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V – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

No documento CONSELHO DE DISCIPLINA (páginas 21-28)

complementares, pelo que não ocorre qualquer abalo à credibilidade daqueles documento e esclarecimentos. Com efeito, como suprarreferido, a factualidade diretamente percecionada pelos elementos da equipa de arbitragem e pelos delegados da FPF, constante das Ficha de Jogo e dos Relatórios de Ocorrências, respetivamente, gozam de um valor probatório reforçado, atenta a presunção de veracidade constante no artigo 220º, nº 3, do RDFPF. Mais do que a existência de um mero indício, há uma presunção de veracidade associada ao conteúdo desta descrição factual – tanto da conduta em si, como de quem foi o seu autor – feita pela equipa de arbitragem na Ficha de Jogo e pelo Delegado da FPF no Relatório de Ocorrências. Deste modo, esses factos gozam de um valor probatório especial e reforçado, de uma presunção de veracidade (presunção iuris tantum), imune à contraprova e perecível apenas perante a prova do contrário. A opção assumida pelo regulamentador assenta na posição de independência e imparcialidade que a equipa de arbitragem e os Delegados da FPF assumem perante o jogo. Tal determina que, estando a factualidade suficientemente descrita e enunciada, aqueles documentos sejam idóneos, per se, a fazer prova dos factos que neles se atestam como diretamente presenciados pela autoridade que os relata.8 Deste modo, perante tal presunção, a todos os que pretendam sindicar e refutar a materialidade relatada naqueles documentos, ou nos esclarecimentos complementares pelos mesmos prestados, impõe-se um especial esforço probatório, exigindo-se-lhes a apresentação de prova bastante para legítima e racionalmente questionar, colocar fundadamente em causa ou justificadamente pôr em dúvida a veracidade dos factos narrados nos relatórios oficiais ou declarações complementares, o que, mais uma vez se sublinha, não aconteceu, pelo que a decisão a tomar não pode deixar de os ter em consideração.

V – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

§1. Enquadramento jurídico-disciplinar – Fundamentos e âmbito do poder disciplina

29. O poder disciplinar exercido no âmbito das competições organizadas pela Federação Portuguesa de Futebol assume natureza pública. Com clareza, concorrem para esta proposição as normas constantes dos artigos 19º, nºs 1 e 2, da Lei nº 5/2007 de 16 de janeiro (Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto), e dos artigos 10º e 13º, alínea i), do RJFD2008.

30. A existência de um poder disciplinar justifica-se pelo dever legal – artigo 5.º, nº 1, do RJFD2008 – de sancionar a violação das regras de jogo ou da competição, bem como as demais regras desportivas,

8 Com as devidas adaptações, GERMANO MARQUES DA SILVA, Curso de Processo Penal, Volume II, 5ª edição revista e atualizada, Verbo Editora, 2011, pp. 273 e 274.

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nomeadamente as relativas à ética desportiva, entendendo-se por estas últimas as que visam sancionar a violência, a dopagem, a corrupção, o racismo e a xenofobia, bem como quaisquer outras manifestações de perversão do fenómeno desportivo (artigo 52º, nº 2, do RJFD2008).

31. O poder disciplinar exerce-se sobre os clubes, dirigentes, praticantes, treinadores, técnicos, árbitros, juízes e, em geral, sobre todos os agentes desportivos que desenvolvam a atividade desportiva compreendida no seu objeto estatutário (artigo 54º, nº 1, do RJFD2008). Em conformidade com o artigo 55º do RJFD2008 o regime da responsabilidade disciplinar é independente da responsabilidade civil ou penal. O quadro normativo agora sumariado alumia estarmos na presença de um poder disciplinar que se impõe, em nome dos valores mencionados, a todos os que se encontram a ele sujeito, no âmbito já delineado e que, por essa razão, assenta na prossecução de finalidades que estão bem para além dos pontuais e concreto interesses desses agentes e organizações desportivas.

§2. Das infrações disciplinares em geral

32. Neste contexto, deve, antes de mais, notar-se que o RDFPF se encontra estruturado, no estabelecer das infrações disciplinares, pela qualidade do agente infrator – clubes, dirigentes, jogadores, delegados dos clubes e treinadores, demais agentes desportivos, espectadores, árbitros, árbitros assistentes, observadores de árbitros e delegados da FPF. Para cada um destes tipos de agente o RDFPF recorta tais infrações e respetivas sanções em obediência ao grau de gravidade dos ilícitos, qualificando assim as infrações como muito graves, graves e leves.

