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CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR:
Como as empresas convivem com ele?
Banca examinadora
Prof. Orientador: Prof. DL Paulo Goldschmidt Pro f.DL Isidoro B1ikstein
FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS
ESCOLA DE ADMlNISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO
'.
João Luis Hamburger
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR:
Como as empresas convivem com ele?
I
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação - Opção Profissional: MBA da FGV/EAESP
Área de Concentração: Marketing
Orientador: Prof. Dr. Paulo Goldschmidt
SÃO PAULO 1999
Fundação Getulio Vargas , Escola de Administração .
V de Empresas de 51.0 Paulo
Biblioteca .
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, N 1199902568
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Aos meus filhos Flávio e Marcelo;
À minha esposa Ruth, com todo amor; A meu pai (in memoriam)
e
HAMBURGER, João Luis. Código de Defesa do Consumidor: Como as empresas
convivem com ele? São Paulo: EAESPIFGV, 1999. 101p. (Dissertação de Mestrado
apresentada ao Curso de Pós-Graduação - Opção Profissional: MBA da EAESPIFGV,
Área de Concentração: Administração Mercadológica).
Resumo: O trabalho analisa o impacto do Código de Defesa do Consumidor nas relações
entre empresas e consumidores no Brasil. Descreve a evolução do direito do consumidor
no Brasil e avalia o momento atual verificando de forma exploratória como as empresas
se adaptaram às exigências do CDC. Compara o Brasil com alguns países. Levanta
questões para futuros estudos sobre o assunto.
Abstract: page 76
Palavras-Chaves: C6digo de Defesa do Consumidor, direito do consumidor, consumerismo,
ética, marketing, reclamações, atendimento ao cliente, legislação.
Sumário
Introdução Pág.01
Capítulo I - Evolução da Defesa do Consumidor no Brasil
1.1 - Antes do Código de Defesa do Consumidor
1.2 - A Constituição de 1988 e o Código de Defesa do Consumidor
Pág. 10
Pág. 10
Pág. 17
Capítulo II - Uma Visão Geral do Código de Defesa do Consumidor
2.1 - Principais direitos definidos
Pág.20
Pág.20
Pág.21
Pág.22
Pág. 23 2.2 - Principais ~arantias e mecanismos de defesa
2.3 - Limitações àatuação das empresas e principais sanções aplicáveis
2.4 - Alterações no comportamento das empresas provocadas pelo CDC
Capítulo IH - A Defesa do Consumidor em Outros Países 3.1 - Estados Unidos
Pág. 28 Pág.29 Pág.33 Pág.35 Pág. 37 Pág.38 3.2 - Europa
3.3 - Argentina
3.4 - Chile
3.5 - Mercosul- demais membros
Capítulo IV - Estudo Exploratório Pág.40
Pág.40
Pág.40
Pág.41
Pág.44
Pág.58 4.1 - Considerações iniciais
4.2 - Objetivo do estudo exploratório
4.3 ~ Desenho do estudo
4.4 - Dados coletados \
Capítulo V - Conclusão
5.1 - Limitações do estudo
5.2 - Sugestões para futura pesquisa
Pág.60
Pág.62
Pag.64
Bibliografia
I. Bibliografia de livros e periódicos (papers)
lI. Bibliografia de jornais e periódicos (revistas)
111.Endereços de correio eletrônicos
Pág.66
Pág.69
Pág. 74
Abstract Pág. 76
Anexos
I. Íntegra da Lei n° 8.078 de II/set/1990
lI. Roteiro de questionário utilizado no estudo
1I1. Número de reclamações fundamentadas no PROCON/SP por tipo (1998)
Pág. 77
Pág. 98
Agradecimentos
Agradeço ao Professor Paulo Goldschmidt, por ter aceito me orientar na preparação
deste trabalho e pelos conselhos recebidos.
Agradeço a todos os colegas do MBA que colaboraram para obter respostas das
respectivas empresas.
Agradeço a todas as empresas que responderam ao questionário .
.
Agradeço ao PROCON/SP e ao IDEC pelo fornecimento de dados estatísticos
solicitados, que serviram de suporte a este trabalho.
Agradeço àqueles que leram este trabalho, com sugestões de melhoria gramatical e de
forma: minha mãe, minha irmã Ruth, minha esposa e meu sogro, Jacó Guinsburg.
Agradeço ainda a minha mãe e irmã por todo o estímulo e apoio, assim como por
algumas dicas que me forneceram sobre literatura que poderia vir a ser útil.
Agradeço à Rhodia Brasil Ltda. Pelo apoio dado no decorrer do meu curso de MBA, e
em particular os meus superiores neste período, Eduardo João Dudorenko e Luiz Carlos
-,
Sacchi.
Finalmente e acima de tudo, um agradecimento especial para minha esposa Ruth e
meus dois filhos por toda aicompreensão e apoio dados no decorrer da preparação deste
trabalho (e no curso do MBA como um todo). Parafraseando uma dedicatória de P G
Wodehouse (THE OXFORD DICTIONARY OF MODERN QUOTATIONS, Oxford
I
University Press, 1991, p. 230): sem a colaboração na digitação deste trabalho por parte
/
Introdução
No quadro de competitividade global em que a economia brasileira atualmente
se insere, é cada vez mais importante às empresas procurarem o bom atendimento de
seus clientes e consumidores, como meio de defesa de sua participação do mercado.
Seus atos podem ser questionados pela imprensa, pelo governo, por entidades de
defesa do consumidor, etc. (KOTLER, 1988, pp. 142-34). Independentemente das
exigências do mercado, porém, há as exigências legais que as empresas devem seguir
mesmo que não explicitamente demandadas por este mercado. Afinal, todos devem
obedecer à lei.
Ainda assim, há empresas que decidem seguir ou não determinada legislação
conforme suas conveniências econômicas: se elas entenderem que há baixa
possibilidade de sanções pelo não cumprimento desta lei por deficiências da
fiscalização, que estas sanções são menos onerosas do que as exigências dessas leis
ou ainda que a morosidade do processo judicial torna mais vantajoso desrespeitar a
legislação, essas empresas poderão optar por um certo grau de não observância da
mesma. São situações de moral hazard (Cf. MILGROM & ROBERTS, 1992, pp. 166-204). Pode ainda haver diferenças de interpretação, questionamento da
constitucionalidade da lei ou da legalidade da regulamentação da mesma. Por isto que
se diz, no Brasil, que há "leis que pegam, e leis que não pegam".
A questão que se coloca é: até que ponto o Código de Defesa do Consumidor
(CDC) foi uma lei que "pegou"? Quais as alterações de comportamento ou atuação
por parte das empresas brasileiras provocadas pela entrada em vigor do Código? E até
que ponto tais alterações foram efetivamente provocadas pelo CDC ou por outros
fatores, como a economia mais competitiva e globalizada ou as evoluções
Uma coisa parece certa: houve de fato uma melhora nos últimos anos na
relação consumidor-fomecedor.tcomo mostraremos mais adiante. O CDC parece ter
sido um dos fatores para isto, mas não só. A maior abertura da economia brasileira,
acirrando a concorrência inclusive com fornecedores externos, aumentou a
necessidade do fornecedor de buscar a satisfação do cliente, levando à queda de
preços em muitos segmentds., ao lançamento de produtos mais modernos e avançados
e mesmo a um melhor atendimento do cliente (LAZZARINI, 1997, pp. F7-F8). Pode
ser que, se a economia fosse tão fechada como nas décadas de 1970 e 1980, o CDC
em si não fosse suficiente para alterar o comportamento dos empresários vis-à-vis
seus consumidores. Mas que a lei teve um impacto importante não pode ser negado,
haja visto o aumento nas reclamações (judiciais, extrajudiciais e através de órgãos da
imprensa escrita, falada e televisionada) por consumidores que se sentem
prejudicados. Um elemento que contribuiu para isso foi a criação dos Juizados
Especiais ou de Pequenas Causas, atualmente regulamentados pela Lei Federal
9099/95. Há atualmente 759 deles, em todos os Estados da Federação, responsáveis
por 65% dos processos abertos no Brasil (RAMOS, "A Justiça mostra seu lado
cigano", p. 47). Só no Estado de São Paulo, as causas julgadas por esses Juizados
aumentaram de pouco mais de 1.700 em 1988 para mais de 164.000 em 1997, um
aumento expressivo de 66% ao ano ("Justiça para todos", CONSUMIDOR S.A., n°
37, dezembro/98, pp. 16-17). A rapidez de julgamento dos processos nestes juizados
também contribuiu para aumentar o ânimo do consumidor de reclamar contra as
violações a seus direitos. Por outro lado, ao dispensar a presença de advogados nas
causas cíveis de pequeno valor, esta lei provocou uma certa oposição corporativa da
Ordem dos Advogados do Brasil (MACHADO, 1998, p. 7).
