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As empresas em sociedades contemporâneas: a responsabilidade social no Norte e no Sul.

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Academic year: 2017

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DOSSIÊ

INTRODUÇÃO

Este artigo recupera a trajetória do lema da Responsabilidade Social, desde a sua introdução, em três contextos sociais diferentes: no Norte (Es-tados Unidos de América e União Européia) e no Sul (Brasil). O texto realiza uma análise comparati-va, com o in tu ito d e aju d ar a exp licitar as especificidades dos en camin h amen tos adotados pelas empresas nessas diferentes sociedades. Tam-bém apresenta as iniciativas pioneiras e os recur-sos programáticos em três realidades sociopolíticas distintas, ao tempo em que procura desfazer a im-pressão de homogeneidade que, muitas vezes, en-cobre a diversidade de sentidos e a gama de atri-buições e iniciativas no meio empresarial.

Para o filósofo P. Ricoeu r (1994), o sen tido da responsabilidade das instituições, alimenta uma

relação. Con ecta a preocu pação de im putar (atri-bu ir obrigações e limitações) a qu em exerce u m poder (econômico, como no caso aqui tratado) com o esforço de atribuir proteção a quem é mais fraco. Podemos, assim, interrogar as empresas, averiguan-do de qu e forma in clu em, em su as respon sabili-dades, as metas qu e a sociedade con temporân ea lhes atribui, como a produção de riqueza, o desen-volvimento e o emprego.

A literatura internacional, desde os meados dos an os 1970 (Hirsch man , 1970; Sain sau lieu ; Segrestin, 1986; Touraine, 1992; Castel, 1995) re-nova a preocupação em identificar a centralidade da empresa no conjunto das modificações sociais. Essa “reabilitação da empresa n o sistema social” (Borzeix, 1986, p.4) parece se conectar ao conjun-to de alterações in tern as da própria sociedade, qu an do a econ omia e o emprego modificam su as contribuições para o desenvolvimento. Incluir, na p ersp ectiva d as resp on sab ilid ad es, a m eta institucional das políticas de emprego supera a tra-dicional proposta da ciência da administração que, em geral, ao valorizar a autonomia da empresa, preocupa-se com sua performance e rentabilidade

AS EMPRESAS EM SOCIEDADES CONTEMPORÂNEAS: a

responsabilidade social no Norte e no Sul

Paola Cappellin

*

Raquel Giffoni

**

* Professor-Dou tor d o Dep artam en to d e Sociologia e d o Program a d e Pós-Grad u ação em Sociologia e An trop olo-gia d a Un iversid ad e Fed eral d o Rio d e Jan eiro e Pesqu isa-d ora CNPq. Largo S. Fran cisco isa-d e Pau la, n . 1. Rio isa-d e Jan eiro - RJ - Brasil. cap p ellin @u ol.com .br

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econ ômica. A empresa, ao ser chamada para “sal-vaguardar o emprego e, por extensão, para salva-guardar a sociedade” (Castel, 1995, p.518), envol-ve-se em diferentes processos de regulação, ganha um caráter institucional, é espaço social de ação coletiva, apta a confrontar o discurso gerencial e as reivin d icações. É com esse in tu ito qu e, p ara Sainsaulieu e Segrestin (1986), a sociologia da em-p r esa n a sce fa z en d o fr en t e “a os em-p r eju íz os tecnocráticos das empresas” (Sainsaulieu; Segrestin, 1986 p.334). Também para o sociólogo Castel (1995, p.518), a estruturação recente do emprego, em suas formas de subcontratações (flexibilidade externa), e o enfrentamento de novas situações de mercado (fle-xibilidade interna) reabrem a discussão sobre “a função integradora da empresa”, já que essas práti-cas empresariais aprofundam a seletividade perma-nente dos trabalhadores. A estruturação do empre-go decorre das escolhas de políticas de transforma-ção e inovatransforma-ção tecnológica, aliadas a solicitações contínuas para modificar as exigências de

compe-tências e de qualificações.1

Apresentamos, mantendo a seqüência histó-rica, a introdução desse lema, primeiramente nos EUA, no decorrer da década de 1960; em seguida, a proliferação de significados que o tema passa a assu-mir no Brasil, a partir do final dos anos 1960; e, por fim, as convocatórias na União Européia, a partir de 1995. Nesses diversos contextos, o debate sobre a função social da empresa não emerge de forma ho-mogênea e, menos ainda, ela é assumida publica-mente como plataforma única. Acreditamos que esse confronto internacional possa aumentar e inovar as interrogações sobre os sentidos de responsabilidade das ações sociais das empresas no Brasil.

