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SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL NAS ESCOLAS E A AGRICULTURA FAMILIAR NO TERRITÓRIO DA APA DELTA DO PARNAÍBA

Maria Helena Cortez de Melo Pires1 RESUMO: Analisa-se questões que convivem paralelamente com a política de Segurança Alimentar e Nutricional: uma, se refere a alimentação escolar e a outra, a Agricultura Familiar interagindo no combate a formação nutricional deficitária. Este trabalho faz parte de um projeto de pesquisa em andamento nas escolas da APA do Delta do Parnaíba integrado a rede KFLA, sob a luz da relação entre políticas públicas de produção e consumo de alimentos. Observou-se, como resultados iniciais, experiências inovadoras fundamentadas no conceito de alimentos funcionais ou bioenergizados, todavia a serem consolidadas no campo da Seguridade Alimentar e Nutricional com grande potencial no território.

Palavras-chave: SAN, Agricultura Familiar, Alimentação Escolar, Alimentos Funcionais.

ABSTRACT: We analyze issues that coexist side by side with the Food and Nutrition Security policy: one is school feeding and the other, Family Agriculture interacting in the fight against deficient nutritional training. This work is part of an ongoing research project in the APA schools of the Parnaíba Delta integrated into the KFLA network, in light of the relationship between public policies of production and consumption of food.

As initial results, innovative experiences based on the concept of functional or bioenergy foods were observed, but they should be consolidated in the field of Food and Nutrition Security with great potential in the territory.

Keywords: SAN, Family Farming, School Feeding, Functional Foods.

1 INTRODUÇÃO

Pelo terceiro ano consecutivo, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) registrou um aumento no número de pessoas passando fome no mundo, que subiu de 815 milhões de indivíduos, em 2016, para quase 821 milhões em 2017. A América Latina e o Caribe acompanharam a tendência global — na região, 39,3

1 Professora Adjunta do Curso de Ciências Econômicas, Universidade Federal do Delta do Parnaíba – UFDPAR – Doutora em Antropologia Cultural – Universidad Complutense de Madrid . E-mail:hel_mandu@yahoo.com.br

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milhões de pessoas vivem subalimentadas, valor que representa um crescimento de 400 mil (ONU, 2018).

No Brasil, os números da fome podem ser considerados estáveis, porém 2,5% da população ainda se encontra em situação alimentar crítica. Em contrapartida, casos de obesidade avançam no país, mais de 33 milhões de pessoas se encontram obesas, conforme o relatório sobre o Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo - 20182.

Agregado a estes fatos, no âmbito da produção agrícola, intensifica-se a oferta de alimentos cultivados e processados a partir do modo de produção que negligencia em grande parte a qualidade dos alimentos e a saúde coletiva interagindo com outras problemáticas como a degradação ambiental e a reprodução da exclusão econômica e social de segmentos da sociedade como da agricultura familiar.

Intentando modificar essa realidade, o Estado incorpora o conceito de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN)3 e passa a desenvolver programas e políticas voltadas para essa vertente afirmando o caráter fundamental que a alimentação, em quantidade e qualidade, tem para a garantia da sobrevivência humana. O desenho das políticas deste setor, portanto se consolidam em dois segmentos: o segmento do alimento propriamente dito (e toda sua rede de produção, oferta, comercialização e acesso) e o segmento nutricional que tem a ver com a cultura e hábitos alimentares, com o aproveitamento biológico do alimento e a saúde da população. Estes dois segmentos estão intrinsicamente ligados a um modelo de produção e consumo de alimentos em cadeias mais sustentáveis que se alinham à Agricultura Familiar.

Sob essa ótica, visando a integração destas redes de produção e consumo de alimentos saudáveis surgem programas públicos de alimentos a exemplo do Programa de Alimentação Escolar (PAE) como impulsionadores desta conexão que atenta tanto para as políticas relacionadas à saúde a partir da alimentação escolar, como também, para inserção de agricultores familiares no mercado mais dinâmico. Desta forma, podemos indagar: qual o potencial das experiências inovadoras na gestão da alimentação escolar, em conexão com a Agricultura Familiar para fortalecer as políticas de SAN?.