Outro aspecto importante foi o progresso tecnológico ocorrido nos últimos
anos, aumentando o grau de informatização das empresas e barateando o custo das
telecomunicações, o que pode ter sido um fator importante para estimular a criação de
acompanhamento das reclamações ou para fornecimento de informações. Inovações
como o código de barras facilitam o controle do estoque e a rastreabilidade de lotes
de produtos com eventuais problemas, para correção ou substituição. Caixas
informatizadas agilizam o atendimento e reduzem o número de erros em lojas e
bancos. Muitos produtos apresentam melhorias e redução de custo graças à inovação
tecnológica e à maior disponibilidades de insumos (não mais restritos aos nacionais,
que, pela proteção contra a concorrência internacional que vigorou nos anos 70 e 80,
eram freqüentemente atrasados tecnologicamente e caros).
Mas, e do lado das empresas? Se, de forma geral, o objetivo de uma empresa
"
deve ser o de procurar melhor atender às necessidades de seus consumidores, como
meio de garantir fidelidade e crescimento (é nisto afinal que se fundamenta o
marketing), ela por vezes pode entender que há condições de maximizar seu lucro
mesmo não fazendo o melhor atendimento possível, graças à falta de opções para o
I
consumidor (se houver pouca concorrência), à falta de informação deste, à sua não
organização ou à ausência de meios para o consumidor fazer valer seus interesses ou
direitos.
Como mostramos abaixo, o sentimento de que precisam estar melhor
defendidos acabou levando os consumidores a se organizarem em instituições de
defesa de seus direitos, e a movimentos para introduzir (e fazer cumprir) leis para
defendê-los contra os abusos do fornecedor. É o que se costuma chamar de
Consumerismo (CAMPOS, 1991, p.11). Segundo KOTLER (1988, p. 142), trata-se
de "um movimento organizado de cidadãos e governo para fortalecer os direitos dos
compradores em relação as vendedores", através do aumento da informação e
proteção ao consumidor e da educação do mesmo. Na parte da informação, inclui o
direito deste último conhecer o custo real de uma operação financeira, a composição
de um produto, seu prazo de validade, seu valor nutritivo, suas contra-indicações e
riscos e seus reais benefícios. Já ENGEL et aI. (1990, p. 759) definem consumerismo
consumidor enquanto estes estiverem envolvidos numa relação de troca com qualquer
tipo de organização".
o
consumerismo surge a partir do sentimento do consumidor de não ter informações suficientes sobre '0 produto, de falhas de desempenho deste, do mauatendimento pelo fornecedor, do orçamento apertado dos compradores e das
diferenças de visão sobre o que constitui o mercado adequado (AAKER & DA Y,
1974, pp. xxiii-xxv).
o
aumento do movimento de defesa do consumidor nas últimas décadas podeser explicado pela maior conscientização do consumidor, mas outros fatores, como o
estado da economia, a dificuldade de entender como usar produtos mais complexos, a
obsolescência planejada do produto, a sensação de abuso de poder econômico por
parte das empresas, podem ter influenciado também esta expansão (HAMBURGER,
1972, pp. 59-63).
-.
Além disto, produtos mais 'complexos, de compra menos freqüente, com alto
grau de inovação tecnológica, são de difícil compreensão para o consumidor no que
diz respeito às informações necessárias à escolha do produto adequado (Holton,
Richard H., Prefácio, em AAKER &DA Y, 1974, pp. xii-xiii).
Muitas empresas podem se ressentir do movimento consumerista,
entendendo-o centendendo-omentendendo-o um fatentendendo-or para denegrir a imagem da empresa e aumentar seus custentendendo-os. Há até
mesmo aquelas que vêem os consurneristas como agitadores, opositores à iniciativa
privada, geradores de burocracia, fora da realidade do mercado e que contribuem
mais para aumentar o custo do produto do que para melhorá-lo (ZULZKE, 1997, p.
17). Há muitas alegações de que medidas excessivas de proteção ao consumidor
podem levar a preços mais elevados e a opções reduzidas de produtos por parte do
consumidor (Winter, Ralph K., "The Consumer Advocate Versus The Consumer", in
Já outras empresas podem reconhecer o impacto no comportamento do
consumidor de acusações contra elas de práticas danosas e preferem implementar
medidas que vão de encontro às exigências consumeristas, até como uma estratégia
de marketing, de diferenciação em relação à concorrência. Departamentos de
atendimento ao consumidor são cada vez mais freqüentes, não só como forma de se
precaver contra ações legais realizadas por consumidores insatisfeitos, mas também
como uma maneira de ter contato com o consumidor, de receber feedback e sugestões
deste quanto aos produtos fornecidos pela empresa e a qualidade de seu serviço
(KOTLER, 1988, pp. 142-43).
Afinal, o consumidor que reclama ativamente de um mau serviço ou produto
reflete inúmeros outros, que podem não ser ativos, mas manifestam sua insatisfação
de uma forma mais silenciosa, porém bastante eficaz: abandonando o consumo deste
serviço ou produto (ZULZKE, 1997, pp. 51-52). Isto sem se falar no efeito
boca-a-boca: o consumidor insatisfeito 'transmite sua decepção a outros que, influenciados
pelo conhecimento da experiência negativa, também evitarão consumir o produto
(idem, p. 56). Pesquisa da USA National Customer evidenciou que mais da metade
dos consumidores nos Estados Unidos com reclamações atendidas voltaram a
comprar produtos ou serviços da empresa questionada, contra apenas 19% dos que
não tiveram seus casos solucionados - e apenas 10% dos que sequer reclamaram
(BLECHER, 1998, p. 54). Para KOTLI~R (citado em ROJO, 1998, p. 30), o custo de
manter um consumidor atual é cinco vezes menor do que o de atrair um novo. Isto
mesmo levando em conta que consumidores ativos na defesa de seus interesses são
uma minoria em relação ao universo econômico de consumidores como um todo
(SCHNAPPER, Eric, "Consumer Legislation and lhe Poor" , in AAKER & DA Y, 1974, pp. 92-93).
Em resumo, a empresa que não ignora o consumerismo, mas o usa como um
canal para conhecer necessidades do consumidor antes ignoradas ou desprezadas,
ameaças de aumento de custo e processos judiciais (KOTLER, 1988, pp. 142-43, e
AAKER & DA Y, 1974, pp. 113-128). Os Serviços de Atendimento ao Consumidor/Cliente (SAC) são, por um lado, um meio de se ter diariamente contato
com os consumidores finais dos produtos da empresa e, por outro, uma forma de
evitar o desgaste da imagem da empresa e os custos decorrentes de pendências
judiciais (ZULZKE, 1997, p. 6-7). Pela própria natureza, porém, os SAC's podem
entrar em choque com a burocracia tradicional das empresas não estruturadas para
receber inputs dos consumidores. E estes consumidores precisam saber (através de
rótulos nas embalagens do produto, por exemplo) da existência do SAC e qual o
canal mais adequado para entrar em contato com ele (idem, p. 60).
Curiosamente, pesqui~a'Qe QUEIROZ et aI. (1999, pp. 27-32) concluiu que o
consumidor avalia a eficácia do SAC mais pela qualidade do atendimento do que pela
resolução do problema gerador da reclamação.
A resposta de fornecedores às reclamações dos consumidores traz benefícios
!
em termos de lealdade -que; em geral, ul trapassam o custo do atendimento das
reclamações (ENGEL et aI., 1990, p. 779). Este diálogo em mão dupla pode inclusive
constituir uma vantagem competitiva-em relação aos concorrentes (ZULZKE, 1997,
p. 9). O mesmo ocorre com as garantias eficientes contra defeitos, uma boa e
confiável rede de assistência técnica e as instruções claras de como usar o produto e
verificar pequenos defeitos (FISK, George, "Guidelines for Warranty Services After
Sale", in AAKER & DAY, 1974, pp. 311-315). Em alguns casos, como nos padrões
de segurança ou de qualidade mínima, o esforço de melhoria dos produtos pelos
fornecedores pode estar ocorrendo de forma autônoma, pode ser coordenada pelo
governo ou várias empresas de um mesmo setor podem estar atuando de forma
coordenada pelas suas associações de classe (AAKER & DA Y, 1974, pp. 113-128).
