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2. ANÁLISE DA IMPLEMENTAÇÃO DA PROPOSTA CURRICULAR DE

2.1 Uma abordagem sobre a definição de currículo no contexto da educação

Nesta seção, discorreremos sobre a definição de currículo e sobre o currículo no âmbito da educação infantil. Um entendimento acerca dessas questões faz-se de extrema importância, tendo em vista que a pesquisa tem como enfoque a implementação da Proposta Curricular para a educação infantil na rede municipal de Juiz de Fora, mais especificamente na Escola Municipal Elisa Amaral, entre o ano de 2013 e o primeiro semestre de 2014.

A palavra currículo tem origem no latim, curriculum, cujo significado é pista de correr ou ato de correr. Gama Kury (2001), no Dicionário da Língua Portuguesa, define currículo como sendo curso, disciplinas de um curso escolar ou conjuntos de matérias de um curso. Já para Amaral (2007), em seu artigo intitulado Noções de Currículo: modalidade e níveis, a compreensão sobre currículo no contexto escolar se traduz em um caminho a ser percorrido e cumprido pelo estudante. Vale ressaltar que esse percurso a ser feito é determinado pela escola.

Ainda conforme Amaral (2007), diferentes significados e ênfases são destinados ao currículo ao longo dos tempos. Desse modo, há autores que fazem uma abordagem de currículo como o “[...] conjunto de conhecimentos que os professores elegeram como aqueles desejáveis de serem apreendidos pelas novas gerações” (AMARAL, 2007, p.02). A autora também aponta que nos dias atuais, admite-se a concepção de que cada estudante constrói, no decorrer de sua trajetória escolar, o seu próprio currículo, o qual resulta da experiência de suas vivências pessoais e socioculturais somadas as que são promovidas pelo contexto escolar.

Já Moreira e Candau (2008, p. 86) conceituam currículo “[...] como as experiências escolares que se desdobram em torno do conhecimento, em meio às relações sociais, e que contribuem para a construção de identidades de nossos estudantes”. Assim sendo, currículo se associa ao conjunto de proposições pedagógicas empreendidas com intencionalidade educativa. Frente a essa perspectiva, fica evidente que diferentes nuances, atribuições e finalidades são atribuídas ao currículo. Entretanto, dentre os conceitos apresentados, todos se distanciam da ideia de currículo apenas como um rol de disciplinas ou como listagem de conteúdos a serem abordados em um determinado período letivo.

Nos últimos anos, o trabalho com o currículo vem sendo alvo das políticas públicas educacionais brasileiras, não só no âmbito das secretarias e órgãos de educação, mas também para os profissionais que atuam nos vários níveis de ensino, no sentido de terem um direcionamento acerca de priorizar o que ensinar, qual a finalidade de ensinar, como ensinar e para quem se destina o ensino. Vários documentos legais, a partir da década de 1990, apontam para esta direção. A LDB, instituída em 1996, fixa que o currículo deve prever uma base comum e outra diversificada, com o objetivo de resgatar e valorizar as diferenças regionais. Em 1997, foram lançados pelo MEC os Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino fundamental. No campo específico da educação infantil temos, publicados em 1998, os Referenciais Curriculares (RCNEI), e no ano seguinte, foram institucionalizadas as Diretrizes Curriculares Nacionais.

Diante desses pressupostos, como meio de garantir certa unidade aos currículos escolares em todo território brasileiro, o governo, através de suas representações, como o MEC, o Conselho Nacional de Educação (CNE) e as secretarias de educação de estados e municípios, formalizou parâmetros e diretrizes curriculares a serem seguidas pelas instituições de ensino.

Neste sentido, o MEC propõe ações como instrumentos capazes de auxiliar na melhoria da qualidade da educação básica, ancoradas no currículo da Educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio. Estas ações estão impressas no Programa Currículo em Movimento, criado em 2009, o qual tem por objetivo “[...] Identificar e analisar propostas pedagógicas e a organização curricular da educação infantil, ensino fundamental e ensino médio implementadas nos sistemas estaduais e municipais” (BRASIL, 2009).

