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Texto publicado na Revista Fórum de Direito Tributário, Belo Horizonte, v.

4, n. 22, Jul./2006.

Autor: Ricardo Mariz de Oliveira

OS IMPORTANTES CONCEITOS DE PAGAMENTO, CRÉDITO, REMESSA, ENTREGA E EMPREGO DA RENDA (a propósito do imposto de renda na fonte e de lucros de controladas e coligadas no exterior)

SUMÁRIO. I – Introdução ao tema. II – Os fundamentos para qualquer incidência tributária a título de imposto de renda.

Considerações preambulares sobre pagamento e crédito da renda. III – Iniciação aos conceitos de remessa, entrega e emprego da renda. Sua identificação com pagamento da renda, e elementos comuns a eles, e também ao crédito da renda. IV - Atenção especial à entrega e emprego da renda. V – A alienação de participação societária em controlada ou coligada no exterior não representa entrega ou emprego dos seus lucros, nem disponibilização dos mesmos. A redução de capital da controladora ou coligada no Brasil também não.

VI – A falsa suposição de que a controladora ou coligada no Brasil possa entregar ou empregar os lucros da controlada ou coligada no exterior sem participação desta, e assim praticar o fato gerador. VII – Ilegalidade da Instrução Normativa SRF n. 38/96. VIII – A fusão, incorporação ou cisão da controladora ou coligada no Brasil também não representa disponibilização dos lucros da controlada ou coligada no exterior. IX - Resumo conclusivo.

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I – INTRODUÇÃO AO TEMA

Há muitas décadas a legislação do imposto de renda vem se referindo a “pagamento”, “crédito”, “remessa”, “entrega” e “emprego” da renda como sendo o momento no qual esse imposto deve ser retido pela fonte pagadora da renda, quando o regime de arrecadação do mesmo seja o de fonte.

Com efeito, pelo menos desde o Decreto-lei n. 5844, de 23.9.1943, há essa previsão, como se pode ver por seu art. 100, que reza:

“Art. 100 - A retenção do imposto, de que tratam os art. 97 e 98, compete à fonte, quando pagar, creditar; empregar, remeter ou entregar o rendimento.”

Com o passar do tempo e da experiência jurisdicional no âmbito do 1º Conselho de Contribuintes e da Câmara Superior de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda, experiência esta, por sua vez, regada ou precedida por sábios estudos doutrinários, os cinco conceitos foram se estratificando no tocante ao momento de retenção do imposto na fonte.

Contudo, mais recentemente, ou seja, a partir de 1988, com a vigência da Lei n. 9532, de 10.12.1997, os mesmos conceitos voltaram a ser empregados para o estabelecimento do momento em que os lucros de coligadas ou controladas, no exterior, de pessoas jurídicas estabelecidas no Brasil, podem ser alcançados pelo imposto de renda da pessoa jurídica (IRPJ) e pela contribuição social sobre o lucro (CSL) devidos por estas. 1

1 A incidência do IRPJ em bases mundiais foi introduzida pela Lei n. 9249, de 26.12.1995, art. 25 a 27, e a da CSL pela Medida Provisória n. 1858-6, de 29.6.1999, art.

19.

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Isto porque o art. 1º dessa lei prescreve quando tais lucros devem ser incluídos no lucro tributável no Brasil fazendo expressa alusão aos cinco conceitos, como se pode observar por sua redação transcrita no início do próximo capítulo.

Neste novo cenário de aplicação dos referidos conceitos 2, por tudo quanto será adiante explanado, eles não recebem qualquer modificação em relação a como já eram compreendidos perante a legislação relativa ao imposto de renda na fonte, mas ganham maior atenção os conceitos de “entrega” e

“emprego”, os quais, para a Secretaria da Receita Federal (SRF), podem se confundir com atos da pessoa jurídica investidora de capitais em controladas e coligadas fora do Brasil, quando esses atos tenham por objeto, ainda que indiretamente, tais participações societárias ou os valores das mesmas, neles contidos os lucros das coligadas ou controladas: são os casos, por exemplo, de alienações em geral dessas participações, ou o caso especial de redução de capital da investidora quando a devolução de capital aos sócios da pessoa jurídica no Brasil é processada mediante a transferência, para eles, dessas participações, ou ainda os casos de fusão, incorporação ou cisão da pessoa jurídica no Brasil em que a participação na pessoa jurídica do exterior integre o patrimônio vertido. 3

2 Que, com relação a lucros de controladas ou coligadas no exterior, evidentemente só se estende até 2002, quando o art. 74 da Medida Provisória n. 2158-35, de 24.8.2001, passou a exigir a tributação dos respectivos lucros independentemente da sua efetiva disponibilização à pessoa jurídica no Brasil. O prolongamento da aplicação dos cinco conceitos no tocante à tributação dos lucros de controladas ou coligadas no exterior somente ocorrerá se o art. 74 for declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento da ação direta de inconstitucionalidade n. 2558-DF, o qual ainda não se encerrou na data (3.5.2006) em que este estudo está sendo completado. A propósito da inconstitucionalidade do art. 74 foi publicado artigo de minha autoria na “Revista Fórum de Direito Tributário” n. 4, p. 9, e em defesa da constitucionalidade o artigo de Alberto Pinto Souza Junior no n. 2, p. 49, da mesma Revista.

3 O parágrafo 2º do art. 2º da Instrução Normativa SRF n. 38/96 declara que na alienação da participação societária devem ser oferecidos à tributação os lucros da controlada ou coligada no exterior que até então não tenham sido tributados no Brasil.

E o parágrafo 6º do mesmo artigo faz a mesma exigência quanto aos lucros ainda não tributados na data em que a pessoa jurídica no Brasil for fusionada, incorporada ou cindida.

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Nestes casos, a indagação que se apresenta é se a pessoa jurídica no Brasil não poderia ser tributada mesmo não tendo recebido os lucros da coligada ou controlada no exterior, porque estaria empregando esses lucros em seu benefício, ou entregando a participação societária a outrem.

É boa hora, portanto, para se rever aqueles conceitos em sua própria concepção estrutural, e dando, em virtude da sua atualidade, maior ênfase ao tema aplicado à tributação dos lucros de controladas ou coligadas no exterior.

Para que se tenha presente a importância fundamental desses conceitos, lembre-se que, afinal, eles se ligam umbilicalmente a outro conceito que é inafastável do fato gerador do imposto de renda, qual seja, o de aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou de provento de qualquer natureza, dado que pagamento, crédito, remessa, entrega ou emprego são manifestações de disponibilização de renda ou provento.

Com razão, mesmo que aqui se coloque de lado qualquer consideração sobre a inconstitucionalidade do art. 74 da Medida Provisória n.

2158-35, de 24.8.2001, não se pode deixar de notar que esse dispositivo coloca em evidência o seguinte ponto relevante: antes da sua vigência, e no mínimo a partir da Lei n. 9532, os lucros das controladas e coligadas no exterior somente podiam ser tributados nas suas controladoras ou coligadas no Brasil quando ocorresse a sua efetiva disponibilização a estas.

Aliás, este aspecto essencial ao nascimento da obrigação tributária não apenas estava expresso no art. 1º da Lei n. 9532, como era, e ainda é, requisito de validade para qualquer pretensão tributária, à luz da superior prescrição do art. 43 do CTN.

Portanto, ao lado da análise conceitual dos cinco eventos, será dedicada atenção especial à sua aplicação no contexto desse dispositivo da Lei n.

9532.

Tudo isto veremos nos capítulos seguintes.

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II – OS FUNDAMENTOS PARA QUALQUER INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA A TÍTULO DE IMPOSTO DE RENDA – CONSIDERAÇÕES PREAMBULARES SOBRE PAGAMENTO E CRÉDITO DA RENDA

Está fora de qualquer questionamento que não se pode afastar da hipótese de incidência do imposto de renda a ocorrência da disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou de provento de qualquer natureza, pois se trata de requisito essencial e fundamental advindo da norma que define o fato gerador do imposto de renda, norma esta que está contida no art. 43 do CTN. 4 5

Destarte, esta exigência estende-se a toda e qualquer hipótese de incidência desse tributo, abrangendo também o imposto de renda cobrável na fonte e a integração, no lucro real tributável, dos lucros de controladas e coligadas no exterior.

