• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO I: O CURRÍCULO

1.3 Teorias curriculares

1.3.2. Teoria Prática

A década de 1960 foi rica em movimentos sociais: independências, sobretudo, dos países africanos, protestos estudantis na França, protestos contra a guerra no Vietname. Foi nessa altura que surgem teorizações que começam a pôr em xeque o pensamento e estrutura da visão técnica tradicional. Nessa fase, as fontes são provenientes da Grã-Bretanha, inseridas na chamada nova sociologia de educação, movimento identificado com o sociólogo Michael Young e nos EUA inserido no movimento de reconceptualização do currículo, (Fernandes, 2011).

A nova sociologia integra-se por causa das transformações do campo institucional e intelectual da sociologia da educação que fizeram crescer o interesse pelos processos organizacionais e pelas interações sociais que se desenrolam no contexto dos estabelecimentos escolares e das salas de aulas e gerar reflexão sobre os conteúdos e estrutura do currículo, num contexto de mudanças socioculturais, (Young, 2010).

Sacristán (1998,p.19) acrescenta que essa teoria centrou-se em “analisar como as funções de seleção e de organização social da escola, que assentam no currículo, se realizam através das condições nas quais o seu desenvolvimento ocorre”.

Neste sentido, Bernstein (1980,p.47) defende que “as formas através das quais a sociedade seleciona, classifica, distribui, transmite e avalia o conhecimento educativo considerado público refletem a distribuição do poder e dos princípios de controlo social”.

Kemmis (1988) defende que a educação é uma empresa prática, tais problemas serão sempre práticos, portanto, não ficam resolvidos com a descoberta de um novo saber. Nesta teoria a ação de relevo é colocada nos professores, configurando os como investigadores da sua prática.

Para Stenhouse (1981) tratou-se de uma atitude de inserção nos contextos sociais e de imersão nos problemas que permitiram encontrar soluções para esses mesmos problemas, superando a dicotomia teórico-prática, pois na visão desse autor o objetivo do currículo é melhorar as escolas através da melhoria do ensino e aprendizagem, assim que as ideias devem ajustar-se à disciplina da prática e que a prática deverá fundamentar-se nas ideias. Por sua vez, o autor reconhece ser

44

bastante difícil na medida em que nunca as nossas realidades estão de acordo com as nossas intenções educacionais.

Na visão de Moreira (2003,p.53) “o olhar dos professores e os saberes de que são portadores são cruciais para a construção de novas visões sobre a educação e o currículo, que rompam com uma conceção positivista de produção do conhecimento que vê a pratica como aplicação da teoria”.

Goodson (1995, p.67) considera que a voz dos professores deve ser ouvida em voz alta em colaboração com os investigadores da academia. Nesse processo, é preciso dar incidência inicial e predominante o exercício profissional do professor17, no sentido de promover a colaboração num trabalho coletivo. Mais do que observar as práticas do professor, será dar-lhe voz, escutar acima de tudo a pessoa. É neste contexto que o autor teve o método autobiográfico que é de extrema relevância nas narrativas dos professores.

De modo geral, a teoria prática caracteriza-se por um discurso humanista, uma organização liberal e uma prática racional, ela está ligada as discussões curriculares da década de 1970, quando os empiristas consideram currículo não só uma prática resultante da relação entre especialistas curriculares e professores, mas também das condições reais dessa mesma prática.

Pacheco (1996), parte de 4 elementos que propõe na definição de um currículo: alunos, professores, meios e conteúdos. Mais do que centrar o debate no meio dos teóricos, este autor coloca-o para o lado da prática e justifica se considerando ser necessário um estudo empírico das situações e reações da sala de aulas. Por isso, ele considera que os problemas curriculares não são suscetíveis de solução teórica, mas de soluções práticas.

Na linha da abordagem de Pacheco, Sacristán (1998,p.37) refere que “as teorias curriculares são mediadores entre o pensamento e ação dos professores. Assim, quer os professores, quer os alunos são destinatários do currículo. Portanto, os sujeitos que intervêm no currículo para além de serem transformados, também transformam o projeto cultural que configura o currículo”.

17O ponto forte de Stenhouse (1981) é a centralidade que coloca no professor e no desenvolvimento dos conceitos de professor como investigador e de profissionalidade como desenvolvimento continuado, indicando o empenhamento e o questionamento sobre a sua acção.

45

Para a teoria prática18 o currículo é um processo, enquanto processo, define-se como uma

proposta que pode ser interpretada pelos professores19 de diferentes modos e aplicada em

contextos diferentes. Assim, os professores e alunos devem ser considerados sujeitos e não objetos.

O pensamento destes autores está associado à perspetiva conceptualista do currículo, contra o movimento tradicionalista e que postula respostas curriculares não uniformes e enquadrada por princípios de emancipação, reflexividade, cidadania participativa, responsabilidade e desenvolvimento global dos estudantes. Esses processos, deixam os professores um papel de grande centralidade na organização e desenvolvimento de processos de ensino-aprendizagem orientados para desenvolver sujeitos críticos.

1.3.2.1 Crítica à teoria prática

Zeichner (1993) chama atenção para o carácter micro e individualizado dos processos de ensinar, considerando que pode reduzir o sentido de reflexividade a uma visão meramente prática, por não ter em conta aspetos sociais, culturais, económicos e políticos que influenciam diretamente o trabalho da sala de aula. Por isso, os professores podem não estar em condições de alterar as condições estruturais do seu trabalho.

Giroux (1990,p.35), associando-se aos críticos defende que “os professores e outros agentes podem desempenhar a tarefa de intelectuais transformativos, promotores de uma pedagogia contra-hegemónica, na qual para além das competências requeridas no ensino também educam os alunos para uma ação transformadora”. Na sua opinião é possível existir ao nível das escolas e do currículo mediações e ações de resistência que podem ser acionados contra os desígnios de controlo e de por instalado.

18 Fernandes (2011) sustenta que para a teoria curricular prática, o foco da atenção é a ação real, os processos de ensino-aprendizagem e o modo como os saberes são ensinados. Neste sentido, a ação de relevo é colocada nos professores, configurando os como investigadores da sua pratica.

19Stenhouse (1981) coloca a centralidade no professor e no desenvolvimento dos conceitos de professor como

46