O fato é que se nota um aumento em reclamações feitas por consumidores
(diretamente ou via órgãos de defesa do consumidor) e uma exigência maior destes
260), da abrangência das garantias (idem, p. 278) e do serviço ao consumidor (pp.
279-280). Muitas empresas (a indústria automobilística nos Estados Unidos, por
exemplo, HAMBURGER, 1972, pp. 282-83), em _f~nção destes movimentos dos
consumidores, passaram a se preoc~par mais em abrir canais de comunicação com os
consumidores e em procurar informá-lo melhor sobre os produtos e serviços
prestados. Afinal, o consumerismo só surgiu porque as empresas não responderam
adequadamente às demandas legítimas dos consumidores (ENGEL et al., 1990, p.
761).
J
Objetivo
No contexto acima descrito, planejou-se este estudo com o objetivo de
analisar o impacto do Código de Defesa do Consumidor e da legislação
complementar na forma de atuação das empresas brasileiras no mercado doméstico,
procurando identificar mudanças de comportamento e de atitudes ocorridas após a
vigência do Código. Serão levantados outros fatores que possam ter influenciado tais
mudanças, e procurar-se-á avaliar o peso dessa influência.
Deve-se frisar que o Código de Defesa do Consumidor visa proporcionar um
maior equilíbrio nas relações entre fornecedor e consumidor, não só pelas inovações
processuais e novos direitos com o objetivo de favorecer este último, mas também
pela "informação e ... orientação. para as duas partes envolvidas em todo processo de
compra e venda de um produto ou de um serviço, capaz de ajudar a equilibrar e a
Plano de Trabalho
Por analisar um tópico atual, objeto de muita discussão nos jornais e revistas,
assim como nas instituições políticas e governamentais, o presente trabalho não visa
dar uma solução definitiva à proposição inicial exposta no objetivo, mas sim levantar
pontos para futuras pesquisas, debates e estudos do tema. Para tal, será feito um
apanhado da evolução da defesa do consumidor no Brasil e um estudo de como as
empresas reagiram a esta defesa.
o
capítulo I envolve o seguinte tópico:• Evolução da Defesa do Consumidor no Brasil, mostrando como surgiu e
evoluiu a conscientização da necessidade de um direito do consumidor no Brasil;
o
capítulo 11aborda os seguintes tópicos:• Uma explicação do conteúdo do Código de Defesa do Consumidor,
destacando os seus principais pontos quanto aos direitos dos consumidores, os
deveres do fornecedor, as sanções cabíveis e os mecanismos de defesa disponíveis
aos consumidores;''-"
• Um Levantamento Sobre as Mudanças de Comportamento de consumidores e
empresas ocorridas após o Código, de forma anedótica (sem ser uma pesquisa
formal).
o
capítulo 111contém: '• A Defesa do Consumidor em Outros Países, comparando a sua legislação e /
o
capítulo IV contém:I
• Estudo Exploratério-elaborado através do levantamento em jornais e na lista de reclamações .fundamentadas do PROCON-SP e de um breve questionário
apresentado a algumas empresas/
o
Capítulo V finaliza com:Capítulo I - Evolução do Direito do Consumidor no Brasil
o
direito do consumidor não nasceu como tal, mas constituiu-se por umaevolução de princípios isolados do direito civil, comercial e penal, de defesa da
idoneidade nas relações entre as partes, seja em hábitos cotidianos, seja na legislação,
até que se viu a necessidade de uma legislação específica e codificada para gerir as
relações de consumo.
1.1 -
Antes do Código de Defesa do Consumidor
Até 1990, não havia no Brasil uma legislação consolidada de defesa do
consumidor, porém apenas medidas esparsas, espalhadas por diversos dispositivos
legais, como mostraremos de forma não exaustiva abaixo. O Código Comercial de
25/06/1850 preocupou-se principalmente em regulamentar a atividade do
comerciante, em definir as formalidades e procedimentos necessários e em regular as
relações comerciais. Sequer há explícito o conceito de consumidor dentro desta lei.
Regula-se a operação de compra e venda mercantil (entre comerciantes), mas não a
operação de compra e venda entre um comerciante e um comprador a varejo. Mesmo
assim, aqui e ali acham-se uns poucos dispositivos que poderiam ser aplicados em
defesa do consumidor:
• A obrigação de os corretores indenizarem as partes por perdas e danos
decorrentes de fraude, quebra de sigilo, não entrega de título, ou falsa identidade
de alguma das partes (arts. 51 a 58);
I
• A obrigação do condutor ou comissário de transporte de indenizar o dono de
gêneros transportados perdidos ou avariados por negligência ou culpa sua (art.
103), por atraso culposo (art. 111), ou pelo não cumprimento dos regulamentos
De resto, embora nas operações mercantis o Código Comercial estabelecesse
o dever de indenizar por prejuízos e o de devolver o valor pago em caso de não
entrega da mercadoria, o seu conteúdo, como foi dito acima, não abrange as
operações com os consumidores.
Já o Código Civil de 01101/1916 contém dispositivos em seu Livro
IH
(Do direito da obrigações) que, embora de ordem genérica, poderiam ser aplicados arelações entre fornecedor e consumidor:
• O direito de credor de coisa certa não poder ser obrigado a receber outra (art.
863);
• A não obrigação do credor de aceitar de terceiro o serviço contratado
pessoalmente com o devedor (art. 878);
• A obrigação de responder por perdas e danos de quem não cumprir com suas
obrigações (art. 1056 a 1064);
• A obrigação do proponente de cumprir o contrato por ele proposto (art. 1.080),
desde que respondida no p~~zo (art. 1081);
• O direito do comprador de imóvel de receber a área total comprada ou de ter um
abatimento no preço, caso se constate que as dimensões reais são inferiores às
informadas em mais de 5% (art. 1139);
• O dever do locador de garantir ao locatário o uso pacífico da coisa locada, que
deve estar em condições de ser usada (art. 1189);
• O direito do locatário de serviços de rescindir o contrato, caso o locador mostre
vfcios ou imperícia ou não siga o contrato (art. 1229).
Além disso, o Código Civil responsabilizou civilmente o empregador pelos
/
as empresas industriais (arts. 1521, IH e 1522), mas somente se tiverem sido negligentes ou culpadas, .levando ao dano (art. 1523). Posteriormente, a súmula 562
do Supremo Tribunal Federal estabeleceu a correção monetárias das perdas e danos.
O decreto-lei 58, de 10/12/1937 (Lei dos Loteamentos), procurou garantir os
direitos do comprador de lote ao terreno mesmo antes do registro da escritura.
Em 1938 foram a definidos de crimes contra a economia popular, através do
decreto-lei n° 869 (ZULZKE, 1997, p. 143).
O Código Penal (Decreto-Lei 284, de 07/12/1940) incluiu em seu Título H
(Dos Crimes contra o Patrimônio) vários dispositivos com penas de reclusão ou
detenção e multas -aplicáveis ao mau fornecedor, pelos crimes de:
• Estelionato (art. 171);
• Fraude no comércio, por vender mercadoria falsificada ou deteriorada como
verdadeira ou perfeita, ou por entregar mercadoria diferente da vendida (art.
175);
• Venda de produtos alimentícios ou medicinais adulterados, nocivos à saúde (art.
272), ou com redução da qualidade (art. 273);
• Informar no invólucro de produto alimentício ou medicinal a existência de
substância não presente em seu conteúdo ou presente em quantidade inferior à
mencionada (art. 275).