§3. Das infrações disciplinares concretamente imputadas

33. No caso que nos ocupa, a imputação lançada em sede de libelo acusatório sustenta-se no vertido no artigo 137º do RDFPF, que, sob a epígrafe “Incumprimento de deliberação ou suspensão”, preceitua nos seguintes termos:

«O dirigente de clube que não acate ou não faça cumprir ordem ou deliberação emanada de órgão social competente da FPF, órgão disciplinar especialmente previsto nos seus Estatutos ou no presente Regulamento, ou não cumpra suspensão, ainda que preventiva, é sancionado com suspensão de 1 mês a 1 ano e cumulativamente com multa entre 5 e 10 UC, salvo quando haja de ser aplicada norma especial constante do presente Regulamento».

34. Este normativo disciplinar é aplicável ao treinador arguido por força do disposto no artigo 183º, nº 1, do RDFPF, nos termos do qual «Os delegados ao jogo dos clubes, os treinadores e todos os outros agentes desportivos, independentemente da função exercida, não especialmente nomeados nos capítulos

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anteriores, são sancionados nos termos do Capítulo VI relativo às infrações específicas dos dirigentes de clube nos casos não especificamente previstos neste capítulo».

§4. O caso concreto: subsunção ao direito aplicável

35. A subsunção ao direito aplicável pressupõe que se efetue a exegese da norma sancionatória em causa, para assim verificar se se encontram preenchidos todos os elementos típicos, objetivos e subjetivos, que a mesma comporta.

36. Nesse pressuposto, cumpre acrescentar que, nos termos do disposto no artigo 15º, nº 1, do RDFPF, constitui «infração disciplinar o facto voluntário, ainda que meramente culposo, que por ação ou omissão previstas ou descritas neste Regulamento viole os deveres gerais e especiais nele previstos e na demais legislação desportiva aplicável».

37. O conceito de infração disciplinar integra pois os seguintes elementos constitutivos: (i) um facto voluntário (ativo ou omissivo); (ii) típico; (iii) ilícito e (iv) culposo. Significa isto que, na medida em que aqueles elementos são de verificação cumulativa, a falta de qualquer um deles comporta, como consequência necessária, a inexistência de qualquer infração disciplinar.

38. O arguido Filipe José Oliveira Moreira, enquanto treinador da Torreense SAD, é agente desportivo para os efeitos do RDFPF, nos termos da alínea b), do artigo 4º, em conjugação com o nº 1 do artigo 3º, daquele Regulamento, estando, como tal, sujeito ao exercício do poder disciplinar por parte da FPF, na medida em que pratique factos que possam ser integrados nalgum dos tipos de infração naquele previstos.

39. Como suprarreferido, vem o mesmo acusado da prática de uma infração disciplinar, que o RDFPF classifica como muito grave, prevista e sancionada pelo artigo 137º, nº 1 (“Incumprimento de deliberação ou suspensão”), em conjugação com o artigo 183º, nº 1, ambos do RDFPF. Este tipo de infração implica que, voluntariamente e ainda que de forma meramente culposa:

(i) O dirigente de clube (ou treinador, por força da norma remissiva constante no artigo 183º, nº 1, do RDFPF);

(ii) não acate ou não faça cumprir ordem ou deliberação ou não cumpra suspensão, ainda que preventiva;

(iii) emanada de órgão social competente da FPF, ou órgão jurisdicional/disciplinar especialmente previsto nos seus Estatutos ou no presente Regulamento.

40. Ora, como se disse anteriormente, o artigo 183º, nº 1, do RDFPF, sob a epígrafe “Âmbito de aplicação” preceitua que «Os delegados ao jogo dos clubes, os treinadores e todos os outros agentes

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desportivos, independentemente da função exercida, não especialmente nomeados nos capítulos anteriores, são sancionados nos termos do Capítulo VI relativo às infrações específicas dos dirigentes de clube nos casos não especificamente previstos neste capítulo». Assim, tendo em consideração a remissão operada por este artigo 183º do RDFPF e ao exposto relativamente à posição de agente desportivo do arguido Filipe José Oliveira Moreira, não se vislumbra qualquer dúvida quanto ao preenchimento do primeiro pressuposto da norma em análise.

