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O Universo Simbólico Do Povo Xokó

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Academic year: 2023

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O UNIVERSO SIMBÓLICO DO POVO XOKÓ

Lindamar Oliveira da Silva1 Cristhiano Rodrigo Cunha2 Ruan Deiveson Farias Paraguassu 2 José David de Jesus Santos2 Barba Gabriela Oliveira de Faria3

1Professor de Ensino Básico Médio e Tecnológico- IFS- Campus São Cristóvão -email:

lindambiental@yahoo.com.br 2Aluno do Curso Técnico em Suporte e Manutenção em Informática – IFS- Campus São Cristóvão –

email: cristhiano.cunha@gmail.com, ; ruan_deiveson@hotmail.com, david_ifs@hotmail.com 3Médica Veterinária Residente – UFBA barba_faria@yahoo.com.br

Resumo: A implementação da Lei nº 11.645 de 10/03/2008, objetivando a disseminação da história e da cultura indígena no espaço escolar, abriu espaço para professores e alunos discutam e conheçam os povos indígenas brasileiros. Entende-se por indígena ao ser pertencente aos agrupamentos humanos que se mantém com vínculos à tradição pré- colombiana, por traços culturais e identificação étnica. O referido artigo versa analisar e apresentar os resultados obtidos no desenvolvimento do projeto de pesquisa e trabalho de campo realizado na terra caiçara, Ilha de São Pedro, no baixo São Francisco sergipano. O objetivo foi viabilizar ações educativas no Instituto Federal de Sergipe Campus São Cristóvão referente a implementação da lei através da fotodocumentação e imagens fílmicas da dinâmica sociocultural e ambiental do povo Xokó. No trabalho de campo utilizamos a metodologia da “observação participativa” e

“entrevistas semiestruturadas”. Durante a pesquisa percebemos que esta etnia vem sofrendo agressões sociocultural e ambiental ao longo dos tempos, hoje com direitos fundiários garantidos vêm tentando resgatar seu processo identidário perdido nesses 500 anos de colonização. A etnia Xokó situada no município de Porto da Folha- SE reconhecida por estar as margens do rio São Francisco e por ser a única etnia sobrevivente do Estado, vítima dos processos avassaladores de agressões aos direitos culturais. Percebemos que a mesma mantém suas tradições de liderança étnica através do Cacique Bá, que tem como meta resgatar os processos culturais, a identidade e historicidade de seus antepassados, fortalecendo assim a existência de seu povo.

Palavras–chave: XOKÓ ,CULTURA INDÍGENA, LEI Nº 11. 645, DE 10/03/2008

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas temos vivenciado grandes mudanças na formação de jovens e adultos na Rede Federal de Ensino Tecnológico, mudanças que se materializaram principalmente no que se refere à cultura dos Povos indígenas na temática escolar, estamos vivenciando um momento histórico através da implementação da Lei nº 11.645 de 10/03/2008, objetivando a disseminação da história e da cultura indígena no espaço escolar (MEC, 2006).

ISBN 978-85-62830-10-5 VII CONNEPI©2012

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Entende-se por indígena ao ser pertencente aos agrupamentos humanos que se mantém com vínculos à tradição pré- colombiana, por traços culturais e identificação étnica. A temática sobre as relações étnicas raciais nessa última década tem ocupado palco de discussão na sociedade brasileira, em movimentos sociais de luta pela vida dos povos indígenas e no meio acadêmico (MEC, 2003)

Segundo publicação da Secretaria da Educação, desporto e Laser do estado de Sergipe a história do Povo Xokó é assim contada: O povo Xokó habita as margens do Rio São Francisco há mais de 500 anos em vários estados da região nordeste do Brasil. Pesquisadores afirmam que há registro de seus antepassados em um espaço geográfico que vai de Sergipe ao sul do Ceará. Entre os século XVII e sua presença é encontrada na margem esquerda, ora na margem direita do “Velho Chico “, em terras que hoje é o Estado de Pernambuco, Alagoas e Sergipe.