Este trabalho investiga experiências que estão sendo realizadas, conectando a Agricultura Familiar à alimentação escolar na cidade de Parnaíba, mais especificamente no Distrito de Irrigação dos Tabuleiros Litorâneos do Piauí (DITALPI) situado em uma Área de

2 www.fao.org/3/I9553ES/i9553es.pdf. Acesso 10/03/2019

3 A Segurança Alimentar e Nutricional, de acordo com o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) enquanto estratégia ou conjunto de ações, deve ser intersetorial e participativa, e consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras da saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis.

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Proteção Ambiental (APA) do Delta do Parnaíba onde se produz alimentos em grande parte orgânicos com agricultores familiares. Este artigo faz parte de um estudo preliminar (avaliação de base) do projeto de extensão da UFDPAR4 que integra os trabalhos da rede KFLA (Kellogg Fellows Leadership Alliance)5, da qual participo. Esta aliança tem atuado com foco na “Segurança Alimentar e Comunidades Prósperas” apoiando seus fellows em diferentes países.

Para tanto, discutiremos a relação entre alguns indicadores. Primeiramente, os hábitos alimentares e a SAN nos espaços escolares e o papel da Agricultura Familiar neste contexto. Em um segundo momento, analisaremos a experiência dos agricultores do DITALPI e dos gestores públicos em conectar alimentos funcionais à merenda escolar do município. Concluiremos com algumas observações e considerações finais.

2 HÁBITOS ALIMENTARES E A SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL NOS ESPAÇOS ESCOLARES.

O ser humano requer pelo menos 49 nutrientes para satisfazer as suas necessidades metabólicas, porém a deficiência ou o consumo inadequado de um desses elementos pode gerar distúrbios fisiológicos que levam a doenças, aumento das taxas de mortalidade, baixo rendimento produtivo, retardo mental, crescimento inadequado, entre outros (OIKEH et al., 2003; LONG; BANZIGER; SMITH, 2004; WELCH; GRAHAM, 2004). Por alimentação inapropriada, também, a obesidade e o sobrepeso começam a ser motivo de preocupação, estabelecendo-se por todas os segmentos sociais. De acordo com pesquisa do Ministério da Saúde a obesidade já é uma realidade para 18,9% dos brasileiros. Já o sobrepeso atinge mais da metade da população (54%). Entre os jovens, a obesidade aumentou 110% entre 2007 e 2017. Esse índice foi quase o dobro da média nas demais faixas etárias (60%) (BRASIL, 2017).

A pesquisa também mostra a mudança nos hábitos alimentares da população. Os brasileiros estão consumindo menos ingredientes considerados básicos e tradicionais. O consumo regular de feijão diminuiu 67,5%, em 2012, para 61,3%, em 2016. Apenas um entre três adultos consome frutas e hortaliças em cinco dias da semana. Esse quadro

4 Universidade Federal do Delta do Parnaíba.

5 Esta rede reforça a ideia de que as formações de cadeias alimentares inovadoras são capazes de conectar os produtores e os consumidores, por meio da mediação das várias instituições (públicas, privadas e do terceiro setor) a fim de buscar soluções inovadoras conjuntas, tanto para a Agricultura Familiar como para a Segurança Alimentar e Nutricional como fator de prosperidade das comunidades.

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mostra a transição alimentar no Brasil, que antes era a desnutrição e agora está entre os países que apresentam altas taxas de obesidade. (BRASIL, 2017).

Este perfil de consumo tem como fator central desse processo a transformação de hábitos alimentares dos brasileiros iniciadas na infância e adolescência. Existem mais alimentos industrializadas, mais fast food e menos consumo de comidas saudáveis, alertam especialistas6. Não resta dúvida que depois de adultos será difícil reverter ou alterar os maus hábitos alimentares, visto que a modificação de hábito alimentar durante a fase adulta apresenta, de forma geral, alta taxa de insucesso.