41. O segundo pressuposto impõe que exista uma ordem ou deliberação prévia ou suspensão, ainda que preventiva, à qual não tenha sido dado cumprimento pelo dirigente de clube (ou treinador). Cumpre realçar que a conjunção “ou” indica, ou significa, opção ou alternativa. Por outras palavras, tal significa que o preenchimento do tipo de infração se verifica pela existência de uma (e apenas uma) das hipóteses autónomas separadas pela dita conjunção abstrata, existindo, portanto, entre elas uma relação de alternância, isto é, existe infração de o dirigente não acatar ou não fizer cumprir ordem ou deliberação, ou não cumpra suspensão. No caso concreto, estamos perante a hipótese de não cumprimento da sanção de suspensão.

43. Ora, conforme resulta do facto provado 2), resulta do Comunicado Oficial da FPF nº 258, de 11 de dezembro de 2020, a aplicação ao treinador arguido das sanções de 22 (vinte e dois) dias de suspensão e, cumulativamente, multa no montante de 5 UC, por factos ocorridos por ocasião do jogo oficial nº 260.06.047, a qual foi aplicada à luz do disposto no artigo 130º, nº 2, alínea a), do RDFPF.

44. Aqui chegados, importa, pois, perceber se a conduta do treinador arguido adotada por ocasião do jogo oficial nº 101.04.015, disputado entre a Torreense SAD e a Amora FC - Futebol SAD, disputado em 14 de dezembro de 2020, a contar para a Taça De Portugal Placard, conduta essa melhor explanada nos factos provados 8) a 11), configura, ou não, violação da sanção de suspensão que lhe fora previamente aplicada, publicitada através do Comunicado Oficial da FPF nº 258, de 11 de dezembro de 2020.

45. Para tal efeito, face às normas disciplinares em causa e ao teor da defesa escrita apresentada pelo treinador arguido, revela-se necessária a análise de matéria fundamental, a saber, a do regime material da sanção de suspensão, no qual se funda essencialmente a defesa.

46. Ora, de acordo com o artigo 37º, nº 1, do RDFPF que estabelece a disciplina da sanção de suspensão, esta «… importa a proibição do exercício da atividade desportiva na qual a infração que a originou foi cometida, por um período de tempo ou de jogos oficiais, podendo tornar-se extensiva a qualquer outra atividade desportiva que o infrator pratique».

47. Desta definição geral e dos números subsequentes daquele artigo resultam as consequências resultantes da aplicação da sanção de suspensão, a saber:

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a) impede qualquer agente desportivo de exercer, durante esse período, qualquer cargo ou atividade desportiva nas competições que se encontrem sujeitas ao poder disciplinar da FPF, ainda que a sanção tenha sido aplicada por órgão disciplinar de associação distrital ou regional, e inabilita-o, em especial, para o exercício das funções de representação no âmbito das competições e das relações oficiais com a FPF, com a LPFP e com as associações regionais ou distritais de futebol – cf. artigo 37º, nº 3;

b) impede o agente desportivo suspenso de estar presente na zona técnica dos recintos desportivos em que se disputem jogos oficiais integrados nas competições organizadas pela FPF, tal como definida no regulamento da respetiva competição, desde duas horas antes do início de jogo oficial e até trinta minutos após o seu termo - artigo 37º, nº 4;

c) o agente desportivo suspenso pode estar presente em cerimónia de entrega de prémios, salvo nos casos em que a sanção de suspensão tenha sido aplicada por infração relativa à proteção da verdade desportiva – cf. artigo 37º, nº 5.

48. Tal permite concluir que a aplicação de sanção de suspensão inibe o sancionado de, por ocasião de uma competição sujeita ao poder disciplinar da FPF, exercer sob qualquer forma qualquer função relacionada com a sua atividade primordial, mas também o inibe de estar presente na zona técnica, seja a que título e porque forma for.

49. Por outro lado, há que atentar ao segmento da norma «por ocasião de uma competição sujeita ao poder disciplinar da FPF». E cotejados os autos facilmente se descortina que todo o inquérito e a acusação deduzida se limitaram, se circunscreveram, a um exato período temporal, por ocasião da realização do jogo oficial nº 101.04.015, desde duas horas antes do seu início e até trinta minutos após o final do jogo. Deste modo, contrariamente ao que vem referido em sede de defesa escrita, em momento algum os autos abordaram o que possa ter acontecido fora daquele contexto, ainda que porventura integrando a dimensão jus-laboral da relação estabelecida entre a Torreense SAD e o treinador arguido, à qual este CDSNP é absolutamente alheio, para além de ser irrelevante para a apreciação do tipo de ilícito disciplinar em causa.