Estudos apresentam que no início do século XIX, vários grupos identificados como Shocó viviam nos sertões de Pernambuco e no sul do Ceará, que haviam fugido de missões religiosas, mostrando que relutavam em viver aldeiados, O nome Xokó já foi grafado sob diferentes formas - Shocó, Yocó, Chocó, Chocoz, Ciocó, Ceocoses. No passado era uma nação numerosa, cerca de 300 famílias, que viviam em harmonia com a natureza, espaço sagrado que ali manifestavam suas práticas mitológicas, exemplo da dança do Toré, atos manifestados no Ouricuri, local utilizado para o ritual. Com a miscigenação absorveram os saberes do samba de coco dançado em seu cotidiano. Como pescadores, caçadores e extrativistas por natureza, desfrutavam das riquezas da terra, utilizavam o barro para a feitura da cerâmica utilitária, também plantavam milho, feijão, arroz e algodão, mantiveram assim a sobrevivência étnica. Por volta de 1859 a 1860, o imperador D. Pedro II em passagem pelo baixo São Francisco visita várias cidades da região. Em uma de suas andanças, D. Pedro II passava em frente à ilha de São Pedro, quando o clima mudou e o vento acabou, atendendo o comando da natureza ele teve que se hospedar na antiga missão de São Pedro durante a noite. No depoimento do indígena José Valmir Rosa, o mesmo relata que D. Pedro II ao acordar, desfrutando do amanhecer sanfransciscano, informou ao frade que tinha ouvido uma cantoria durante à noite, então o missionário afirmou que eram indígenas da região vivenciando seus rituais. Assim, D. Pedro II solicitou a presença dos povos indígenas e os mesmos dançaram e cantaram para o Imperador. Encantado com a manifestação cultural indígena afirmou: "Comigo vou levar algo que nunca esquecerei e, portanto, quero deixar algo para vocês". Foi dessa forma, então, que os antepassados do Povo Xokó receberam a oficialização de suas terras. D. Pedro II deu de presente uma légua em quadro, correspondendo à fazenda Caiçara. Certo tempo, após a doação de D. Pedro II, o indígena Manoel Francisco Rosa, junto com outro parente, foi buscar o documento deixado por D.Pedro II na Bahia, o fazendeiro João Porfirio Brito sabendo desse fato, mandou os jagunços esperar os dois na estrada e fazer um convite para ir até a sua casa, lá lhes ofereceu comida e bebida, roubando os documentos ao qual o imperador reconhecia o direito à terra para este grupo étnico.

Desta forma, mudanças ocorreram no espaço de morada desta etnia, a paz consolidada acabou quando João Porfirio Brito, chamado de Coronel, usando de muita violência com jagunços invadiram não só a terra do povo Xokó, mas todo o baixo São Francisco. Não suportando os maus tratos foram procurar abrigo no estado Alagoas junto aos Kariris, que vivem até hoje no município de Porto Real do Colégio, Por esse fato a tribo de Alagoas hoje chama-se Kariri-Xokó. Ficaram na terra caiçara aproximadamente 5 ou 6 famílias, que se sujeitaram a trabalhar na terra como escravos sendo obrigados a nunca mais falar a palavra índio, deixando assim de exercer talvez seu maior patrimônio a língua materna, este sendo um dos maiores motivos de seu desaparecimento, legado de seus antepassados , também não poderiam informar sua origem de qual nação indígena pertenciam, passando assim a serem chamados de caboclos . Assim os remanescentes Xokós permanecem por mais de100 anos.

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Diante de tantas lutas, perdas e sofrimentos a alternativa para sobrevivência foi reconquistar o antigo território Xokó. Com apoio da Diocese de Própria, do Conselho Indigenistas Missionários (CIMI), do sindicato de trabalhadores, de outros órgãos e amigos, acontecendo assim um marco, em 09 de Setembro de 1979, entraram na ilha de São Pedro, cercaram a ilha, mas continuaram morando na Caiçara, por quase um ano. Nesse tempo foram a varias autoridades, entre elas o Juiz de direito de Porta da Folha, os delegados da Polícia Federal e Civil, o impasse permanecia. Ao chegarem à ilha, só encontraram a antiga igreja de São Pedro, o cemitério, as ruínas de um convento e muitas árvores servindo de moradia e esconderijo por um bom tempo. Este período para o povo XOKÓ não foi fácil, como moravam em baixo de árvores, tinham que enfrentar mudanças climáticas, chuva, sol, ataques de pequenos animais e fazendeiros, que mantinham a perseguição, dessa vez contratando jagunços para amedrontá-los e os fazer recuar, porém tudo isso não foi o bastante para desistirem e continuaram lutando pelo direito a terra.

