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O Trabalho como Linguagem: O Gênero no Trabalho

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Academic year: 2023

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O Trabalho como Linguagem:

O Gênero no Trabalho *

Elisabeth S o u za L obo

E ste tex to p e rc o rre u m itin e rá rio dos e stu d o s so b re o tra b a lh o fe m in in o em suas v á ria s p ro b lem ática s e ab o rd ag e n s, p riv i­

leg ian d o alg u m as e as d isc u tin d o à lu z dos e n fo q u e s q u e ilu m in ara m a p ro d u ç ã o no cam p o d a S o ciologia e d a H is tó ria S ocial B rasileira.

E m p rim e iro lu g ar, situ o os esp aço s do tem a n a Sociologia d o T ra b a lh o relacio- n an d o -o às p ro b le m á tic a s d o m in a n tes . Em seg u n d o lu g a r, tra to de re c o n s titu ir as c o n ­ fig u raçõ es e p ro b le m á tic a s n os estu d o s s o b re tra b a lh o fe m in in o e trab a lh a d o ra s , na su a p a rtic u la rid a d e o u n as re la çõ e s com as a b o rd a g e n s da S o ciologia d o T ra b a lh o e d a H is tó ria S ocial, a sa b e r: (a) d o d e se n ­ v o lv im e n to e m o d ern iza ç ão à d iv isão se­

x u al d o tra b a lh o ; (b) d iv isão sex u al do tra b a lh o : q u a lifica çã o , c a rre ira s e su b je tiv i­

d a d e; (c) tra b a lh o s d o g ê n ero n a so cio lo ­ gia d o tra b a lh o .

C ad a u m a d estas três v e rte n te s im p lica q u e stõ es e e n fo q u e s p ró p rio s o u a rtic u la ­ dos u n s aos o u tro s. T ra to d e d isc u tir pelo m enos alg u n s, sem p re te n d e r um le v a n ta ­ m en to ex ten siv o . P a ra c o n c lu ir, v o lto a u m a q u e stão : o g ên ero será m esm o u m a

c ateg o ria de t r a b a lh o 1 n a so ciologia do tra b a lh o ?

1. O Trabalho F em inino na S ociologia do Trabalho Brasileiro

T alv ez em alg u m m o m en to n os fin s da d é ca d a de 70 e in ício d os a n o s 80 tivesse sid o p o ssív el a firm a r q u e h a v ia n o Brasil u m d e b a te p o lítico e c u ltu ra l in te n so sobre o tem a do tra b a lh o fe m in in o e a té m esm o q u e , se a p ro d u ç ã o so ciológica n ão era im p a c ta n te n o c o n ju n to d a d isc ip lin a, pelo m en o s p o d e ria ser c o n sid e ra d a p ro m is­

so ra. 2

M as, se n em do p o n to de v ista q u a n ti­

ta tiv o a p ro d u ç ã o sociológica so b re tr a b a ­ lho fe m in in o se m u ltip lic o u , co m o n o caso de o u tro s países, do p o n to d e v ista q u a li­

ta tiv o a co n teceu a q u i o m esm o p ro b lem a d ia g n o s tic ad o p o r B. B ecalli: “a v ariáv el sexo n ã o tem u m e sta tu to c e n tra l n a so cio ­ logia d o tr a b a lh o ” , 3 e n e m o tem ta m ­ p o u co p a ra a eco n o m ia d o tra b a lh o , o q u e tam b é m o c o rre na Itá lia c o n fo rm e o m esm o diag n ó stico .

* N .E . A p re se n te v e rsão fo i a p re s e n ta d a n o X I V E n c o n tro A n u a l d a A N P O C S , e m o u tu ­ b ro de 1990, q u a n d o o b te v e a p ro v a ç ã o p a ra p u b lic a ç ã o p elo C o n selh o E d ito ria l d o B IB . A a u to ra p re p a ra v a a v e rsão d e fin itiv a q u a n d o fo i c o lh id a p elo a c id e n te q u e re su lto u n a su a m o rte . E m re sp eito ao zelo e à m a n e ira c rite rio sa q u e ,E lizab eth L o b o sem p re im p rim iu ao s seus tra b a lh o s , a E d ito ria d o B IB so licito u p e q u e n o s esc la rec im e n to s a H e le n a H ira ta , R eg in a M o rei, P ao la C a p p ellin , E lin a P essan h a, A lice A b re u e M arco A u rélio G a rcia .

BIB, R io d e Ja n e iro , n . 31, p p . 7-16, 1." se m estre d e 1991 7

(2)

A c o m p a ra ç ã o co m o u tra s o b serv açõ es d e B ianca B ecalli p o d e se r su g estiv a. E la a rg u m e n ta q u e p a r a a A n tro p o lo g ia , p a ra a E co n o m ia d o T ra b a lh o e a té m esm o p a ra a P sicologia o te m a se co lo ca n o c e n tro d a p e sq u isa e m p íric a e d a teo riza ç ão . S eria im p e n sá v el u m a n tro p ó lo g o q u e ignorasse a d iv is ão se x u a l d o tra b a lh o ao e s tu d a r so cied ad es e m q u e o fu n c io n a m e n to da fa m ília e da eco n o m ia se so b re p õ em , o u , n o c as o dos e c o n o m istas d o ;tra b a lh o seria im p o ssív el ig n o ra r a s co n ex õ es e n tre seg­

m en ta çã o do m e rc a d o , d ifere n ça s sa lariais e d iv isão sex u al d o tra b a lh o . N a P sico lo ­ gia, o re c e n te d e b a te in te rn a c io n a l so b re o s m ecan ism o s d e fo rm a ç ã o d o iuízo m o ral n o m as cu lin o e n o fe m in in o lev a a té ao q u e stio n a m e n to d o s p a rad ig m a s d a d isci­

p lin a . N a d a d isso p a re c e o c o rre r n a Socio­

lo g ia d o T ra b a lh o ita lia n a q u e p e rm a n ec e em g ra n d e p a r te p o u c o p erm eáv el à s d is­

cu ssões su s c ita d a s p e la p ro d u ç ã o so b re o tra b a lh o fe m in in o .