50. Como resulta da materialidade dada como provada, e que resulta à saciedade dos autos, facto inquestionável é que, por ocasião da realização do jogo oficial nº 101.04.015, o treinador da Torrense SAD, arguido Filipe José Oliveira Moreira, bem sabendo ter sido sancionado, três dias antes, com a sanção de 22 (vinte e dois) dias de suspensão, não foi inscrito na ficha técnica da Torreense SAD, não esteve no banco dos técnicos desta equipa, mas foi-se posicionar na bancada oposta aos bancos de suplentes, sendo a única pessoa aí presente, e desde aí esteve durante todo o jogo a dar instruções técnicas e táticas aos jogadores da Torreense SAD, tendo inclusive, após a final da primeira parte do jogo, chamado até junto

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se si um dos jogadores desta equipa, com quem esteve a conversar cerca de 2 (dois) minutos. Ora, na defesa escrita apresentada, o treinador arguido admite que esteve na bancada em causa, mas descarta (ou ignora) todos os elementos que compõem e sustentam a acusação quanto ao que estava concretamente a fazer naquele local (num espetáculo desportivo sem público), logrando inclusive afirmar que estava naquela bancada apenas como adepto (?) e que não deve satisfações sobre o que estava lá a fazer. Certo, naturalmente que o arguido não é obrigado a prestar declarações (podendo até mentir), mas a sua explicação afigura-se de todo inverosímil, não apenas por, enquanto treinador, se encontrar suspenso, como também, como adepto, a sua presença estar proibida, como ainda, como agente desportivo da Torreense SAD não estar incluído na listagem das pessoas autorizadas a estar presentes no interior do recinto desportivo, entregue por aquela SAD ao Delegado da FPF, constante a fls. 19. As fotografias constantes nos documentos de identificação do treinador arguido, de fls. 24 (no detalhe de inscrição), 27 (no cartão de cidadão), 32 (na licença UEFA PRO), 34 (simples) e o seu cotejo com as imagens de fls. 45 a 66, permitem concluir, sem margem para dúvidas, o que vem de se afirmar. Ao treinador arguido assiste efetivamente o direito de não esclarecer qual foi a sua concreta conduta durante o jogo, e de não explicar como e porque motivo se encontrava naquela bancada durante todo o tempo em que decorreu o jogo oficial em causa. Contudo, a partir do momento em que, com base nas menções exaradas no Relatório de Ocorrência elaborado pelo Delegado da FPF, nos esclarecimentos complementares por este prestados, e ainda atentos os esclarecimentos prestados pelos senhores árbitros que dirigiram o jogo oficial dos autos, que redundaram na imputação de estar naquele local (na bancada) e a adotar comportamentos que especificamente, naquelas concretas circunstâncias, não lhe eram permitidos, certamente teria sido do seu interesse, até face ao disposto no artigo 220º, nº 3, do RDFPF, não só impugnar os mesmos, como também requerer a correspetiva produção de prova, sob pena dos factos em causa ficarem sem resposta e, uma vez assentes em prova que beneficia da presunção de veracidade, serem os mesmos julgados procedente, como deverá acontecer.

51. Bem se compreende que a função de treinador (principal ou não) implica diversas tarefas no contexto da estrita prática competitiva, nomeadamente, a interferência na escolha dos jogadores titulares em cada jogo oficial, a promoção de palestras motivacionais antes e nos intervalos dos jogos e, eventualmente a mais importante, a transmissão de instruções técnicas e táticas aos seus jogadores, durante o jogo, tendo em vista a melhoria da sua prestação em campo e, desse modo, lograr influência e, a final, obter vencimento no jogo. Ora, esta é, inegavelmente, uma atividade tipicamente desportiva, enquanto fundamentalmente caracterizadora da função de treinador. É precisamente este exercício de

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atividade que está vedado ao treinador suspenso, aliás, se assim não fosse, ficaria absolutamente esvaziada (e desprovida de qualquer sentido, porque inócua) a aplicação de sanção de suspensão.

