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5 – A subordinação como elemento necessário à afirmação de direitos sociais nas

No documento Uma releitura da subordinação (páginas 53-59)

Vimos como o trabalho é subordinado ao capital, bem como o papel que essa subordinação exerce no plano da gerência da força de trabalho. Além disso, encaramos também o viés jurídico de tal subordinação como elemento fundamental da relação de

55 SUSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas; TEIXEIRA, Lima. Instituições de

direito do trabalho. 22ª ed. Vol. 1. São Paulo: LTr, 2005. p. 246

emprego. Vamos, agora, dissecar o conceito da subordinação jurídica, inserindo-a no plano social de sua configuração prática.

Otávio Pinto e Silva57, analisando a evolução do conceito de subordinação,

identifica os critérios usados pela doutrina para conceituar esse elemento definidor da relação de emprego. Seriam eles: subordinação jurídica, dependência econômica, dependência técnica e dependência social. Para melhor compreendermos o conceito jurídico de subordinação, é importante atentarmos para cada uma destes sub-elementos que compõem o conceito acabado. Ainda que se tenha encarado a dependência do trabalhador face o empregador apenas sob o critério da subordinação jurídica, podemos dizer que os demais elementos da dependência são componentes da subordinação, à medida que na evolução histórica deixaram sua marca na definição do conceito. Assim, é de rigor analisá-los.

A dependência econômica é a posição do trabalhador, que depende do emprego que lhe é ofertado para sobreviver, perante o empregador. Délio Maranhão58, explica que tal

critério nem sempre é válido, na medida em que pode existir dependência econômica entre pessoas jurídicas – como é o caso do grupo de empresas de que trata o artigo 2º, § 2º da CLT – e nem por isso estará caracterizada a relação de emprego entre essas empresas,. Além disso, relata o autor, seria absurdo descaracterizar o vínculo empregatício de um trabalhador que consegue uma fonte de renda que o faça não depender mais exclusivamente do empregador para a sua subsistência, ou mesmo que seja independente em relação a esse, utilizando seu salário como fonte de renda complementar.

Tais ponderações estão corretas no âmbito específico proposto por Maranhão. É importante, todavia, que se faça uma reflexão sobre a real dimensão da dependência econômica do empregado perante o empregador. Dependência econômica não é, única e exclusivamente, a posição na qual fica alguém que precisa da remuneração paga por outrem para sobreviver. Está também, por exemplo, em condição de dependência econômica alguém que, em um processo de negociação, não tem poder de barganha suficiente para fazer jus a determinadas imposições.

57 SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, Autonomia e Parassubordinação nas Relações de Trabalho. São Paulo: LTr, 2004.

Parece claro que um trabalhador fique em situação de dependência econômica em relação ao tomador de seus serviços quando fornece sua mão-de-obra. Isso porque este empregador poderá dispor da força de trabalho da forma que quiser esegundo seus interesses, realizando uma atividade econômica que muitas vezes o trabalhadorsequer sabe qual é. E se, por ora, isso não basta para a total redefinição do conceito de subordinação já demonstra um possível viés a ser adotado.

Outra faceta da análise subjetivista da expressão dependência se dá pela dependência técnica. Está em dependência técnica de alguém aquele que não possui os meios adequados para organizar sua prestação de serviços. Em outras palavras, aquele que está sob a direção técnica de outro, que lhe dita à forma como os serviços devem ser prestados. Vimos no tópico anterior que um dos princípios da gerência científica, tal qual a proposta por Taylor, é justamente manter o trabalhador nessa condição. Mais do que não ter condições de organizar sua prestação de serviços, simplesmente tal possibilidade lhe é negada pela gerência.

Outro elemento citado é o da dependência social, que seria a conjugação dos elementos jurídicos e econômicos da subordinação. Muitos problemas podem ser levantados em relação a esse critério de classificação da dependência. Devemos, então, refletir, sobre a posição do empregado, tendo em vista a figura do empregador, em uma estrutura de produção de uma dada empresa. A sujeição do trabalhador ao capitalista já foi muito abordada em nosso estudo. Ainda que não possamos falar em dependência social no sentido estritamente jurídico da relação de emprego, é certo que a posição socialmente inferior de um perante o outro perpassa toda a relação entre os dois.

Délio Maranhão explica de forma bem lúcida o raciocínio jurídico que levou à caracterização da subordinação do empregado perante o empregador. Explica o autor que:

“o empregador, que exerce um empreendimento econômico, reúne, em sua empresa, os diversos fatores de produção (...). Desses fatores, o principal é o trabalho. Assumindo o empregador, como proprietário da empresa, os riscos de empreendimento, claro está que lhe é de ser reconhecido o direito de dispor daqueles fatores, cuja reunião forma uma unidade técnica de produção. Ora, sendo o trabalho, ou melhor, a força de trabalho, indissoluvelmente ligada à sua fonte, que é a própria pessoa do trabalhador, daí decorre, logicamente, a situação

subordinada que este terá de ficar relativamente a quem pode dispor de seu trabalho”59.