E na Sociologia d o T ra b a lh o b ra sile ira ? O s a rg u m e n to s d e B ianca B ecalli a ssin a ­ lam q u e o n ú c le o fo rte d a S o ciologia d o T ra b a lh o — o e stu d o d a fá b ric a , d o s pos­

to s d e tra b a lh o — n ã o in c o rp o ro u a p ro ­ b lem á tica d o tra b a lh o fe m in in o . N a Socio­

logia d o T ra b a lh o b ra s ile ira , o n ú c le o fo rte te rá sido, a té q u a se o fin a l dos an o s 70, o d os e stu d o s so b re o sin d icalism o c o rp o ­ rativo.'* O s e s tu d o s p o ste rio re s s o b re in d u s­

tria liz a ç ã o e a titu d e s o p e rá ria s n ã o se d e ti­

v e ram so b re o tra b a lh o fem in in o . A exce­

ç ão m ais im p o rta n te te rá sid o o e stu d o clássico d e A ziz S im ão q u e n ã o p o r acaso se rá o o rie n ta d o r d e u m a d as p rim e iras teses so b re tra b a lh o fe m in in o .5

P e n s a r p o r q u e o s e stu d o s clássicos so b re a in d u s tria liz a ç ã o e a e s tru tu ra d a classe o p e rá ria b ra sile ira p e rm a n e c e ra m im p e r­

m eáv eis a su a co m p o siç ão se x u a d a exige u m a d isc u ssã o te ó ric a . N a v e rd a d e essa co m p o siç ão foi u m a c a ra c te rís tic a bem n íti­

d a n a classe tra b a lh a d o ra d a P rim eira R e ­ p ú b lic a , o n d e a s o p e rá ria s tê x te is e as co stu re ira s c o n s titu ía m u m p e rc e n tu a l im ­ p o rta n te 8 e, além d e tu d o , p re se n te n as lu ta s o p e rá ria s e n a im p re n sa d o p e río d o , p rin c ip a lm e n te a n a rq u ista .

A q u e stão d a “ in v is ib ilid a d e ” d as o p e ­ rá ria s foi o b je to d e d ife re n te s ab o rd ag e n s:

n u m p rim e iro m o m e n to p ensou-se q u e a

“ v iab iliz aç ã o ” se ria possível a p a r tir da m u ltip lic aç ão d o s e stu d o s so b re as m u lh e ­ res tra b a lh a d o ra s . J. S c o tt a p o n to u as d ifi­

c u ld a d e s da h isto rio g ra fia p o sitiv ista p a ra e x p lic a r p o r q u e a h is tó ria o p e rá ria igno­

ra ra a s m u lh e re s e co m o a m u ltip lic aç ão

d o s estu d o s so b re as o p e rá ria s n ã o m o d i­

ficou as d e fin içõ e s e stab e le c id a s d a s cate­

go rias a n a lític a s .7

D e fa to a an álise d a q u e stã o su p õ e a in te rp e la ç ã o de categ o ria s e m eto d o lo g ias q u e o rie n ta ra m ta n to a h istó ria social q u a n ­ to a so cio lo g ia d o tra b a lh o . E m p rim eiro lu g a r coloca-se a q u e stão q u a se con sen su al de q u e é um fa lso p ro b lem a b u sc a r u m a c a u s a o rig in al d a su b o rd in a ç ã o d a s m u lh e ­ res. Isto sig n ifica o a b a n d o n o d e u m a lógi­

ca cau sal fu n d a d a n u m a e s tru tu ra fa ta lm e n ­ te d e te rm in a n te , p o r u m a an álise c o m p re en ­ siv a q u e c o n stró i sig n ificaçõ es. T rata-se p o is d e p e s q u is a r c o m o a s u b o rd in a ç ã o das m u lh e res se c o n s tru iu h isto ric a m e n te , nas p rá tic a s, n as c u ltu ra s , nas in s titu iç õ e s .8

Sociólogos e h isto ria d o re s tra b a lh a ra m co m u m c o n ce ito d e classe c o n stru íd o a tra ­ vés d e v m a rep resen ta çã o m a scu lin a do o p e rá rio e e m b o ra te n h a sid o afirm ad o in ca n sa v elm en te q u e “a classe o p e rá ria tem do is sex o s” , 9 n a v e rd a d e e ra p re ciso reco ­ n h e c e r q u e a classe era m asculina, o u seja, q u e o c o n ce ito re m e tia a. u m a p o siç ão e s tru ­ tu ra l. A an álise d a s p rá tic a s d iferen ciad o - ras p e rm a n ec ia n u m se g u n d o n ív el d e ex­

p licitação . A p e sa r d o c o n ce ito a p o n ta r p a ra u m p a rad ig m a q u e se p re te n d ia u n iv ers al

— d e classe — os e stu d o s so b re as p r á ti­

c as e a c o n sc iê n cia o p e rá ria s v ã o to rn a r e v id e n te q u e se fu n d a v a n u m a g e n era liz a ­ ção d a s p rá tic a s m ascu lin as.