Este programa também tem o propósito de elaborar documentos que tenham a finalidade de propor uma atualização das diretrizes curriculares desde a primeira etapa da educação básica até o ensino médio. Também busca elaborar textos orientadores voltados para a organização do currículo, eferências de conteúdos, visando garantir a formação básica comum da educação em âmbito nacional – base nacional comum e base curricular comum.

No tocante à Educação Infantil, Kramer (2001, p.5), destaca que o debate sobre proposta pedagógica ou curricular ocorreu pela primeira vez no ano de 1995, em decorrência do trabalho de alguns pesquisadores que, ao atenderem à solicitação da Coordenação-Geral de Educação Infantil (COEDI), órgão vinculado ao

MEC, passaram a produzir trabalhos com a finalidade de relacionar currículo e educação infantil, tendo como desafio responder à seguinte indagação: “o que é proposta pedagógica e currículo na educação infantil?”.

O MEC, ao fazer essa proposição, tinha como objetivo estabelecer um paradigma orientador do projeto de educação infantil para todo o Brasil, com vistas a implementar as diretrizes instituídas na política nacional voltadas para a Educação Infantil, em 1994. Ao empreender essas ações, o Ministério da Educação buscou promover o incentivo, a elaboração, a implementação e a avaliação das propostas pedagógicas e curriculares em consonância com as orientações teóricas para a educação infantil contidas nas diretrizes desta política. (BRASIL, 1996, p. 08).

O início dessas ações através da COEDI teve como ponto de partida a realização de um diagnóstico que retratasse as propostas pedagógicas curriculares em andamento nas diversas regiões do Brasil. Desse modo, Kramer (2001) nos aponta que, no final de 1994, uma equipe de trabalho tinha a tarefa de analisar textos construídos por ela e por consultoras como Tisuko Kishimoto, Zilma de Moraes Ramos de Oliveira, Maria Lucia de A. Machado e Ana Maria Melo. Ao fazer um estudo acerca dos dados coletados nos textos, a equipe procurou realizar uma discussão conceitual sobre o significado de currículo e da proposta pedagógica (BRASIL, 1996). O resultado disso foi a elaboração do documento “Propostas Pedagógicas e Currículo em Educação Infantil: um diagnóstico e a construção de uma metodologia em análise” (BRASIL, 1996).

Kramer (2001) assevera que, por meio da análise desse documento, é possível dizer que existem semelhanças acerca das concepções de currículo apresentadas pelas consultoras. Para a autora, não há diferenciação entre currículo e proposta pedagógica, uma vez que, em conformidade com suas construções, esses termos se confundem. Contudo, ela acaba optando por tratá-lo como proposta pedagógica.

Ainda segundo Kramer (2001), Oliveira não discute essa diferenciação, mas o designa como currículo. Em contrapartida, outras autoras, apesar de ressaltarem similaridades entre os termos, evidenciam que existem diferenças pontuais. Kishimoto, por exemplo, sinaliza que o “[...] currículo seria algo mais específico e proposta pedagógica mais amplo” (KRAMER, 2001, p. 5). Mello, por sua vez, apresenta o termo como Proposta Psicopedagoga, e Machado propõe o termo Projeto Educacional Pedagógico (BRASIL, 1996; KRAMER, 2001).

Diante de tais considerações, pode-se dizer que definir currículo ou proposta pedagógica não é uma tarefa simples. “Currículo é uma palavra polissêmica”, permeada de significados construídos em tempos e espaços sociais diversos. Sua evolução não está condicionada a uma ordem cronológica, mas decorre de contradições de um momento histórico, podendo assumir vários significados ao mesmo tempo (BRASIL, 1996, p. 19).

Apesar das discussões empreendidas, o MEC fez a proposição de um currículo nacional para essa etapa da educação através da publicação, em 1998, dos Referenciais Nacionais para a Educação Infantil (RCNEI), voltados para as escolas que atendem à faixa etária de 0 a 5 anos de idade e aos profissionais que atuam com as crianças pequenas. Os Referenciais para a Educação Infantil se traduzem em um guia, cujas orientações buscam promover e implementar práticas educativas de qualidade, que fomentem o desenvolvimento e o exercício da cidadania das crianças que frequentam as instituições educativas (BRASIL, RCNEI, 2002, p. 13).