A história pessoal e familiar e ainda o envolvimento cultural permitem compreender o porquê do desenvolvimento dos hábitos alimentares. O paladar, o aspecto, o preço, a facilidade em confeccionar, a publicidade etc., mais do que o conhecimento dos benefícios para a saúde, condicionam as escolhas alimentares que realizamos (GLANZ et al, 1998). As escolhas alimentares são condicionadas, portanto, por várias tentações publicitárias que nem sempre condizem com tipos de alimentações saudáveis.

Desse modo, fatores como escola, rede social, condições socioeconômicas e culturais são vistos como parceiros da família, de forma a contribuir na construção dos hábitos alimentares saudáveis das crianças. Outro aspecto historicamente associado a SAN é a consciência crescente em colocar na mesa produtos alimentares livres de contaminação, a utilização de produtos de origem orgânica na alimentação que, além de estar vinculada a melhoria de qualidade de vida, reforça a preocupação com os problemas ambientais. O papel da alimentação no contexto escolar, então, está intrinsicamente relacionado ao conceito de Segurança Alimentar e Nutricional.

Tanto a construção de hábitos alimentares saudáveis como a preocupação com o meio ambiente propõem um modelo de produção e consumo de alimentos mais sustentáveis, que aproxime a produção de pequenos agricultores familiares e o consumo de alimentos. A contribuição das políticas de alimentação escolar para a reconexão da cadeia alimentar com a Agricultura Familiar tem um potencial significativo na medida em que envolve e integra temas como saúde, educação, geração de renda, organização social, meio ambiente, gênero e participação. Elementos estes fundamentais no processo de desenvolvimento local. Entretanto, é importante o entendimento do conceito da Agricultura Familiar e das políticas de alimentação escolar no Brasil.

6 Revista Paulista de Pediatria vol.31 no.3 São Paulo Sept. 2013.

www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-05822013000300324&script=sci_arttext&tlng=pt, Acesso 15/04/2019

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2.1 A Agricultura Familiar e as políticas de alimentação escolar

O universo da Agricultura Familiar no Brasil é extremamente heterogêneo conforme indica Couto (2013). Muitas abordagens e políticas genéricas reportam-se aos agricultores como se todos eles fossem movidos pela mesma racionalidade, enfatiza o autor:

Essa pluralidade contém grandes diferenças que vão desde o mais simples agricultor de subsistência para o autoconsumo familiar (produtor exclusivo de valor de uso) até o mais complexo, tecnificado, integrado mediante rigoroso contrato junto aos capitais agroindustriais das firmas rede, nacionais ou não (produtor exclusivo de valor de troca) (COUTO 2013, p.14).

São diversas as categorias que envolvem Agricultura Familiar, como explica Couto (2013), pois possuem diferentes histórias agrárias e relações com movimentos sociais, ritos, objetivos práticas históricas, níveis tecnológicos, níveis de organização (orçamento, gestão, trabalho), custos de oportunidade, níveis de integração interna e externa, sistemas de produção, subsistemas de escalas distintos. Entretanto são categorias submetidas a mesma racionalidade concorrencial de chamadas de editais de crédito rural mediados por um menu de projetos padronizados (COUTO, 2013)

No plano macrorregional, dados do IBGE revelam que metade dos agricultores familiares se concentram no Nordeste brasileiro. Esta forte concentração nunca mereceu, de nenhum governo, políticas que correspondesse a representação numérica desses agricultores, ao contrário, no caso do crédito do PRONAF, os últimos dez anos mostraram um aumento da desigualdade interrregional. Esses velhos mecanismos só beneficiam os espaços mais dinâmicos e competitivos. (COUTO, 2013).