Em outubro de 1982, a família Brito, desejando fortalece-se na luta contra os Xokós, vende a Caiçara ao Fazendeiro Jorge de Medeiros Pacheco. A fundação Nacional do Índio - FUNAI, em 1985, formou uma Comissão de engenheiros, técnicos, antropólogos, advogados acompanhados por um técnico do INCRA de Sergipe para fazer um levantamento fundiário e posteriormente a demarcação da terra Caiçara. Mas, isso não foi possível devido à resistência dos fazendeiros que se diziam donos da terra. E mais uma vez, foram parar na justiça com uma nova luta. Passaram dois anos e nenhuma providência foi tomada, esperaram muito e sentindo que o problema não seria resolvido, novamente a comunidade foi obrigada a fazer mais uma retomada para garantir o direito que tinham sobre a Caiçara. Isso aconteceu em 31 de agosto de 1987. Chegando lá, encontraram um empregado e o mandaram ir embora, foi quando o empregado avisou ao fazendeiro Jorge Pacheco e o mesmo se comunicou com a polícia do Estado. E outra vez foram vítimas da violência praticada pelo fazendeiro invasor.

Informações da FUNAI chegavam pedindo que ficassem despreocupados, pois haviam sido tomadas algumas providências e que nada iria acontecer com a população étnica, porém o massacre aconteceu, a policia chegou empurrando, batendo, chutando e mandando todos deitarem no chão. Então começaram a rezar e falar que não iriam sair, quando o fazendeiro viu que ninguém saía, mandou a policia atirar, mas a fé que os motivava foi bem maior e eles não conseguiram. Depois de um processo de muita luta e sofrimentos a ilha de São Pedro foi desapropriada No dia primeiro de dezembro do mesmo ano, com a cobertura do Juiz de Direito da Comarca de Porto da Folha o povo Xokó foi barbaramente massacrado e expulso da terra Caiçara, com os corações cheios de dores e mágoas.

Depois de muita luta e sofrimentos a ilha de São Pedro é desapropriada no dia 7 de dezembro de 1989, pelo governador do Estado de Sergipe, Augusto Franco, pagando a importância de Cr$ 2.400.000,00 (dois milhões e quatrocentos mil cruzeiros), correspondente a uma área de mais de 600 tarefas de terras, no entanto quando se mediram havia apenas 319 tarefas de terras. Iniciando então um novo tempo, tempo este de novas lutas, de muita pressão e mobilização política, até que em solenidade ocorrida no palácio do governador do Estado de Sergipe passou-se a documentação da ilha de São Pedro para União, e daí para usufruto do povo Xokó, através da FUNAI.

Surge um novo momento histórico, os indígenas recorreram a FUNAI para que novas providências fossem tomadas. A questão foi parar na Justiça Federal, sendo dirigido pelo procurador da República em Sergipe, o Exm° Dr. Evaldo Campos, que deu entrada ao processo

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em 9 de janeiro de 1988. Em 24 de dezembro de 1991, após muita luta, acontece de fato a homologação da terra Caiçara. Sendo este um marco de resistência, marco na história ambiental, social e cultural do povo Xokó. Nos dias 22 e 23 de maio de 1993 o povo Xokó organizado festeja, celebrando na Terra Caiçara, comemorando a vitória, a conquista esperada durante muitos anos.

Desde 1982, por sugestão da FUNAI, a comunidade Xokó faz escolha de Cacique. Na época acharam melhor que o Cacique fosse um jovem e assim elegeram, em eleição secreta e direta, o jovem Daminhão, que tinha apenas 17 anos, O tempo de mandato do Cacique nunca foi definido, sendo assim o que encerra o mandato de um cacique é a vontade da comunidade.