Isto já estava claro nos estudos relacionados ao imposto de renda na fonte, e ficou evidente – até por comparação com a Lei n. 9249, de 26.12.1995 - quando o art. 1º da Lei n. 9532 veio completar o regime de tributação em bases mundiais, colocando-se ao lado do art. 43 do CTN, não apenas o observando em sua concepção teórica, mas também lhe dando consistência e definições práticas voltadas para as hipóteses por ele regidas especificamente.

Para fazer esta afirmação é suficiente a atenta observação da redação do art. 1º da Lei n. 9532, que é a seguinte:

4 Ficando reiterado mais uma vez que aqui não se discute o art. 74 da Medida Provisória n. 2158-35.

5 Quanto à CSL, não tratada no art. 43, fica, contudo, submetida ao mesmo requisito, dado que a disponibilidade da renda é atributo que vem juntamente com o direito definitiva e incondicionalmente adquirido e, portanto, integrado ao lucro que se acresce ao patrimônio. Por isso mesmo, na prática a jurisprudência vem estendendo a mesma exigência à base de cálculo dessa contribuição.

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“Art. 1º - Os lucros auferidos no exterior, por intermédio de filiais, sucursais, controladas ou coligadas serão adicionados ao lucro líquido, para determinação do lucro real correspondente ao balanço levantado no dia 31 de dezembro do ano-calendário em que tiverem sido disponibilizados para a pessoa jurídica domiciliada no Brasil.

Parágrafo 1º - Para efeito do disposto neste artigo, os lucros serão considerados disponibilizados para a empresa no Brasil:

a) no caso de filial ou sucursal, na data do balanço no qual tiverem sido apurados;

b) no caso de controlada ou coligada, na data do pagamento ou do crédito em conta representativa de obrigação da empresa no exterior.

c e d) “omissis”; (operações específicas, sujeitas a outras considerações, embora não colidentes com o que será exposto aqui)

Parágrafo 2º - Para efeito do disposto na alínea "b" do parágrafo anterior, considera-se:

a) creditado o lucro, quando ocorrer a transferência do registro de seu valor para qualquer conta representativa de passivo exigível da controlada ou coligada domiciliada no exterior;

b) pago o lucro, quando ocorrer:

1 - o crédito do valor em conta bancária, em favor da controladora ou coligada no Brasil;

2 - a entrega, a qualquer título, a representante da beneficiária;

3 - a remessa, em favor da beneficiária, para o Brasil ou para qualquer outra praça;

4 - o emprego do valor, em favor da beneficiária, em qualquer praça, inclusive no aumento de capital da controlada ou coligada, domiciliada no exterior.”

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Verifica-se claramente que todas as hipóteses descritas minuciosamente nesse longo dispositivo refletem a ocorrência da necessária disponibilização (a transferência ou passagem da disponibilidade) dos lucros à pessoa jurídica sediada no Brasil, seja em relação às suas filiais e sucursais no exterior, seja em relação às suas coligadas ou controladas, embora aqui somente seja relevante cogitarmos de coligadas e controladas. 6

Com efeito, o “caput” do art. 1º da Lei n. 9532 determina que os lucros advindos de controladas ou coligadas no exterior sejam oferecidos à tributação somente quando forem efetivamente disponibilizados à pessoa jurídica controladora ou coligada sediada no território nacional.

E o parágrafo 1º trata das hipóteses de disponibilização desses lucros, determinando em sua alínea “b” que a disponibilização se dá, “no caso de controlada ou coligada, na data do pagamento ou do crédito em conta representativa de obrigação da empresa no exterior”.

Portanto, pagamento ou crédito, pelas controladas ou coligadas no exterior às suas controladoras ou coligadas no País, são os dois únicos meios de disponibilização dos lucros daquelas para estas.

Em sequência, o parágrafo 2º define os conceitos de crédito e de pagamento nas suas alíneas “a” e “b”, respectivamente.

Segundo a alínea “a” desse parágrafo 2º, a hipótese de crédito se configura quando ocorrer a transferência do registro do valor do lucro da controlada ou coligada no exterior para qualquer conta representativa do seu passivo exigível.

Esta descrição do que seja crédito trás claramente à tona que a disponibilização somente ocorre quando a própria pessoa jurídica no exterior coloca seus lucros à disposição daquela que participa do seu capital social.

6 Eis que filiais e sucursais, sendo estabelecimentos da própria pessoa jurídica matriz sediada no Brasil, geram lucros automaticamente disponíveis para esta. Ou, em outras palavras, os lucros disponíveis para as filiais e sucursais há estão, de pleno direito, disponíveis para a pessoa jurídica no Brasil da qual aqueles estabelecimentos fazem parte.

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Tanto é assim que, no parágrafo 1º, letra “b”, já fora especificado tratar-se de crédito em conta representativa de obrigação da controlada ou coligada, eis que se deve tratar de colocação do valor à disposição da controladora ou coligada no Brasil por decorrência de uma obrigação já existente.

Portanto, o ato de disponibilização – no caso, através de crédito – é sempre ato da controlada ou coligada no exterior, e refere-se a um objeto – seus lucros – já tornados devidos à sua controladora ou coligada no Brasil, portanto, a uma obrigação daquela perante esta.

É neste sentido que a doutrina e a jurisprudência administrativa sempre entenderam a palavra “crédito”, quando usada pela lei para se referir à ocorrência do fato gerador do imposto de renda na fonte, onde os mesmos eventos aludidos no art. 1º da Lei n. 9532 – pagamento, crédito, remessa, entrega, emprego – são utilizados para a configuração do momento em que nasce a obrigação tributária cujo objeto seja esse imposto.

Realmente, como elemento temporal do fato gerador do imposto de renda, o termo “crédito” tem sido objeto de profundas investigações da doutrina e de acertados pronunciamentos jurisprudenciais.

Neste sentido, e antes de qualquer outra consideração, deve ser dito que hoje em dia está definitivamente afastada qualquer idéia de que o crédito a que a lei se refere possa ser (baste ser) uma simples contrapartida de um débito qualquer, feito em lançamento contábil segundo a linguagem das partidas dobradas.

Não, pois o crédito a que a lei se refere para considerar devido o imposto de renda, embora também seja representado graficamente por um lançamento contábil em favor do beneficiário, deve, contudo, necessariamente, ser a contrapartida de um débito representativo de obrigação de direito privado, já existente para a fonte pagadora da renda, e já vencido, através de cujo ato a fonte geradora da renda a torna disponível para o respectivo beneficiário, o qual, por sua vez, é credor da fonte na mesma relação jurídica de direito privado.

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Com efeito, o crédito em questão corresponde ao ato, ativo e positivo, da fonte produtora da renda, de colocá-la à disposição do respectivo beneficiário, para que ele receba o que lhe é devido no momento em que comparecer para a conclusão do pagamento.

Crédito, neste sentido, é ato de quase-pagamento, pois a fonte reconhece a sua dívida já devida porque já vencida, e a disponibiliza em conta individual para o respectivo credor, titular da renda ou do provento correspondente.

A necessidade de que se trate de dívida vencida decorre de que somente depois do vencimento ela é exigível pelo credor. Assim, no caso de crédito da renda, a fonte ainda é devedora, porque ainda conserva consigo os respectivos recursos financeiros, mas, através do ato inequívoco de colocar o dinheiro à disposição do credor em conta individual deste, já manifesta a sua obrigação de pagar, e a sua prontidão para fazer o pagamento: daí o crédito ser um quase-pagamento.

A jurisprudência administrativa, de longuíssima data – mesmo antes do CTN -, vem reconhecendo que o crédito a partir do qual existe a obrigação tributária é apenas aquele que se revista destas características.

E, ao assim fazer, explicita o verdadeiro conteúdo não apenas do crédito, mas também do pagamento, da remessa, da entrega e do emprego da renda, como eventos demarcadores do nascimento da obrigação tributária.

José Luiz Bulhões Pedreira inclusive explicou estar aí a gênese da expressão “disponibilidade jurídica”, depois absorvida pelo CTN.

