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Durante todas as nossas análises percebemos que os usos mais gramaticalizados ou discursivizados não são restritos a textos produzidos por apenas um dos grupos de falantes investigados. Todos os integrantes dos dois grupos, submetidos a uma entrevista, fizeram usos mais ou menos abstratos, entretanto, nos dedicaremos nesta seção das nossas conclusões a identificar as incidências mais utilizadas por cada grupo dos termos analisados a fim de que respondamos de maneira mais clara a questão impulsionadora desta pesquisa.

Quanto ao uso do e, tanto o grupo com maior quanto o grupo com menor nível de instrução utilizou-o como sequenciador textual mais vezes do que com outras funções. Isso significa dizer que para os dois grupos de nossa pesquisa o termo “e”

Anafórico Sequencial Conclusivo Alternativo Intensificador

Resumitivo →Te dê cia resumitiva Introduzindo informações livres (inclusive antes de discurso reportado)

serve principalmente para acrescentar temas relevantes ao tópico discursivo o que não impede de utilizá-lo com outras funções, como sequenciador temporal, por exemplo. É importante lembrarmos que esse uso é o que possui menor grau de abstratização dentre os valores elencados neste trabalho. Esse resultado pode nos indicar duas conclusões: há forte influência nas escolhas dos alunos e da professora devido à relação ensino- aprendizagem (seja por um grupo ou outro) ocorrida na sala de aula; ou que as escolhas por usos menos abstratos ainda sejam muito latentes em língua portuguesa, pois, como o “e” é a conjunção prototípica da adição, esse valor continua sendo o predominante mesmo na língua falada cujos usos sejam mais ousados.

Os usos do não apresentaram tanta uniformidade quanto os usos do “e”. Os usos dos alunos foram prioritariamente relacionados à sequenciação temporal. É bem verdade também que os alunos utilizaram esse termo muito mais que a professora. O que tudo indica é que o “aí” foi utilizado majoritariamente para suprir a necessidade de promover conexões entre ações que se sucedem, mas isso não quer dizer que usos dêiticos (os mais antigos já encontrados em língua portuguesa) não fossem requeridos. Os usos do efetuados pela professora – que se restringiram a 9 ocorrências – oscilam entre anáfora temporal (menos abstrato), sequenciação textual (mais abstrato) e

estrutura pré-fabricada e especificador de sintagma nominal indefinido (que são menos abstratos)23. Portanto, podemos concluir que, além de o “aí” ser mais utilizado pelo grupo com menor nível de instrução, o uso desse grupo foi mais abstrato em comparação ao uso apresentado pelo outro grupo.

Enquanto isso, o termo mas foi utilizado por ambos os grupos com o valor

fortemente opositivo, incluindo a subfunção concessiva que, inclusive, foi a mais identificada. Com isso, podemos comprovar que o “mas” ainda traz consigo a carga semântica opositiva como o principal valor atribuído a ele. Entretanto, esse valor não foi o único a ser identificado, pois o “mas” introdutor de ressalva foi o segundo valor mais usado. Esse uso serve para adicionar um adendo que esclarece a informação apresentada anteriormente, orientando o interlocutor e é um dos mais abstratos. É razoável afirmar que o uso mais identificado do “mas” em nosso corpus é o menos abstrato de todos.

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Os critérios de comparação utilizados para classificar os usos da professora como mais ou menos abstrato têm como parâmetro o uso do “aí” produzido pelos alunos que, nesse caso, foi o de sequenciador temporal.

O termo assim – bastante utilizado pelo grupo com menor grau de instrução –

apresentou diversos valores no corpus de nossa pesquisa. O valor predominante nas incidências tanto desse grupo quanto no grupo com maior nível de instrução foi o valor irrestritocuja função primordial é anunciar complementos verbais e nominais de base catafórica (tal valor é considerado como um dos mais gramaticalizados, dentre os demais valores analisados). Em linhas gerais, o termo “assim” exibiu funções de diferentes naturezas nas entrevistas que possuíam uma forte tendência abstrata, inclusive, com usos mais discursivos (como preenchedor de pausa), mas houve também casos muito menos abstratos como o uso do “assim” com valor dêitico locativo. Isso nos faz acreditar que o uso do “assim” está bastante gramaticalizado, apesar do valor mais antigo ainda existir em nosso cotidiano.

Diferentemente do “assim”, o então foi muito mais utilizado pelo grupo com maior nível de instrução cujo uso mais expressivo foi o de introduzir informações livres– o que corresponde a organizar uma sequência de informações novas. Esse valor

do “então” é o mais abstrato de todos os investigados, pois sua função restringe-se basicamente a promover um arranjo ao discurso. Como houve somente duas ocorrências do “então” no que se refere aos usos do grupo com menor nível de instrução, qualquer conclusão que se dedique a tecer sobre a tendência mais ou menos abstrata dos usos desse termo corre o risco de se tornar uma falácia. No entanto, é importante apresentar que os dois usos são bastante gramaticalizados (ambos introduzem informações livres). Tanto essa função do “então” quanto a função de valor irrestrito do “assim” têm – precipuamente – finalidade de apresentar o que se segue, organizando o discurso e enquanto a professora prefere usar o “então”, os alunos preferem usar o “assim”. Talvez essa seja a justificativa para a incidência tão baixa de “assim” na fala da professora e tão baixa ou nula incidência de “então” nas falas dos alunos. Ou ainda o “assim” seja menos marcado para os alunos e mais marcado para a professora e vice-versa24.

É notável que, dos cinco termos analisados, três apresentam o mesmo comportamento tanto pelo grupo com maior nível de instrução quanto pelo grupo com menor nível de instrução, são eles: “e”; “mas”; e “assim”. O “e” apresentou um

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É válido lembrar que o princípio da marcação se refere à complexidade do termo (tamanho, conhecimento partilhado sobre seu significado) e à quantidade de ocorrências, além disso, quanto menos marcado – menos complexo para o falante, maior sua ocorrência.

comportamento menos abstrato, o “mas”, com efeito, se comportou de modo menos abstrato e o “assim” se comportou de modo mais abstrato. Não consideramos o “então” nesse grupo porque a quantidade utilizada pelos alunos foi ínfima, apesar de já ter afirmado uma possível causa. Quanto ao termo “aí”, além de ser bastante utilizado pelo grupo com menor nível de instrução, esse termo foi utilizado basicamente pelos alunos como sequenciador temporal (uso mais abstrato) do que a maioria dos usos da professora.

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