O cam p o d a so cio lo g ia m a rx is ta e stá b ali­

z a d o p o r alg u n s m arc o s b em defin id o s:

so c ied a d e de classes, a in d u stria liz a ç ã o ca­

p ita lis ta e a lu ta d e classes. A classe, p e n ­ sa d a com o o s u je ito tem u m a s itu aç ão es­

tru tu ra l e p o siçõ es a p e n a s m atiza d as p ela lu ta d e classes q u e p o r su a v e z ex p ressa as fo rm as d e c o n sc iê n cia d e classe. A u n i­

v e rsa lid a d e d a re la çã o d e classe ap en as a d m ite u m a s itu a ç ã o e sp ecífica d as m u lh e ­ res e n q u a n to m ais e x p lo ra d a s fre n te ao u n iv ers al m ascu lin o . M as su a s itu aç ão a m b í­

g u a n o tra b a lh o p ro d u tiv o , n a m e d id a em q u e são p re c a ria m e n te o p e rá ria s , a s exclui d a ciasse o p e r á r ia. 10

E sta n ã o é u m a ab o rd ag e m c ro n o lo g i­

c a m e n te d a ta d a , m as a tra v essa u m a lin h a d e an álise m a rx is ta o rto d o x a , fu n d a d a no e stu d o d as c o n tra d iç õ e s c a p ita l-tra b a lh o e n a c o n sc iê n cia d e classe com o “ co n sciên cia g lo b al d o seu se r so c ial” . 11

O seg u n d o c a m p o im p o rta n te n a socio­

logia d o tra b a lh o e stá c o n stitu íd o pelas ab o rd ag e n s so b re in d u stria liz a ç ã o , d esen­

v o lv im e n to e m o d e rn iz a ç ã o d o m in a n tes até os anos 6 0 /7 0 . Se estes e stu d o s só o casio : n a lm e n te inco rp o ram .,, d e fo rm a d escritiv a o tra b a lh o fe m in in o , é no e n ta n to d e n tro

(3)

d e seu c a m p o teó rico q u e se s itu a m as teses e p e sq u isa s p io n e ira s so b re o tra b a lh o fem i­

n in o re a liz a d a s n o s a n o s 7 0 .12 2 . A Problem atização d o Trabalho

Fem inino

a) D o D e s e n v o lv im e n to e M o d e rn iza ç ã o à D iv isã o S e x u a l d o T ra b a lh o

N o B rasil d o s an o s 60 e d e p a r te d os a n o s 70, a id éia d e q u e as so cied ad es com

“p a rtic ip a ç ã o lim ita d a ”, m a rc a d a s p o r b a i­

x as tax a s d e c resc im e n to e co n ô m ico e p ro ­ fu n d a s d isto rç õ e s n a d istrib u iç ã o d e re n d a , d esig n av am às m u lh e res u m p a p e l su b o r­

d in ad o n a so c ied a d e, se a rtic u la v a com a tra d iç ã o eco n o m icista, p re se n te n o d iscu rso d as C iên c ias S o ciais, q u e d e d u z ia a s u b o r­

d in a ç ã o e co n ô m ica à su b o rd in a ç ã o social d as m u lh e r e s .13

E stas a b o rd a g e n s g u a rd a v a m p o n to s em c o m u m , o rig in a d o s d o p riv ile g ia m e n to da e x p lic aç ão e s tru tu ra l n a an álise d os tr a b a ­ lh o s fe m in in o s e n a re fe rê n c ia às d ic o to ­ m ias tra d ic io n a lis m o /m o d e rn iz a ç ã o , su b d e ­ s e n v o lv im e n to /d e s e n v o lv im e n to . S e g u n d o su a ló g ica, a s u b o rd in a ç ã o d a s m u lh e re s , p ró p ria às so cied ad es tra d ic io n a is , se re so l­

v eria p e la m o d e rn iz a ç ã o /d e s e n v o lv im e n to das fo rça s p ro d u tiv a s , o u ao c o n trá rio , a m o d e rn iz a ç ã o e o d e se n v o lv im en to c a p ita ­ lista a c e n tu a v a m a s u b o rd in a ç ã o d a s m u ­ lh ere s n a s o c ied a d e de classe e su a e x clu ­ são do m erc ad o de tra b a lh o in d u s tria l (tese d e S a ffio tti) e d a p ro d u ç ã o a g ríc o la (tese de M a d e ira e S in g er).

A an álise do tra b a lh o fe m in in o p a rtia de u m a e v id ê n cia e m p írica — a d im in u i­

ção d a m ão-de-obra fe m in in a n a in d ú s tria têx til d u ra n te os an o s 50, 60 e 70, e na a p lic a ç ã o d a h ip ó te se d e M arx s o b re a fo rça d e tra b a lh o fe m in in a c o m o p a r te d o e x érc ito in d u s tria l d e re se rv a . A h ip ó te se p arecia p e rtin e n te u m a vez q u e e fe tiv a ­ m e n te se o b se rv o u u m d e cré sc im o d a m ão- d e -o b ra fe m in in a n a in d ú s tria e q u e as c a ra c te rís tic a s d a in se rç ã o d a s m u lh e re s n o tra b a lh o in d u s tria l c o rre sp o n d ia m a u m p e r­

fil de in te rm itê n c ia , b a ix a s q u a lific a ç õ e s e b aix o s sa lário s, u m p e rfil q u e C h e iw a S p in d e l c a ra c te riz a ra c o m o o d e “ tr a b a ­ lh a d o re s d e m e n o r v a lo r”, u tiliz a d a s pelo cap italism o c o m o e x c e d e n te d e m ão -d e-o b ra su b m e tid a s a a lta s ta x a s d e e x p lo r a ç ã o .14

E stas p e sq u isa s c o n trib u íra m larg a m e n te p a r a o p ro cesso d e “ v isib iliz a ç ã o ” d o tr a ­ b a lh o fe m in in o , e s u a s h ip ó te se s s o b re as m u lh e re s c o m o e x é rc ito in d u s tria l d e re­

se rv a só fo ra m c o n te s ta d a s q u a n d o a p ro ­

b lem á tica d a d iv isão sexual d o tr a b a lh o foi d e se n v o lv id a já n o s an o s 80.