Esse importante autor, in “Imposto de Renda – Pessoa Jurídica”, Adcoas-Justec, 1979, vol. I, p. 121, adotado e transcrito no acórdão n. 101-93525, de 25.7.2001, da 1ª Câmara do 1º Conselho de Contribuintes, diz claramente:

“A renda pessoal resulta da repartição da renda social. Pressupõe, portanto, atos dos agentes da repartição. E como o ordenamento jurídico não admite a execução privada das obrigações, a aquisição da disponibilidade de renda pressupõe ato da fonte

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pagadora do rendimento (ou da autoridade judiciária, suprindo sua omissão) que torne o rendimento disponível para o beneficiário. Daí a noção, construída pela jurisprudência administrativa, de que ocorre disponibilidade jurídica quando a fonte pagadora coloca a renda à disposição do beneficiário. A partir desse momento a renda está disponível, porque o beneficiário, além de ser titular de direito de recebê-la, tem o poder de adquirir a disponibilidade econômica.” (grifos apostos)

Nota-se que, ao lado da observação de que foi a jurisprudência administrativa que construiu a noção de disponibilidade da renda, antes mesmo de o CTN a prescrever como elemento intrínseco ao fato gerador, Bulhões Pedreira destaca no que consiste a aquisição dessa disponibilidade (ato da fonte colocar a renda à disposição do beneficiário), e porque ela é o que é (porque sem esse ato, e não havendo execução privada, o beneficiário não tem como se apoderar da renda).

Sua lição, portanto, pode ser assim resumida: a aquisição da disponibilidade deriva de ato da fonte pagadora, de tornar a renda disponível para o seu titular, e é pressuposto para a percepção da renda porque, sem esse ato da fonte, e não havendo execução privada ou ordem judicial, o credor não tem como se apropriar dela.

Assim, e em suma, a disponibilidade é derivada de ato (de disponibilização) da fonte que efetua o pagamento (ou ato equivalente, inclusive o crédito), porque o ordenamento jurídico não admite a execução privada, razão pela qual, quando a fonte não pratica o ato, este precisa ser suprido por ordem judicial. Não é à toa, portanto, que a jurisprudência também reconhece que neste último caso a disponibilidade somente ocorre com o trânsito em julgado de decisão líquida e certa.

Outro importante autor, que dedicou ao imposto de renda a sua vida acadêmica e profissional, nos legou a mesma lição com relação ao evento disponibilidade, reconhecendo ser decorrente de ato positivo da fonte (inclusive por crédito), de colocar o rendimento à disposição do seu titular.

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Realmente, com a sua costumeira precisão, lecionou Henry Tilbery 7:

“A disponibilidade jurídica de acordo com o dispositivo citado ocorre desde o momento em que o beneficiário, pessoa física, estiver em condições de exigir o pagamento, por exemplo, quando lhe for creditado por pessoa jurídica. Entendemos, porém, que deve haver um crédito identificado em favor do beneficiário: a inclusão da despesa aproximada ou estimada dentro de uma “Provisão”, coletivamente com outros itens, ainda não coloca a receita à disposição do eventual beneficiário.” (grifos acrescidos)

Não é demais ressaltar que a jurisprudência também acompanha, sem rodeios, esta última parte da lição desse saudosíssimo mestre8. E os grifos

7 Em seu “Direito Tributário 3”, Editora Bushatsky, 1975, p. 92.

8 Do que podem ser dados alguns exemplos, sendo todos os grifos apostos aqui. No acórdão n. 103-07602, de 13.10.1986, da 3ª Câmara do 1º Conselho de Contribuintes, a ementa foi a seguinte: “Não há fato gerador do imposto de renda incidente na fonte quando os juros são contabilmente creditados ao beneficiário do rendimento em data anterior ao vencimento da obrigação, consoante os prazos ajustados em contrato de empréstimo, que se mantenha inalterado. O simples crédito contábil, antes da data aprazada para seu pagamento, não extingue a obrigação nem antecipa a sua exigibilidade pelo credor. O fato gerador do imposto na fonte, pelo crédito dos rendimentos, relaciona-se, necessariamente, com a aquisição da respectiva disponibilidade econômica ou jurídica”. No voto condutor desse acórdão lê-se: “O fato verdadeiramente inarredável é que o crédito contábil antes de vencido o semestre nem alterou a periodicidade do pagamento dos juros, que continuaram sendo devidos em razão dos contratos de empréstimos, nem propiciou aos credores do exterior o direito de exigir esses juros antes de vencido o semestre, o que implica dizer que esses credores não adquiriram a correspondente disponibilidade jurídica, muito menos a econômica. Pois, não se pode confundir disponibilidade de crédito a renda com disponibilidade de renda. É evidente que, cuidando-se de empréstimos entre pessoas jurídicas, e seguindo-se o regime de competência, a apropriação das receitas e das despesas dos juros segue critérios próprios desse regime de competência, que não se encaixam com que foi dito acima referentemente à tributação na fonte. ... Costuma-se dizer que o fato gerador do imposto de renda na fonte ocorre quando os rendimentos são pagos, creditados, empregados, remetidos ou entregues ao beneficiário. O entendimento vem do art. 5º da Lei nº 4.154/62, consolidado no art. 577 do RIR/80. Porém em qualquer das situações é indispensável que o beneficiário adquira a disponibilidade econômica ou jurídica dos rendimentos, sem o que não há fato gerador. Conforme se decidiu no Acórdão nº CSRF/01-0632, de 11.04.86, de que nos dá notícia parte da sua ementa: ‘Há

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no trecho acima expõem, acima de qualquer dúvida, que a disponibilidade da renda deriva de um ato da fonte, quando o beneficiário já pode exigir o pagamento.

Outro importante jurista brasileiro que tratou do assunto, e que não pode deixar de ser citado aqui até mesmo por ter sido coautor do anteprojeto do CTN, é Gilberto de Ulhôa Canto. Em seu livro “Estudos e Pareceres de Direito Tributário”, Editora Revista dos Tribunais, 1975, p. 376 a 378, ele não poderia ter sido mais explícito: 9

disponibilidade jurídica quando se adquire título vencido, ou quando este vencer, ocasião em que exsurge o direito à pretensão e/ou à ação para se exigir o crédito. Enquanto o direito não puder ser exigido, tem-se direito de crédito, mas não ainda disponibilidade jurídica de renda.’ Em vista de todo o exposto, tenho para mim que os lançamentos contábeis de fim de exercício social, creditando aos beneficiários do exterior os juros até então produzidos, não determinaram a ocorrência do fato gerador do imposto de renda incidente na fonte, sem prejuízo de que a recorrente pudesse ter apropriado esses juros como despesas incorridas nesse exercício. O fato gerador ocorreu, de fato e de direito, quando completado o semestre que os tornou exigíveis”. Tratando do IRPF, o acórdão n.

104-17291, de 8.12.1999, da 4ª Câmara do mesmo Conselho, reza: “CRÉDITOS A SÓCIOS - CONTABILIDADE DE PESSOAS JURÍDICAS - LUCRO REAL - Crédito efetuado na contabilidade de pessoa jurídica em favor de sócio, sem comprovação do efetivo pagamento, não caracteriza o fato gerador do imposto da pessoa física beneficiária.

Possibilidade de ter sido a despesa incorrida mas não paga”. Cite-se, também, o acórdão n. CSRF/01-0820, de 29.7.1988, da 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais:

O crédito de rendimento só configura disponibilidade jurídica se incondicional, isto é, se o recebimento do respectivo numerário depender exclusivamente do beneficiário, o que não ocorre na hipótese de rendimento creditado por rescisão de contrato de trabalho, pendente de homologação por Sindicato, que se consumou no ano subsequente, quando então se tornou disponível para efeito de tributação”.