É possível distinguir vários dos elementos subjetivos da dependência entre os elementos descritos pelo referido autor como justificantes da subordinação do empregado perante o empregador. Quando se diz que o empregador reúne todos os fatores de produção, essa expressão carrega um enorme caráter econômico que, ainda que não tenha o condão de produzir dependência, também não pode ser afastado da análise da relação de emprego. Além disso, a caracterização do empregador como alguém que dispõe da força de trabalho da melhor forma possível para organizar uma unidade e produção também guarda estreita relação com a subjetividade da expressão “dependência técnica”. E, finalmente, na afirmação de que o empregador pode dispor da força de trabalho do empregado – que obviamente está indissoluvelmente ligada à pessoa do trabalhador – temos um profundo elemento social. Não se pretende, enfim, justificar única e exclusivamente o uso dos conceitos de dependência no bojo da caracterização da subordinação, nem tampouco afirmar, de pronto, a sua imprescindibilidade quando da conceituação do fenômeno jurídico que é a subordinação na relação de emprego.

Percebe-se, assim, que a subordinação jurídica é um elemento que – além de ser essencial e multifacetado – transcende as discussões doutrinárias sobre sua caracterização, podendo assumir as mais diversas formas de dependência e sujeição do empregado ao empregador, sendo fundamental para o direito do trabalho como elemento definidor da relação de emprego.

Sendo o empregado um trabalhador subordinado, ele estará sujeito ao poder de direção do empregador. Dessa forma, com a existência de vínculo empregatício inevitavelmente irá existir o poder de direção subordinando a prestação de serviços do empregado.

Assim, temos que o empregador organiza o trabalho do empregado; fiscaliza-o para garantir que está sendo cumprido a contento; e, em caso de infrações mais graves, pode puni-lo com sanções disciplinares. É evidente, dessa forma, que – pelo menos no âmbito privado da empresa – a subordinação do empregado ultrapassa os limites do fenômeno

jurídico.

Godinho utiliza uma definição de subordinação que, além de muito correta, pode nos auxiliar de maneira decisiva na constatação do que propomos com este tópico. Para ele:

“a subordinação corresponde ao pólo antitético e combinado do poder de direção existente no contexto da relação de emprego. Consiste, assim, na situação jurídica derivada do contrato de trabalho, pela qual o empregado comprometer- se-ia a acolher o poder de direção empresarial no modo de realização de sua prestação de serviços”60

Assim, havendo poder de direção e atuação da gerência científica na organização do trabalho e da produção, haverá relação de emprego trabalho subordinado. E havendo relação de emprego e trabalho subordinado, é necessária a intervenção do Estado, através da tutela estabelecida pelo direito do trabalho.

IV – A INTENSIFICAÇÃO DA EXPLORAÇÃO

Pretende-se, no presente capítulo analisar as maneiras através das quais as novas formas de gerência e organização do trabalho interferem na forma de exploração do trabalho. Afirmamos anteriormente a inerência da exploração do trabalho para o capitalismo, e agora aprofundaremos nosso estudo com a caracterização da exploração no contexto atual da forma de organização do trabalho.

Precarização, “trabalho flexível”, e subcontratação de trabalhadores. Ao enfrentar esses dilemas do direito do trabalho, devemos sempre buscar a solução que mais se aproxime da efetivação máxima dos direitos sociais. Neste contexto, a conceituação do elemento subordinação é de fundamental importância. Como elemento definidor da relação de emprego – e, consequentemente, da hipótese de incidência clássica do direito do trabalho, com toda a criação de direitos subjetivos e responsabilidades que ele enseja – é sobre a subordinação que recaem todas as espécie de mutações e deformidades a fim de descaracterizar o trabalho subordinado típico.

Das diversas formas de descaracterização do empregado típico, ganha mais espaço a que elimina a subordinação. Assim é que é cediço, tanto na doutrina quanto na jurisprudência, que qualquer fraude contra os direitos dos trabalhadores não se sustenta caso reste caracterizada a presença da subordinação. Percebe-se, assim, que não havendo subordinação, praticamente não há direito do trabalho. A questão, todavia, é mais complexa. Isso porque, conforme já fora dito, o trabalho subordinado se justifica na medida em que submete a prestação de serviços ao poder de organização, fiscalização, controle, enfim, ao poder de direção do empregador, o modo como ele dirige os fatores de produção que tem à sua disposição, no sentido de melhor realizar sua atividade econômica, em proveito de si ou de sua empresa. Acabar com o trabalho subordinado praticamente implica acabar com o poder que o dono dos meios de produção tem sobre tais meios, ou sobre o principal fator que transforma esses meios em produção, qual seja, o trabalho humano.

Percebe-se, portanto, que ainda que a forma de organização do trabalho e da produção tenha mudado, não dá para “apagar” todo e qualquer traço da subordinação nas

relações de trabalho típicas. Assim, parece-nos praticamente inata às relações de compra e venda de mão de obra, das relações de exploração da força de trabalho humana, a existência de dependência ou subordinação do empregado para com o empregador.

No documento Uma releitura da subordinação (páginas 53-59)