N o e n ta n to , o q u a d ro ex p lic ativ o da

“ m o d e rn iz a ç ã o ” — co m o “ p ro c esso co m ­ p lex o e c o n tra d itó rio d e m u d a n ç a s o c o rri­

d a s n o p aís n as e s tru tu ra s p ro d u tiv a s , n as fo rm a s d e o rg a n iz aç ã o d o tr a b a lh o e nas relaçõ es so ciais (e n tre classes, .e n tre sexos) e q u e c o n d u z ira m a s o c ied a d e b ra s ile ira à c o n fig u ra ç ã o p re d o m in a n te m e n te c a p ita lis­

ta e in d u s tria l” 15 p e rm a n e c e u c o n stan te n u m seg u n d o tip o d e ab o rd ag e m so b re o tra b a lh o fe m in in o — d e sta v e z p e lo ân g u lo d a “ re p ro d u ç ã o d a s d e s ig u a ld a d e s ” e das

“ estratég ia s d e s o b re v iv ê n c ia ” .

A fo rm u la ç ã o d essa p ro b le m á tic a re fle te já a p re o c u p a ç ã o q u e in v a d e a s C iên cias S o ciais n o B rasil d os a n o s 70 e m to rn o das tra n s fo rm a ç õ e s n as relaçõ es e co n ô m icas e so ciais — m ig ra ç ã o , d e g ra d a ç ã o d os salá­

rio s reais, in d u stria liz a ç ã o a c e le ra d a. Elas e stão n a ra iz d a e x p a n s ã o d o tra b a lh o fe­

m in in o e in fa n til, p e rc e p tív e l n o fin al da d é c a d a . M as o o b jetiv o fu n d a m e n ta l é a in d ag a çã o so b re o sig n ificad o d o tra b a lh o fe m in in o p a r a a o rg a n iz aç ã o f a m ilia r .111

E stes e s tu d o s tra z e m u m a c o n trib u iç ã o fu n d a m e n ta l po is asso ciam fa m ília e tra ­ b a lh o . N o e n ta n to , a re fle x ã o te n d e a p ri­

v ileg iar a o rg a n iz a ç ã o fa m ilia r, e seu p ro ­ jeto estratég ic o , s u b s u m in d o in te g ra lm e n te a s m u lh e re s co m o a to re s sociais. P e rm a ­ nece isto sim a re la çã o e n tr e v id a fa m i­

lia r e m erc ad o d e tra b a lh o e a d ife re n ­ c ia çã o n a fo rm u la ç ã o d a s e stratég ia s fa m i­

liares se g u n d o as d ifere n cia çõ e s d os g ru p o s sociais. N o v a m en te n ã o se tra ta d e um a lin h a de ab o rd ag e m d a ta d a , m as q u e in fo r­

m a fu n d a m e n ta lm e n te as p e sq u isa s sobre m erc ad o d e tra b a lh o . U m a p e sq u isa re ce n ­ te so b re m e rc a d o d e tra b a lh o n a G ra n d e S ão P a u lo re to m a alg u m as teses so b re a a rtic u la ç ã o tra b a lh o p ro d u tiv o e e sp a ço de re p ro d u ç ã o — a fa m ília , e d o tra b a lh o fe m in in o co m o p a r te d a e stratég ia fa m ilia r, s e n d o o rg a n iz a d o p e lo g ru p o fa m ilia r, a c re sc e n ta n d o co m o te rc e ira c ara cte rística b á sica e e s tru tu ra l so b re a n a tu re z a d o tra ­ b a lh o fe m in in o o fa to d e q u e ele se in se­

re n o q u a d ro d a D iv isão S ex u al d o T r a ­ b a lh o d e c o rre n te d a d iv isão sex u al dos p a p éis n a s o c ie d a d e .17

A im p o rtâ n c ia d e sta a b o rd ag e m em te r­

m o s d e “ v ia b iliz a ç ã o ” é n o v a m e n te in d is ­ c u tív e l, n o e n ta n to , o p ro b le m a c o n siste na v isão e s tru tu ra l so b re a n a tu re z a d o tr a b a ­ lh o fe m in in o o q u e im p e d e a p ro b le m a ti­

z aç ão d as fo rm as h istó ric a s e c u lfu ra is da d iv isão se x u a l d o tra b a lh o e fixa-as em term o s d e re p ro d u ç ã o d os p a p é is sociais.

9

(4)

b) D ivisã o S e x u a l d o T ra b a lh o : as m e ta ­ m o rfo se s d e u m a p ro b le m á tic a

A s p e sq u isa s so b re o tra b a lh o fe m in in o a rtic u la d a s à d in âm ica do m ercad o de tr a ­ b a lh o a p o n ta ra m a se g reg a ç ãç o c u p a c io n a l

— os g ra n d e s “ g u eto s o c u p a c io n a is” da m ão -d e-o b ra f e m in in a .18 E ste p ro b le m a se vê re fo rç a d o p elas teses so b re a seg m en ta­

ç ão d o m erc ad o d e tra b a lh o q u e in clu iu as m u lh e res n o s g ru p o s d e m ão-de-obra se c u n d á ria — c a ra c te riz a d o s p e la in stab ili­

d a d e , b aix o s s a lá rio s e d e s q u a lific a ç ã o .19 O s e stu d o s so b re m erc ad o d e tra b a lh o in clu em a v a riá v e l fe m in in a, m a s só aque- las(es) m ais p a rtic u la rm e n te p re o c u p a d a s (os) co m o tr a b a lh o fe m in in o v ã o se in te r­

ro g a r m ais d e tid a m e n te so b re a relação s e x o /m e rc a d o .

