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Capítulo II Enquadramento teórico

2. Avaliação de escolas

3.1. Razões para a avaliação das escolas

Ao pensar abordar o tema da avaliação das escolas imediatamente se nos colocou a necessidade de tentar compreender as razões efectivas que justificam o desenvolvimento deste processo.

Contudo, antes de introduzirmos o tema relativo às razões legais para a avaliação das escolas, iremos recordar o que a lei prevê para a avaliação do sistema educativo. Uma das primeiras respostas, podemos no caso do nosso país, encontrá-la na Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE), consubstanciada pela Lei Nº 46/1986, de 14 de Outubro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 115/1997, de 19 de Setembro e com as alterações e aditamentos introduzidos pela Lei nº 49/2005, de 30 de Agosto, que no seu artigo 52º refere:

1. O sistema educativo deve ser objecto de avaliação continuada, que deve ter em conta os aspectos educativos e pedagógicos, psicológicos e sociológicos, organizacionais, económicos e financeiros e ainda os de natureza político-administrativa e cultural.

2. Esta avaliação incide, em especial, sobre o desenvolvimento, regulamentação e aplicação da presente lei.

Da análise constante nos pontos anteriormente referidos perspectivamos que todo o sistema educativo terá de ser avaliado, onde cabe a avaliação das escolas nos seus aspectos de funcionamento educativo, pedagógico, organizacional e administrativo.

Nesta perspectiva podemos questionar as razões para esta avaliação apesar da inevitabilidade da introdução de processos de avaliação nas organizações escolares. Sendo tão diversificadas as valências dos contextos educacionais, parece-nos evidente que devem ser as escolas com os seus actores internos e externos ponderando, designadamente os fundamentos para estes processos avaliativos que, forçosamente devem definir as bases que sustentem as razões para a dinamização destes procedimentos de avaliação, interna ou externa.

Existem investigadores, como Costa e Ventura (2002) que, no âmbito destes processos de avaliação e na perspectiva de prestarem um serviço ao sistema educativo, encontram as seguintes razões para a avaliação da organização escolar:

 A individualidade de cada escola, enquanto organização identificada com o meio onde está inserida, o que a torna diferente de todas as outras;

 A capacidade de decisão da escola, tendo em conta as suas próprias competências, basicamente na vertente de uma crescente autonomia, através da edificação de um projecto educativo único;

 O aumento significativo da pressão sobre os resultados académicos, da sociedade local e nacional, numa lógica de mercado;

 Os diminutos recursos financeiros e humanos postos à disposição da escola, devido às actuais políticas sociais e ao evidente decréscimo de recursos;

 O incremento de um sistema de informações cada vez mais rigoroso e mais amplo sobre a acção educativa que possibilita o controlo e a regulação do sistema educativo;  A promoção das escolas, através dos processos avaliativos usados como estratégias de

marketing, especialmente com a publicitação dos rankings nacionais dos resultados escolares;

 A identificação de constrangimentos, dificuldades e insucessos, na procura da melhoria e do desenvolvimento organizacional da escola.

Em ciências da educação, a avaliação já não é apenas entendida como uma matéria direccionada para a avaliação dos alunos e das suas aprendizagens, tendo passado a integrar um sentido mais amplo que Rodrigues (1993) reconhece como muito ambicioso, se considerarmos que tudo é avaliado desde alunos a professores, ao ensino e suas estratégias, aos meios e materiais utilizados, aos estabelecimentos de ensino e seus recursos, aos sistemas educativos e políticas de educação. Nesta perspectiva, tudo o que compõe uma organização escolar e o próprio sistema educativo pode ser sujeito a um juízo de valor organizado, formalizado e tecnicamente concretizado. Neste contexto podemos inferir que a avaliação em educação deverá englobar diversos níveis de decisão, distintos aspectos e diferentes elementos.

Tendo em consideração os níveis de decisão poderemos acrescentar a ideia de que tradicionalmente a avaliação das escolas, na opinião de Rocha (1999) passou a ser um meio de controlo técnico e/ou ético-político. Este controlo constitui uma das razões para que o processo de avaliação das escolas tenha sido encarado com alguma desconfiança e, até recusa

por parte dos professores e de outros elementos intervenientes no processo educativo, porque o objectivo principal deste procedimento não passava apenas pelos alunos.

De acordo com Madureira (2004), tal desconfiança deve-se em muito, ao desconhecimento da sua utilidade e também ao facto de muitas vezes, a avaliação ser realizada sem se saber objectivamente o que se espera alcançar, ou seja, o que deve ser na verdade avaliado.

