P revalência de hemoglobinas anormais
em recém-nascidos da cidade de Natal,
Rio Grande do Norte, Brasil
P revalence of abnormal hemoglobins in newborn s
in Natal, Rio Grande do Norte, Brazil
1 De p a rtamento de Pe d i a t r i a , Un i ve r s i d a d e Fe d e ral do Rio Grande do No rt e , Na t a l , Bra s i l . 2 Ce n t ro de Hematologia e He m o t e rapia do Rio Gra n d e do No rt e , Na t a l , Bra s i l . 3 Curso de Fa r m á c i a , Un i versidade Fe d e ral do Rio Grande do No rt e , Na t a l , Bra s i l .
4 De p a rtamento de An á l i s e s Clínicas e Tox i c o l ó g i c a s , Un i versidade Fe d e ral do Rio Grande do No rt e , Na t a l , Bra s i l .
C o r re s p o n d ê n c i a Maria Cristina Pignataro Em e renciano de Ara ú j o De p a rtamento de Pe d i a t r i a , Un i versidade Fe d e ral do Rio Grande do No rt e . Rua Ge n e ral Cord e i ro de Farias s/n, Na t a l , RN 5 9 0 1 0 - 1 8 0 , Bra s i l .
c r i s t i n a p i g n a t a ro @ b o l . c o m . b r
Maria Cristina Pignataro Em e renciano
de Araújo 1
Édvis Santos Soares Se rafim 2
Wi vel Antonio Pe re i ra de Ca s t ro Jr.3
Te reza Maria Dantas de Me d e i ros 4
A b s t r a c t
Hemoglobinopathies are among the most p re va-lent here d i t a ry diseases in humans. Studies in d i f f e rent areas of Brazil have identified the p re valence of S and C abnormal hemoglobins. The study analyzed 1,940 cord blood samples of newborns from maternity hospitals in Na-t a l , Rio Grande do No rNa-te SNa-t a Na-t e , Na-to inve s Na-t i g a Na-t e the pre valence of abnormal hemoglobins. Al l samples were submitted to cellulose acetate e l e c t ro p h o resis using a Tr i s - E D TA - b o rate b u f f e r at pH 8.5. El e c t ro p h o resis in agar gel pH 6.2 was performed on samples presenting abnor-mal hemoglobin. Some 37 (1.91%) of the new-borns presented hemoglobinopathies, as fol-l ow s : 29 (1.50%) sickfol-le cefol-lfol-l trait (Hb FA S ) , 6 (0.31%) heterozygous Hb C (Hb FAC ) , one ( 0 . 0 5 % ) h o m ozygous Hb S (Hb FS), and one (0.05%) Hb Ba rts suggestive of alpha thalassemia. The re-sults show the need to implement screening for hemoglobinopathies in the neonatal popula-t i o n .
Sickle He m o g l o b i n ; Sickle Cell An e m i a ; Ne o n a-tal Scre e n i n g
I n t ro d u ç ã o
As hemoglobinopatias são doenças genetica-mente determinadas e apresentam morbidade s i g n i f i c a t i va em todo o mundo 1.
De n t re as hemoglobinas anorm a i s, a hemo-globina S é a mais freqüente e os homoz i g o t o s ou port a d o res de anemia falciforme apre s e n-tam anemia hemolítica crônica, estando asso-ciada a manifestações clínicas importantes d e s-de os pri m e i ros anos s-de vida, incluindo aum e n-tada suscetibilidade a infecções e re c o r re n t e s episódios de oclusão vascular 2 , 3 , 4. Em b o ra o t raço falciforme (Hb AS) comumente seja as-s i n t o m á t i c o, há relatoas-s de morte as-súbita e com-plicações clínicas tais como hematúria, hipos-t e n ú ria, embolismo pulmonar e infarhipos-to esplê-nico especialmente quando os port a d o res são expostos a condições extremas de baixa tensão de oxigênio como ocorre em esforços físicos e x-t e n u a n x-t e s, despre s s u rização da cabine de vôo e em grandes altitudes 5.