Outro marco importante para a educação infantil diz respeito à publicação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, em 1999. As DCNEI ressaltam a autonomia das escolas na elaboração, execução e acompanhamento da educação infantil, sem mencionarem a utilização de parâmetros ou referenciais na organização dos currículos dos estabelecimentos de ensino. Com as DCNEI, surgiu a questão do cuidar e educar como ações indissociáveis, o que deve ser pleiteado pelas escolas.

Decorridos dez anos, nosso país reafirma a relevância das DCNEI, ao promulgar, em 2009, as Novas Diretrizes para a Educação Infantil, as quais deveriam ser levadas em consideração pelos órgãos e secretarias de ensino ao elaborarem suas propostas curriculares. As DCNEI, em seu artigo 3º, definem currículo da educação infantil como:

[...] Conjuntos de práticas que buscam articular as experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o desenvolvimento integral de crianças de 0 a 5 de idade (BRASIL, 2009, p. 11).

Ao dialogarmos com as novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a primeira etapa da escolarização, depreendemos que elas trazem em seu bojo uma

concepção de currículo, infância e criança, e seu artigo 3º convida-nos a pensar em uma proposta educativa para a prática que, além de possibilitar à criança o acesso ao conhecimento produzido pela humanidade ao longo dos tempos, não deve ignorar as experiências trazidas pelo aluno.

Fundamentadas também nas Novas DCNEI, Salles e Farias (2012, p. 32) definem currículo na Educação Infantil como:

[...] conjunto de experiências culturais de cuidado e educação, relacionados aos saberes e conhecimentos, intencionalmente selecionados e organizados pelos profissionais de uma Instituição de Educação Infantil para serem vivenciadas pelas crianças, na perspectiva de sua formação humana.

Para essas autoras, o currículo se constitui como um dos elementos da proposta pedagógica, devendo ser guiado pelos pressupostos que a sustentam.

Micarello (2007), em seu texto intitulado “Dimensão curricular da Educação Infantil e do 1º Ciclo”, também mostra que a definição de currículo não é tarefa simples em decorrência das várias acepções que, historicamente, têm sido designadas ao termo. Entretanto, suas construções acerca de currículo coadunam com as de Salles e Farias (2012) na medida em que se defende a ideia “[...] de currículo como processo, como uma construção coletiva dos diferentes atores envolvidos no contexto educacional, em uma dinâmica que envolve as ações dos sujeitos, que reorientam essas ações, tendo como referência os contextos em que elas se desenvolvem” (MICARELLO, 2007, p. 28).

No caso específico da 1ª etapa da educação, Micarello (2007) considera imprescindível que as metas de uma proposta pedagógica, como também as ações que serão feitas para efetivá-las precisam, necessariamente, ter como ponto de partida o modo como se concebe a infância e os objetivos a serem alcançados na educação de crianças pequenas.

Essas reflexões a partir da conceituação de currículo, bem como a síntese dos documentos legais que abordam a temática corroboram nosso entendimento de que, apesar dos órgãos e secretarias terem autonomia para a elaboração de suas propostas curriculares, como ocorreu na rede municipal de Juiz de Fora, essa autonomia também deve se expressar nas atribuições e no compromisso que cabem a cada segmento. Isso inclui não só na elaboração, mas também na implementação

que conta com a participação de todos, como secretaria, equipe gestora, docentes, outros profissionais da escola e comunidade.

Na próxima seção, discutiremos o brincar, tendo em vista que essa atividade é recomendada como principal eixo de trabalho na prática educativa das crianças de 0 (zero) a 5 (cinco) anos de idade, não só na Proposta Curricular para a Rede Municipal de Juiz de Fora, mas também nos documentos oficiais, tais como os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (1998) e as Diretrizes Curriculares Nacionais reformuladas em 2009.