P o r o u tro lad o , n o c o n te x to d a S o cio lo ­ gia d o T ra b a lh o b ra sile ira se desen v o lv e n o in ício d o s a n o s 80 a p esq u isa so b re p ro ­ cesso de tra b a lh o , e o rg a n iz aç ã o d o tr a b a ­ lh o fa b ril. N ã o se tra ta a q u i de a n a lis a r em d e ta lh e c o m o este n ú c le o d u ro da so­

ciologia d o tra b a lh o se c o n stitu i e se e x ­ p a n d e , as in flu ê n c ia s e tra je tó ria s d e su a c o n stitu iç ã o co m o c a m p o d e p e sq u isa . O c e rto é q u e p a s s a a se r u m a te m á tic a im ­ p o rta n te e o n d e o s e stu d o s so b re o tr a b a ­ lh o fe m in in o fa b ril e n c o n tra m u m e sp aço . A te n ta ç ã o p o sitiv ista se m p re p o d e suge­

r ir q u e u m a vez d e n tro d a fá b ric a e d ian te da d ife re n cia ç ã o e n tre operárias e o p e rá ­ rio s, p e sq u isa d o res(a s) fo ram lev a d o s(a s) a p ro b le m a tiz a r e sta d ifere n cia çã o , m as os m u ito s e x em p lo s e m q u e o sexo d o s(as) o p e rário s(a s) p e rm a n e c e o c u lto a fasta m a ilu são p o sitiv ista . N a v e rd a d e , fo ra m m u ito m ais as(os) p e sq u isa d o ra s(e s) q u e já e s tu d a ­ vam o tra b a lh o fe m in in o q u e p ro b lem ati- z a ra m a d iv is ão sex u al d o tra b a lh o na f á b r ic a .20

O s a p o rte s teó rico s m ais im e d iato s in ci­

d em no q u e stio n a m e n to d a s teo rias d o e x érc ito in d u stria l d e re serv a e d a segm en­

taç ão d o m e rc a d o d e tra b a lh o , n o e stu d o d a s q u a lific a ç õ e s e d a g e stão d a m ão-de- o b ra . A s p e sq u isa s d e H ira ta & H u m p h re y s o b re as tra je tó ria s p ro fissio n a is o p e rá ria s n o p e río d o d a crise d e 1981 a 1983 e a re to ­ m ad a eco n ô m ica a p ó s o P la n o C ru z a d o p e rm itira m re la c io n a r d iv isão sex u al d o tra ­ b alh o e d in âm ica d o m ercad o d e tra b a lh o c o n clu in d o q u e a s o p e rá ria s n ão são sim ­ p lesm en te s u b s titu íd a s p o r o p e rá rio s, nem estes p o r a q u e la s . A d iv is ão sexual d o tr a ­ b a lh o ten d e a p re s e rv a r o e q u ilíb rio e n tre em p re g o fe m in in o e m ascu lin o , c o n fo rm e a d in âm ica d e e m p re g o d o s d istin to s seto res

e m p re g ad o s de m ão-de-obra fe m in in a ou m ascu lin a. P o r o u tro la d o as tra je tó ria s p ro ­ fissio n ais se a rtic u la m d ife re n te m e n te com q u alifica çõ e s, p a r a o o e rá rio s e o p e rárias . E stas te n d e m a v o lta r ao tra b a lh o in d u s­

tria l, p a ssa d a a crise, n a ra z ã o d ire ta de su a q u a lifica çã o . P o r o u tro la d o , os e stu ­ d os d a re p a rtiç ã o d o s p o sto s d e tra b a lh o e d as q u a lifica çõ e s m ascu lin as e fem in in as m o stra m q u e “o c o n ju n to d a m ão-de-obra fe m in in a n ã o e stá m a rc a d o p e la p re ca rie ­ d a d e e a in s ta b ilid a d e e q u e as teo rias de seg m en taç ã o a o a n alisare m a o cu p aç ão fe m in in a so b re estim am os m ec an ism o s de m e rc a d o e su b e stim a m as fo rm a s d e segre­

g ação n o p ro cesso d e tra b a lh o ” . 21 P a ra le la m e n te , o q u e stio n a m e n to e a re ­ d e fin içã o d a s q u a lific a ç õ e s — q u e se to r­

n a rá u m a q u e s tã o c e n tra l p a ra a so cio lo ­ g ia d o tra b a lh o fa ce às m u d a n ç a s tecn o ­ ló g icas n o p ro c esso d e tra b a lh o , e stá igual­

m en te s u s c ita d o p e la d iv isão sexual d o tra ­ b a lh o ao a p o n ta r os c ritério s de q u a lifi­

caç ão m ascu lin o s e fe m in in o s — “o s ta le n ­ tos das m u lh e re s e a q u a lific a ç ã o dos h o m e n s” . O u tr o te m a fo rte d a sociologia d o tra b a lh o — a s estratég ia s d a gestão a p o n ta m as d ife re n c ia ç õ e s e n tre m ecan is­

m o s d e stin a d o s a u m a m ão -d e-o b ra m ascu li­

n a e fe m in in a: a im p o rtâ n c ia d ifere n cia d a da fo rm a ç ã o d e m ão -d e-o b ra, d o s in ce n ti­

v os sociais, d a e s ta b ilid a d e q u a n d o d irig i­

d os a o p e rá rio s o u o p e rá ria s .