A identificação de hemoglobinas anorm a i s em recém-nascidos permite o diagnóstico pre-coce de port a d o res de anemia falciform e, evi-tando ou reduzindo as complicações clínicas da doença, part i c u l a rmente as infecções pneu-mocócicas que constituem uma das pri n c i p a i s causas de mortalidade nesses pacientes 6 , 7 , 8.
dos recém-nascidos afetados, às quais poderá ser dado aconselhamento genético que possi-bilite uma decisão consciente em futura gra-v id ez 9.
As duas hemoglobinas anormais mais fre-qüentes na população bra s i l e i ra são as hemo-globinas S e C, ambas de origem africana, evi-denciando a intensa participação do negro a f ri-cano na composição populacional bra s i l e i ra
1 0 , 1 1. Esse fato é bem cara c t e rizado nos estudos de pre valência de hemoglobinopatias re al i z a-dos em diferentes regiões do Brasil 1 2 , 1 3 , 1 4 , 1 5 , 1 6 , 1 7 , 1 8 , 1 9 , 2 0 , 2 1.
Nesse estudo objetivamos investigar a pre-valência de hemoglobinopatias em neonatos por intermédio da triagem em sangue de cor-dão umbilical em uma população da cidade de Natal, Rio Grande do No rt e, Brasil.
Casuística e métodos
No período de janeiro a deze m b ro de 2001, fo-ram analisadas 1.940 amostras de sangue de c o rdão umbilical de recém-nascidos prove-nientes de três maternidades públicas da cida-de cida-de Natal: 830 amostras da Ma t e rnidacida-de Es-cola Ja n u á rio Cicco (MEJC), da Un i ve r s i d a d e Fe d e ral do Rio Grande do No rte (UFRN); 797 do Hospital e Ma t e rnidade Santa Ca t a rina, da Se c re t a ria Estadual de Saúde; e 313 da Un i d a d e Mista Ma t e rn o - Infantil de Lagoa Seca, da Se-c re t a ria MuniSe-cipal de Saúde do Estado do Rio Grande do No rt e.
Os recém-nascidos foram escolhidos alea-t o ri a m e n alea-t e, independenalea-temenalea-te da idade ges-tacional e tipo de part o, após as mães serem in-f o rmadas sobre o estudo e assinarem o Te rm o de Consentimento Co n s c i e n t e. As va ri á veis a va-liadas durante a coleta foram grupo étnico ma-t e rn o, nama-turalidade mama-terna e procedência das a m o s t ra s. O grupo étnico materno foi definido por bra n c o, pardo e negro, considerando cri t é-rios como cor da pele, textura do cabelo e for-mato do nariz e lábios.
A coleta do sangue foi efetuada pelo obste-t ra re s p o n s á vel pelo parobste-to após o clampeam e n-to do cordão umbilical, colocadas em tubos contendo anticoagulante (EDTA) na pro p o r ç ã o de 1mg/mL de sangue e acondicionadas em g e l a d e i ra até o momento das análises, não ex-cedendo 48 hora s. In i c i a l m e n t e, os eri t r ó c i t o s f o ram lavados três vezes em solução de clore t o de sódio 0,154 M a 20oC e, em seguida, lisados com saponina a 1% 1 0. Todas as amostras fora m submetidas à eletro f o rese de hemoglobina em acetato de celulose utilizandose tampão Tri s -E D TA - Bo rato pH 8,5 2 2. As amostras que
apre-s e n t a ram hemoglobinaapre-s anormaiapre-s em pH alca-lino foram submetidas à eletro f o rese em gel de ágar pH 6,2, para confirmação das hemoglobi-nas anormais S e C 2 3.
Foi realizado estudo familiar de dez re-c é m -nasre-cidos que apre s e n t a ram hemoglobi-nas anormais e re t o rn a ram após os dois meses de vida para confirmação do diagnóstico. As a m o s t ras de sangue dos pais e das crianças fo-ram submetidas à eletro f o rese em pH alcali-n o, e aquelas que apre s e alcali-n t a ram hemoglobialcali-nas a n o rmais foram confirmadas mediante eletro-f o rese de hemoglobina em pH ácido e teste de solubilidade 2 4.
A análise estatística dos dados foi baseada em cálculos percentuais das va ri á veis qualita-t i va s. O qualita-tesqualita-te do qui-quadrado (χ2) foi utilizado com a finalidade de comparar as fre q ü ê n c i a s, utilizando-se nível de significância de 5%. A p a rte computacional foi realizada com base no pacote estatístico Statistica for Wi n d ows by St a t Soft, inc. versão 5.1, edição 1997.