DEMANDAS DE RESPONSABILIDADE SOCIAL ÀS CORPORAÇÕES: EUA nos anos 1960

A din âmica qu e levou , n os EUA, algu mas grandes corporações a abandonarem seu

isolamen-to do con texisolamen-to social e aju starem su as metas e es-tratégias econômicas é reconhecida como questão nos anos 1960. Com efeito, diversos movimentos sociais, dentro e fora do campo empresarial, con-testaram a au ton omia das corporações, geran do u ma crise em relação à su a in depen dên cia e seu autogoverno.

Nos EUA, du ran te as décadas de 1920 e 1930, o debate sobre o papel da corporação já divi-dia opiniões. É importante ter em mente que, nes-se período, as du zen tas maiores empresas, n os EUA, con trolavam aproximadamen te 50% da ri-queza corporativa da nação e 22% da sua riri-queza total (Berle; Mean, 1968).

O debate foi retomado, seguindo Kaufman, Zacharias e Karson (1995), após a Segunda Guerra Mundial, quando houve um esforço legislativo de regulamentar as corporações. O livro de Howard R. Bo w e n , S ocia l Re sp on sibilitie s of th e Businessm an (1953), considerado uma das referên-cias mais importantes nesse tema, abre o caminho d a reflexão sobre a resp on sabilid ad e social, formatando seu primeiro esboço: “Que responsa-bilidades a empresa deveria assumir como

própri-as ju n to à sociedade?”2 Havia a crença de que as

gran des empresas eram cen tros vitais de poder e de tomada de decisão e que suas ações, em muitos pontos, afetavam a vida dos cidadãos. Nos EUA, a sinergia que permitiu a introdução do lema da res-ponsabilidade social foi fomentada pelas pressões políticas e pelas críticas públicas aos negócios das gran des corporações. Para D. Vogel a década de 1960 é o tempo em que, finalmente,

... a corporação está sen do su jeita à mesma pres-são democrática experimen tada para a n ação, 150 an os atrás. Assim como o Estado democráti-co, a corporação con temporân ea deve agora se ajustar continuamente a uma série de demandas competitivas e con flitan tes em relação aos seu s recursos (...) portanto, a gerência das corporações é agora forçada a equ ilibrar a deman da dos seu s acionistas, orientada para o lucro, com a necessi-dade e deman das sociais e políticas feitas por seu s ou tros con stitu in tes (Vogel, 1978, p.8-9).

1 Castel ch ega a p ergu n tar se h oje é p ossível “...ten tar

rep en sar se in vestir e ser com p etitiva p ara u m a em p resa d everia ser exclu sivam en te segu ir p olíticas d e com p ri-m ir ao ri-m áxiri-m o os cu stos salariais.” (Castel, 1995, p .589)

2 O sociólogo am erican o Carroll (1999) d efin e Bowen com o

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Nos anos 1960 algumas questões animaram o debate n a sociedade american a: as reivin dica-ções postas pela ação da Era dos Direitos Civis; os m ovim en tos d u ran te a Gu erra d o Vietn ã; o monitoramento realizado pelas Igrejas Católicas e Protestan tes, n o con trole das empresas america-nas no exterior; e, finalmente, o esforço dos movi-mentos dos acionistas em politizar o gerenciamento das empresas. Esse con ju n to de deman das e, ao mesmo tempo, a capacidade de mobilização de várias in stitu ições revelam o qu an to são amplos os in teresses e qu ão diversificados são os “atores cidadãos” que se organ izaram para mon itorar o comportamento empresarial. Mas sugere também a evidência de uma ampla rede de influências que propunham reverter a autonomia e a autoridade da empresa, como centro de interesses econômicos.

O boicote de negros a uma linh a de ônibus da cidade de Mon tgomery, em 1955, é lembrado como u m dos primeiros sin ais da pressão políti-ca, incentivada pela influência dos consumidores, cujas conseqüências econômicas acarretaram

mu-danças no comportamento das empresas.3

Pique-tes e boicoPique-tes em lanchonePique-tes de aproximadamen-te 140 cidades são paraproximadamen-tes dos eventos políticos que resu ltaram n o Ato dos Direitos Civis em 1964. A ele se agregam outros, sit-ins e manifestações, que se somaram às exigências feitas às empresas para que contratassem empregados negros. Em 1964, a empresa Kodak, em Rochester (NY), foi pressiona-da pelas organizações religiosas brancas e negras a promover uma maior incorporação da população n egra n o seu estabelecimen to. A escolh a dessa empresa n ão foi por acaso. A Kodak h avia coope-rado pu blicamen te com o Comitê do presiden te Kennedy para a elaboração do “Plano Oportunida-des Igu ais para o Progresso”. Esse even to Oportunida-desloca para a arena nacional o debate sobre natureza da respon sabilidade social das empresas. Segu in do esse exemplo, também a empresa Xerox concorda em se tornar parceira da Freedom Integration God Honor Today - FIGHT. Boicotes nas empresas Pepsi-Cola, Gu lf e Su n Oil foram particu larmen te