Mesmo com o Código Penal, notou-se a necessidade de uma legislação penal
mais vigorosa, e foi então elaborada a lei 1521, de 16/12/1951, para punir os crimes
contra a economia popular, tais como:
• Vendas de produtos em desconformidade às determinações oficiais de peso e
composição (art. 2°, III);
• Mistura de produtos de qualidade ou graus de pureza diferente (art. 2°, V);
• Exigência de exclusividade do comprador ou imposição de um preço de revenda
em combinação com outros fornecedores (art. 2°, VIII);
• Deixar de entregar o bem vendido ou, nas vendas à prestação, deixar de devolver
as prestações caso o bem
não
seja entregue (art.2°, X);• Fraude de pesos e medidas (art. 2°, XI)
A Lei 4137 de 10/09/1962, procurou reprimir o abuso do Poder Econômico,
proibindo, entre outras coisas, a elevação sem justa causa dos preços por empresa
monopolista (art. 2°, II), ou a prática de atos monopolistas como fazer com que
ocorresse escassez de bens de consumo (art. 2°, III). Proibiu ainda a venda casada
(art. 2°, IV, b) e estabeleceu multas para as empresas que praticassem abuso
econômico.
A Lei 4680 de 18/06/1965 deu força de lei ao Código de Ética dos
Profissionais de Propaganda, procurando coibir práticas de propaganda enganosa ou
abusiva (MORGENSZTERN, 1982, p.IO).
Houve também a partir da década de 1950 diversas normas administrativas de
regulamentação do nível de higiene e de composição de produtos, ligadas
principalmente à produção e comercialização de alimentos (ZULZKE, 1997, P 143).
Um exemplo é a Resolução n° 23/66, da Comissão Permanente de Aditivos para
Alimentos, que trata dos resíduos admissíveis no leite (MOURA, 1977, p. 23).
MOURA aliás, denunciava práticas corriqueiras nos anos 70: brometo de potássio
presente em pães e farináceos, alimentos contaminados ou com aditivos proibidos,
I
mais de 10 mil pessoas por a ano (MOURA, 1977, pp. 21-29), além de reclamar da
impunidade, e das penalidades irrisórias então vigentes (idem, p. 23).
E a Lei 6437 de 20/08/1977 estabeleceu penas para as infrações à legislação
sanitária penal, indo desde a advertência até o cancelamento do alvará de
licenciamento do estabelecimento. Com isto, complementou-se a legislação sobre
alimentos que foi se formando no decorrer dos anos, determinando padrões de
qualidade, armazenamento e rotulação para diversos tipos de alimento.
A Lei 6493 de 11/11/1977 (conhecida como Lei Herbert Levy) obrigou as
lojas nos anúncios de venda a prazo a detalharem as informações sobre os encargos
embutidos na operação (MORGENSZTERN, p.15), como forma de tentar coibir que
o consumidor, por desconhecimento, acabasse contratando contratos de
financiamento onerosos demais.
Em paralelo, verificaram-se diversos movimentos da sociedade civil, a partir
da década de 1930, em defesa no consumidor, originalmente em protestos contra a
carestia, e depois na forma de alguns boicotes a produtos com preço muito elevados
(ZULZKE, 1997, p. 141). Foi a partir de 1971, com a proposta de se criar uma
Comissão Especial de Defesa do Consumidor (CAMPOS, 1991, p. 50), que começou
a haver um movimento de defesa do consumidor propriamente dito no Brasil. Em
1975 foram fundadas a Associação dos Consumidores no Rio Grande do Sul
(MORGENSZTERN, 1982, p. 13) e a ANDEC - Associação Nacional de Defesa do
Consumidor no Rio de Janeiro (ZULZKE, 1997, p. 144). Nos anos seguintes, novos
organismos surgiram em outros estados (idem, 150).
Em 1976 uma Comissão Parlamentar de Inquérito de Defesa do Consumidor
propôs várias medidas de defesa do consumidor (CAMPOS, 1991, pp. 51-52).
Órgãos de defesa do consumidor foram surgindo a partir dos anos 70: em nível
estadual, os Procons (Procuradorias de Defesaido Consumidor) e os Decons
fiscalização eram escassos, tais órgãos tiveram grande importância para divulgar à
população práticas enganosas ou fraudulentas realizadas por algumas empresas
alimentícias (ZULZKE, 1997, pp. 154-55) .
.
"
O PROCON do Estado de São Paulo foi criado junto com o Sistema Estadual
de Proteção ao Consumidor pela Lei Estadual n° 1903, de 29/12/1978 (FILOMENO,
p. 19). O número de reclamações cresceu de 1.535 em 1977 para mais de 90 mil em
1988 (citados em CAMPOS, 1991, p. 59). Como mostra MORGENSZTERN (1982,
pp. 19-20), os tipos de reclamações não são constantes: se em 1977 se concentravam
na área de alimentos e eíerrodoméstícos, em 1981 já estavam mais voltados para.
imóveis, produtos em geral e educação. E. o uso do PROCON estava mais
concentrado na classe média. A partir da criação, em 1983, da Delegacia do
Consumidor (DECON), ficou mais fácil reprimir crimes contra a saúde pública e a
economia popular no âmbito do Estado de São Paulo (ZULZKE, 1997, p. 157).
Em 1979 foi instituído o Conselho Nacional de Auto-Regulamentação
Publicitária (CONAR), para investigar e recomendar a retirada de publicidade
enganosa ou abusiva (CAMPOS, 1991, p. 34). Desde 1982, o Ministério Público
paulista inclui entre as sua atribuições defender os direitos do consumidor (Lei
Orgânica do Ministério Público, art. 32, I, 34, b), in idem, pp. 22-23), tendo sido
criada, em 1983, a Promotoria de Justiça do Consumidor, que vem conseguindo
acordos entre fornecedor e consumidor em cerca de 70% dos casos (PAULINA,
1999, pp. 20-22). Os Juizados de Pequenas Causas (atuais Juizados de Causas
Especiais), autorizados a funcionar pela Lei Federal 7.244 (CAMPOS, 1991, p. 55),
ao desburocratizar os procedimentos para propor ações de pequeno valor (abaixo de
40 salários mínimos, sendo dispensada a representação por advogado se o valor da
causa for inferior a 20), deu acesso à Justiça a muitos consumidores lesados, que
antes teriam considerado o custo da causa como superior ao prejuízo a ser reparado.
O de São Paulo foi estabelecido pela Lei n° 7244, de 07/11/1984 (idem, p. 23). Em
Direitos do Consumidor (idem, p. 43). A reação do público contra as tentativas de
burlar o congelamento de preços durante o Plano Cruzado (1986) demonstrou um
aumento de conscientização dos consumidores quanto à necessidade de defender seus
direitos.
Um exemplo disto foi a fundação, em 1987, do IDEC (Instituto Brasileiro de
Defesa do Consumidor); com o objetivo de "promover a melhoria das relações de
consumo em nosso país, por meio da informação e da conscientização de indivíduos e
grupos sociais" ("O que é o IDEC" , http://www.uol.com.br/idec/oque.htm). Este
instituto conta atualmente corri 4?000 associados (ibidem), respondendo a cerca de
700 consultas mensais feitas por eles (OLIVIERA, e-mail de 15/06/99). Antes deste,
já havia outras entidades criadas, como a Associação das Donas-de-Casa do Brasil, e
a Associação de Defesa do Consumidor da Cidade de São Paulo
(MORGENSZTERN, 198~"_R',21, que relaciona entre as pp. 22 e 29 diversas outras
entidades, privadas e públicas, criadas para defesa do consumidor). Em nível
governamental, em 1986 foi instituído o Conselho Nacional de Defesa do
;/
Consumidor (FILOMENO, 1987, p.l9). Novas associações de consumidores
surgiram após a entrada em vigor do CDe. Em 22 de julho de 1998 foi fundado o
Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor para articular as ações
as entidades filiadas, que são atualmente 22, de treze Estados (CONSUMIDOR S.A.
mar/99, p.17).
Alguns jornais e revistas começaram, a partir de 1975, a publicar colunas de
defesa do consumidor, com informações sobre os direitos deste, divulgação de
reclamações de consumidores que se julgavam lesados e da solução dada a suas
queixas. Um caso pioneiro foi a coluna "Defesa do Consumidor", no jornal Aqui-São
Paulo, em 1976 (MORGENSZTERN, p. 13).
Algumas empresas, conscientes da necessidade de melhor ouvir e atender o
consumidor, começaram a partir de 1978 a criar departamentos com este propósito
de atendimento ao consumidor bem estruturados .antes de 1990, que chegariam a
<,
"
cerca de mil com telefone gratuito em 1991, após a vigência do CDC (ZULZKE,
1997,p.172).
Apesar de toda esta movimentação, ainda havia numerosas reclamações contra
desrespeito ao consumidor, antes da entrada em vigor do CDC. CAMPOS (1991, pp.
