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2. FORMAS IMPERFECTIVAS DE PASSADO E O COMPLEXO TAM

4.2. Procedimentos metodológicos

4.2.1. O fenômeno em estudo

4.2.3.3. Nível textual-discursivo 1 Figura e Fundo

4.2.3.3.3. Unidades da narrativa

De acordo com Brioschi e Di Girolamo (2000), boa parte da narrativa

literária se ajusta ao modelo proposto por Labov (1972 b) para a narrativa28. Em certos aspectos, compartilham a mesma forma o relato de uma narrativa literária e o relato da narrativa natural, ou seja, o relato oral e improvisado. Os estudos de Labov revelaram, nos exemplos reunidos de narrativa natural, uma estrutura relativamente constante que se articula em várias partes. Analisaremos as unidades da narrativa a partir da proposta de Labov (1972 b), exemplificada abaixo:

a) resumo: introdução inicial das linhas gerais da ação. Labov (1972a) inclui o resumo como um componente a mais da estrutura narrativa e o define como a unidade da narrativa que a sintetiza. De acordo com González (2009), este mecanismo estrutural adverte o interlocultor que a narração começará e permite que, ao início da narração, já se tome conhecimento ao menos, parcialmente, do resultado dos acontecimentos. Os verbos que aparecem no resumo, geralmente, estão no pretérito indefinido. De acordo com Labov (2001), este componente da narração é o mais completo do relato. Vejamos um exemplo29, no trecho a seguir:

(146) “I: y a l[a] media como que me anduve máh <alargamiento/> avispando ahí/ bueno la experiencia ¿de que? poh/ la primera pelea

poh fue en el liceo poh// <risas = "E"/> pegue y me pegaron.”

(M 193)

A primeira briga poh foi no liceo poh // risos = “E” bati e me bateram.

b) orientação: introdução dos personagens, do local e do tempo de ação. Nesta parte do relato, o narrador proporciona informações no que diz

28 Essa divisão já foi usada por Maldonado (1992) na análise da expressão do Aspecto imperfectivo em

Língua Inglesa.

29 Não encontramos em nosso corpus ocorrências de formas imperfectivas no resumo. Logo, este exemplo

foi retirado de entrevistas gravadas entre os anos 2005 e 2009, que compõem o banco de dados do projeto para o Estudo Sociolinguístico do Espanhol da Espanha e da América (PRESEEA).

125 respeito ao tempo, ao espaço, aos personagens e às atividades ou condutas da narração. Geralmente, a orientação está na parte inicial, mas pode, também, estar distribuída no decorrer do relato. De acordo com Silva – Corvalán (1987), a orientação de maneira geral está marcada por advérbios de tempo ou, ainda, por elementos temporais. Geralmente encontramos o pretérito imperfeito do indicativo. Estes elementos marcam a distância temporal entre o fato narrado e o momento da interação verbal. Vejamos um exemplo, a título de ilustração:

(147) Era bello, fino, se llamaba Esteban./ Era belo, fino, se chamava Esteban. (Bruja – Julio Cortázar)

c) complicação da ação: elemento desencadeador e complicador da ação. Segundo González (2009), esta unidade constitui o núcleo da narrativa, no qual aparecem os diversos fatos narrados, constitui o clímax do relato. Este elemento estrutural se caracteriza pelo uso de sequências ou cláusulas narrativas que apresentam verbos no presente e no passado. Nesta parte, o narrador conta o que aconteceu até chegar ao desfecho. Vejamos um exemplo:

(148) Allí iban los tres, con la mirada en el suelo, tratando de aprovechar la poca claridad de la noche/ Ali iam os três, com o olhar no chão, tratando de aproveitar a pouca claridade da noite. (La noche que lo dejaron solo – Juan Rulfo)

d) resolução: resolução do problema desencadeado. A resolução corresponde à finalização da história, mostra de que forma foi resolvido o problema exposto na complicação da ação. A seguir, apresentamos um exemplo:

(149) Ahora, esgrimía una navaja mientras me miraba fijamente./ Agora,

esgrimia uma navalha enquanto me olhava fixamente. (El que vino a

126 e) avaliação: nesta parte, o narrador procura motivar o seu interlocultor a valorizar o fato narrado. De acordo com González (2009), esta unidade da narrativa é utilizada pelo narrador para validar sua história, ou seja, para deixar clara a razão do seu relato e do seu objetivo ao narrá-lo. Neste sentido, a avaliação marca a parte central de uma narrativa. Esta unidade não se constitui estritamente uma parte, mas está formada por todos os fragmentos que o narrador utiliza para tornar a história interessante ao seu interlocultor. Os mecanismos de avaliação podem ser: modificadores de intensidade, cláusulas livres, cláusulas livres dentro de cláusulas narrativas ou negações para se referir a acontecimentos que poderiam ter ocorrido, mas não ocorreram. Segundo González (2009), a avaliação retarda o desenvolvimento da narração por meio da utilização de cláusulas não narrativas que mantêm a ação suspensa em um ponto temporal. Por meio da avaliação, se narram alguns aspectos da atitude dos falantes ou da importância dos fatos para os personagens ou para quem conta a história. Os tempos verbais que marcam a avaliação são os pretéritos imperfeito e indefinido, podemos ter ainda, verbos no presente. Vale salientar que essa unidade da narrativa, pode ou não aparecer, bem como o resumo e a coda, pois não são elementos essenciais para a história. Portanto, o narrador pode ou não colocar esses elementos em sua narrativa. A continuação, apresentamos um exemplo da avaliação, na narrativa.

(150) Entonces entró en su casa, que era verdaderamente hermosa, y se dedicó a amueblarla poco a poco. Era divertido./ Então entrou em sua casa, que era verdadeiramente bonita, e se dedicou a mobiliá-la pouco a pouco.

Era divertido. (Bruja – Julio Cortázar)

f) coda: finalização do tempo da narrativa. Geralmente, as narrativas finalizam com uma resolução. No entanto, segundo González (2009), em muitas ocasiões, o narrador acrescenta um elemento adicional a sua história (comentário final ou moral da história): a coda, que permite ao interloctor captar que o relato terminou. Nesse sentido, a coda permite retornar ao tempo presente. A coda é apresentada por meio de clausulas

127 livres que aparecem ao final da narrativa, para indicar que ela está sendo finalizada. De acordo com Silva-Corvalán (1987), geralmente aparece o pretérito indefinido nesta unidade da narrativa. É importante destacar que a coda e a resolução têm funções que coincidem parcialmente. A primeira aponta, de forma explícita, que o relato acabou com o uso de expressões como: “e assim termina a história”. Por outro lado, a resolução informa o que aconteceu finalmente no relato. Vejamos um exemplo de coda:

(151) Comprobé a los treinta años que volvía a ser vulnerable a pesar de la cama./ Comprovei aos trinta anos que voltava a ser vulnerável apesar da cama. (El enemigo – Virgilio Piñera)