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3. ORGULHO E PRECONCEITO

3.1. REDES SOCIAIS

Redes sociais podem ser vistas como grupos de pessoas que compartilham laços (TURKAT, 1980). São essenciais na transmissão de informação, críticas para a troca de bens e serviços, e têm forte impacto na maneira como vivemos (JACKSON, 2008). Cada membro da rede é um ator, representado por um nó em gráficos de rede, e as relações entre eles - suas interações sociais - são laços, representados por linhas (JACKSON, 2008; RECUERO, 2009). Estes são caracterizados por sua força, podendo ser fortes, fracos ou ausentes, dependendo de uma combinação entre tempo, intensidade emocional, intimidade e serviços recíprocos que caracterizam o laço (GRANOVETTER, 1973). Cada um desses fatores, de acordo com o autor, goza de certa independência; porém, seu conjunto está altamente intracorrelacionado.

Granovetter (1973) postula que a análise de processos em redes interpessoais é a melhor ponte entre níveis micro e macro, sendo através dessas redes que interações em pequena escala são traduzidas para padrões em larga escala, como difusão, mobilidade social, organização política e coesão social em geral, que por sua vez retornam a pequenos grupos. Coloca dois fatores diretamente ligados à formação de laços fortes, sendo eles tempo e semelhança. Quanto maior o laço conectando dois indivíduos, maiores as semelhanças entre eles. No entanto, onde laços são fracos tal consistência é psicologicamente menos crucial. Apresenta o conceito de ‘ponte’, rotas pelas quais informação ou influência podem fluir entre contatos diretos de A e de

9 Livro de Jane Austen, publicado em 1813. Mais famosa das histórias de Austen, narra a história de cinco irmãs em busca de casamentos, enquanto discute costumes sociais da época, como a necessidade de casar por amor ou por motivos financeiros. Cabe lembrar que, à época, o casamento era o grande diferencial da mulher em relação a seu futuro financeiro e sua posição social. Escolho esse como título da seção por ambos se tratarem de reflexões sobre relações sociais e escolhas estratégicas.

10 Essa seção foi desenvolvido na disciplina Gestão Estratégica, ministrada pelos professores Dr. Dusan Schreiber e Dr. Serje Schmidt em II/2016. O artigo foi publicado em sua totalidade (SILVEIRA-NUNES et al, 2018, no prelo). Aqui, incluímos versão inicial do estudo, seguindo o princípio de necessidade para compreensão do presente estudo em sua totalidade (SAMUELSON, 1994).

B e, consequentemente, entre qualquer um conectado indiretamente a A e, indiretamente, conectado a B. Assim, de acordo com o autor, pontes assumem papel importante no estudo de difusão, sendo que existem apenas na ausência de laços fortes. Um laço forte pode ser ponte apenas se não existir laço forte entre qualquer dos outros indivíduos envolvidos, o que é raro em redes sociais de qualquer tamanho, apesar de possível em grupos pequenos. Laços fracos, no entanto, não sofrem tais restrições, apesar de não, automaticamente, serem pontes. Granovetter (1973) aponta que o realmente importante é que todas pontes são laços fracos. Coloca ainda que pontes ocorrem raramente em redes de grande escala; porém, a função funciona a nível local.

Discutindo inovação, Granovetter (1973) argumenta que o papel de inovadores, ou first

adopters de inovações, está associado a sujeitos marginais dentro de uma rede, aqueles que não

têm muitos laços fortes dentro desta. Já o próximo grupo, os early adopters, estão mais integrados ao sistema local, tendo papéis centrais - laços fortes - dentro da rede. Porém, estes indivíduos com papéis centrais, devido a seus laços fortes, tendem a formar grupos fechados, ‘cliques’, que impedem a difusão de informação. Assim, o autor coloca que esses inovadores, indivíduos marginais, alheios às cliques, com vários laços fracos com atores de diferentes grupos, estão melhor posicionados para difundir inovação, já que alguns desses laços serão pontes locais e a difusão será espalhada através delas, não confinada a um grupo central. Nos termos do autor, uma rede efetiva seria uma rede densa, formada por laços fortes, e uma rede estendida seria esparsa, formada por laços fracos. O autor conta laços fracos que não agem como pontes como laços fortes, para maximizar separação entre redes densas e esparsas.

Sobre cliques, Jackson (2008) as expressa como subredes de conexão completa que devem conter, no mínimo, três nós. Aponta também que um mesmo nó pode participar de várias cliques ao mesmo tempo. Uma medida de clique pode ser o número e tamanho dela; uma dificuldade com essa medida está no fato de serem extremamente sensíveis a mudanças na rede: a remoção de um laço em uma grande clique pode alterar completamente sua estrutura. Jackson (JACKSON, 2008) pontua como maneira mais comum de mensuração de cliques o clustering, subgrupos nos quais nós, ou atores, em um mesmo subgrupo são ligados por laços positivos, ou fortes, enquanto atores em diferentes clusters não compartilham laços positivos, existindo apenas entre eles laços negativos, ou fracos (WASSERMAN; FAUST, 1994)

Os autores apontam também dois modos de mensuração de variáveis estruturais de redes: redes de um modo, onde todos os atores pertencem a um conjunto, e redes de dois modos, onde os atores estão distribuídos em dois conjuntos. Wasserman e Faust (1994) ainda observam que, apesar de possíveis, estudos em três modos ou mais são raros, dado o grau de complexidade

de tais estruturas. Quanto à categorização de redes sociais, o fazem pela natureza do conjunto de atores e as propriedades dos laços entre eles. Apontam três tipos de redes: 1) rede de um modo, com um único conjunto de atores; 2) rede de dois modos, com dois conjuntos de atores; e 3) rede de dois modos, com um conjunto de atores e um conjunto de eventos. Apontam também a existência de redes egocêntricas e redes diádicas (WASSERMAN; FAUST, 1994).