13-28) relacionou muitas das críticas feitas então contra os fornecedores, entre as
quais produtos alimentícios sem higiene, deteriorados ou nocivos contra a saúde; I
remédios com graves efeitos colaterais; produtos inócuos ou com defeito; má
assistência técnica; fraude na composição do produto; garantias ineficazes; contratos
de adesão com cláusulas em letras minúsculas prejudiciais ao consumidor;
propaganda enganosa; financiamento a juros excessivos; não cumprimento de prazo
de entrega. Nessa época, a legislação de defesa do consumidor era deficiente e
esparsa.
1.2 -A Constituição de
1988
e o Código de Defesa do Consumidor
A nova Constituição Brasileira, promulgada em 05/10/1988, incluiu em seus
dispositivos regras para a defesa do consumidor. Deu competência tanto à União como aos Estados de legislar sobre responsabilidade por dano ao consumidor (art. 24,
VIII), e impôs ao Estado brasileiro a obrigação de promover, na forma da lei, a defesa
do consumidor (art. 5°, XXXII). E mais, deu ao Congresso Nacional um prazo de 120
dias para elaborar um código de defesa do consumidor (art. 48 do Ato das
o
Congresso acabou demorando bem mais que estes 120 dias, e o Código (Lei8.078, de 11/09/1990) só foi promulgado quase dois anos após a nova Constituição,
passando a vigorar a partir de 11 de março de 1991.
A Lei n° 9.099 de 26/09/1995 introduziu em nível nacional os Juizados de
Causas Especiais (PAVAN, 1997, p. 11), e a Lein" 9.307 de 23/09/1996 deu ao
consumidor a opção de submetersuas reclamações a um Juízo Arbitral.
A Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça tem
tornado várias medidas com base no CDC. Por exemplo, em outubro de 1998 as
administradoras de cartões de crédito foram obrigadas a informar a seus clientes o
!
custo de captação do dinheiro usado para refinanciar as dívidas dos associados
(LANDI, 1998, p. 7A), em dezembro de 1998 foi determinada uma multa às
administradoras que enviassem a consumidores cartões de crédito não solicitados por
estes (JT, 03/12/98, p. 6A), a Portaria n° 3, de 19/03/1999, listou quinze cláusulas
habituais de contratos de adesão (por exemplo, exigindo assinatura de título de
crédito em branco, taxas de administração ou locação futura, carência para
cancelamento de cartão de crédito) que a SDE considerou abusivas, e portanto nulas,
mesmo se constantes dos contratos (CONSUMIDOR, maio/1999, pp. 24-25) e as
fabricantes de lâmpadas foram multadas em 17/08/1999 por terem alterado o padrão
de fabricação destas (de 127 volts para 120) em prejuízo dos consumidores, sendo
ainda obrigadas ainda a voltar a fabricar o padrão antigo (JT, 18/08/1999, p. lOA).
Aumentaram também nos últimos anos as indenizações por dano moral ao
consumidor, de menos de 20 salários mínimos há seis anos para de 100 a 200 hoje em
dia, mas os critérios usados pela jurisprudência a fim de fixar os valores continuam
subjetivos, o que tem levado a uma certa variabilidade nos valores definidos pelos
juizes, mesmo para casos similares (AGUILAR, 1999, p. A-14).
Um serviço de registro de reclamações inovador está na Internet:
-consumidores um canal de comunicação ágil para que suas reclamações, elogios e
experiências possam ser divulgados rapidamente, e que dispõe também de uma lista
de telefones de Serviços de Atendimento ao Cliente. Por exemplo, em 14/08/1999
este serviço tinha registradas 2.111 reclamações, classificadas da seguinte forma
(http://www.reclama.comlpagpesq.htm):
Bancos &Financeiras & Seguradoras & Adm. de Cartões - 235 Construtoras, Empreiteiras, Incorporadores, Imobiliárias e Adm Imóveis - 29
Editoras, Livrarias e Publicações - 137
Indústria Automobilística - 239
Informática - Produtos - 96
Informática - Serviços - 80
Organizações de Ensino, Institutos, Associações e Conselhos Regionais - 16 Produtos &Serviços - Eletrodomésticos e Eletroeletrônicos em geral - 144 Produtos &Serviços - Móveis, Decoração e Materiais de Construção - 69 Serviços - Lazer (Restaurantes,Teatros , ...)&Turismo - 66
Serviços - Operadoras de TV a cabo - 154
Serviços - Operadoras de TV - Diversos - 6
Serviços - Públicos em Geral - 171
Serviços &Produtos - Saúde - 33
Serviços &Produtos - Telefones e Pagers - 365
Serviços - Transportes - 74
Capítulo II - Uma Visão Geral do Código de Defesa do Consumidor
2.1 -Principais direitos definidos
o
Código definiu quem deve ser considerado, para aplicações de seusdispositivos, como consumidor (toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza
produto ou serviço como destinatário filial - art. 2°) e fornecedor (toda pessoa física
ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes
despersonalizados que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação,
construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização
de produtos ou prestação de serviços - art. 3°).
No seu art. 6°, foram definidos os direitos básicos do consumidor:
• a proteção contra os riscos de produtos perigosos ou nocivos;
• a informação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, com
liberdade de escolha e igualdade nas contratações;
• a rotulagem adequada sobre a quantidade, características e composição do
produto, seu preço e seus riscos;
• a proteção contra propaganda enganosa e práticas abusivas;
• a modificação das cláusulas contratuais excessivamente onerosas;
• a indenização por danos patrimoniais e morais;
• a inversão do ônus da prova em determinadas circunstâncias;
• o direito de ser representado por entidades de defesa do consumidor;
• a boa prestação de serviços públicos.
Como dito acima, esses, são os direitos básicos, não excluindo outros
decorrentes de tratados e convenções internacionais, outras legislações, ou mesmo do
costume (art. 7°).
2.2 - Principais garantias e mecanismos de defesa
/
o
CDC procurou proteger o Consumidor, entendendo-o como a parte fraca darelação de consumo; invertendo o ônus da prova (o fornecedor - o réu - deve provar a
sua alegação, e não o consumidor que é o autor da ação), impondo ao fornecedor o
dever de informar o consumidor sobre diversas características, limitações, prazo de
validade e outras informações acerca do produto ou serviço; fazendo com que a
publicidade ou informação prestada pelo vendedor fizesse parte integrante do
contrato, proibindo portanto a publicidade enganosa ou abusiva; obrigando o
fornecedor a se identificar adequadamente nos rótulos e impressos utilizados nas
vendas; e criando um prazo de arrependimento para vendas fora do estabelecimento
comercial (LAZZARlNI, 1991, pp. 266-270).
Os fornecedores passaram a ser considerados responsáveis pelos danos
causados por seus bens e serviços aos consumidores, independentemente de prova de
culpa, salvo se provar que o dano provém por culpa exclusiva do consumidor ou de
Medidas de proteção aoconsumidor já existentes na legislação anterior foram
aperfeiçoadas e complementadas.
Diversos dispositivos do CDC procuram aumentar a segurança dos produtos e
serviços oferecidos (LAZZARINI, 1997, p. F 1O). Foi determinada a responsabilidade
solidária de todos os fornecedores na cadeia de fornecimento do produto, desde o
fabricante original até o revendedor final para o consumidor (idem, pp. F14-F 16). Os
órgãos oficiais passaram a ter a obrigação de publicar um cadastro de reclamações
contra fornecedores (CDC, art. 44). O consumidor, por sua vez, passou a contar com
_o direito de ter acesso ao cadastro do fornecedor, e de exigir a correção de qualquer
informação errônea neste (CDC, art. 43).
2.3 - Limitações à atuação das empresa, e principais sanções aplicáveis
O CDC impôs diversas obrigações às empresas fornecedoras, tais como a de
não colocar no mercado produtos altamente nocivos ou perigosos à saúde e segurança
do consumidor (art. 10); reconhecer toda promessa contida em propaganda como
I
integrante do contrato (art. 30); rotular adequadamente, em português, tudo o que for
relevante ao produto (art. 31); evitar toda propaganda abusiva ou enganosa (art. 37);
efetuar venda casada de dois produtos (art. 39, I); executar serviços sem a aprovação
prévia de orçamento pelo consumidor (art. 39, VI); colocar no mercado produto em
desacordo com norma técnica (art. 39, VIII); não expor o consumidor a ridículo,
constrangimento ou ameaça (arts. 39, VII e 42). O envio de produto sem solicitação
prévia do consumidor, salvo como amostra grátis, foi proibido (CDC, art. 39, Ille
parágrafo único).