9 Cabendo uma observação inicial: neste trecho, Gilberto de Ulhôa Canto deu muita ênfase à fórmula verbal do regulamento então vigente (coincidente com a do Decreto- lei n. 5844), mas o essencial, como de verifica por sua própria lição, é a natureza de cada ação – o “facere” - representada por um dos cinco verbos. Ademais, como se sabe – e sobre isto não é necessária qualquer citação -, a interpretação da lei não se limita ao método literal ou gramatical, mesmo porque uma mesma ideia pode ser exprimida por várias formulações linguísticas. Por isso, a interpretação vai à procura do conteúdo da norma através de todos os métodos de exegese. No art. 1º da Lei n. 9532 a redação é diversa e mais apurada do que a do texto interpretado por Gilberto, mas a essência dos atos referidos naquele é a mesma representada pelos verbos deste, pois o art. 1º, depois de usar o verbo “disponibilizar”, emprega os substantivos para aludir aos atos e

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“10 (910) De fato, ao dispor sobre a responsabilidade da fonte pagadora do rendimento, pela retenção do tributo, diz o vigente Regulamento do Imposto de Renda, aprovado pelo Decreto n.

58400, de 10.5.1966 (cuja redação pouco difere da adotada nos textos anteriores):

‘Art. 309 - Compete à fonte reter o imposto de que trata o Título I deste Livro quando pagar, creditar, empregar, remeter ou entregar o rendimento’.

A forma verbal utilizada pelo legislador não deixa qualquer dúvida quanto a só ser obrigatória a retenção do imposto pela fonte quando esta agir por uma das maneiras pelas quais a lei prevê a exteriorização do fato gerador, na espécie: pagar, creditar, empregar, remeter ou entregar o rendimento. Trata-se de forma verbal ativa, que pressupõe um ‘facere’ por parte da fonte, e que de maneira alguma se coaduna com a interpretação adotada pela instância ministerial, que equipara a palavra crédito, com o sentido de lançamento contábil a favor do titular da conta, à mesma palavra com o significado de direito ao recebimento de uma prestação em dinheiro ou a este redutível. A exigibilidade de um pagamento, tão logo ocorra o fato dele determinante, segundo a relação contratual que lhe dá origem - como o vencimento de prazo - independe de qualquer atuação da fonte. Ora, para fins de retenção do imposto, quis a lei que a obrigação respectiva só surgisse em razão de atividade específica da fonte pagadora, de às consequências ou resultados das ações representadas pelos verbos empregados no texto analisado por Gilberto. Isto ficará muito claro na sequência do presente estudo, mas, para aclarar este ponto desde já, aqui pode ser dito que “pagamento” é o ato (assim como consequência ou resultado) da ação de pagar, “remessa” é ato (assim como consequência ou resultado) da ação de remeter, o mesmo ocorrendo com “entrega”,

“emprego” e “crédito”. Por outro lado, esse estudo de Gilberto de Ulhôa Canto girava em torno da conceituação de “crédito” e “creditar”, onde a dualidade de sentido do substantivo se manifesta porque ele tanto pode ser empregado para o crédito entendido como direito, quanto para o crédito entendido como registro contábil disponibilizando o direito, e daí a admissão, feita por ele, de que “se o substantivo poderia ter o duplo sentido, o verbo não pode”. Já quanto aos outros quatro conceitos, não há essa dualidade no substantivo, e é total a coincidência entre a ação representada pelo verbo de cada um deles e o ato, consequência ou resultado da ação, que se representa pelo respectivo substantivo.

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ato positivo seu, qual seja: o creditar, o pagar, o empregar, o remeter ou o entregar o rendimento. Quisesse a lei que o fato gerador da obrigação tributária em causa surgisse com o só vencimento do prazo contratual, tê-lo-ia dito, sem dúvida, de forma clara, sem condicionar a ocorrência do fato gerador a um ato positivo, um ‘facere’ da fonte pagadora do rendimento, como a forma verbal utilizada demonstra. Portanto, é inviável a inteligência dada à palavra crédito para compreender tanto o registro contábil como o direito de haver prestação contratual, pois a lei fala em creditar e não em crédito; e, se o substantivo poderia ter o duplo sentido, o verbo não pode.

11 (911) Em segundo lugar, a decisão sob exame discrepa da jurisprudência do Conselho de Contribuintes e da extinta Divisão do Imposto de Renda (vide decisões no item, citadas em 6 (906) retro).

Também a doutrina não dá abrigo à tese afinal adotada, como se vê no lúcido comentário de TITO REZENDE, que adiante se transcreve, no sentido de não caber a retenção do imposto sobre juros por serem os mesmos devidos, mas tão-somente quando pagos.

‘Em muitos casos’, diz o saudoso fiscalista, ‘entendeu o Conselho - e acertadamente ante os termos da lei - que não é exigível o imposto sobre os juros de debêntures simplesmente devidos pelas empresas, senão no momento em que forem pagos tais juros. No caso, entretanto, o fisco não está exigindo imposto sobre a totalidade dos juros devidos, mas tão-somente sobre a parte deles que confessadamente foi paga, conforme se vê do balanço anexo ao processo.’

12 (912) Finalmente, a tese adotada pela instância ministerial implica em privar de eficácia palavras usadas no texto legal, contrariando a regra básica de interpretação: ‘Verba cum effectu sunt accipienda’. De fato, a decisão final prolatada no aludido processo (e em outros semelhantes, do interesse do mesmo contribuinte) faz com que quatro dos cinco fatos geradores previstos no transcrito art. 309 do Regulamento do Imposto de Renda, percam, por completo, qualquer efeito. Em realidade, ainda que fosse lexicamente possível – que não é – atribuir-se ao verbo creditar significado igual ao de vencimento da obrigação ou de

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surgimento do crédito pelo decurso do prazo contratual, ficariam vazios de conteúdo os demais verbos consignados no dispositivo legal em tela, quais sejam: pagar, remeter, empregar e entregar.

Guardada a ordem cronológica em que tais fatos ocorrem, é de toda evidência que a ação decorrente de qualquer dos quatro verbos acima enumerados só terá lugar depois de vencida a dívida, ou seja, depois do decurso do prazo contratual. Assim, alçado o vencimento da dívida à categoria de fato gerador da obrigação tributária respectiva, jamais se dará a hipótese de qualquer dos atos pagar, remeter, empregar ou entregar o rendimento poder constituir exteriorização do fato gerador (como quer a lei) da obrigação tributária respectiva, porque o vencimento do débito lhes antecederá sempre.” (parte dos grifos é composta por destaques do original)

Todos esses escólios da melhor doutrina da tributarística não deixam de ter forte fundamento legal no ordenamento jurídico total, como não poderia deixar de ser.

Realmente, no tocante a pagamento e a crédito, ambos submetidos às mesmas exigências intrínsecas acima explanadas, até porque crédito é quase- pagamento, há que se ter em vista que a visão acima exposta afina-se perfeitamente com a teoria geral das obrigações, tal como inclusive está expressa na nossa lei civil.

Realmente, a luz do art. 304 do Código Civil 10, pagamento é modo ou forma de extinção de obrigação, e não qualquer ato de simples entrega de dinheiro. Assim, não há pagamento quando se entrega moeda a títulos diversos, mesmo em antecipação da liquidação de uma dívida futura, ou de uma dívida ainda não vencida.

Para deixar clara a distinção, vale observar que a antecipação de pagamento ocorre quando a parte que a recebe ainda não adquiriu o direito ao

10 Que reza: “Qualquer interessado na extinção da dívida pode pagá-la, usando, se o credor se opuser, dos meios conducentes à exoneração do devedor”. No Código Civil de 1916 era o art. 930.

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pagamento, e, no âmbito tributário, ainda não tem a disponibilidade jurídica da renda representada pelo pagamento, porque ainda está obrigada a cumprir a sua prestação de direito privado, de modo que somente a partir do cumprimento desta lhe nasce o respectivo direito ao pagamento e à renda. Na verdade, quem recebe antecipadamente ao cumprimento da sua obrigação, coloca-se na situação de devedor de uma nova obrigação, que é a de restituir o valor adiantado caso não cumpra o seu dever de direito privado, do qual o pagamento é contraprestação, e somente se torna verdadeiro dono dessa importância – dispondo econômica e juridicamente da respectiva renda – a partir de quando cumprir esse dever.

