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INTRODUÇÃO 23 CAPÍTULO 1 QUESTÃO AGRÁRIA, LUTA PELA REFORMA AGRÁRIA E

CAPÍTULO 3. A FORMAÇÃO DA VIA CAMPESINA NO BRASIL E SUAS AÇÕES TERRITORIAIS

1. QUESTÃO AGRÁRIA, LUTA PELA REFORMA AGRÁRIA E MOVIMENTOS SOCIAIS NO CAMPO BRASILEIRO

1.2 O DESAFIO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS DO SÉCULO

1.2.4 Reforma Agrária de Mercado

Borras Junior (2008) destaca que um dos maiores problemas sobre a luta pela terra é a respeito do programa de reforma agrária de mercado. Segundo o autor o programa foi inserido no Brasil em 1997 pelo Projeto Cédula da Terra, tendo em 1996 um programa piloto no Ceará. Este projeto ganhou destaque por defender a ordem vigente da concentração da estrutura fundiária e amenizar a luta pela terra, através da compra da terra, dificultando o acesso para os camponeses. Como bem argumenta Ramos Filho (2014, p.29, grifo do autor), “[...] o capital e o mercado de terras assumem a condição de protagonista na promoção da redistribuição deste bem ao eliminar aqueles ociosos por produtores mais eficientes”. O Banco Mundial é o principal difusor dessa política e assim como outras imposições, como a Revolução Verde, a reforma agrária de mercado avançou em diversos países, principalmente, na América Latina (RAMOS FILHO, 2014).

Para Borras Junior (2008) os movimentos sociais camponeses responderam urgentemente com a criação do Fórum Nacional de Reforma Agrária, que conteve a participação de MST, Contag e Fetraf45. Como resposta, o fórum buscou uma investigação do pacote no Painel de Inspeção do Banco Mundial, contudo, o pedido foi

negado duas vezes e o programa continuou a crescer (BORRAS JUNIOR, 2008). Conforme coloca Borras Junior (2008, p.263, tradução nossa), a reforma agrária de mercado tornou-se a “[...] ameaça mais real aos olhos do MST e outros membros da Via Campesina no Brasil, e ajudando a empurrar uma externalização rápida da questão brasileira no cenário internacional”. Assim, a Via Campesina e outros movimentos camponeses colocam como pauta fundamental discutir a reforma agrária de mercado. Como monstramos na seção anterior, a reforma agrária de mercado foi o que impediu a concretização do II PNRA e tem sido o maior obstaculo da atual luta pela terra.

2. POR UMA REBELDIA MUNDIAL: O PROCESSO DE

CONSTRUÇÃO DA VIA CAMPESINA

La Vía Campesina46 é um movimento internacional que articula 163 movimentos de 73 países e se considera como um “movimento autônomo, pluralista e multicultural, sem nenhuma filiação política, econômica ou de qualquer outro tipo” (VIA CAMPESINA, 2011, não paginado)47.

A composição do movimento é variada e consiste na participação desde cultivadores de arroz na Indonésia, de pequenos produtores familiares no Canadá, de agricultores de subsistência em Moçambique, dos trabalhadores agrícolas em Andaluzia, dos cocaleiros na Bolívia e do sem-terra no Brasil (BORRAS JUNIOR, 2005). Além da Via Campesina ser um dos maiores em quantidade de movimentos ou organizações membros é, também, um dos maiores movimentos por conta de sua diversidade de sujeitos e tipos de camponeses que representa. Pelo quadro 1 podemos visualizar a quantidade de membros da Via Campesina divididos por região.

Divisões Quantidade de movimentos membros

África 1 7 África 2 8 América Central 26 América do Norte 7 América do Sul 40 Ásia meridional 21 Caribe 13 Europa 27

Sudeste Asiático e Ásia oriental 14

Total 163

Quadro 1 – Divisões da Via Campesina e quantidade de movimentos membros Fonte: Via Campesina (2011)

Org.: Leandro Nieves Ribeiro, nov. de 2015.

46 Primeiramente, vale explicar que o nome completo do movimento em questão é La Vía

Campesina. Contudo, conforme explicaremos ainda neste capítulo (no 2.1.2, a expressão Via Campesina é a comumente utilizada. Dessa forma, usaremos nessa pesquisa tanto o nome completo quanto a expressão reduzida.

47 No site oficial da Via Campesina (www.viacampesina.org) é informado a quantidade de 164

movimentos membros de 73 países. Contudo, na lista de membros, do mesmo site, contabilizamos a existência ao todo de 163 movimentos de 73 países.

Figura 1 – Representação mundial da Via Campesina e sua respectiva divisão Fonte: Via Campesina (2011).

Org.: Leandro Nieves Ribeiro. novembro de 2015.

Vale destacar a relevância da América do Sul que sozinha corresponde a 25% dos membros oficiais da Via Campesina, com 40 membros. Na lista oficial da Via Campesina, o Brasil é representado por 7 membros, a saber: Coordenação Nacional das comunidades quilombolas (Conaq), Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) e a Pastoral da Juventude Rural (PJR). Contudo, conforme demonstraremos ao longo do texto, outras organizações brasileiras são consideradas como membros da Via Campesina, tais como a CPT e a FEAB48.

O objetivo da La Via Campesina é estabelecer uma articulação, comunicação e uma coordenação de atividades em comum em escala mundial e regional. Dessa forma, esse movimento internacional, articulador de outros movimentos camponeses, é sem dúvida, considerado como um processo novo e surpreendente nos levando a questionar as condições históricas que culminaram na organização e na forma de organização (VIEIRA, 2011; DESMARAIS, 2013).

Para demonstrar o quanto novo e diferente é a organização e proposta da Via Campesina traremos a seguir as características desta articulação. Partiremos primeiramente do processo de formação da Via Campesina Internacional quando se acordou em criar um movimento que representasse a escala internacional os camponeses. Em segundo lugar o foco será sobre a organização do movimento em escala mundial, destacando a organicidade e o calendário permanente de lutas do movimento. No terceiro, apresentaremos o projeto contra-hegemônico da Via Campesina, como a proposta da soberania alimentar que se contrapõem com a proposta de segurança alimentar e propõem uma mudança no sistema de produção alimentar. Além desta, apresentaremos os outros temas centrais defendidos pelo

48 Pelos nossos estudos percebemos que a Via Campesina no Brasil tem a aliança com outros

movimentos sociais e organizações, podendo ter uma dimensão maior do que do esperado nesse trabalho.

movimento, a saber: reforma agrária, recursos naturais e genéticos, biodiversidade, gênero, direitos humanos, migração e trabalhadores rurais, agricultura camponesa sustentável e êxodos de jovens no campo.

2.1 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA FORMAÇÃO DA VIA