Foram vedadas cláusulas contratuais abusivas contra o consumidor (CDC, art.
51). Diversas sanções administrativas (multa, apreensão ou inutilização do produto,
permanente, interdição de estabelecimento e imposição de contrapropaganda, entre
outras) e penais (em casos mais graves chegando até a detenção por dois anos) contra
desrespeitos aos dispositivos '~~ Código foram estabelecidas (CDC, arts. 56 a 80).
2.4 -Alterações no comportamento das empresas provocadas pelo CDC
A entrada em vigor do CDC trouxe uma série de dúvidas às empresas sobre
como se adaptarem a ele. O aumento no número de serviços de atendimento ao
consumidor citado acima constitui apenas um exemplo de ações tornadas por diversas
empresas na tentativa de melhorar o canal de comunicação com os consumidores.
Mas apenas 300 serviços de atendimento ao consumidor poderiam ser considerados
profissionais, na opinião do editor do Guia Brasileiro do SAC, Roberto Meir
(BLECHER, 1998, p. 54), o que se comprova pelo elevado percentual de
consumidores que abandonam a linha antes de ser atendido pelo operador (10%), em
função da demora no atendimento (idem). Já uma pesquisa da Vantive do Brasil entre
as 120 maiores empresas nacionais levantou que a grande maioria já tinham central
de atendimento ao cliente, inclusive com número de telefone gratuito e uso da
Internet, mas de baixa qualidade, com reclamações anotadas mas encaminhadas com
grande atraso. (JT,_23/11198, p. 8A).
De forma imediata, a principal preocupação parece ter sido a alteração da
rotulagem dos produtos a fim de adaptá-Ia às exigências do CDC.
Pelo menos no que se refere aos alimentos parece ter havido adesão quase
total, como se vê pelos poucos casos de reclamações contra empresas alimentícias:
em 1997, após a vigência do CDC, 37% das reclamações registradas no PROCON-SP
se referiam a produtos com defeitos, 24% a maus serviços e 20% a problemas com
planos de saúde - e apenas 1% com alimentos, reflexo do trabalho das empresas
(ZULZKE, 1997, p. 177). Além disto, após a vigência do COC, o número de
atendimentos diário pelo PROCON-SP praticamente dobrou, de 488 em 1991 para
946 atualmente (CONSUMIDOR S.A. mar/99, p. 17). O índice de sucesso na
resolução dos problemas levados ao PROCON era de 80% (VEJA, 16/09/1998, p.
150).
Um problema que continuou a existir em muitos estabelecimentos comerciais
estava na falta deinformação adequada, clara e ostensiva dos preços dos produtos
colocados à venda, o que originou a maioria das multas aplicadas pelo PROCON-SP
entre abril e maio de 1999 (JT, 19/05/1999, p.6A).
Notou-se uma maior atenção do consumidor com os seus direitos: pesquisa de
1994 da Standard, Ogilvy e Mather (citada em ZULZKE, 1997, p. 184) mostra a
maioria dos consumidores conferindo o prazo de validade dos produtos, fazendo
pesquisa de preço antes de comprar, reclamando verbalmente em caso de problemas e
verificando a presença de aditivos ou corantes artificiais, e uma significativa minoria
reclamando por escrito de problemas com produtos ou serviços, junto ao fornecedor e
órgãos de defesa do consumidor. Mas poucos (18%) informavam-se junto aos SAC's.
Há vários casos de empresas que passaram a usar o SAC até como meio de
receber sugestões para aprimoramento de produtos, p)mo a indústria de alimentos
que mudou a forma de ernbalar-cseus salgados congelados, a multinacional que
aumentou o comprimento das fraldas descartáveis e trocou a tampa de alguns
produtos de limpeza, e a fabricante de eletrodomésticos que mudou a embalagem de
suas jarras de vidro (VEJA, 21/04/1999, p. 137).
I
Um segmento que passou a se preocupar mais com a opinião do consumidor
nos anos 90 foi o dos supermercados. De 15 dirigentes de redes de supermercados na
Grande São Paulo entrevistados por RÓJO (1998, p. 33), 14 consideraram muito
Isto se deveu não só ao CDC, mas também à maior concorrência no setor a partir do
Plano Real (idem, p. 36).
o
ramo publicitário foi outro que passou a se preocupar com as restrições do CDC contra propaganda enganosa ou abusiva, evitando promessas mirabolantes oufalsas, e indicando ressalvas na propaganda. Apesar disto, pesquisa realizada por
ARRUDA et aI. (1996, pp. 26-27) identificou uma tendência de não levar em conta a
perspectiva ética em muitas campanhas publicitárias, embora em geral os anunciantes
procurassem respeitar os códigos de ética profissionais, a legislação e os hábitos e
costumes nacionais. Por outro lado, estudo exploratório de ARRUDA (1993, pp.
26-27) mostrou que a maioria das indústrias de bens de consumo em São Paulo é contra o uso de fraude, logro e engano no tocante à quantidade e qualidade de seus produtos,
e também contra o conluio de preços, mas também indicou uma substancial perda de
sensibilidade em muitos dirigentes destas empresas no que tange ao campo moral e
ético, chegando mesmo a defenderem algumas práticas não éticas.
Uma análise de técnicos de vários PROCONs classificou alguns setores da
economia em termos do grau de dificuldade do consumidor para resolver eventuais
problemas: a dificuldade foi considerada pequena para os setores de móveis, telefonia
(esta classificação foi feita em 1998, antes que as novas controladoras de empresas
telefônicas começassem a operar) e eletroeletrônicos, média para serviços bancários,
planos de saúde, cartões de crédito, carros e financeiras, e grande para cobranças
indevidas de serviços pelos telefones 0900 e para os serviços públicos (VEJA,
16/09/98, pp. 150-151).
o
setor de planos de saúde é um que teve um grande aumento no número de reclamações nos últimos anos, até pelo crescimento do uso deste produto pelapopulação. Estas reclamações foram encaminhadas não somente aos órgãos de defesa '.
do consumidor, mas também ao" Ministério de Saúde, através dos Núcleos de
mensalidades e exclusões de cobertura (JT, 2611111998, p. 16A), além de propaganda
enganosa (SCHEINBERG, 1999, p. A13).
o
ramo de medicamentos e cosméticos é um em que há empresas compropaganda enganosa (há até casos de produtos sem registro no Ministério da Saúde
sendo comercializados), o que levou o Ministério da Saúde a enviar ao CONAR 27
exemplos de comerciais enganosos (YAMAZATO, 1999, p.14A).
Um setor com índice de reclamações relativamente baixo, mas com alto índice
destas não resolvidas (cerca de um terço), é o das montadoras de automóveis: elas se
recusam a cumprir a cláusula ?o CDC que dá direito ao consumidor de trocar o
produto entregue com defeito (JT, 29/03/99, p. lOA). O motivo provável disto: como
o automóvel é um produto de valor alto, o consumidor não pode fazer uso dos
Juizados de Causas Especiais. Assim, para fazer valer seu direito, o consumidor é
obrigado a ingressar na Justiça Comum, aguardando meses ou até anos para uma
decisão (ainda mais se a empresa apelar ...), ao final dos quais o carro pode estar
completamente depreciado ...
E houve um aumento no PROCON-SP de 322% no número de reclamações de
não entrega ou atraso de entrega de veículos no primeiro semestre de 1998,
comparado com igual período de 1997 (JT, 21/09/98, p.lOA).
Por outro lado, uma mo~tadora implantou
um
programa de redução no <,número de reclamações de seus clientes, aumentando a proporção de queixas
atendidas em um único dia de 40% em 1993 para 70% em 1998 (VEJA, 16/09/98, p.