Portanto, a alusão, na lei tributária, ao termo jurídico “pagamento”

importa em compreendê-lo exatamente por seu significado jurídico, isto é, como modo de extinção de uma obrigação, e por isso não há pagamento quando ainda não haja obrigação. Esta é uma imposição inclusive do art. 109 do CTN.

Vê-se que no campo tributário, atenta inclusive ao disposto nesse artigo do código, a Lei n. 9532 não se afastou deste aspecto básico do direito privado, quando, tratando dos eventos geradores da obrigação tributária, especificou dever tratar-se “do pagamento ou do crédito em conta representativa de obrigação da empresa no exterior” (letra “b” do parágrafo 1º do art. 1º).

E percebe-se como a doutrina tributária e a jurisprudência administrativa sobre o conceito de disponibilidade estavam e estão sustentadas em sólido fundamento jurídico.

Portanto, pode-se retornar à consideração anterior, ou seja, a de que pagamento é ato positivo da pessoa que o efetua, clareado com o detalhe de ser ato pelo qual essa pessoa solve uma dívida por obrigação já existente.

Afinal de contas, o pagamento somente pode ser feito pela pessoa que deve, ou por alguém em seu nome e por sua conta. E o crédito também só pode ser feito pela pessoa que deve, pois se trata de ato seu, interno a ela.

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III – INICIAÇÃO AOS CONCEITOS DE REMESSA, ENTREGA E EMPREGO DA RENDA – SUA IDENTIFICAÇÃO COM PAGAMENTO DA RENDA, E ELEMENTOS COMUNS A ELES, E TAMBÉM AO CRÉDITO DA RENDA

Como já foi apontado, há três outros eventos previstos na lei tributária que determinam o nascimento da obrigação tributária cujo objeto seja o imposto de renda, tanto o cobrado na fonte quanto o incidente sobre lucros advindos de controladas ou coligadas no exterior.

São eles a remessa, a entrega e o emprego da renda.

Pode-se dizer, sem erro, que os três possuem (1) a mesma qualidade de representarem pagamento extintivo de obrigação, e também (2) a mesma virtude de representarem pagamento que finaliza a ocorrência do fato gerador.

Em termos simples, para depois nos aprofundarmos um pouco mais, podemos dizer que:

- a remessa consiste no envio do dinheiro para o beneficiário de um pagamento, sendo que esse termo geralmente é reservado para utilização quando se trata de transferência de moeda para o exterior (ou de um país para outro), onde se encontra o beneficiário;

- a entrega reside no ato físico de passar o dinheiro do pagamento para as mãos do beneficiário ou de alguém por ele autorizado a receber, embora para os fins presentes, segundo a definição do art. 1º da Lei n. 9532, se trate apenas de passagem do dinheiro a representante do beneficiário;

- o emprego é a utilização do dinheiro do pagamento em alguma finalidade de interesse do beneficiário, correspondendo a um ato da fonte pagadora, de dar uso ao dinheiro em nome e por conta do beneficiário, geralmente sob instrução deste.

No fundo, portanto, esses três tipos de atos correspondem a maneiras ou espécies de efetivação de pagamento, tanto que leis tributárias mais recentes omitem referência à remessa, entrega ou emprego, contentando-se em

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aludir apenas a pagamento ou crédito como os eventos nos quais a fonte deve reter o imposto.

E, como espécies de pagamento, remessa, entrega e emprego também se amoldam à figura a que alude o art. 304 do Código Civil (art. 930 da anterior codificação).

Tanto é assim, também, que a própria Lei n. 9532 coloca esses três eventos dentro da espécie “pagamento” (veja-se a letra “b” do parágrafo 2º do art. 1º), em contraposição a “crédito” (tratado na letra “a”), além de mencionar crédito em conta bancária que, à toda evidência, é pagamento, não em mãos, mas em conta do próprio recebedor.

Aqui há um aspecto relevante, sobre o qual se precisa deter um pouco mais antes de avançar no estudo desta matéria.

Realmente, todas as prescrições do parágrafo 2º do art 1º da Lei n.

9532, relacionadas a crédito, pagamento, remessa, entrega e emprego, estão encimadas pelo “caput” do mesmo artigo, onde o dispositivo determina a tributação dos lucros “em 31 de dezembro do ano-calendário em que tiverem sido disponibilizados para a pessoa jurídica domiciliada no Brasil” (grifo aposto).

E também estão sob a disposição do próprio parágrafo 1º do art. 1º, segundo o qual “para efeito do disposto neste artigo, os lucros serão considerados disponibilizados para a empresa no Brasil: ..., no caso de controlada ou coligada ..., na data do pagamento ou do crédito ...” (grifos acrescidos).

Portanto, o fato gerador somente ocorre quando houver disponibilização, e disponibilização somente ocorre quando haja pagamento ou crédito. Daí, e já por aí, ser claro que os eventos remessa, entrega e emprego são tipos ou modalidades de pagamento, o que vem depois a ser clarificado e expresso no prosseguimento do dispositivo, quando a letra “b” do parágrafo 2º define que é “pago o lucro, quando ocorrer” o crédito em conta bancária, a entrega, a remessa e o emprego.

Na compreensão da relevância dessa ordem pela qual se apresenta o dispositivo legal não se pode olvidar que os parágrafos são seqüências

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sistemáticas de uma disposição completa, a qual se inicia na cabeça do artigo e se espraia por todos os seus parágrafos e itens, sendo que estes somente se prestam a complementar o disposto no “caput” ou a estabelecer exceções ao mesmo.

Com efeito, as diretrizes de hermenêutica jurídica, inclusive adotadas jurisprudencialmente11, sempre prescreveram que os parágrafos subordinam-se ao “caput” do dispositivo, do qual são normas dependentes ou complementares.

Como normas dependentes ou complementares do “caput”, os parágrafos são verdadeiras sub-ordens em relação à ordem principal emanada do “caput”, ou por este iniciada, uma verdadeira sequência de prioridade ou importância de disposições, começando pela mais importante e se desdobrando nas complementares de menor importância.

Mesmo quando não se trate de uma espécie de hierarquia pela qual a norma principal seja aquela contida no “caput”, certamente o conjunto de disposições contidas no “caput” e nos parágrafos de um mesmo artigo devem se

11 Por exemplo, o Parecer n. SR-70, de 6.10.1988, do Consultor Geral da República (DOU de 7.10.1988, p. 19675 e seg.), com fulcro da doutrina de Vicente Ráo, afirmou:

“Sabemos que o parágrafo é, tecnicamente, o desdobramento do enunciado principal, com a finalidade de ordená-lo inteligentemente ou excepcionar a disposição principal.

Ordenando ou excepcionando, sempre se refere ao ‘caput’: ‘... em sentido técnico- legislativo indica a disposição secundária de um artigo, ou texto de lei, que, de qualquer modo,, completa ou altera a disposição principal, a que se subordina. Comumente, o conteúdo do parágrafo deve ligar-se e sujeitar-se à prescrição contida na disposição principal, como o particular ao geral. Também usa o legislador, com frequência, dispor a matéria em sucessão lógica, unindo o sentido de cada parágrafo ao do parágrafo anterior e o de todos os parágrafos ao do texto principal do artigo.’ (Vicente Ráo, ‘O Direito e a Vida dos Direitos’, vol. I, p. 326)’”. O Supremo Tribunal Federal, Pleno, no mandado de injunção n. 60-3 (AgRg), decidido em 12.9.1990, considerou caso concreto afirmando “o parágrafo estar jungido ao regime jurídico único de que cogita o ‘caput’”. O Ministro Moreira Alves, votando no recurso extraordinário n. 146615-4-PE, julgado em 6.4.1995 pelo Plenário do Supremo Tribunal, afirmou “que é princípio de hermenêutica jurídica que, quando os parágrafos, no tocante a hipóteses determinadas, as disciplinam deferentemente da regra geral contida no ‘caput’ do mesmo dispositivo, aqueles devem ser interpretados, sempre que possível, como exceções a este”.

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unir para formar um todo integrado de comandos normativos, tendo um objeto comum. Muitas vezes, a disposição da lei vai se “esparramando” pelo “caput” e por seus parágrafos, para melhor e mais ordenada redação, e para sua total expressão, que somente termina no final do artigo integral, isto é, no final do seu último parágrafo e do seu último item.