M as m u ito m a is d o q u e as p rccisões p o n ­ tu ais q u e a p ro b le m a tiz a ç ã o em term o s de d iv isão sex u al d o tra b a lh o p e rm itiu p a ra a an álise e m p íric a n a s p e sq u isa s n a socio­

logia d o tra b a lh o , p arece-m e fu n d a m e n ta l a p ro b le m a tiz a ç ã o d a s q u a lifica çõ e s, d as tra je tó ria s o c u p a c io n a is e d a s fo rm as de g e stão co m o c o n stru ç õ e s h istó ric a s e sociais com o a p o n ta v a m os p rim e iro s tra b a lh o s de R u th M ilk m a n , a o e s tu d a r a in d ú s tria elé­

tric a e a u to m o b ilístic a . É c e rto , n o e n ta n to q u e p a r te d a p ro d u ç ã o , e sp e cialm en te b r a ­ sileira q u e p ro b le m a tiz o u a d iv is ão sex u al do tra b a lh o , o fe z a in d a re la c io n a n d o d iv i­

são sexua! d o tra b a lh o e p a tria rc a d o .22 A fo rm u la ç ã o d o p a tria rc a d o , m esm o relati- v iza d a p e la s d ifere n cia çõ e s h istó ric a s, p e r­

m an e ce n o q u a d ro de re fe rê n cias a um a e s tru tu ra d e te rm in a n te , fu n d a d a n a s bases m a te ria is . D e u m a c e rta fo rm a , o p a tr ia r ­ c a d o fu n d a a d iv is ão sex u al d o tra b a lh o e é p o r sua vez fu n d a d o n a s b ases m ate ­ riais d a so c ied a d e. O u , o q u e m e p a rec e seg u ir u m ra c io c ín io se m elh an te : as re la ­ ç õ es sociais o rg a n iz a m a s d iv isõ es d a socie­

d a d e e a d iv isão sex u al d o tra b a lh o é um lo cu s fu n d a m e n ta l d as re la çõ e s e n tre os sex o s. A h isto ric id a d e d a d iv isão sex u al d o

(5)

tra b a lh o e seu c o n te ú d o de c o n stru çã o c u ltu ra l m e p a rec em a q u i p e rd id o s n a m e­

d id a e m q u e se re stab e le c em re la çõ e s de d e te rm in a ç ã o e s tru tu ra l. C om o a p o n ta S h eila R o w b o th a n , a p a la v ra “ p a tria rc a d o ” c o lo c a m u ito s p ro b lem as: re m e íe a u m a fo rm a u n iv e rs a l e h istó ric a d e o p re ssã o , com fo rte s m arc as b io lo g iz an tes o u a in d a p ro d u z “ u m m o d elo fe m in ista d e base-su- p e r e s tr u tu r a ”, u m a e s tru tu ra fix a , e n q u a n ­ to q u e as re la çõ e s e n tre h o m e n s e m u lh e ­ res sã o ta n to m u tá v e is q u a n to fazem p a rte d e h e ra n ç a s c u ltu ra is e in stitu c io n a is, im ­ p licam re c ip ro c id a d e s ta n to q u a n to a n ta ­ go n ism o s. 23

C om o c o n c e ito p e rtin e n te p a ra p e n sa r as re la çõ e s n o tra b a lh o — q u e são u m a sp e cto d as re la çõ e s sociais e n tre h o m en s e m u lh e res , a d iv isão sexual d o tra b a lh o n ã o e sg o ta a p ro b le m á tic a d estas re la çõ e s, n a m e d id a em q u e elas c o m p o rta m cons­

tru çõ es c u ltu ra is e h istó ric a s, in te rd e p e n ­ d en tes e c o m p le m e n ta re s. A s re la çõ e s e n tre h o m e n s e m u lh e re s sã o v iv id a s e p e n sa d as e n q u a n to re la çõ e s e n tre o q u e é d e fin id o co m o m as cu lin o e fe m in in o — o s g ên ero s.

N e ste se n tid o a d iv is ão sex u al d o tra b a lh o é u m d os m u ito s Iocus d a s re la çõ e s d e gê­

n e ro . P o r q u e o uso d o g ên ero co m o c a te ­ g o ria a n a lític a ? P o rq u e ju sta m e n te c o n s­

tró i a o m esm o te m p o u m a re la ç ã o s o c ia l/

sim b ó lic a sem e sta b e le c e r u m a m ec ân ic a de d e te r m in a ç ã o .24

D e fato , a p ro b le m á tic a d a D iv isã o S e­

x ual d o T ra b a lh o se a rtic u la com a c a te ­ g o ria g ê n ero e a b re e sp a ço p a ra se p e n sa r as n o v a s q u e stõ es q u e p re o c u p a m a so cio ­ logia d o trabalho: as “m e ta m o r fo s e s” d o tra b a lh o e o seu q u e stio n a m e n to , a s u b ­ je tiv id a d e no tra b a lh o , e as id e n tid a d e s n o tra b a lh o , o p ro b le m a d e ig u a ld a d e e d ife ­ re n ça s e as fo rm a s c o n te m p o râ n e a s da g estão e d e p o lítica s sociais.

c) O s T ra b a lh o s d o G ên ero na S o ciologia d o T ra b a lh o

A c ateg o ria n ã o é p ró p ria da so ciologia d o tra b a lh o . P a ra c h e g a r a e la , seja-m e p er­

m itid o p e rc o rre r u m cam in h o d u p la m e n te h e te ro d o x o — ao cam p o d a so ciologia do tra b a lh o e a u m c o n ju n to d e co n ceito s.

P o r u m la d o o c o n ce ito re m e te à cons­

tru ç ã o de sig n ificad o s c u ltu ra is . N o cam p o e sp ecífico d a s relaçõ es d e tra b a lh o , estes sig n ific a d o s fo ra m c o n stru íd o s n a m u ltip li­

caç ão d os e stu d o s d a h istó ria social e d os e stu d o s d e c u ltu ra . F o ra m estes estu d o s q u e g eraram u m a n o v a linguagem p ara fa la r d a s u b je tiv id a d e n o tra b a lh o , a p o n ta