O projeto de pesquisa foi previamente a p ro-vado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da U F R N e desenvolvido cumprindo integralmente os p ri ncípios éticos estabelecidos na Re s o l u ç ã o 196/96 do Conselho Nacional de Sa ú d e.
R e s u l t a d o s
A Tabela 1 apresenta os tipos de hemoglobinas e n c o n t radas nas análises das 1.940 amostra s de sangue de cordão umbilical, re l a c i o n a n d o os seus genótipos com o grupo étnico matern o. Do total analisado, 1.903 (98,09%) cri a n ç a s a p re s e n t a ram perfil eletroforético normal FA . O traço falciforme (genótipo FAS) foi o mais p re va l e n t e, re p resentando 1,5%, e a anemia f a l-c i f o rme (genótipo FS) l-correspondeu a 0,05%. Fo ram ainda detectados os genótipos FAC (0,31%) e a hemoglobina FA + Ba rt’s (0,05%).
As freqüências gênicas ve rificadas fora m 0,9905 para o gene βA, 0,0080 (gene βS) e 0,0015 p a ra o gene βC. Valendo-se do cálculo de Ha rd y-We i n b e rg, observou-se por meio do teste qui-q u a d rado (p < 1) qui-que a distribuição dos fenóti-pos na população se encontra dentro do espe-ra d o.
Cidade de Natal, com pre valência de 0,70% pa-ra o tpa-raço falciforme e 1,41% papa-ra o tpa-raço da hemoglobina C. Tomando-se por base as 1.798 a m o s t ras de crianças cujas mães eram natura i s do Estado do Rio Grande do No rte (Grande Na-tal e interior do Estado), 34 apre s e n t a ram he-moglobinas anorm a i s, re p resentando uma pre-valência de 1,89%.
Os dados expostos na Tabela 3 mostram os genótipos das dez crianças port a d o ras de he-moglobinas anorm a i s, que re t o rn a ram para c o n f i rm a ç ã o, e de seus familiare s.
D i s c u s s ã o
A cidade de Natal, capital do Estado do Rio Grande do No rte está situada na Região No r-deste do Brasil e tem sua composição étnica re-sultante da miscigenação de índios, brancos e n e g ros afri c a n o s. A maioria dos brancos ve i o
de Po rtugal; os negro s, principalmente da Co s-ta Oeste da África; e os índios das tribos Po t i-guar (Tupi), Tapuia e Ca ri ri 2 5 , 2 6.
At u a l m e n t e, de acordo com os re s u l t a d o s obtidos na Pesquisa Nacional por Amostra de D o m i c í l i o, o Rio Grande do No rte tem um total de 2.777.509 habitantes. Desse total, 1.454.665 (52,37%) foram classificados como pard o s, 1.171.699 (42,19%) bra n c o s, 126.441 (4,55%) n e g ro s, 2.374 (0,09%) da raça amarela, 3.169 (0,11%) de origem indígena e 19.161 (0,69%) sem declaração 2 7.
A amostra estudada foi constituída por uma maior percentagem de recém-nascidos cujas mães eram pard a s, re p resentando 62,10% da amostra. O grupo étnico branco contribuiu c o m 27,10% e o negro com 10,80% ( Tabela 1). As d i s c repâncias entre os percentuais da amostra analisada e os dados do IBGE se dão em virt u-de da dificuldau-de u-de cara c t e rização do gru p o étnico pela cor da pele.
Tabela 1
P revalência de hemoglobinas anormais em recém-nascidos conforme o grupo étnico matern o .