efeti-vos, tanto que, em mais de trinta empresas, foram criados mais de cin co mil empregos para a popu -lação n egra. Esses são algu n s dos exemplos qu e introduzem a noção de que as empresas têm a res-ponsabilidade de elevar a qualidade de vida nas cidades e de integrar a população negra ao merca-do de trabalho.

As exigências do movimento contra a guer-ra do Vietnã, em relação às empresas, aconteceguer-ram num contexto consideravelmente diferente. Os ra-dicais faziam u ma crítica explícita às empresas e ao sistema das corporações, publicando relatórios sobre suas políticas numa série de áreas, incluin-do proteção ambiental, investimento na África incluin-do Su l e dispu tas trabalh istas. Nos an os 1960, u ma das principais intervenções no comportamento das grandes empresas americanas foi referente à ques-tão da produção industrial de armamentos. Entre 1966 e 1969, os argu men tos – qu e tiveram como alvo muitas corporações como a AT&T, ITT, Bank of Am érica, UNITED Aircraft, Honeywell, General Eletric e Dow Chem ical – apoiavam-se em elemen-tos de diferente natureza. O primeiro é político: as corporações eram vistas como a parte mais impor-tante e poderosa da economia política americana. Com efeito, cada u ma das doze corporações qu e foram avaliadas tem em comu m o en volvimen to financeiro no esforço da guerra e no complexo in-dustrial militar. O segundo diz respeito aos desafi-os colocaddesafi-os peldesafi-os movimen tdesafi-os an ti-gu erra às empresas, que têm uma dimensão moral particu-larmente forte. A concepção protestante da respon-sabilidade individual está implícita. Num certo sen tido, de acordo com D. Vogel, pedia-se qu e as corporações tivessem “uma alma” e não permitis-sem que os produtos do seu capital e trabalho fos-sem u tilizados para fin s imorais. O movimen to estudantil universitário americano também é in-cluído nesse movimento, pois realizou mais de 183 manifestações contra os negócios da multinacional do setor qu ímico, a Dow Chem ical (qu e produ zia

napalm) entre 1968 e 1969.4

O controle sobre as corporações foi

realiza-3 O slogan “Tod o n egro n a cid ad e n ão d everia tom ar os

ôn ibu s p or u m d ia, em p rotesto” cu stou à em p resa ro-d oviária ro-d a ciro-d aro-d e ro-d e Mon tgom ery m ais ro-d e $7.000 p or d ia em p erd as d e ren d im en to (Vogel, 1978b).

4 Ao se torn ar o sím bolo d o p rotesto estu d an til, a Dow

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do também pela Igreja Protestante, que exerceu um importante papel em monitorar as empresas ame-ricanas atuantes na África do Sul, enquanto a Or-dem Católica exerceu algu ma in flu ência para as

empresas que atuavam na América Latina.5 A

ori-gem desse ativismo social é vin cu lada à h istória an tiga do Con selh o Nacion al de Igrejas (NCC, si-gla em in glês), u m qu arto de sécu lo an tes de se tornar uma questão política. O sociólogo america-n o D. Vogel lembra qu e, desde 1947, taamerica-n to a Vida Econômica quanto a Vida Eclesiástica preocu pa-ram-se em promover u ma an álise ética das qu es-tões econ ômicas. Em segu ida, em 1963, o NCC tornou-se a primeira organização a sugerir publi-cam en te qu e as relações d e igu ald ad e n as corporações influenciam a conduta social das em-presas. Em 1966, a ju n ta geral dessa in stitu ição expandiu essa implicação. Podemos salientar dois

exemplos: o caso da Polaroid e o da IBM.6 Em 1963,

a resolu ção das Nações Un idas decidiu por u m

embargo armamentista à África do Sul.7 Em 1969,

u m pequ en o n ú mero de empregados n egros da empresa se uniu a um grupo militante denomina-do Movimento denomina-dos Trabalhadenomina-dores Revolucionári-os da Polaroid (PRWM, sigla em inglês) e distribu-íram pan fletos acu san do: “Polaroid aprision a n e-gros em 60 segundos”. Os manifestantes argumen-tavam que os produtos da Polaroid esargumen-tavam sendo u sados n o sistema de cartão de iden tificação n a África do Sul e convocaram um boicote internaci-onal. Em 1970, a empresa Polaroid publicou uma declaração que negava a utilização do equipamen-to da empresa no programa de identificação. Ade-mais, a própria empresa afirmou ter instruído seus