Perspectivando a avaliação das escolas numa vertente mais técnica e considerando que para Lesne (1984) avaliar é um processo que põe em confronto o que se pretende medir ou ajuizar com a norma ou o modelo existente para a situação em apreço, de modo a poder atribuir-lhe um valor ou uma qualidade, isto é, pondo em confronto o referido perante o referente. Para tal, na avaliação das escolas, para organizar o referente deverá ser ponderada a situação ideal do que é pretendido para uma escola de excelência comparando-a com a situação real observada, considerando a diferença entre o ideal e o real, como discrepância, relativamente ao processo em causa.

Complementando esta ideia de referente e referido em avaliação, Figari (1996) apresenta o referente como um elemento externo que se relaciona com o referido. Para este autor, o acto de avaliar consiste numa reflexão sobre a diferença entre o referente (o necessário ou o desejável) e o referido (o que se está a medir).

Considerando a grande diversificação dos conceitos de avaliação e, consequentemente, da avaliação das organizações escolares, Couvaneiro e Reis (2007) observaram que, além de ser um instrumento de medição de alguma coisa, terá de ser também um processo de aprendizagem, que conduza à mudança de práticas, através da sistematização da informação sobre a organização e o funcionamento da instituição escolar, levando à melhoria contínua da escola, pelo seu papel essencialmente formativo.

A avaliação em educação deverá ser contextualizada como um todo, composto por diversas partes, mas nunca como a soma das várias avaliações feitas isoladamente e realizadas segundo compromissos desarticulados. Do mesmo modo, também deverá forçosamente compreender características holísticas e integradoras, evidenciando a escola como o objecto a avaliar e destacando a necessária articulação das várias etapas avaliativas, bem como a sua interligação ao documento que traça as linhas orientadoras e a identidade da escola, o seu Projecto Educativo (Sá, 2009). Neste pressuposto, a avaliação da escola poderá ser contextualizada como um amplo sistema de questões, de ruptura das letargias instaladas e da possibilidade de accionar articuladamente estudos, análises, reflexões e juízos de valor, de

forma a permitir mudanças qualitativas na organização e no seu contexto, perspectivando a melhoria de procedimentos e da interacção social.

Em complemento desta ideia, Afonso (2002) considera a avaliação das organizações escolares quando integrada num sistema amplo de avaliação de alunos, de professores, de sistemas educativos e suas políticas, centralizada politicamente, possuindo uma dimensão ideologicamente simbólica e sendo visível para os actores externos. O mesmo autor identificou ainda três orientações inscritas em diferentes lógicas para a contextualização desta avaliação:

 Conservadora, quando prefere métodos de controlo administrativo-pedagógico, consolidando-se por uma actuação predominantemente autoritária.

 Liberal, se concebida como um instrumento de selecção de lideranças por mérito individual, ou como meio de gestão de valores, de produtividade, de saberes, de crescimento e de prestação de contas.

 Progressista, se posta em prática enquanto meio de desenvolvimento das aprendizagens críticas e reflexivas e da melhoria dos projectos educativos, com a finalidade de delinear linhas de responsabilização partilhadas.

A avaliação das escolas não se dissociará da responsabilização e da transparência exigidas aos dirigentes locais, devendo ser um instrumento essencial para regular e defender o interesse público e as relações interinstitucionais, numa autonomia sustentada em planos de melhoria da organização escolar (Grilo e Machado, 2009).

Mas, analisando o contexto actual do que aparentemente se atribui como objectivos da avaliação das escolas surgem-nos, de acordo com Neto-Mendes (2002) algumas perguntas para as quais podemos considerar apenas ter respostas em aberto:

 As finalidades da escola podem ser questionadas quando nos interrogamos a respeito do papel da avaliação das escolas?

 O “Estado avaliador”, numa perspectiva conservadora, poderá desempenhar o papel de controlo e de regulação, como forma de reforço para a autonomia das escolas?  A qualidade e a eficiência, hoje exigidas pelas políticas educativas, deverão ser

unicamente aferidas pelos exames nacionais e seus resultados?

 Será que o caminho da competição entre escolas, através dos rankings, numa perspectiva mercantilista, poderá ser a resposta do sistema às crises económicas, aos critérios de convergência e à globalização?

 Que métodos e instrumentos de avaliação deverão ser adoptados para a promoção da melhoria das escolas?

 Poderemos conciliar os processos de avaliação externa e interna apesar das suas diferentes vertentes?

 Poderão as actuais políticas educativas, especialmente as que nos apresentam os

rankings das escolas, a gestão de recursos públicos por entidades privadas, entre

outras, revelar-se como um ataque à escola pública, à sua imagem e à validação social?

Apesar de se tratar de questões com respostas ainda em aberto, é uma evidência incontornável que a avaliação das escolas é hoje uma realidade no nosso país, como vem acontecendo um pouco por todo o mundo.

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