Sobre redes egocêntricas, Granovetter (1973) aponta a falta de consenso sobre se esta rede deveria ser tratada como composta apenas por aqueles contatos com os quais ego (o nó em função do qual a rede está estruturada) está ligado diretamente, ou se a rede deveria incluir os contatos dos contatos e/ou outros. Análises centradas no encapsulamento de um indivíduo por sua rede tendem a acompanhar a primeira colocação, enquanto análises centradas na manipulação de redes seguem a segunda, já que informações ou favores disponíveis através de contatos diretos podem depender de quem são seus contatos. Quanto a isso, o autor sugere a divisão da rede de ego em duas partes: a) laços fortes e fracos não-ponte, contatos que não apenas conhecem uns aos outros, mas que também têm poucos contatos não ligados a ego; e b) laços fracos formadores de pontes, onde os contatos de ego não estão associados entre si, mas estão associados a indivíduos não ligados a ego.

Granovetter (1973) discute ainda a relação entre interações a nível micro e padrões a nível macro. Argumenta que a análise de processos em redes interpessoais fornece uma ponte frutífera entre níveis micro-macro. Coloca que é através dessas redes que interações a nível micro são traduzidas em padrões em escala macro e que esses, por sua vez, retornam a grupos pequenos. Sua estratégia é de escolher um aspecto limitado de interação em pequena escala - a força de laços interpessoais -, e mostrar como o uso qualitativo de análise de redes sociais pode relacionar esse aspecto a fenômenos em nível macro - mobilidade social, organização política, e coesão social em geral. Tal escolha baliza o argumento de estudos focados em pequenos recortes de campo, cujos processos, em escala micro, podem ser relacionados a processos em escala macro.

O autor ressalta que o modelo de redes interpessoais se presta a ligar grupos em nível micro a outros grupos similares e também a grupos maiores, mais amorfos, o que explica sua ênfase em laços fracos, mais prováveis de ligar membros de diferentes grupos. Granovetter (1973) postula a hipótese de que o desenvolvimento da lógica transitiva está associado ao desenvolvimento cognitivo, e que crianças desenvolvem laços fortes ao longo desse desenvolvimento. A principal colocação do artigo é que “a experiência pessoal dos indivíduos está intimamente ligada a aspectos de estrutura social de grande escala, muito além da competência ou controle de indivíduos particulares” (GRANOVETTER, 1973, p. 1377–8,

tradução nossa). Assim, ligar níveis macro e micro é de suma importância para o desenvolvimento da teoria sociológica.

Tal ligação gera paradoxos em relação a laços fracos, frequentemente vistos como geradores de alienação, mas que aqui são tidos como indispensáveis às oportunidades apresentadas a indivíduos e à sua integração na comunidade. Já laços fortes, responsáveis por coesão local, levam à fragmentação. Afirma que o modelo apresentado é um passo limitado na ligação dos níveis, um fragmento de teoria, e aponta que tratar apenas da força de laços ignora, por exemplo, todos os pontos importantes citados por seus conteúdos.

Wasserman e Faust (1994) destacam a Análise de Redes Sociais como uma perspectiva distinta, que assume a importância de relacionamentos entre unidades interativas. Engloba teorias, modelos e aplicações expressas em termos de conceitos relacionais ou processos, sendo relacionamentos - definidos por laços entre unidades componentes - fundamentais em teorias de redes. Apontam, como princípios responsáveis pela distinção da análise de redes em relação a outras abordagens metodológicas, as seguintes diferenças: a) a visão de atores e suas ações como unidades interdependentes; b) os laços entre atores como canais para transferência ou fluxo de recursos materiais ou imateriais; c) modelos de rede focados em indivíduos que veem a estrutura ambiental de rede como provedora de oportunidades ou restrições à ação individual; e d) modelos de rede que conceituam estruturas - sociais, econômicas, políticas, etc - como padrões duradouros de relações entre atores.

O estudo de Redes Sociais, ou Análise de Redes Sociais, é de interesse de diversas disciplinas, principalmente, mas não limitado a, Sociologia e Comunicação. Através da aproximação metodológica, é possível expressar o ambiente social, como padrões ou regularidades em relacionamentos, como ‘estrutura,’ e suas quantidades de mensuração como ‘variáveis estruturais’ (WASSERMAN; FAUST, 1994). Turkat (1980) aponta como essencial o entendimento de a) como estruturas de redes sociais impactam nosso comportamento; e b) quais estruturas de rede são suscetíveis de emergir em uma sociedade. Também, a Análise de Redes Sociais pode prover insights valiosos para compreensão de processos sociais, políticos e econômicos, que de outra maneira poderiam ser incompreensíveis (GRANOVETTER, 1973; JACKSON, 2008; TURKAT, 1980; WASSERMAN; FAUST, 1994).

Levando em conta os objetivos da pesquisa, e o fato de esses terem suas raízes em estudos de Redes Sociais, acreditamos ser necessária uma compreensão densa dos preceitos básicos de estudos em Redes Sociais. É necessária também clareza no uso dos conceitos, o que procuramos alcançar com a delimitação dos mesmos no presente momento. Seguindo a proposta de Indústria Criativa como mercados em redes sociais colocada por Potts et al. (2008),

tal entendimento se faz ainda mais necessário. Quanto às redes sociais de produção apontadas por Potts et al. (2008), acreditamos tratar-se de redes estratégicas, arranjos propositais a longo prazo entre organizações com fins lucrativos (JARILLO, 1988). Esses são os estudos que abordaremos a seguir.