No plano microrregional, é importante distinguir os sistemas agrários e os tipos de agricultura e agricultores em cada território. Entre a pluralidade do universo na Agricultura Familiar, apontada por Couto (2013), podem-se encontrar mutuários de credito oficial (PRONAF, CRESOL, Crediamigo etc) ou os que não utilizam crédito rural. São agricultores familiares tecnificados ou não, patronais e semipatronais, em transição para o mercado, em processo de integração, de valorização ao patrimônio familiar – ou no outro extremo, em processo de proletarização e consolidação da prática da “pluriatividade como estratégia de sobrevivência (COUTO FILHO, 2007)

Nesta lacuna encontram-se variados tipos de agricultores familiares com diferentes inserções no mercado. Como salienta Buainain (2006), em qualquer situação, um ponto fundamental para o sucesso do empreendimento rural familiar está no acesso aos mercados que melhor remuneram seus esforços, sejam eles mercados tradicionais e/ou novos.

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Como os agricultores familiares historicamente têm enfrentado sérios problemas de falta de mercado para seus produtos, especialmente os alimentos, uma das propostas foi investir na demanda institucional. No Brasil, assim como em vários outros países, tem havido um movimento de estabelecer conexões entre instituições públicas e a agricultura familiar de tal forma a criar um mercado bastante grande e estável para tais produtores e fornecer alimentos de boa qualidade e da região local para os beneficiários de programas de alimentação suplementar.

Com a descentralização oficial do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) em 1996, uma série de leis e documentos tem surgido, que propuseram exatamente esse tipo de aquisição. Em 2004, o relatório final da II Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional deu prioridade a alimentação e educação nutricional nas escolas e creches, indicando, como questão importante para a melhoria da qualidade nutricional, a preservação dos hábitos alimentares regionais e a garantia de aquisição da produção local de frutas, legumes e hortaliças. Definindo diretrizes como “Dar prioridade a seleção dos alimentos que compõem o cardápio do programa, conforme a vocação agrícola e agroindustrial da localidade, com o propósito de incentivar o desenvolvimento local sustentável, apoiando os projetos de aquisição de alimentos da agricultura familiar e de cooperativas de pequenos produtores. ”

Não obstante as recentes políticas de SAN apontem para novos modelos agroalimentares no Brasil, na prática, ainda são poucas as iniciativas que caminham nessa direção, especialmente em relação ao Programa de Alimentação Escolar. As razões para isso ainda são pouco conhecidas, embora existam determinados indícios que remetem a dificuldades em sua efetivação.

Entretanto, são vários os atores locais que atuam de forma a contribuir para conexão de produtores e consumidores apontando experiências inovadoras, abrindo novas possibilidades que construam alternativas às restrições de toda ordem que dificultam o caminho para o fortalecimento da SAN e de comunidades prósperas. E essas iniciativas locais fazem toda a diferença.

Com base nessas considerações, este trabalho procurou analisar as iniciativas dos agricultores familiares do DITALPI, como se organizam e quais suas dificuldades e perspectivas no que tange ao mercado de alimentos funcionais e escolares.

2.2 Agricultura Familiar nas merendas escolares na APA do Delta do Parnaíba

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Na década de 1980, o Governo Federal estabeleceu um ambicioso Programa Nacional de Irrigação - PRONI e, especialmente para o Nordeste, o Programa de Irrigação do Nordeste - PROINE, cuja meta central era a irrigação de um milhão de hectares até o ano 1990, sendo que aproximadamente 40% desse total seria de responsabilidade da Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco - CODEVASF, Departamento Nacional de Obras Contra as Secas - DNOCS e Departamento Nacional de Obras e Saneamento DNOS. Nesse contexto, o DNOS iniciou a implantação do Projeto de Irrigação Tabuleiros Litorâneos do Piauí - DITALPI, nos municípios de Parnaíba e Buriti dos Lopes, Norte do Estado, com a previsão de irrigar 10.000 hectares distribuídos em lotes para pequenos, médios e grandes produtores. Para implantação do projeto, foi necessária a desapropriação de 13.000 hectares.