distribuidores locais a interromper a venda de qualquer produto para o governo da África do Sul, incluindo filmes a serem usados em tal programa. O diretor de relações pú blicas da empresa assim declarou: “Temos responsabilidade pelo uso final do nosso produto... Em resposta ao grande PRWM, articulamos uma política muito estrita de recusa a fazer negócios diretamente com o governo sulafrican o... Nós, n a con dição de corporação, n ão ven -deremos n ossos produ tos em casos em qu e seu uso constitua uma redução potencial da liberdade humana” (Vogel, 1978, p.173).

O m ovim en to eclesiástico, em 1974, monitorou o comportamento da empresa america-na IBM, a partir da legalidade e da moralidade america-na venda de computadores para a África do Sul, afir-mando que os computadores aumentam a eficiên-cia do sistema de caderneta bancária sul-africana e podem ser usados para o desenvolvimento da ca-pacidade n u clear da África do Su l. Além disso, foi dito que a IBM desejava vender seus produtos para fortalecer a capacidade de repressão do go-verno daquele país. Longe de ser um ato comercial simples e neutro, a distribuição e o uso de compu-tadores foram vistos a partir de suas conseqüênci-as políticconseqüênci-as.

Para concluir, entre as ações de monitoramento das corporações american as, devemos in clu ir os gru pos organ izados de acion istas qu e bu scam politizar o geren ciamen to das empresas (Vogel, 1983). Sempre com referên cia à África do Su l, as reuniões anuais de acionistas são espaços que tor-nam públicos os desacordos frente às políticas das grandes empresas americanas. Entre 1970 e 1977, h á resoluções de acionistas que, agindo junto aos movimen tos eclesiásticos, se mobilizaram para sugerir maior transparência das empresas em suas políticas in tern as de empregos. O caso mais co-nhecido é aquele protagonizado por um pequeno gru po de advogados qu e, em 1970, organ izou o Projeto acerca da Responsabilidade Corporativa (PCR, sigla em in glês). Esse gru po, em virtu de de sua propriedade coletiva de doze ações, anunciou, em entrevista coletiva à imprensa, que estava pres-tes a submeter nove resoluções aos 1.300.000 aci-5 Para D. Vogel, o in teresse d as Igrejas n esse tip o d e qu

es-tão está ligad o à ativação d e p od eres tam bém econ ôm i-cos p or elas. Com efeito, as Igrejas são in stitu ições eco-n ôm icas sigeco-n ificativas cu jos recu rsos, em 1979, esta-vam estim ad os em m ais d e 160 bilh ões d e d ólares n os EUA . Ad e m a i s , s ã o i n s t i t u i ç õ e s c u jo s p r i n c í p i o s legitim ad ores p od em ser e, com m aior p robabilid ad e, são im p ortan tes in stitu ições com fu n d os d isp on íveis.

6 Vogel refere-se a ou tras ações d os m ovim en tos

eclesiás-ticos: n a Nam íbia em 1966-67; em An gola em 1969; e o boicote árabe n os EUA, em 1975-76 (Vogel, 1978).

7 Lem bram os qu e, em 1970, as Nações Un idas, com a

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on istas da empresa au tomotiva GM. Os objetivos su geridos pelo gru po de acion istas são: en corajar o máximo de debates possíveis sobre a relação entre r esp on sab ilid ad e cor p or ativa e au tor id ad e gerencial; permitir que os investidores expressem seu desprazer com o desempen h o social da GM, compartilhando votos sobre várias propostas con-tra os geren tes; expan dir o con selh o de diretores para vin te e seis, a fim de abrir espaço para três diretores adicionais e criar um comitê para respon-sabilidade corporativa.

Em 1972, por exemplo, a Mobil foi a ú n ica empresa a forn ecer os dados sobre su as práticas de emprego. Em segu ida, Ford, GM, Gu lf, ITT, Texaco, 3M, Xerox, Colgate-Palmolive, Gillette, entre outras, fizeram o mesmo. Polaroid e ITT es-tabeleceram comitês especiais de in speção para examinarem as práticas da empresa nessa temática, segu in do os pedidos dos movimen tos eclesiásti-cos da Igreja.