Segundo relatos do Cacique Bá essa eleição aos moldes do homem branco não se mostrava muito boa, pois dividia o povo segundo seus candidatos de preferência. Assim, em 2003 a forma de escolha foi mudada passando a ser por revelação em espaço sagrado, o Ouricuri (MEC, 2000).

Em tempos contemporâneos, o povo Xokó vem recebendo e conquistando vários benefícios dos governos estadual e federal, os mesmos residem em casa de alvenaria, não mais vivenciando nas moradias tradicionais dos antepassados. A oferta da educação escolar formal acontece, que por si só, não é o suficiente, sendo necessário o respeito à cultura indígena e à sabedoria desenvolvida historicamente por seus antepassados, a exemplo das diferentes línguas que marcam culturalmente os povos indígenas. Segundo BANIWA (2006) os índios não precisam da escola e da escrita para contar sua história, ensinar suas cosmologias, suas tradições sociais, suas línguas, elas precisam dela para se representarem, representando seu universo, para o mundo fora da aldeia. Possuem energia elétrica, água encanada e posto de saúde. A igreja secular passou por reformas mantendo a originalidade, ganhou recentemente bancos novos.

Hoje tendo como liderança o Cacique Bá, que foi revelado através dos ritos e mitos por seu povo a 9 anos, o mesmo tem como meta, resgatar os costumes indígenas, o modo de ser e de fazer dos seus ancestrais a exemplo da pintura corporal, e seu valor simbólico.

No presente trabalho o objetivo foi viabilizar ações educativas no Instituto Federal de Sergipe, Campus São Cristóvão, referente a implementação da lei Lei nº 11.645 de 10/03/2008, através da fotodocumentação e imagens fílmicas da dinâmica sociocultural e ambiental do povo Xokó.

2. MATERIAL E MÉTODOS

No trabalho de campo utilizamos a metodologia da “observação participativa” e

“entrevistas semiestruturadas”, por meio de coleta de informações com enfoque qualitativo, vislumbrando possíveis atividades de extensão. Visitas periódicas aconteceram a terra caiçara, identificando, conhecendo e reconhecendo a área a qual nos propomos estudar. Inicialmente apresentamos a pesquisa às lideranças da tribo, ao Cacique, ao Pajé, aos professores e indígenas residentes na comunidade, solicitamos autorização para efetuarmos a fotodocumentação e o trânsito na aldeia. Em seguida selecionamos os indígenas participantes entre idosos, adultos, educadores, adolescentes e crianças que, com suas experiências vividas, através da oralidade relatassem os fatos históricos, ambientais, culturais e sociais da tribo, analisando seu simbolismo, as práticas do extrativismo vegetal e animal , seus hábitos alimentares, sua produção de arte plumaria, cerâmica, suas crenças mitos e ritos, o simbólico em suas práticas tradicionais e contemporâneas.

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Foram realizadas caminhadas transversais, com guias locais, para identificar em seu cotidiano o social, o cultural e o ambiental do povo XOKÓ , em seguida iniciamos a documentação em áudio, vídeo e fotografia de acordo com o calendário local.

Fomos informados e convidados pelo Cacique e pelo Pajé que iria acontecer a festa de celebração da reintegração da Ilha de São Pedro. A mesma é realizada todos os anos no dia 9 de setembro. Dispomo-nos a documentar todas as atividades realizadas, nesta celebração festiva.

Quando entramos na terra caiçara iniciamos o processo fílmico e fotográfico, acompanhando o ritual proposto pelos indígenas: Registro da celebração de missa católica com a presença do bispo diocese de Propriá na igreja secular da Tribo, em seguida na mesma igreja registramos e apresentação de uma peça teatral. No dia seguinte registramos a alvorada festiva, as pinturas corporais, a produção alimentar, o ritual do Toré após a chegada do Ouricuri, o almoço comunitário e a comercialização de artesanato, o rio São Francisco, as embarcações e o banho nas águas doces.