Também é possível que os parágrafos exprimam situações de exceção à norma do “caput”, mas sempre mantendo com ele um conjunto normativo integrado e destinado a objeto comum.

A recomendação doutrinária quanto a tal método de técnica legislativa acabou por se transformar em lei, quando a Lei Complementar n. 95, de 26.2.1998, disciplinadora do processo legislativo, estabeleceu no seu art. 11, inciso III, letra “c”, que os parágrafos devem expressar os aspectos complementares à norma enunciada no “caput”, ou as exceções à regra por este estabelecida.

E essa lei complementar não pode ser relegada a segundo plano, pois representa importante papel no ordenamento jurídico vigente, eis que decorreu do disposto no parágrafo único do art. 59 da Constituição Federal, segundo o qual “lei complementar disporá sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis”.

Portanto, hoje em dia, para a feitura das leis a vinculação dos parágrafos ao “caput” é norma jurídica. E hoje, como sempre, a mesma vinculação deve ser considerada no processo de interpretação das leis.

O que se constata, assim, é que no art. 1º da Lei n. 9532 há uma só disposição – a de que os lucros somente podem ser tributados quando forem disponibilizados aos respectivos beneficiários –, e os seus parágrafos e itens vêm em complemento dessa disposição central, dizendo que a disponibilização somente ocorre por pagamento ou crédito e dando os contornos complementares à disponibilização e às suas várias espécies por eles tratadas, de modo que todas as espécies carregam consigo o mesmo conteúdo intrínseco de haver a disponibilização da renda através de pagamento ou crédito feito pela fonte ao respectivo beneficiário.

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Não só a letra do art. 1º leva a isto, mas também a natureza jurídica dos atos de pagamento e de crédito, e ainda porque, se há disponibilização dos lucros, alguém tem que ser o agente da disponibilização, qualquer que seja a sua espécie, e esse alguém somente pode ser a própria controlada ou coligada no exterior (a fonte pagadora, assim como ocorre com o imposto de fonte), já que os lucros foram gerados por ela e pertencem a ela, ninguém podendo, salvo ordem judicial, apoderar-se deles.

Nem se pense, no caso de controle de uma pessoa jurídica por outra, que o fato da controladora deter o poder de mando sobre a controlada possa desmentir esta afirmação, primeiramente porque as respectivas personalidades jurídicas são distintas, e em segundo lugar porque mesmo o exercício do poder de comando depende da prática de atos formal e substancialmente regidos pelo direito, sendo o direito no caso configurado no estatuto da controlada e expresso na lei do país em que esta se situa. Assim sendo, enquanto o ato de disponibilização dos lucros da controlada não for praticado com observância das normas estatutárias e legais a ele aplicáveis, os lucros pertencem à controlada, e apenas pela prática desse ato eles podem ser dados como distribuídos à controladora, para, somente depois, poderem ser pagos ou creditados a esta. 12

Claro que o mesmo ocorre com as coligadas.

Por conseguinte, somente há pagamento ou crédito dos lucros se eles primeiramente tiverem sido autorizados à distribuição com observância da lei local e do estatuto da controlada ou coligada no exterior, para que depois possam ser pagos ou creditados à controladora ou coligada no Brasil.

Daí que os tributos brasileiros sobre lucros de controladas ou coligadas no exterior somente podem ser exigidos quando eles forem disponibilizados para as suas controladoras ou coligadas no Brasil, e isto somente ocorre através de crédito ou de pagamento dos mesmos a estas, sendo que remessa, entrega ou emprego são espécies de pagamento.

12 Ademais, nem sempre o controle é total, podendo não haver vontades coincidentes dentro do grupo controlador. Por outro lado, a mesma norma também se aplica às coligadas.

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Seja como for, em todas essas maneiras de pagamento, como já dito quanto aos atos de creditar e de pagar, deve sempre estar presente aquela exigência de se tratar de cumprimento de uma obrigação de direito privado, já existente para a pessoa devedora e já vencida.

E todas elas também correspondem necessariamente a atos positivos, isto é, a ações concretas, da pessoa que credita ou paga, inclusive por remessa, entrega ou emprego.

De tudo quanto foi dito a propósito dos atos de pagamento, entrega, emprego, remessa e crédito, sobressai, portanto, uma constatação relevante e constante: trata-se de que todos eles representam ações positivas da fonte para solver uma obrigação existente perante o titular da renda ou do provento, de tal modo que todos eles se caracterizam pela participação ativa da fonte quando procede à retirada de recursos do seu patrimônio para disponibilizá-los ao beneficiário da renda ou provento tributável.

Em outras palavras, todas as cinco hipóteses legais carregam consigo a mesma característica de serem maneiras de a fonte devedora de uma dívida, que representa renda para o respectivo credor, disponibilizar essa renda ao credor-contribuinte, no caso, para que os lucros da controlada ou coligada no exterior estejam por ela disponibilizados à sua controladora ou coligada no Brasil.

IV – ATENÇÃO ESPECIAL A ENTREGA E EMPREGO DA RENDA Já foi apontado no capítulo introdutório deste estudo que os conceitos de “entrega” e “emprego” ganharam atenção especial na interpretação e aplicação do art. 1º da Lei n. 9532, tendo eles passado sem maiores cuidados quando outrora se tratou do imposto de renda na fonte, a despeito de que, a propósito deste, os conceitos até aqui explanados imperaram na solução de todos os pontos de dúvida e de todos os conflitos que se estabeleceram.

Assim, para o presente trabalho importa dar atenção especial ao disposto nos n. 2 e 4 da letra “b” do parágrafo 2º do art. 1º da Lei n. 9532, relativos à entrega e ao emprego dos lucros de controladas ou coligadas no exterior.

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Relembremos que os referidos itens aludem expressamente a

“entrega, a qualquer título, a representante da beneficiária” e a “emprego do valor, em favor da beneficiária, em qualquer praça, inclusive no aumento de capital da controlada ou coligada, domiciliada no exterior”.

Uma primeira observação é a iniludível percepção, na própria redação da lei, da presença daquele elemento fundamental de participação ativa da controlada ou coligada no exterior na colocação dos seus lucros à disposição da controladora ou coligada no Brasil, mediante emprego dos mesmos.

Realmente, é a controlada ou coligada no exterior que faz a “entrega, ..., a representante da beneficiária” ou o “emprego, em favor da beneficiária”.

Trata-se de um conceito simples, pois, se há entrega ou emprego, e em favor de alguém (da beneficiária), deve haver uma outra pessoa que seja a autora desse ato, e essa pessoa somente pode ser aquela que detenha a posse dos recursos a serem entregues a representante da beneficiária, ou a serem empregados em favor desta. No caso, somente a controlada ou coligada no exterior é que pode fazer a entrega ou o emprego dos seus lucros em favor da sua controladora ou coligada no Brasil.

Nem pode ser diferente, pois se a entrega é para representante da beneficiária e o emprego é em favor da beneficiária, tais atos somente podem ser praticados pela fonte de origem, geradora da renda e devedora da obrigação de efetuar o pagamento no qual a renda está embutida.

Ademais, entrega e emprego são espécies de pagamento, e pagamento é feito por quem deve.

Também é relevante constatar uma particularidade presente nos dois conceitos:

- a entrega pode ser dar por múltiplas formas, tanto que a própria lei alude à entrega a qualquer título;

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- o emprego dos lucros também pode se dar por múltiplas formas, das quais o aumento do capital da própria controlada ou coligada, citado no dispositivo legal, é apenas uma delas.

Abra-se um parêntesis para dizer que não se deve confundir esta afirmação com qualquer ideia de que as formas de disponibilização dos lucros, previstas no art. 1º da Lei n. 9532, seriam meramente exemplificativas.

O que ocorre é que essa lei arrola taxativamente as hipóteses de disponibilização aplicáveis aos lucros auferidos no exterior, que são apenas cinco, ou melhor, são duas - crédito e pagamento -, sendo esta última hipótese subdividida em quatro hipóteses, que são o pagamento propriamente dito, inclusive em conta bancária, a remessa, a entrega e o emprego.