Hoje o DITALPI beneficia os agricultores do território, possuindo uma área de 9.033,65 hectares, porém, apenas 8.007 ha são irrigáveis, ele foi dividido em duas etapas a primeira possui 2.273,00 hectares dividida em categoria de irrigante, conforme Quadro 01, e a segunda etapa, com o término das obras, irá possuir 5.985 há.

Quadro 01- DITALPI (primeira etapa) CATEGORIA DE

IRRIGANTE

AREA MEDIA (ha)

QUANTIDADE AREA TOTAL

(ha)

Pequeno Produtor 8,07 67 541,00

Técnico Agrícola - - -

Enge Agrônomo 18,50 6 111,00

Empresa 95,35 17 1.621,00

Total 90 2.273,00

Fonte: DNOCS (2019).

Os agricultores estão organizados integrando a Associação do Distrito de Irrigação de Parnaíba e esta não é responsável pelas práticas agrícolas dos produtores, é responsável apenas pelas vendas e regularização dos lotes de terras vendidos. As vendas dos produtos cultivados no DITALPI são de total responsabilidade das cooperativas.

Atualmente existem nos Tabuleiros Litorâneos três cooperativas que são BioFruta, Orgânicos e Parnaíba Litoral. O DITALPI beneficia 67 produtores, contemplados com os lotes, gerando emprego e renda e também alimentos de qualidade. A produção orgânica de alimentos é uma das principais características do distrito, fato que caracteriza a área como um dos poucos polos de fruticultura orgânica do país. No local são cultivados coco, uva, goiaba, banana, abacaxi e mamão. Contudo, o principal cultivo é de acerola.

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Por estar situada em Área de Proteção Ambiental do Delta do Parnaíba, o planejamento socioeconômico do território contempla atividades com características específicas que atentam para sustentabilidade do mesmo. Nesse sentido, alguns agricultores do Distrito de Irrigação dos Tabuleiros Litorâneos do Piauí (DITALPI), tem desenvolvido um modelo inovador do ponto de vista ambiental e tecnológico, a partir do conceito da produção biodinâmica7 na agricultura. Os agricultores associados, através das suas diferentes organizações, são estimulados a adotar novas práticas agrícolas, com o uso de material genético e de sistemas de fertilização inovadores. Muito deles com certificação orgânica pelo IBD e que serviu, nos últimos dois anos, para o desenvolvimento de tecnologia agrícola com manejo orgânico e o desenvolvimento de tratamento diferenciado do solo e das plantas, energizando seus frutos e aumentando a resistência às doenças e pragas. Ademais, começam a trabalhar, também, com o conceito de alimentos funcionais8, interagindo com a alimentação escolar.

Apesar de alguns autores restringirem a conceituação de alimentos funcionais apenas para aqueles compostos por elementos que ocorram naturalmente e não sinteticamente, em concentrações acima da normalmente presente nos alimentos convencionais, a maioria dos pesquisadores considera que os alimentos funcionais possam ser:

um alimento natural, não modificado; um alimento ao qual o componente foi adicionado para prover o benefício; um alimentos no qual um componente foi retirado por meios tecnológicos ou biotecnológicos para alcançar o benefício; um alimento em que um componente foi substituído por outro com propriedades mais favoráveis; um alimento cuja biodisponibilidade de um componente foi modificado;

um alimento formado pela combinação de quaisquer alternativas anteriormente citadas. (NITZKE, 2012, p. 15)

A prefeitura do município de Parnaíba, por meio do Departamento de Alimentação Escolar da Secretaria de Educação, tem planejado e administrado o cardápio oferecido aos alunos de maneira a contemplar os alimentos advindos da Agricultura Familiar. O diferencial observado foi uma iniciativa inovadora na medida em que busca inserir alimentos funcionais

7A biofortificação é o processo de produção de alimentos ricos em micronutrientes biodisponíveis. Essas culturas são naturalmente fortificadas com altos teores de vitaminas, minerais, proteínas, ferro, micronutrientes nas suas partes comestíveis, importantes para a saúde, como aquelas que atuam na redução do risco de doenças. Entre os alimentos “biofortificados” encontram-se frutas e hortaliças que demoram mais para amadurecer, reduzindo o desperdício (depoimento de agricultor do DITALPI).