A editoração do vídeo foi feita e apresentada na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia de 2011 para os educandos e professores do IFS- Campus São Cristóvão. Também foi usado como material para estudo e apresentação nas aulas da disciplina Arte e educação, cumprindo as normativas do MEC para implementação da Lei nº 11. 645, de 10/03/2008.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

O contato com o povo Xokó foi estabelecido por intermédio do prefeito do município de Porto da Folha e do secretário de Cultura e de Turismo. Posteriormente com as lideranças locais na pessoa do cacique Bá e do Pajé Raimundo. A partir da observação participativa desenvolvemos os objetivos do projeto com a participação da comunidade indígena. No decorrer das caminhadas transversais identificamos e registramos o patrimônio material e natural da aldeia e as manifestações culturais. O desejo de resgatar, preservar e conservar a cultura indígena por parte do grupo étnico foi perceptível, através dos relatos orais, das práticas de pintura corporal, da manifestação da dança o Toré, da religiosidade católica, da feitura de comidas tradicionais, da arte plumária, da indumentária com fibras vegetais, da reclusão no espaço sagrado Ouricuri, do navegar das embarcações, da feitura das panelas de barro e do invisível no velho chico, assim expressando o sentimento de pertencimento deste povo com a terra caiçara.

Dessa forma percebemos a interação do homem com a natureza em busca do elo perdido, pois esta etnia vem sofrendo agressões sociocultural e ambiental ao longo dos tempos, hoje com direitos fundiários garantidos vêm tentando resgatar seu processo identidário perdido nesses 500 anos de colonização branca. Percebemos também laços de reciprocidade em seu cotidiano, um diálogo entre o ser e o viver em tempos contemporâneos, o reencontro com o simbólico, através do patrimônio material e imaterial legado deixado dos antepassados e a possibilidade de ser Xokó em tempos modernos.

Na percepção indígena a conservação da natureza e a contribuição do seu povo na oralidade do Cacique Bá “O índio já nasce com a missão de cuidar da natureza. O próprio índio é a natureza, a semente dele foi colocada na Terra para isso. A semente branca tentou apodrecer a semente do índio, mas a semente sadia que ficou brotou e cresceu. Vocês podem ver que a nossa mata é preservada, lá fora não tem mais nada. A gente sabe para que o índio quer a terra e o branco sabe para que ele quer”.

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No que se refere a pintura corporal o cacique relata que “As pinturas significam luta e união. O urucum é vermelho e o carvão com jenipapo é o preto. Essas duas cores juntas significam luta e união. O capricho na pintura é para que ninguém reconheça a gente”.

Quanto a manutenção da tradição alimentar o cacique Bá em sua narrativa afirma que: “ No passado a gente comia a caça, mas hoje a caça precisa crescer. Mas os vizinhos invadem nossa área para caçar. Nos já fizemos denúncia ao IBAMA, mas a área é grande e não dá para pegar. Eles desmatam e os animais vêm para cá. Antes os indígenas faziam farinha e fubá, mas hoje teve um avanço e o índio está envolvido, mudou. Lá no Ouricuri a gente vive o passado a comida é feita na panela de barro, o peixe aqui é torrado no óleo lá é assado . Aqui a comida é feita no gás lá é no fogareiro. Hoje comemos basicamente o peixe porque as caças como peba, tatu, camaleão, mocó, veado, capivara às vezes a gente caça, tem aqui no alagado. Todo primeiro sábado de cada mês nos reunimos no Ouricuri”.

A pesca artesanal sempre foi uma prática tradicional dos povos indígenas, mas como ela acontece hoje foi o relato do Cacique Bá que nos revelou:” Antes era na laça quando tinha muito peixe. Hoje fazem um tipo de arpão com borracha de estilingue e mergulha para pegar o tucunaré na fundo do rio. Mas essa pesca é para quem tem habilidade. Outros pescam com rede ou tarrafa”.

O significado da dança e do canto do Toré na fala do Cacique Bá: “ É um encontro com o nosso Deus. Estamos pensando no alto, inspirados pelas forças do além. O Toré é sagrado não é profano. Na verdade cada povo tem sua forma de cultuar seu Deus. Os católicos rezam para as imagens e os índios se inspiram na lua, no sol, no canto dos pássaros, enfim na natureza”. Ainda com relação ao Toré o cacique relatou quanto ao uso de fumo e bebidas: “Só usamos insenso que é uma raiz que a gente queima. Somos a única tribo do Nordeste que não usa fumo, em Alagoas eles usam. Aqui não tem nenhum jovem fumante, os casos de uso de drogas é zero.