52. Adita-se ainda que, relativamente às funções do treinador, e onde as mesmas podem ser exercidas, a defesa escrita do treinador arguido construiu uma teoria assente no paralelismo com o cumprimento da sanção de suspensão por parte dos jogadores. Contudo, com todo o respeito, nada menos adequado. Na verdade, por um lado, porque o cumprimento da sanção de suspensão aplicada aos jogadores tem um regime próprio e específico, vertido no artigo 40º do RDFPF. Por outro lado, como bem refere a senhora Instrutora, aquela pretensa comparação desfaz-se com um raciocínio básico e lógico: no âmbito das competições, a função do jogador esgota-se essencialmente em jogar, correr, rematar, passar a bola, marcar golos, defender, atacar, disputar a bola, etc. Ora, seguindo aquele exemplo, como poderia o jogador incumprir uma sanção de suspensão por estar presente na bancada se a sua função é essencialmente jogar e isso apenas pode fazer dentro do terreno de jogo? Por sua vez, a função de treinador realiza-se numa vasta diversidade de ações e momentos, e é precisamente a essa diversidade que o artigo 37º, nº 3, do RDFPF, se refere, e que pretende incluir e abarcar; na verdade, contrariamente ao que postula a defesa escrita do treinador arguido, o exercício da atividade de treinador não se circunscreve ao local que este ocupa no recinto desportivo, não é suscetível de se concretizar apenas na zona técnica e especificamente na área técnica, qual aura divina que recai sobre as suas palavras e ações quando este se encontra naqueles locais. Logo, com mediana clarividência se conclui pela inadequação de tal comparação e, por conseguinte, do argumento nela fundado. O treinador arguido não deixou de o ser (e passou a ser adepto, conforme alega na defesa escrita), só porque não estava no banco dos técnicos, mas sim na bancada.

53. Aqui chegados, resta concluir, atendendo à factualidade considerada provada e no que tange ao tipo subjetivo de ilícito, que a conduta do treinador arguido se apresenta como suscetível de preenchimento na modalidade de dolo, havendo, no caso vertente, conhecimento (ou seja, o arguido agiu com representação de todos os elementos que integram o facto ilícito – elemento intelectual) e vontade (ou seja, o arguido dirigiu a sua vontade à realização do facto ilícito, querendo diretamente praticá-lo – elemento volitivo do dolo) de realização do tipo objetivo de ilícito9. Com efeito, o treinador arguido ao aceder à bancada oposta aos bancos dos técnicos, ao ser a única pessoa que aí se encontrava, ao aí permanecer durante todo o jogo, a dar instruções técnicas e táticas aos seus jogadores, tendo inclusive chamado um deles junto de si, quando não reunia as condições regulamentares para ali entrar e permanecer (pois não constava na ficha técnica da Torreense SAD, nem na lista de pessoas autorizadas a

9 Vide, quanto a este ponto, FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal – Parte geral, Tomo I, Coimbra Editora, 2007, pág. 348 e ss..

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estar presentes no recinto desportivo, entregue pela Torreense SAD ao Delegado da FPF), na medida em que se encontrava suspenso (o que bem sabia, como também sabia a Torreense SAD, cujo delegado ao jogo, antes do início deste, questionou o Delegado da FPF se o treinador poderia estar naquela bancada estando “castigado”), pelo que agiu com conhecimento e vontade de praticar os atos por que vem acusado, bem sabendo que, ao fazê-lo, não cumpria, não acatava deliberação emanada de órgão competente da FPF, no caso concreto, deste CDSNP, que o havia sancionado, além do mais, com 22 (vinte e dois) dias de suspensão, que ainda não cumprira à data da realização do jogo oficial dos autos, em 14/12/2020, e que, desse modo, agia em desrespeito dos regulamentos oficiais e que tal infração constituía ilícito disciplinar.

54. Finalmente, adotando a conceção de culpa de FIGUEIREDO DIAS10, conclui-se que a conduta do treinador arguido se afigura culposa, juridicamente censurável por manifestamente indiferente e contrária aos valores protegidos pelo ordenamento jurídico-disciplinar. Face ao exposto, fica demonstrado o preenchimento dos elementos objetivos e subjetivos do tipo da norma sancionatória prevista e sancionada pelo artigo 137º, nº 1, conjugado com o artigo 183º, nº 1, ambos do RDFPF.

No documento CONSELHO DE DISCIPLINA (páginas 21-28)

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