Não obstante a taxatividade da lei, é possível em cada uma das hipóteses de disponibilização que mais de uma situação esteja embutida.

O próprio pagamento, em sua forma direta e originária, pode vir a ser substituído pela dação de algum bem em pagamento da obrigação.

Em suma, a taxatividade das espécies de disponibilização decorre de que a lei alude a crédito ou pagamento “numerus clausus”, e seria mesmo inviável ampliar os meios de liquidação (ou quase-liquidação) de obrigações além desses dois.

Não obstante, a amplitude de cada uma das hipóteses deriva do conteúdo de cada conceito exprimido, isto é, da possibilidade, inerente a cada um deles, de se manifestar por múltiplas maneiras.

É por isso mesmo que expressões como “a qualquer título” e

“inclusive”, encontradas nos n. 2 e 4 da letra “b” do parágrafo 2º, denotam a amplitude dos conceitos a que aludem.

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Mas isto não significa inexistência de limites, dado que cada conceito se situa dentro de contornos que são inerentes a ele em sua própria identidade, ou seja, em sua identidade jurídica de pagamento. 13

Feito este esclarecimento, fechemos o parêntesis para voltar ao emprego dos lucros da controlada ou coligada no exterior na específica hipótese de capitalização dos mesmos, que o dispositivo legal cita expressamente.

O que importa notar desde logo nessa hipótese é a necessária participação ativa da controlada ou coligada no exterior neste específico ato de disponibilização, porque é ela que aumenta o seu capital e atribui renda aos seus sócios.

E, assim sendo, esta forma especificamente citada na lei bem direciona o entendimento do conceito geral de emprego, pois ela representa uma das maneiras de a controlada ou coligada no exterior ativamente transferir parte dos seus lucros à sua controladora ou coligada no Brasil, fazendo-o não em espécie, mas em novas partes do seu capital social.

E nesse ato de aumento do capital já há obrigação a ser cumprida, pela existência da deliberação societária de capitalização dos lucros. Ainda que tudo ocorra num único ato, há anterioridade lógica da obrigação em relação ao seu adimplemento.

Assim, dissecando-se analiticamente esta específica forma de emprego dos lucros, destacam-se nela duas características básicas e inamovíveis para que haja disponibilização de lucros por emprego, qualquer que seja a sua forma:

- a ocorrência de passagem dos lucros da controlada ou coligada no exterior para a titularidade da controladora ou coligada no Brasil;

- a participação ativa da controlada ou coligada no exterior nessa passagem.

13 Mais adiante será feita nova alusão a este aspecto da taxatividade.

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E tais características básicas também estão detectadas na disponibilização dos lucros por meio de crédito ou de outros estilos de pagamento, sendo que entrega e emprego não passam de tipos ou formas de pagamento, tudo isto como visto anteriormente.

Daí, qualquer que seja a maneira pela qual haja a entrega ou o emprego dos lucros da controlada ou coligada no exterior, em todas elas estarão necessariamente presentes as mesmas características.

Resta, então, verificar outras possíveis maneiras ou formas de efetivação da entrega ou do emprego de lucros pela controlada ou coligada no exterior em favor da sua controladora ou coligada no Brasil, atos estes que perante a lei sempre serão catalogados como espécies de pagamento, não apenas por sua efetiva natureza jurídica quanto porque assim está expresso no art. 1º, parágrafo 2º, letra “b”, da Lei n. 9532.

Comecemos por “emprego”, porque apresenta certas particularidades mais complexas, para depois vermos “entrega”.

Pois bem emprego é pagamento porque a expressão “emprego do valor, em favor da beneficiária” refere-se necessariamente ao emprego dos lucros, por qualquer meio, pela controlada ou coligada no exterior, em favor da sua controladora ou coligada no País, para pagar uma dívida dela, ou seja, para pagar lucros já devidos à sua controladora ou coligada.

Isto é assim, e desencadeia o nascimento da obrigação tributária, porque o emprego de lucros é um ato que, quando ocorre, reflete uma realidade na qual os lucros foram efetivamente pagos através da sua utilização, por alguma maneira, em favor da beneficiária, sendo razoável que o legislador equipare, para fins do disposto no art. 1º da Lei n. 9532, esse “emprego do valor” ao efetivo e direto pagamento dos lucros.

E é assim, também, porque o emprego pressupõe a existência da obrigação da controlada ou coligada no exterior perante a sua controladora ou coligada no Brasil, nascida de um ato jurídico mediante o qual a controladora ou coligada no Brasil pode exigir que a controlada ou coligada no exterior lhe transfira parte (ou a totalidade) do seu lucro.

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Note-se mais uma vez que o “emprego do valor” é uma forma indireta de pagamento, pois, ao invés de os lucros serem distribuídos e pagos diretamente à controladora ou coligada no Brasil, são autorizados à distribuição, pelos meios legais e estatutários cabíveis, e são empregados pela própria pessoa jurídica distribuidora em nome e por conta da controladora ou coligada que já estava intitulada ao seu recebimento.

Somente assim há o que a lei diz, ou seja, “emprego do valor, em favor da beneficiária”.

Sem dúvida, ante os já apontados pressupostos fundamentais da tributação, o denominador comum de todas as espécies de disponibilização dos lucros, elencadas no parágrafo 2º do art. 1º da Lei n. 9532, é a existência de uma distribuição autorizada de lucros, da qual nasce o direito dos sócios da pessoa jurídica no exterior ao seu recebimento, seguida da satisfação (cumprimento da obrigação) desse direito por uma das formas lá citadas, quais sejam:

- crédito em conta do passivo exigível da controlada ou coligada no exterior, em favor da controladora ou coligada no Brasil, conta esta que a lei ainda se encarrega de dizer expressamente ser representativa de obrigação da controlada ou coligada no exterior;

- crédito feito pela controlada ou coligada no exterior em conta bancária da controladora ou coligada no Brasil, esteja essa conta no Brasil ou no exterior;

- entrega, pela controlada ou coligada no exterior, do respectivo valor a um representante da controladora ou coligada no Brasil, em favor desta;

- remessa do respectivo valor, pela controlada ou coligada no exterior, ao Brasil ou para qualquer outra praça, em favor da controladora ou coligada no Brasil.

Releia-se a alínea “a” e os n. 1, 2 e 3 da alínea “b” do parágrafo 2º para se confirmar estas assertivas, pelas quais se constata que no crédito e em todos esses tipos de pagamento está presente a participação ativa da controlada

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ou coligada no exterior quando disponibiliza seus lucros à sua controladora ou coligada no Brasil.

Com o emprego dos lucros – objeto do n. 4 da alínea “b”, e que diz

“emprego do valor, em favor da beneficiária, em qualquer praça” - outra não é a situação, eis que o emprego e as demais formas acima referidas são espécies de um mesmo gênero, o qual se denomina “disponibilização dos lucros por pagamento” pela pessoa jurídica que os gerou, em favor da sua controladora ou coligada no País.

Aliás, já foi vista neste mesmo capítulo a sequência normativa do art.

1º da Lei n. 9532, inclusive à luz do que dispõe o art. 11 da Lei Complementar n.

95, ou seja:

- todas as referidas prescrições relativas a pagamento, crédito, remessa, entrega ou remessa dos lucros estão encimadas pelo “caput” do art. 1º, que determina a tributação dos lucros “em 31 de dezembro do ano-calendário em que tiverem sido disponibilizados para a pessoa jurídica domiciliada no Brasil”;

- as mesmas prescrições também estão subordinadas ao disposto no próprio parágrafo 1º do art. 1º, segundo o qual “para efeito do disposto neste artigo, os lucros serão considerados disponibilizados para a empresa no Brasil: ..., no caso de controlada ou coligada ..., na data do pagamento ou do crédito ...”;

- no art. 1º da Lei n. 9532 há uma só disposição – a de que os lucros somente podem ser tributados quando forem disponibilizados aos respectivos beneficiários –, e os seus parágrafos e itens vêm em complemento dessa disposição central, com os contornos complementares à disponibilização em suas duas espécies, que são crédito ou pagamento;

- o que significa que o fato gerador somente ocorre quando houver disponibilização, e disponibilização somente ocorre quando haja pagamento ou crédito, sendo que emprego, assim como remessa e entrega, é forma de pagamento.