150)
Mas algumas concess.ionárias de veículos têm obrigado os compradores a
emplacar o carro no próprio local, a um preço bem superior ao do DETRAN, apesar
da proibição legal de efetuar vendas casadas (J'I', 18112/98, p. 14A). Há também
estacionamentos que não assumem a responsabilidade de roubos ou batidas em carros
concessionárias com substancial atraso na entrega de carros, mesmo já pagos (JT,
17/03/99, Jornal do Carro, p. 2).
o
setor da telefonia, com a privatização, conheceu um aumento substancial no número de reclamações em 1998 (sete vezes superior ao de 1997), o que pode sedever a um período de adaptação das novas controladoras e a um atraso na atuação da
ANATEL (comparada com a Agência Nacional de Petróleo, que conseguiu reduzir
adulteração e sonegação e a Agência Nacional de Energia Elétrica, que conseguiu
reduzir blecautes) de fiscalização das mesmas (ONAGA, 1999, p.5A). Mas a situação
pareceu melhorar nos últimos meses, com redução no número de reclamações.
o
fim da inflação, com o Plano Real, aumentou o poder de negociação do consumidor, pois ele passou a poder comparar preços com mais facilidade, e denegociar melhor as condições de compra, na visão da diretora do PROCON de São
Paulo, Maria Inês Fornazaro, embora ele ainda demonstrasse muito desconhecimento
de seus direitos (BARBOSA, 1999, p. 4A). Na mesma entrevista, ela lista setores que
pela posição predominante no mercado no passado ainda não absorveram a cultura de
um melhor atendimento ao consumidor: planos de saúde, escolas, cursos livres,
móveis, bancos, carros, serviços públicos, telefonia e energia elétrica. -'o,
,---\
Capítulo IH -
A
Defesa do Consumidor em Outros Países
Se nos primórdios da história o princípio que vigorava nas relações comerciais
era o do caveat emptor (o comprador compra o bem no estado, e cabe a ele verificar a
qualidade do bem antes da compra, não podendo realizar reclamações posteriores),
mesmo nas codificações mais antigas já havia algumas normas contra abusos
comerciais. A maioria das nações acabou sentindo a necessidade de regulamentar as
relações de consumo, seja de forma estatutária (legislação), seja de forma voluntária
por parte dos fornecedores (por exemplo, através de estatutos e regulamentos de
corporações de ofícios ou conselhos profissionais, ou de entidades para investigar
reclamações por parte dos consumidores). Isto se intensificou no final do século XIX
e no decorrer do século XX, à medida que os consumidores, mais instruídos do que
no passado e mais conscientes de seus direitos (haja vista os movimentos trabalhistas
'"
e por direitos civis e políticos que ocorreram neste período) se tomaram mais
exigentes (ZULZKE, 1997, pp. 121-22).
Entidades de defesa do consumidor foram logo surgindo, seja em âmbito
local, seja em nacional ou até internacional. Um exemplo é a Organização
Internacional de Uniões de Consumidores, fundada em 1960, que se tornou em 1995
a Consumers International, à qual/se filiam no Brasil o IDEC, o Centro de
Informação, Defesa e Orientação ao Consumidor (CIDOC), o Grupo Executivo de
Proteção ao Consumidor, e o Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor
(BRASILCON), assim como quase 250 outras organizações (oficiais e privadas) de
defesa ao consumidor, localizadas em 113 países diferentes
(http:í(J 9~~.128.6.150/consumers/about/history purpose/history purpose.html), sendo ainda
Em 1972 a Conferência de Direito Internacional Privado de Haia submeteu à
aprovação de países filiados uma proposta recomendando "a aplicação da lei em
favor dos consumidores, dispersos e desprotegidos diante de poderosas e
centralizadas organizações industriais, que têm grandes departamentos jurídicos de
ação direta sobre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário" (MOURA, 1977, p. 31). E
em abril de 1985 a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou a Resolução 39/248
(Diretrizes Internacionais de Proteção ao Consumidor), com sugestões de políticas de
proteção ao consumidor a serem adotadas pelos países membros (ZULZKE, 1997, p.
139).
Abaixo, fazemos um apanhado de como está a defesa do consumidor nos
Estados Unidos
e
em alguns países da Europa (para mostrar como os países maisdesenvolvidos tratam o temaje nos do Mercosul (para verificar o tratamento do tema
por países de realidade próxima à brasileira. Como se verá, a legislação brasileira
atual de defesa do consumidor tem abrangência similar à dos países desenvolvidos
(isto não ocorre necessariamente, porém, quanto ao grau de fiscalização pelo poder
público, e a mobilização do consumidor brasileiro ainda é inferior à destes países), e
superior à dos países sul-americanos.
3.1 - Estados Unidos
Na virada do século, Harvey Wiley denunciou casos de adulteração de
alimentos e medicamentos, liderando um movimento para que a lei obrigasse a
rotular estes produtos quanto à composição, e proibisse os que fossem danosos à
saúde (FABER, 1972, pp. 15-22). Isto, aliado à denúncia de falta de higiene no abate
I
de animais para carne no romance de Upton Sinclair, The Jungle, levou à aprovação
tradicional liberalismo nas relações comerciais norte-americanas, desde o início do
"-século XX os consumidores começaram a se organizar em sociedades de proteção ao
consumidor, e a defender perante o governo a criação de órgãos estatais para coibir
práticas contra os consumidores. Entre estes, destacam-se a Consumers Research
Incorporation, fundada em 1929, e a Consumer
Union,
criada por dissidentes daI
primeira em 1936, com
mais
'de dois milhões de associados e editora da revistamensal Consumer Reports, que em 1961 já contava com quatro milhões de leitores
(HERRMAN, citado por CAMPOS, 19á6, p. 33), e que realizava extensos testes de
qualidade e segurança de produtos (FABER, 1972, pp74-83). Ralph Nader era seu
conselheiro (MOURA, 1977, pp. 105-106).
Em 1962, o governo federal editou o Consumer Protection and Interest
Program, reconhecendo como direitos básicos do consumidor "o direito à proteção
contra acidentes, o direito à informação, o direito de escolha e o direito de ser ouvido
e atendido" (CAMPOS, 1991, p. 33). ENGEL et al. (1990, p. 759) acrescentam os
direitos a ter um meio ambiente limpo e saudável e os dos pobres e outras minorias de
ter seus interesses protegidos. Nos Estados Unidos, destacam-se entre outros órgãos
federais de defesa do consumidor ("Consumerism", in ENCYCLOPEDIA
BRIT ANNICA, vol. 3, p. 578):
• A Federal Trade Commission (FTC), criada em 1914, para coibir práticas
comerciais enganosas (inclusive propaganda) e regulamentar a rotulagem de
produtos de consumo, além de aplicar as leis anti truste com poderes até de
consulta aos livros e documentos internos da empresa acusada de violação da lei
(CAMPOS, 1991, pp. 30-31),;
• A Food and Drug Administration, fundada em 1927, para proporcionar proteção
no consumo de alimentos, medicamentos, cosméticos e substâncias afins, após
legislação de proteção aos alimentos de 1848, 1890 e 1906, o (Pure Food and
Drug Act) , e encarregada de aplicar, entre outras leis, o Food, Drug and
adulterados ou mal identificados (CAMPOS, 1991, p31; FABER, 1973, pp.
46-7), dava ao FDA o poder de confiscar produtos suspeitos enquanto eles eram
testados (outras leis ligadas ao mesmo assunto foram o Food Additives
Amendment de 1958, e a Emenda Kefauver-Harris, que exigiu que medicamentos
fossem testados antes de serem comercializados, e que eles tivessem o nome
genérico destacado na embalagem - KOTLER, 1988, p. 157);
• A National Highway TrajJic Administration, criada em 1970, para assegurar a
segurança do automóvel.
Outras leis de defesa do consumidor nos Estados Unidos foram (KOTLER,
1988, p. 158): o National TrajJic and Safety Act (1958), que estabeleceu padrões
obrigatórios de segurança para automóveis e pneus; o
Fair Packaging and Labeling
I
Act (1966), que obriga à informação na embalagem da composição do produto e do
volume embalado, e do nome do fabricante, e permite que indústrias tenham padrões
de embalagem; o Child Protection Act (1966) e o Toy Safety Act (1984) que proíbem
a venda de brinquedos perigosos; o Truth-in-Lending Act (1968), que exige a
divulgação do verdadeiro custo financeiro de um empréstimo e proíbe práticas
abusivas de cobrança (complementado pelo Fair Debt Collection Practice Act de
1978); o Consumer Product Safety Act (1972), que criou a Consumer Producl Safety
Commission para impor padrões de segurança e sanções pelo desrespeito às mesmas;
e o Magnuson-Moss Warranty/Fl'C Improvement Act (1975), que regulamenta as
garantias ao consumidor e autoriza o uso de ações coletivas em defesa dos
consumidores, além de aumentar os poderes da FTC.