Tem os mais velhos, que fumam e bebem. A bebida do ouricuri é produzida com a casca da jurema e uma coisa que vocês conhecem e é bem gostosa, mas não posso revelar, nem como é feita. É forte demais e dá moleza. Tem muita gente que pensa que coisa de índio é coisa do diabo, mas é a mesma coisa dos outros povos. O católico olha para as imagens, o índio para os sinais do céu”.

Na ocasião da entrevista com o Cacique Bá, às vésperas da Conferência Rio+20, perguntamos a ele sobre a possibilidade de intervenção oral no evento o que ele diria: “Na verdade nem sei se vou poder falar. Devem tirar 2 ou 3 para representar os indígenas. Talvez vou falar do mau olhar que se tem sobre o índio, especialmente no Nordeste. É o cacique do Povo Xokó que está indo, vou buscar experiências, conhecer outras pessoas. Já faz nove anos que sou cacique. O tradicional é que o Cacique seja cacique até morrer, mas enquanto estiver servindo meu povo como Cacique eu serei. Logo que conseguimos a posse da terra a FUNAI exigiu que tivéssemos um Cacique e promovemos eleições durante muitos anos, mas com as eleições estamos nos dividindo e os costumes se perdendo. Foi aí que resolvemos escolher o Cacique no ouricuri e então fui escolhido. Até as crianças apontaram para mim. As eleições dividiam, porque tinha candidatos e os votantes se dividiam. A eleição foi implantada pelos brancos, não dá certo com índios”. No diálogo sobre eleição do cacique perguntamos se poderia ser uma mulher a ocupar o cargo étnico. Cacique Bá respondeu: “Pode, elas participam de tudo.

As mulheres têm mais poder que os homens. O índio tem que trazer comida depois tomar um banho e relaxar”.

Sobre a língua materna, a possibilidade de uso na opinião do Cacique Bá: “Não tem mais ninguém que saiba, se perdeu. Tem algumas palavras no ritual e nos cantos. Tem estudos de

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Universidades que dizem que nossa língua original era o Tupi Guarani, é impossível resgatar.

Nós queremos resgatar a cultura. Estamos conseguindo com os jovens”.

6. CONCLUSÕES

O universo simbólico do povo Xokó está trançado na vida ribeirinha, no seu cotidiano aquático, nas suas estórias e histórias narradas por eles. Nos possibilita a compreensão através dos seus saberes e fazeres, sendo assim, a produção imagética contribuiu para implementação da Lei 11. 645, de 10/03/2008 na Rede Federal de Educação Profissional Tecnológica, em especial no IFS- Campus São Cristóvão. A produção do material foi utilizado pelos professores responsáveis por ministrar a temática, cultura e arte indígena em espaço escolar. A comunidade escolar teve a possibilidade de um olhar menos preconceituoso a respeito dos povos indígenas que contribuíram para a formação do povo brasileiro e que foram quase dizimados pelos colonizadores europeus.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao povo XOKÓ, em especial a pessoa do Cacique Bá pela oportunidade de materializar esta pesquisa, pois nos recebeu com muito carinho, revelando seus rituais, desejos de prosperidade e de resgate dos costumes ancestrais.

REFERÊNCIAS

BANIWA, G. – Desafios da Escolarização Diferenciada – In: Povos Indigenas no Brasil:

2001-2005. Editores Gerais Beto Ricardo e Fany Ricardo. São Paulo: Instituto Sócioambiental, 2006, p 151-154.

MEC/SEF/SEED-SE - Povo Xokó- Histórias que marcaram nossa vida. Secretaria de Estado da Educação, do Desporto e Laser. Aracaju, 2000, 44p

MEC/SEMTEC/DEM- Seminário de Politicas de Ensino Médio para os Povos Indígenas – Anais . Brasilia (DF), 2003, 115p

MEC/ SECRETARIA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA – Orientações e ações para educação das relações étnico-raciais. Brasilia: SECAD, 2006.

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