Por conseguinte, tanto quanto a crédito e a outras formas de pagamento, somente há emprego dos lucros se eles primeiramente tiverem sido

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autorizados à distribuição com observância da lei local e do estatuto da controlada ou coligada no exterior, e, ao depois, não tendo sido pagos diretamente à controladora ou coligada no Brasil, o tenham sido indiretamente mediante a sua utilização (o seu emprego) em outra operação realizada pela controlada ou coligada no exterior e na qual a controladora ou coligada no Brasil seja a beneficiária.

Na verdade, quando a hipótese é de emprego dos lucros, o fato gerador se forma pelo binômio “emprego pela controlada ou coligada no exterior – em favor da controladora ou coligada no Brasil”.

Este binômio, que exsurge do ordenamento jurídico integral, no caso está devidamente exprimido na norma especial, que alude a ele com a expressão

“emprego do valor, em favor da beneficiária”.

E, como dito acima, há uma pessoa agente da disponibilização e autora do emprego em favor da beneficiária: essa pessoa é a controlada ou coligada no exterior.

A partir disso não é difícil verificar que a entrega dos lucros também está sujeita às mesmíssimas considerações para que o respectivo conceito seja entendido, e até fica menos complexo perceber que se trata de uma ação positiva de autoria exclusiva da fonte de origem dos lucros quando se lê na letra “b” e no n. 2 do parágrafo 2º do art. 1º que é “pago o lucro, quando ocorrer”“a entrega, ..., a representante da beneficiária”.

Portanto, quanto à entrega o binômio legal é “entrega, ... ,a representante da beneficiária”, sendo que a controlada oucoligada no exterior é a pessoa agente do ato de entrega.

Estes, pois, os elementos fundamentais com base nos quais deve ser enfrentada toda em qualquer questão específica relacionada às cinco formas de disponibilização de renda ou provento, inclusive de lucros de controladas e coligadas no exterior, e, em especial, as questões em que se trate de entrega ou de emprego de tais lucros.

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Contudo, nos próximos capítulos serão acrescentadas outras considerações relevantíssimas sobre o tema, as quais poderiam estar aqui, mas são destacadas em momentos mais oportunos deste estudo. 14

V – A ALIENAÇÃO DE PARTICIPAÇÃO SOCIETÁRIA EM CONTROLADA OU COLIGADA NO EXTERIOR NÃO REPRESENTA ENTREGA OU EMPREGO DOS SEUS LUCROS, NEM DISPONIBILIZAÇÃO DOS MESMOS – A REDUÇÃO DE CAPITAL DA CONTROLADORA OU COLIGADA NO BRASIL TAMBÉM NÃO

Quando a controladora ou coligada no Brasil aliena a sua participação societária na controlada ou coligada no exterior não ocorre qualquer dos elementos que caracterizam a disponibilização de lucros em geral, nem por entrega ou o emprego em particular, conforme exposto nos capítulos precedentes.

Com efeito, os lucros acumulados pela controlada ou coligada no exterior representam tão somente expectativa de direito para a sua controladora ou coligada no Brasil, isto é, expectativa de ela vir a receber os lucros se distribuídos pela controlada ou controlada, ou “direito futuro não deferido” na dicção do art. 74 do Código Civil de 1916.

A questão da tributação das meras expectativas veio à baila no julgamento do recurso especial n. 320455-RJ, proferido pela 1a Turma em 7.6.2001, no qual se lê o seguinte:

“Do mesmo modo, há de se entender que ‘o fato gerador do imposto de renda é o acréscimo patrimonial mais a respectiva disponibilidade jurídica ou econômica (CTN, art. 43)’. REsp.

181912/PR, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ 03.11.98.

...

14 Não obstante, atente-se para o capítulo relacionado à falsa suposição de que a controladora ou coligada no Brasil possa praticar, ela própria e de per si, o fato gerador por entrega ou emprego dos lucros da sua controlada ou coligada no exterior.

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Partindo de tais pressupostos, sem a necessidade de maiores digressões, de ordem doutrinária, afigura-se-me escorreita a decisão ora objurgada, porquanto é certo que a disponibilidade econômica ou jurídica da renda só ocorre quando houver real acréscimo patrimonial, não cabendo a tributação sobre mera expectativa de ganho futuro e em potencial.”

No caso em julgamento, tratava-se de direito de crédito sujeito à variação cambial, e se discutia quando esta se transformaria em direito definitivo e em renda adquirida e disponível. Portanto, lá estava em causa o regime de competência na sua generalidade e na sua aplicação à pessoa jurídica credora da potencial variação cambial, portanto, sem a necessidade de um ato da devedora, ao passo que aqui se discute específica hipótese de incidência na qual a participação da devedora no ato de disponibilizar é parte integrante. Não obstante esta distinção, mais a seguinte passagem do acórdão é extremamente elucidativa também para a situação aqui abordada, até porque a necessidade da participação da devedora na situação passível de tributação torna ainda mais grave a exigência de não se tratar de mera expectativa de direito:

“Nesse aspecto, a razão está com a recorrida, quando invoca em suas contra-razões, opiniões doutrinárias e precedentes jurisprudenciais em favor da tese defendida, acabando por concluir, ‘in expressis’: ‘Assim, tem-se que, o efeito acréscimo patrimonial, disponibilizado para o contribuinte, não pode ser verificado pelos registros contábeis, mas somente pelo ganho determinado no momento em que a Recorrida cumprir a obrigação financeira, pois é somente nesse momento que ela se beneficia (ou não) com a quantidade de reais necessária para a liquidação da obrigação em moeda estrangeira. Antes disso, os registros contábeis significam, tão-somente, mera expectativa de ganho, que não constitui hipótese de incidência do imposto de renda. Como viu-se acima, a disponibilidade a que se refere o art. 43 do CTN resulta de um fator econômico concreto e atual (dinheiro em caixa por exemplo) ou de um fato reconhecido como tal pelo Direito (um direito reconhecido pela lei, como o direito de crédito). Logo, não há como se falar que meros registros contábeis, que representam tão-somente expectativas de resultado positivo (já que não se sabe se quando a obrigação for cumprida, a variação será positiva ou negativa) constituam um acréscimo patrimonial, e que este, por força do regime de competência, esteja disponibilizado para o

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contribuinte no momento em que registrado; ao contrário, é certo que o contribuinte não dispõe desse ganho, uma vez que ainda não implementado o termo em que deveria cumprir sua obrigação financeira’.”

Assim também com os lucros acumulados em controlada ou coligada no exterior, os quais, quando muito, representam expectativa para sua controladora ou coligada no Brasil de um dia se transformarem em lucros para ela.

Outrossim, por meio da alienação da participação societária na controlada ou coligada no exterior essa expectativa não se transforma em direito adquirido pela controladora ou coligada no Brasil, sobre aqueles lucros.

Neste ponto, é importante recordar que somente com o art. 74 da Medida Provisória n. 2158-35 passou a ser prevista a tributação da mera expectativa de direito sobre os lucros, de modo que não se podia antecipar a aplicação da respectiva norma para atingir fatos anteriores à sua vigência, como eram os casos subsumidos ao art. 1º da Lei n. 9532.

Com efeito, segundo o “caput” do art. 74 “os lucros auferidos por controlada ou coligada no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora ou coligada no Brasil na data do balanço no qual tiverem sido apurados, na forma do regulamento”.

Contudo, o parágrafo único desse artigo determinou que “os lucros apurados por controlada ou coligada no exterior até 31 de dezembro de 2001 serão considerados disponibilizados em 31 de dezembro de 2002, salvo se ocorrida, antes desta data, qualquer das hipóteses de disponibilização previstas na legislação em vigor”.

Portanto, até 31.12.2002 não vigia a norma de disponibilização ficta, mesmo para os lucros apurados até 31.12.2001, salvo se, antes dessa data, ocorresse uma das hipóteses de disponibilização previstas na Lei n. 9532, caso em que não se aguardaria 31.12.2002 para exigir a tributação, ficando esta devida desde a data da ocorrência da situação de efetiva disponibilização.

Referências

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