isso, o ECA também define que, no caso da prática de atos infra-cionais, devem receber uma sanção de caráter educativo e pedagógico, prioritariamente em meio aberto.

Crianças e adolescentes com até 18 anos de idade não são responsabilizados, segundo as normas do Código Penal Brasileiro, mas, sim, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, que dispõe de medidas socioeducativas para a sua responsabilização.

3 O Sistema Socioeducativo é o modelo de responsabilização juvenil no Brasil que deve assegurar a garantia de direitos a inserção de adolescen-tes nas políticas públicas, como na educação, na saúde, na assistência social. A responsabilização, portanto, é uma ferramenta educativa que vai além da lógica punitiva, da prisão e do isolamento. O ECA e o SINASE determinam a responsabilização por meio das medidas socioeducativas (artigo 112 do ECA) e, quando necessário, também medidas protetivas (artigo 101 do ECA), respeitando a “condição peculiar de desenvolvimento”

de adolescentes.

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DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS SÃO MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS1:

I. Advertência: é um aviso, um alerta de que ações do mesmo tipo podem resultar em uma medida socioeducativa mais severa. Não pode ser um sermão, deve ser realizada por escrito.

II. Obrigação de reparar o dano: é aplicada em casos em que o adolescente é chamado a reparar o dano causado à vítima, seja por meios financeiros ou por formas alternativas.

III. Prestação de serviços à comunidade: é a medida que envolve a execução de tarefas de interesse público ou da comunidade, de forma gratuita, tais como ajudar em escolas, hospitais e órgãos públi-cos. Pode ser realizada por, no máximo, seis meses e não pode ser superior a oito horas por semana, para não prejudicar a frequência do adolescente à escola.

IV. Liberdade assistida: é a medida em que uma equi-pe interdisciplinar dos CREAS acompanha, auxilia e orienta o adolescente durante, no mínimo, seis meses, a fim de que se integre melhor à escola, con-tribua nas relações familiares, na profissionalização ou em programas assistenciais, se necessários.

V. Semiliberdade: é quando o adolescente realiza ativi-dades de profissionalização ou ativiativi-dades escolares durante o dia, indo para a unidade somente à noite.

1 Mais informações: <http://cedecaceara.hospedagemdesites.ws/site/wp--content/uploads/2018/12/Cartilha-Adolescentes-em-conflito-com-a-lei.

pdf>.

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VI. Internação: é a medida mais severa. Deve ser aplicada excepcionalmente e somente em casos de atos infracionais cometidos com grave ameaça ou violência. O adolescente não pode ficar mais de três anos na internação e deve ser avaliado a cada seis meses.

Com a legislação vigente, existem normas que re-gulamentam as medidas socioeducativas e as medidas protetivas. Ressalta-se que, em relação à prática do ato infracional, não são aplicadas medidas socioeducativas para as crianças; para estas, são aplicadas as medidas protetivas, pois compreende-se que as crianças estão em condição peculiar de desenvolvimento e que as medidas devem visar à proteção e à garantia de direitos2.

As medidas socioeducativas estão organizadas como:

em meio aberto, em que o adolescente é responsabilizado sem perder sua liberdade; e as medidas em meio fechado, quando o adolescente cumpre a medida nos centros socio-educativos. Estes têm como função atender os adolescen-tes que cometem atos infracionais considerados graves.

Os centros socioeducativos descritos no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) têm uma nor-matização conceitual e jurídica para seu funcionamento e atendimento, visando a uma política articulada e com características específicas, contemplando o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Constituição Federal de 1988.

2 Crianças e adolescentes com até 18 anos de idade não são responsabilizados, segundo as normas do Código Penal Brasileiro, mas, sim, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, que dispõe de medidas socioedu-cativas para a sua responsabilização.

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A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), nos seus princípios e fins, discorre sobre a responsabilidade do Estado quanto à valorização do pluralismo e concepção pedagógica, bem como a valorização e a consideração da liberdade e o apreço à tolerância; por isso, os/as adoles-centes autores de atos infracionais, ao adentrar no sistema socioeducativo, são também sujeitos de garantias e estão incluídos nesses princípios e fins, de tal forma que os pro-cessos formativos integram a competência da sociedade e da família. Compactuando com a LDB, enxergamos as dispo-sições do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que declara que os adolescentes têm direito à educação, focando no pleno desenvolvimento de sua pessoa, para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho.

No que tange à regulamentação e execução das medidas socioeducativas para adolescente que pratique ato infracio-nal, o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE, 2012) é o órgão responsável. Portanto, é responsá-vel pela provisão de vagas para o atendimento às medidas socioeducativas por meio de implementação, ampliação, construção, reforma e equipagem de unidade de atendimen-to socioeducativo (Núcleos de Atendimenatendimen-to Integral – NAI, unidades de internação e unidades de semiliberdade).

O SINASE é uma política pública específica que deve promover a articulação com as outras políticas de saúde, educação, assistência, justiça e segurança pública. Pre-coniza a escolarização do/a adolescente à luz dos direitos humanos, sendo estabelecidas também oportunidades de acesso ao ensino adaptado à realidade e integrados aos pro-gramas multissetoriais. Para uma pedagogia socioeducativa significativa, é importante integrarmos ao debate a reflexão

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do projeto de vida dos jovens, pois a normativa pode até ser obrigatória e dar passos para afirmações de inclusão;

contudo, as questões subjetivas e sistemáticas do trabalho precisam também ser consideradas.

Diante desses elementos normativos, destacamos o direito à educação, principalmente para adolescentes que cumprem medidas socioeducativas. O acesso à educação pública de qualidade é um dos pilares para construção da cidadania plena e garantia dos direitos sociais. De acordo com Lessa (2019), a política de encarceramento em massa tem sido incapaz de promover a reintegração, produzindo, inclusive, o efeito reverso, de aumentar as desigualdades e a falta de oportunidades de adolescentes que cometem atos infracionais.

Diante do exposto, o Conselho Nacional de Educação tem uma Resolução nº 3, de 13 de maio de 2016 em que define as Diretrizes Nacionais para o Atendimento Escolar de Adolescentes e Jovens em Cumprimento de Medidas So-cioeducativas, garantindo o acesso ao processo de ensino e aprendizagem.

Sintetizando, o art. 120 do ECA 1990 prevê a inserção em regime de semiliberdade como medida socioeducativa, que é definida como restritiva (portanto, não privativa) de liberdade.

No cumprimento dessa medida, são obrigatórias a escolari-zação e a profissionaliescolari-zação, e é garantida aos adolescentes a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial. Como transição para o meio aberto, essa medida pode ser aplicada no caso de o adolescente receber progressão da medida de internação em estabelecimento educacional (privativa de liberdade), de forma a retornar gradativamente ao convívio familiar e comunitário.

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