8 Estão relacionadas ao papel metabólico ou fisiológico que um nutriente ou um não nutriente tem no crescimento, desenvolvimento, manutenção e outras funções do organismo humano (ANVISA). O Brasil foi um dos primeiros países a regulamentar o uso de alegações de propriedade funcional. Estes regulamentos tiveram como referência o Codex Alimentarius e a FAO/OMS. O International Life Sciences Institute of North America (ILSI, 1999) define alimentos funcionais como os alimentos que, em virtude dos seus compostos bioativos, fornecem benefícios à saúde, além da nutrição básica.

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e bioenergizados na escola desenvolvidos por agricultores associados dos Tabuleiros Litorâneos.

A acerola (Malpighia emarginata D.C.), que é o principal cultivo entre os agricultores familiares, esta sendo utilizados na merenda escolar como sucos biofortificados na medida em que acrescentam a moringa9 no composto, desenvolvido por um produtor do DITALPI que trabalha com este conceito biodinâmico nas suas culturas. Outros projetos de alimentos funcionais estão sendo desenvolvidos pela UFDPAR a partir da abóbora, macaxeira, algas marinhas. A capacidade de reposicionar alimentos, em particular os snacks como suplementos nutricionais de forma a fortalecer a Agricultura Familiar e a SAN, pode gerar iniciativas exitosas a serem replicadas. O grande desafio será a diminuição dos custos de produção.

O potencial de integração da Agricultura Familiar ao mercado mais dinâmico é grande. A acerola, por exemplo, pelo seu inegável potencial como fonte natural de vitamina C, além de conter 12 elementos antioxidantes e sua grande capacidade de aproveitamento industrial, têm atraído o interesse dos fruticultores e passou a ter importância econômica no território da APA do Delta do Parnaíba. O Brasil é o maior produtor, consumidor e exportador de acerola no mundo. Existem plantios comerciais em praticamente todos os Estados brasileiros. Contudo, é na região nordestina, por suas condições de solo e clima, onde a acerola melhor se adapta. Além de produzir praticamente durante os doze meses do ano, tem-se obtido na APA, com irrigação e manejo orgânico, produtividades de até 80 toneladas por hectare/ano.

As estimativas a respeito do tamanho do mercado de alimentos funcionais são bastante especulativas e dependem das definições utilizadas. Tal como os produtos orgânicos, apresenta uma capacidade aparentemente enorme de crescimento, à medida que novos critérios de segmentação encontrem uma boa aceitação por parte do consumidor:

alimentos funcionais para mulheres, para idosos, para crianças.

O mercado de alimentos funcionais tem crescido a taxas anuais de aproximadamente 10% e se revela um campo fértil de pesquisa e oportunidades comerciais.

Porém, de acordo com Jocelem Mastrodi Salgado10, as inovações em alimentos funcionais no Brasil são ainda incipientes se comparadas ao estágio em que se encontram hoje empresas do Japão, Estados Unidos e Europa. Ainda há um longo caminho a percorrer.

9 A moringa é repleta de benefícios para a saúde: tem mais proteína do que um iogurte e tanta quanto a carne de boi; mais potássio que a banana e mais vitaminas que a laranja. Além disso, ela possui uma enorme quantidade de antioxidantes, muita vitamina A e B, ferro e uma variedade de aminoácidos essenciais. Também há diversos minerais presentes, como cromo, ferro, selênio e zinco.

10 Professora da Esalq/ USP e presidente da Sociedade Brasileira de Alimentos Funcionais (SBAF),

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O diagnóstico realizado com os produtores locais do DITALPI apontou alguns fatores que dificultam a relação entre consumo de alimentos funcionais, produção da agricultura familiar e políticas públicas:

 Pouco conhecimento do mercado dos alimentos bioenergizados e funcionais e o seu papel na alimentação e saúde humana.