C y n th ia C o k b u rn , “ re m e te n d o ta lv e z m ais p re cisa m e n te a o p e rc u rs o d a p ro d u ç ã o a n g lo -sax ô n ia, u m a vez q u e o p e rc u rso d a p ro d u ç ã o fra n c e sa , p o r ex em p lo , p assa talv ez m ais p e la s fo rm u la ç õ e s da p sico p a- tologia d o trab a lh o . N ã o ex istem á rea s s e p a ra d a s in s titu c io n a lm e n te d a v id a social n as q u a is as fo rm as d e c o n sc iê n cia se c o n s­

titu e m : m e n ta lid a d e s e s u b je tiv id a d e s se fo rm am e se e x p ressam em c a d a e sfera dã e x is tê n c ia ” — in clu siv e n o tra b a lh o e, in clu siv e, n o tra b a lh o tecn o ló g ico . 25

V á rio s c am in h o s a p o n ta m p a ra as fo r­

m as h istó ric a s e c u ltu ra is d a s re la çõ e s de tra b a lh o , e m a is a in d a p a ra a relação de tra b a lh o co m o in te ra ç ã o q u e e n v o lv e s u b ­ je tiv id a d e s . O g ên ero é u m a d as d im e n ­ sões d e stas su b je tiv id a d e s. Q u a n d o a re la ­ ç ão d e tra b a lh o se c ris ta liz a ou se u n iv e r­

s aliza — a s e stra té g ia s e m p re s a ria is e as p rá tic a s d e tra b a lh o to rn am -se efeito s de lógicas a b s tra ta s a p e n a s a d je tiv a d a s pela v id a q u o tid ia n a .

M as se o tra b a lh o d e ix a d e ser u m a o p e ­ ra çã o física q u e e n v o lv e u m a “ fo rç a de tra b a lh o e se to rn a u m a p rá tic a c o m u n i­

c ativ a, nem os gestos, n em a lin g u ag em da g e stão e d a s(o s) tra b a lh a d o ra s (e s ) p o d e ser g e n era liz ad a . E a g e síão m esm o c o m p re e n ­ d e isto q u a n d o tra b a lh a c a d a vez m ais com lin g u ag en s in d iv id u a liz a d a s, q u a n d o apela à p a rtic ip a ç ã o ” . O g ên ero a p o n ta en tão p a ra e sta n o v a q u e s tã o q u e p e rseg u e a so cio lo g ia d o tr a b a lh o ; a re d e fin iç ã o da p ró p ria re la çã o (ou m elh o r, in te raç ã o ) d o t r a b a lh o .20

A q u i se c o lo c am v á ria s q u e stõ es re la ­ tiv as à fo rm a ç ã o d e c o letiv o s e à p o ssi­

b ilid a d e d e p rá tic a s c o letiv as. T ra d ic io n a l­

m en te se a p o n ta m as d ific u ld ad e s d e ações co letiv as e n tre as tra b a lh a d o ra s — seja n o s e stu d o s de g rev es, seja n os e stu d o s d e caso . A s p rá tic a s co le tiv a s são po is m esm o q u e in v o lu n ta ria m e n te se x u a liza d a s.

assim co m o as re la çõ e s com a tecn o lo g ia o u com a fo rm a ç ã o p ro fissio n a l o u com as carreiras.

A q u i, n o v a m e n te , m ais além d a d e sc ri­

ção e m p íric a d a s d ifere n ça s, ab re-se o ca­

m in h o p a ra u m a p ro b le m a tiz a ç ã o de d ife ­ re n ç a s e ig u ald a d es.

Se as re la çõ e s co m o tra b a lh o e co m o e m p reg o são d ifere n te s e n tre h o m e n s e m u lh e re s , isto sig n ifica q u e se d e v em cris­

ta liz a r c a rre ira s d ife re n te s, m es m o q u e p a ra le la s em term o s d e q u a lifica çõ e s, p os­

to s, sa lá rio s, p ro m o çõ e s? O s e stu d o s de caso a p o n ta m e sta co m o a so lu ç ão m ais f r e q ü e n te .27 P o r o u tr o lad o , n o co n te x to b ra sile iro , a p ro b le m á tic a d a ig u ald a d e,

11

(6)

d ife re n ç a n o tra b a lh o , é a in d a q u a se u m a re fe rê n c ia te ó ric a , a tu a liz a d a a p en a s n o tem a d a d ife re n c ia ç ã o p e la leg islação do tra b a lh o s o b re a m a te rn id a d e e so b re a a p o s e n ta d o ria . Q u a n d o é n ecessário co n ­ te m p la r d ife re n ç a s e n tr e tra b a lh a d o re s e tra b a lh a d o ra s , q u a n d o é n ecessário e v ita r c ris ta liz a ç ã o d e d ifere n ça s q u e c riem s itu a ­ ções d e d e sig u a ld a d e ? A ten d ê n cia de um a leg islação p ro te to ra d as m u lh e re s tra b a lh a ­ d o ra s, e sp e cialm en te n o q u e d iz resp eito à m a te rn id a d e é e n ra iz a d a na legislação tra b a lh is ta b ra s ile ira e am b ig u a m e n te , a p o ss ib ilid a d e d a a p o s e n ta d o ria m ais ced o reforça esta p ro te çã o m esm o se sob o a rg u ­ m e n to ju s to d o re c o n h e c im e n to d a “ d u p la jo r n a d a ” d as m u lh e res .

O gên ero fo rn ec e a q u i o s c ritério s p a ra a d efin ição d e p o lítica s so ciais ta n to q u a n ­ to p a ra a s e stratég ia s d e g e stão e o rg an i­

z a ç ã o d o tra b a lh o m esm o se a d ifere n ça de g ên ero n ã o e stá e x p lic ita d a n o s d is c u r­

sos. L ogo, a n o ç ã o d e g ên ero re m e te ao d isc u rso so b re o m as cu lin o e o fe m in in o , n a q u ilo q u e p a re c ia se r e x clu siv am e n te um a re la ç ã o té c n ic o /o rg a m z a tiv a . N e ste s e n tid o o u so d o g ên ero n a so ciologia d o tra b a lh o c o in c id e com a p ro b le m a tiz a ç ã o d as sub- je tiv id a d e s e tam b é m co m as id e n tid a d e s

p re sen te s n o m u n d o d o tra b a lh o . M as, o b ­ s e rv a B ianca B ecalli: “ a id éia d e q u e a id e n tid a d e c o le tiv a fe m in in a p o ssa se r u m a sp e cto sig n ific a tiv o da id e n tid a d e d e clas­

se p e rm a n ec e em g e ra l a u se n te d o d e b a te p o lítico o u d a in v estig ação d os e stu d io s o s”.