Grupo étnico G e n ó t i p o s To t a l
m a t e rn o FA FA S FA C F S FA + B a r t ’s
n % n % n % n % n % n %
B r a n c o 5 1 9 2 6 , 7 5 7 0 , 3 6 0 0 , 0 0 0 0 , 0 0 0 0 , 0 0 5 2 6 2 7 , 1 0
P a rd o 1 . 1 7 9 6 0 , 7 7 2 1 1 , 0 9 4 0 , 2 1 1 0 , 0 5 0 0 , 0 0 1 . 2 0 5 6 2 , 1 0
N e g ro 2 0 5 1 0 , 5 7 1 0 , 0 5 2 0 , 1 0 0 0 , 0 0 1 0 , 0 5 2 0 9 1 0 , 8 0
To t a l 1 . 9 0 3 9 8 , 0 9 2 9 1 , 5 0 6 0 , 3 1 1 0 , 0 5 1 0 , 0 5 1 . 9 4 0 1 0 0 , 0 0
χ2
( 2 )= 1,34.
p = 0,49.
FAS = Genótipo normal; FAZ = Traço falciforme; FAC = Traço para hemoglobina C; FS = Homozigoto para hemoglobina S (anemia falciforme); FA+Bart´s = Heterozigoto para alfa talassemia.
Tabela 2
P revalência de hemoglobinas anormais em recém-nascidos conforme a naturalidade matern a .
N a t u r a l i d a d e N ú m e ro G e n ó t i p o s To t a l
m a t e rn a de amostras FA S FA C F S FA + B a r t ’s
t e s t a d a s n % n % n % n % n %
I 1 . 1 1 0 2 1 1 , 8 9 2 0 , 1 8 0 0 , 0 0 0 0 , 0 0 2 3 2 , 0 7
I I 6 8 8 7 1 , 0 2 2 0 , 2 9 1 0 , 1 5 1 0 , 1 5 1 1 1 , 6 0
I I I 1 4 2 1 0 , 7 0 2 1 , 4 1 0 0 , 0 0 0 0 , 0 0 3 2 , 1 1
To t a l 1 . 9 4 0 2 9 1 , 5 0 6 0 , 3 1 1 0 , 0 5 1 0 , 0 5 3 7 1 , 9 1
χ2
( 2 )= 0,53
p = 0,77
A pre valência das hemoglobinas S e C en-c o n t radas nesse estudo não difere dos re s u l t a-dos obtia-dos em estudo anterior realizado na população de Natal como também de outro s a u t o res que analisaram essa distribuição em d i versas regiões do Brasil 1 1 , 1 3 , 1 6 , 1 7 , 1 9 , 2 0 , 2 8.
Analisando-se a pre valência de hemoglo-b inas anormais de acordo com a natura l i d a d e m a t e rna foi encontrado um maior perc e n t u a l nas crianças cujas mães eram provenientes de o u t ros estados do Brasil, contudo, re s i d e n t e s na cidade de Natal, re p resentando 2,11% com p re valência de 0,70%, para o traço falciform e, e 1,41%, para o traço da hemoglobina C (Ta b e l a 2). En t re t a n t o, não houve diferença estatistica-mente significativa entre os grupos (p = 0,07).
A cro m a t o g rafia líquida de alta re s o l u ç ã o ( H P LC) é considerada uma técnica altamente s e n s í vel para o estudo das hemoglobinas anor-mais porque evidencia pequenas quantidades de Hb A, bem como Hb S, Hb C e outras hemo-globinas anorm a i s, na presença de gra n d e s quantidades de Hb F. Os sistemas automatiza-dos pro p o rcionam um processamento rápido das amostras com um alto índice de re p ro d u t i-bilidade e exatidão, constituindo-se num exc e-lente método para triagem neonatal 6. To d a v i a , na litera t u ra, vários trabalhos demonstram a eficácia da eletro f o rese de hemoglobina em pH a l c a l i n o, seguida de eletro f o rese em pH ácido p a ra a detecção de hemoglobinopatias em san-gue de cordão 8 , 1 2 , 1 5 , 2 9.
A metodologia empregada nesse estudo m o s t rou-se sensível para diagnosticar hemo-globinas anormais em sangue de cord ã o. Obte-ve-se boa separação das hemoglobinas S e C e das hemoglobinas A e F, além da detecção de
hemoglobina Ba rt’s, encontrada em 0,05% da a m o s t ra total analisada, o que sugere o diag-nóstico de portador de alfa talassemia.