 Desafio de produção em escala com equipamento e processos mais demorados do que os convencionais;

 Baixa disponibilidade de recursos para pesquisa e desenvolvimento de novos produtos;

 Custo elevado das análises laboratoriais para confirmação de experiências.

 Burocracia para a comercialização dos alimentos.

O consumo de alimentos funcionais/ bioenergizados da agricultura familiar do território da APA do Delta da Parnaíba, a partir de hábitos alimentares crescentes nas escolas, apresenta um significativo passo em termos de SAN e traz boas perspectivas para o fortalecimento da cadeia produtiva local.

3 CONCLUSÃO

Os diferentes contextos da Agricultura Familiar no Brasil e suas políticas públicas, não são movidas pela mesma racionalidade. A forma genérica de se ver a Agricultura Familiar pode, na verdade, estar deixando de fora uma gama extremamente diferenciada de estabelecimentos produtivos com funções e atividades complementares diversas e, talvez fosse mais eficiente abrir estes programas nacionais de Agricultura Familiar por segmentos mais refinados sem ter em mente estritamente o aumentar da produção de alimentos tradicionais como, feijão, milho, arroz, suínos etc. Existem um leque de outras atividades que necessitam ser observadas e nunca são relacionadas do ponto de vista das políticas governamentais.

Iniciativas que visam o fortalecimento da Agricultura Familiar alinhada a alimentos bioenergizados ou alimentos funcionais, especialmente quando conectados à merenda escolar, tem sido apontada como uma das estratégias com maior poder de impacto na saúde da população, refletindo diretamente na melhoria dos níveis de SAN e qualidade de vida das comunidades. Ao mesmo tempo que insere o agricultor familiar no mercado mais dinâmico.

Neste contexto a escola é um espaço privilegiado para a promoção da saúde, por ter a missão de educar e contribuir para o desenvolvimento físico dos cidadãos, bem como a

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promoção de valores e hábitos ligados a SAN. Para tanto há que ter uma conexão maior entre o ambiente familiar, o escolar e os vários setores envolvidos na produção e beneficiamento de alimentos. A relação entre a alimentação escolar e a formação de hábitos alimentares não é um tema usualmente discutido entre os diferentes atores envolvidos no território.

Embora no campo da SAN a iniciativa da Prefeitura Municipal de Parnaíba, ao inserir alimentos funcionais no consumo da merenda escolar, seja de grande importância é interessante observar que a execução de políticas promotoras de saúde, em sua plenitude, somente será possível com amplo debate sobre como cada escola realiza efetivamente as diretrizes do programa e como os sujeitos envolvidos entendem tais planos e encaminhamentos na sua rotina diária. Compartilhar esta visão e hábito de consumo de alimentos naturais e funcionais no território relacionado a própria produção agrícola bioenergizada local é fundamental no processo de fortalecimento da SAN da população, como também, da consolidação deste mercado diferenciado. A Agricultura Familiar pode ter as mesmas condições e vantagens comparativas e competitivas geradas pela inovação, na medida em que pode chegar à mesa alimentos funcionais a um maior número de pessoas, e não somente para segmentos mais privilegiados economicamente.

Mostra-se, portanto que o conceito de alimentos bioenergizados e alimentos funcionais tem todo o sentido de racionalidade e pode resultar em ganhos efetivos, superiores à agricultura convencional, baseada em agroquímicos e destruidora da vida do solo, das plantas e, em consequência, da saúde das pessoas. Como experiência inovadora estas iniciativas de determinados atores locais (agricultores, gestores da alimentação escolar e pesquisadores) merecem a devida acolhida por parte dos investidores, agencias de financiamento, governos e, especialmente, dos futuros consumidores dos seus produtos, cuja contribuição, para a saúde humana constitui o fundamento primeiro do trabalho e do empenho por parte destes atores locais.

REFERÊNCIAS

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Referências

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