C y n th ia C o k b u rn , p o r su a v ez, a v a n ç a a h ip ó te se d e q u e “ a lu ta em q u e m u itas m u lh e res e stão h o je e n g ajad a s b u sc a n d o o b te r c o m p e tên c ia téc n ica n a c iê n cia , na e n g e n h a ria , n a s salas d e a u la o u n o s locais d e tra b a lh o é u m a lu ta m u ito m ais ‘p ela d e sm as cu lim z aç áo ’ d o q u e p e la q u a lific a ­ ç ã o ”, 28

O q u e o c o rre é q u e tra b a lh a m o s ain d a , e esp e cialm en te n a S o ciologia d o T ra b a lh o b ra sile ira com co n ce ito s fu n d a d o s em re ­ lações e s tru tu ra is o n d e as re p re se n taç õ es sim b ó licas, as lin g u ag en s são n e u tra s : as lin g u ag en s d e classe co m o a s lin g u ag en s d o tra b a lh o .

M as, se ch eg arm o s a c o n c e itu a r as lin ­ guagens d o tra b a lh o , talv e z o g ên ero , p o r d efin içã o , ten h a fin a lm e n te u m lu g a r na so ciologia d a q u ilo q u e v irá a se r o tr a b a ­ lh o n a s o c ied a d e b ra sile ira .

( R e c e b id o para p u blicação e m o u tu b ro d e 1990)

N o tas í . R em eto ao títu lo d o a rtig o d e S c o tt (1988).

2 . V e r B ecalli (1989).

3 . Id e m , p . 187.

4 . M esm o q u e a lg u n s d os e stu d o s clássico s te n h a m re la c io n a d o m ais e s tre ita m e n te in ­ d u strializa çã o e co m p o siç ão d a fo rç a d e tra b a lh o , e p o r isso m es m o te n h a m s id o lev ad o s a a p o n ta r a p re se n ç a d a s m u lh e res , a ssin a la n d o su a seg reg ação n o m u n d o fa b ril. V er S im ão (1981).

5 . Blay (1978).

6 . 33,7% d o p ro le ta ria d o in d u s tria l se g u n d o o C en so de 1920 c ita d o p o r P e n a (1981:92).

7 . S c o tt (1988:17).

8 . Y e r ta m b é m C o k b u rn (1990) e M ilk m a n (1987). O b serv a-se a m esm a a b o rd ag e m — a in d a q u e com im p lica çõ e s d ifere n te s — em K e rg o a t (1990).

9 . V er os tra b a lh o s d e K e rg o at (1978) e R o d rig u es (1978).

10. Q u a n d o n ã o ig n o ra o sexo d os o p e rá rio s, a an álise se p a ra as o p e rá ria s d a classe:

“ o frág if v ín c u lo q u e a m u lh e r m an té m co m a co n d iç ão o p e rá ria p ro d u z u m e sta d o , p o r assim d ize r, d e a p a tia p ro fissio n a l. Em n e n h u m m o m e n to d a p e sq u isa p ô d e-se c o n s ta ta r a p a rtic ip a ç ã o fe m in in a nos. c o n flito s tra b a lh is ta s . Pelo. c o n trá rio , as o p e rá ria s sem p re a p a re c e m co m o u m g ru p o à p a r te , d e sin te ressa d o e a u se n te dos p ro b le m a s d a classe".

(F re d eric o , 1979:58).

(7)

11. V e r e n tre o u tro s A n tu n e s (1988:176). A c ita çã o é d e M é sz áro s, I, 1973.

12. V e r em p a rtic u la r os tra b a lh o s de S a ffio tti (1976), B lay (1978), M a d e ira e S inger (1975:13).

13. V e r C E P A L (1969) e O N U (1984). V e r tam b étti L o b o (1985) e 'H i r a t a (1988).

14. V e r S p in d e l (1983).

15. V e r H ira ta (1988).

16. V e r B ilac (1978).

17. V e r F e rre ira (1989). P a ra u m a p e r s p e c tiv a ,p a i s d ife re n c ia d a , v e r M o n ta ü (1990:58- 69) e Silva T e lle s (1986: C ap . V I e C o n clu são ).

18. V e r B ru sc h in i (1988).

19. V e r S a ffio tti (1981).

2 0 . V e r H ira ta (Í9 8 1 ), H u m p h re y (1984), A b re u (1986) e L o b o e S oares (1986).

2 1 . V e r H ira ta e H u m p h re y (1988), e H ira ta (1990), S i l v a ,(1985) e N ev es (1983).

K "

2 2 . V e r M ilk m a n (1987). E lid a R u b in i L ie d k e n o se u d e ta lh a d o e ric o e stu d o re m e te a o p a tria rc a d o n a su a d e fin içã o clá ssic a d e “ e s tru tu ra ç ã o d e re la çõ e s so ciais e n tre h o m en s e m u lh e re s cu jas b ases m a te ria is e n co n tram -se n o s m o d o s c o m o a s so cied ad es h is to ric a ­ m en te d a d a s o rg a n iz am su as v id a s , a s fo rm u la çõ e s id eo ló g ica s d o p a tria rc a d o fazem p a r te d a h e g em o n ia c u ltu ra l n e ssa s s o c ie d a d e s” (L ie d k e, 1989:12).

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Referências

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