A legislação anti truste foi concebida em parte como forma de coibir o abuso
por parte de indústrias monopolistas ou oligopolistas. Ela remonta à Lei Antitruste de .
Sherman (MORGENSZTERN, 1982, p. 5). Todos os 50 Estados americanos contam
com uma divisão tratando de questões do consumidor, e com legislação própria. O
mesmo ocorre com vários condados e municípios (LEEPSON, 1978, p.4). Há
mais voltados para aspectos de segurança do consumidor do que para o bom
funcionamento do produto.
A atuação de advogados como Ralph Nader, a partir dos anos 60, tem sido
importante. Protestos levaram a movimentos de boicotes a supermercados praticantes
de preços abusivos (HERRMAN, citado por CAMPOS, 1991, p. 33), em 1966 à
aprovação do Motor Vehicle Safety Act, que criou padrões de segurança para veículos
automotores (FABER, 1972, pp. 92-93) e, em 1967, à aprovação do Wholesome
Meat Act, que regulamentou o processamento de carne (KOTLER, 1988, p. 142).
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Nader, por exemplo, fundou em 1971 a entidade Ralph Nader Public Citizen, além de
outras entidades voltadas para defesa de direitos específicos do consumidor
(CAMPOS, 1991, pp. 35-38). Houve também processos coletivos (class actions)
contra empresas violadoras dos direitos dos consumidores, e decisões dos tribunais
I
cada vez mais favoráveis aos consumidores (NADER, Ralph, "The Great American
Gyp", in AAKER &DAY, 1974, pp. 29 e 33).
Em boa parte, porém, a def~a do consumidor ocorre através da
auto-regulamentação de empresas, organizadas nos chamados Better Business Bureaus,
organizações locais (mas coordenadas em uma associação nacional) para investigar as
práticas comerciais, estabelecer padrões éticos de conduta, receber reclamações de
abusos por maus comerciantes, e para conduzir campanhas de conscientização do
público sobre métodos fraudulentos seja na publicidade seja nas práticas de vendas
("Better Business Bureau", in ENCYCLOPEDIA BRITANNICA, voI. 2, p. 177), que surgiram nos Estados Unidos a partir de 1914 (CAMPOS, 1991, p. 30), se bem que
sua atuação fosse prejudicada por falta de verbas em determinados momentos
(FABER, 1972, pp. 106-07). Em muitos casos, contudo, as empresas procuraram
melhorar seu atendimento ao consumidor por uma questão de imagem ou de
marketing (FABER, 1972, pp. 128-32).
Mesmo assim, alguns críticos acham que ainda há muito a fazer para
alega que há uma desproporção das penalidades impostas a empresas por
irregularidades que podem afetar milhares ou milhões de pessoas, com prejuízos de
bilhões de dólares, comparadas às impostas a pessoas físicas por delitos bem mais
leves. E sugere cinqüenta novas normas contra o que ele considera crimes
corporativos (idem, pp. 41-50), tais como obrigar as empresas a comunicar
atividades que possam causar mortes ou ferimentos e a informar suas vítimas caso
tenham sido condenadas por abusos contra o consumidor, reduzir o ônus ~da prova
para o consumidor, e criar sanções de publicidade contrária.
3.2-Europa
Na Inglaterra, diversas leis de defesa do consumidor remontam ao século XIX
(como o Adulteration 01 Food and Drugs Act de 1872, contra a adulteração de
alimentos e medicamentos, e oSale of Goods Act de 1893, que determina que, caso o
comprador tenha informado ao vendedor o propósito para o qual ele está adquirindo
determinado produto, este ao realizar a venda está implicitamente garantindo que o
bem vendido é adequado a esse propósito). A Independent Broadcasting Authority
(IBA) regula a publicidade no rádio e televisão, proibindo por exemplo a propaganda
subliminar, a propaganda abusiva, e o anúncio de determinados produtos; como o
cigarro. Há um prazo de quatro dias para arrependimento de compras feitas a
domicílio ("Consumerism", in ENCYCLOPEDIA BRITANNICA, vol, 3, pp.
578-79). A Consumers Association foi criada em 1957 e edita diversas pUbliciações de
defesa do consumidor (MOURA, 1977, p. 106), contando em 1990 com dois milhões
de associados e laboratórios para testes de produtos de consumo (ZULZKE, 1997, p.
131). Pela Lei de Proteção do Consumidor de 1987, o ônus da prova sobre a
adequação do produto às suas especificações é do produtor (Folha de S. Paulo, citado
em CAMPOS, 1991, p. 75). Muitas empresas privadas adotaram ombudsmen para
investigar as reclamações de seus clientes (ZULZKE, 1997, pp. 48).
Outros países com organismos de defesa do consumidor são a Holanda, a
Alemanha e a Bélgica (idem, ibidem).
Nos países nórdicos existe, desde o século passado, a figura do ombudsman,
para investigar reclamações contra abusos das autoridades administrativas (MOURA,
1977, p. 95). Mas reclamações acerca de omissões na defesa oficial ao consumidor
acabaram levando, desde os anos 40, a normas em seu favor (idem, p. 96). O
ombudsman não é mero receptor de reclamações, mas alguém com independência
dentro da organização para agir com isenção a favor do público (ZULZKE, 1997, pp.
46-49).
Na Suécia, a legislação do Varudeklarationsnâmnden (Conselho de Qualidade
da Rotulagem, VDN) exige que o produto seja adequadamente descrito e explicado
quanto ao seu uso, e alguns rótulos chegam a ter mais de 200 palavras
«"Consumerism", in ENCYCLOPEDIA BRITANNICA, voI. 3, p. 579). O prazo de
arrependimento de compras feitas a domicílio é de sete dias, e há legislação
regulando os contratos de adesão, as vendas a crédito, as locações, os pacotes
turísticos, osalimentos, etc. (idem, ibidem). Em 1957 foi criado o Instituto Nacional
do Consumo para analisar e testar qualquer produto, divulgando publicamente as
conclusões (MOURA, 1977, p.96). Um resultado de sua atuação foi a instalação dos '<,
cintos de segurança nos carros, a partir de 1963, com expressiva redução no índicel
de mortalidade nos acidentes (idem, p. 97).
Outros órgãos de defesa do consumidor criados na Suécia foram a Junta Geral
de Reclamações contra propaganda ou rotulagem enganosa; o NO
(Naringsfrihet-Ombudsman ou Comissariado de Liberdade do Comércio), encarregado de vetar
medidas prejudiciais ao mercado livre;
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Comissariado do Consumo, para investigarconsumidor (MOURA, 1977, p.98). Desde 1976 vigora na Suécia a inversão do ônus
da prova: cabe ao comerciante ou industrial provar que as informações e promessas
constantes dos anúncios e embalagens são exatas, e não ao reclamante provar que são
falsas (FILOMENO, 1987, p. 27).
O Conselho do Consumidor da Dinamarca (Forbrugerradet) existe desde 1947·
(ZULZKE, 1997, p. 131).
Na França, há desde 1951 a União Federal dos Consumidores (UFC) e desde
1968 o Instituto Nacional do Consumo, afora ainda o Comitê de Coordenação das
Organizações de Consumidores - CCOC (idem, pp. 100:-101). Cada uma destas
entidades dispõe de uma publicação própria, com circulação medida em centenas de
milhares de exemplares, e o INC tem programas semanais no rádio e na televisão
(idem, p. 102). A UFC conseguiu nos anos 70 uma série de melhoria de segurança ou
salubridade de produtos através de uma série de boicotes . O mesmo ocorreu na
mesma época com a Federation Romande des Consommateurs, da Suíça (SMITH,
1990, p. 205).
Finalmente, a preocupação com os consumidores na Comunidade Européia
remonta à sua criação, no Tratado de Roma de 1957 (arts. 85 e 86). E em 1972 a
Assembléia Consultiva do Conselho da Europa editou a Carta de Proteção
Consumidor (PAVAN, 1997, p. 4).
3.3 - Argentina
A Constituição argentina, em seu art. 42, protege os consumidores no tocante
à sua saúde, seguridade e interesses econômicos (cf. SANDLER, 1998, p. 1). Há
várias associações para defesa do consumidor, entre os quais a Asociación de
Defensa de los Consumidores y Usuarios en la Argentina (ADECUA), a Unión de