A presença da hemoglobina Ba rts também foi observada por Ruiz et al. 2 8, utilizando gel de ágar de amido, encontrando uma pre va l ê n-cia de 0,39% ao analisar 2.281 amostras de san-gue de cordão umbilical na cidade de Sa n t o s, São Pa u l o. Um estudo mais recente re a l i z a d o por Vi a n a - Ba racioli et al. 2 0, utilizando eletro-f o rese em pH alcalino e pesquisa de hemoglo-bina H intra - e ri t ro c i t á ria, evidenciou a pre va-lência de 4,38 % de Hb Ba rts em amostras de sangue de cordão umbilical de re c é m - n a s c i d o s do Hospital de Base de São José do Rio Pre t o, São Pa u l o.
Na litera t u ra, existem várias publicações relacionadas ao diagnóstico neonatal das he-moglobinopatias em diversos países, demons-t rando a impordemons-tância desse procedimendemons-to na redução da mortalidade em crianças menore s de cinco anos de idade 2 9 , 3 0 , 3 1 , 3 2.
No Brasil, diversos pesquisadores têm re a l i-zado estudos para a identificação de hemoglo-binas anormais em re c é m - n a s c i d o s. Ra m a l h o et al. 3 3p e s q u i s a ram a hemoglobina S em san-gue de cordão umbilical de 220 re c é m - n a s c i-dos na cidade de Ca m p i n a s, São Pa u l o, encon-t rando a pre valência de 2,72% para o encon-traço fal-c i f o rm e. A mesma pre valênfal-cia para o heteroz i-goto da hemoglobina S foi encontrada por Ru i z et al. 2 8, em um estudo realizado com 2.281 re-cém-nascidos da cidade de Sa n t o s. No Estado de Minas Ge ra i s, o pro g rama de triagem neo-natal para doença falciforme iniciado em mar-ço de 1998, analisou 605.419 cri a n ç a s, encon-trando uma prevalência de 3,2% para o traço f a l-c i f o rm e, 1,3% para o portador da hemoglobina C e 0,08% para doenças falciformes 3 4. Re c e n-t e m e n n-t e, esn-tudos realizados por Ducan-tn-ti en-t al.
1 5, em São José do Rio Pre t o, São Pa u l o, e Da u d t et al. 1 4, em Po rto Alegre, Rio Grande do Su l , e v i d e n c i a ram uma pre valência de 3,72 % e 1,2 %, re s p e c t i va m e n t e, para o traço falciform e.
A pre valência de 1,5% para o traço falcifor-me encontrada nesse estudo mostrou-se infe-rior à observada por Ba n d e i ra et al. 1 2em 1.988 recém-nascidos de Pe rn a m b u c o. Essa difere n ç a pode ser explicada pelo grande contingente de e s c ra vos africanos trazidos para aquele estado d u rante o período colonial bra s i l e i ro, fato que não ocorreu no Estado do Rio Grande do No rt e. Fo ram enviadas correspondências a todas as mães dos recém-nascidos que apre s e n t a ra m hemoglobinas anormais com o intuito de con-vidá-las a comparecer ao ambulatório de he-matologia do He m o n o rt e, para re c e b e rem o aconselhamento genético.
Tabela 3
Resultados dos genótipos das crianças portadoras de hemoglobinas a n o rmais e seus familiares, após confirm a ç ã o .
I d e n t i f i c a ç ã o G e n ó t i p o s
C r i a n ç a P a i M ã e I rm ã o
1 (E. R. T. ) A S A A A S A A
2 (F. L. C. O.) A S A S A S –
4 (M. F. A. S.) A S A S A A –
7 (G. N. A.) S F A S A S –
9 (A. D. N.) A S A S A A –
16 (G. P. C.) A S A S A A –
18 (A. C. M. L.) A S A S A A –
24 (E. C. L. A.) A C A C A A –
31 (T. S. N.) A S A A A S –
Das 37 crianças port a d o ras de hemoglobi-nopatias detectadas, apenas dez re t o rn a ra m , após dois meses, para confirmação do diag-nóstico e realização do estudo familiar (Ta b e l a 3). Admite-se que o re t o rno foi prejudicado pe-la dificuldade de localização de endereço de al-gumas mães, pela falta de conhecimento sufi-ciente sobre a importância do diagnóstico des-sa alteração genética e pelo reduzido poder a q u i s i t i vo da maioria delas.
Fo ram detectados dois casais considera d o s de ri s c o, heterozigotos para a hemoglobina S (Tabela 3). Os pais da criança, a qual apre s e n-tou traço falciform e, após re c e b e rem ori e n t a-ção médica sobre a alteraa-ção genética e a pro-babilidade do nascimento de filhos com ane-mia falciform e, decidiram não mais arri s c a r uma nova gestação. A criança diagnosticada como port a d o ra de anemia falciforme foi ins-c rita no ambulatório de hematologia do He m o-n o rte para acompao-nhameo-nto médico, io-ncluio-n- incluin-do o uso de terapia pre ve n t i va com antibiótico e esquema de va c i n a ç ã o.
A Po rt a ria do Mi n i s t é rio da Saúde no8 2 2 , de 6 de junho de 2001, publicada no Di á rio
Ofcial da União de 7 de junho de 2001, determ i-nou a obri g a t o riedade do Pro g rama Na c i o n a l de Triagem Neonatal em todo o Te r ri t ó rio Na-cional, tendo como objetivo o desenvo l v i m e n-to de ações de triagem neonatal, diagnóstico, acompanhamento e tratamento das doenças congênitas como fenilcetonúria, hipotire o i d i s-mo congênito, fibrose cística, doenças falcifor-mes e outras hemoglobinopatias 3 5.
L e vando-se em conta a extensão de nosso p a í s, a miscigenação racial e a pre valência das h e m o g l o b i n o p a t i a s, torna-se necessária a ex-pansão dos centros de triagem para detectar estas alterações genéticas, a fim de perm i t i r um melhor conhecimento sobre esse grupo de doenças here d i t á ri a s.
No Estado do Rio Grande do No rte não há relato de estudos re f e rentes à identificação de hemoglobinas anormais no período neonatal. Os resultados obtidos nesse estudo perm i t e m recomendar a implementação de um pro g ra-ma para triagem neonatal de hemoglobinopa-tias em nosso Estado, oferecendo orientações e aconselhamento genético às famílias das c ri a n-ças port a d o ras de hemoglobinas anorm a i s.
C o l a b o r a d o re s
M. C. P. E. Araújo contribuiu na elaboração do pro j e-to de pesquisa, coleta de amostra s, análises labora t o-ri a i s, interpretação dos dados e redação do texto. W. A. P. Ca s t ro Jr. auxiliou na execução das análises labo-ra t o ri a i s. E. S. S. Se labo-rafim participou do acompanha-mento e orientação médica aos pais e familiares dos recém-nascidos que apre s e n t a ram hemoglobinas a n o rm a i s. T. M. D. Me d e i ros contribuiu na execução das análises labora t o riais e redação do texto, assim como na revisão final da versão para publicação. R e s u m o
As hemoglobinopatias estão incluídas dentre as doen-ças hereditárias mais freqüentes nas populações hu-m a n a s . Estudos realizados ehu-m diferentes regiões do Brasil têm demonstrado que as hemoglobinas anor-mais S e C são as anor-mais pre va l e n t e s . Com o objetivo de i n vestigar a pre valência de hemoglobinas anormais no período neonatal, f o ram analisadas 1.940 amos-t ras de sangue de cordão umbilical provenienamos-tes de re-cém-nascidos de três maternidades da cidade de Na-t a l , Rio Grande do No rNa-t e . Todas as amosNa-tras fora m submetidas à eletro f o rese de hemoglobina em acetato de celulose utilizando tampão Tr i s - E D TA - Bo rato pH 8 , 5 . As amostras que apre s e n t a ram hemoglobinas anormais foram submetidas à eletro f o rese em gel de ágar pH 6,2 para confirmação. Fo ram identificadas 37 (1,91%) amostras com hemoglobinas anormais, d a s quais 29 (1,50%) com traço falciforme (Hb FA S ) , 0 6 (0,31 %) com Hb C, uma (0,05 %) com anemia falcifor-me (Hb FS) e uma (0,05 %) apresentou Hb Ba rt’s ,s u g e-rindo alfa talassemia. Os resultados encontrados evi-denciam a necessidade de implantação da triagem de hemoglobinopatias em recém-nascidos na nossa po-p u l a ç ã o.
R e f e r ê n c i a s
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Recebido em 13/Ja n / 2 0 0 3