Essas diversas formas de pressão, exercidas sobre as empresas nos EUA, nos anos 1960-1977, evidenciam o ajuste das práticas das empresas no que diz respeito à configuração e à composição de seu s empregados; à defesa dos direitos h u man os n o seu in terior e (ou ) n as socied ad es on d e comercializam seus produtos; à escolha dos mer-cados con su midores; e à escolh a privilegiada de clientes internacionais. Assim, o círculo de atores e in stitu ições qu e su gerem a Respon sabilidade Social Empresarial – RSE – é u m cen ário qu e n ão é prefixado. Ao contrário, ele se expande e se arti-cula com a agenda nacional, de acordo com a capa-cidade de mobilização de grupos e setores organi-zados, bem como em função de sua vitalidade em proporcionar a formação de porta-vozes que inter-pretem as exigências dispersas na sociedade.

O MEIO EMPRESARIAL BRASILEIRO E A RESPONSABILIDADE SOCIAL

Se o interesse mundial empresarial pela res-ponsabilidade social parece apresentar-se com mais ênfase na década de 1990, no Brasil, a emergência

desse lema tem in ício n os an os 1960, qu an do al-gumas associações empresariais introduzem valo-res e princípios éticos como componentes da ges-tão da empresa. Tal preocupação é uma tímida con-tribuição do ambiente empresarial próximo ao pen-samento religioso progressista, em adesão ao pro-cesso de redemocratização do Estado de direito no Brasil. Mas se constitui como parte da posição que critica a atitude tradicional do empresariado, até então profundamente marcada por comportamen-tos autárquicos e autoritários. São pioneiras duas entidades. Inicialmente a Associação dos Dirigen-tes Cristãos de Empresas do Brasil (ADCE-Brasil), fundada em São Paulo, em 1961. As atividades da ADCE no Brasil inspiraram um debate sobre o papel social das empresas e, em especial, a pu blicação pela filial paulista, em 1965, da Carta de Princípi-os do Dirigente Cristão de Em presas. Em 1974, a associação pu blicou ou tro importan te docu men -to, O Decálogo do Em presário, a primeira proposta clara de ligar a gestão empresarial com a respon -sabilidade social. Para a ADCE-RJ, h á in dicações de qu e “imperfeições sociais” coexistem com o progresso e até podem ser causadas por ele. A prin-cipal missão da entidade é estabelecer ligações en-tre o espaço das organizações empresariais e o con-texto social, de modo qu e as ações sociais sejam u m in stru men to ú til para a con stru ção de u ma

n ova cu ltu ra.8 Su cessivamen te, em 1986, a Fu n

-dação Instituto de Desenvolvimento Empresarial e Social (Fides), em colaboração com a ADCE, pro-pôs “humanizar a empresa e promover sua relação com a sociedade”. A Fides desenvolve instrumen-tos edu cacion ais e in telectu ais específicos, bem com o estab elece relações com au torid ad es ecumênicas, tal como a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, criando um canal de interlocução com os sindicatos dos trabalhadores.

8 A red e criad a p ela ADCE d esen volveu n ovos in stru m en

tos e estim u lou a trad ição católica d a carid ad e. Seu p rin -cip al objetivo, in sp irad o n a en cíclica d o Pap a Leão XIII,

Reru m N ovaru m (1891), é ap rofu n d ar a reflexão sobre

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Ou tras três associações, n u m âmbito mais p r agm ático, ap óiam a p ostu r a p r oativa d o empresariado, qu an do se in au gu ra a con ju n tu ra da redemocratização nos anos de 1980. A Câmara Americana de Comércio de São Paulo (AMCHAM – São Paulo), a partir de 1982, introduz o conceito de “cidadania corporativa”, quando implementa a difu são de ações sociais empresariais. A associa-ção instituiu o Prêmio Eco (empresa-comunidade), com o objetivo de incentivar ações sociais nas áre-as de cultura, educação, meio ambiente, participa-ção comu n itária e saú de. O gru po Pen samen to Nacion al das Bases Empresariais – PNBE – se fez porta-voz da recomendação de estabelecer um “pacto social” n egociado. Em 1987, o PNBE, propon -do dar prioridade aos interesses nacionais, propa-ga os conceitos de democracia e cidadania no meio empresarial, mobilizan do-se em três âmbitos: a defesa de um pacto social nacional, o

desenvolvi-mento nacional e o controle da inflação.9 Por fim, a

rede de Gru po de In stitu tos, Fu n dações e Empre-sas (GIFE) inaugura no Brasil, em 1985, uma nova visão do in teresse das empresas privadas n o fo-men to a projetos sociais. O GIFE realiza su a pri-meira reu n ião em 1988, com u m debate sobre filantropia, patrocinado por representantes das fi-liais brasileiras da Alcoa e da Kellogg Foundation, em colaboração com a Câmara Americana de Co-mércio de São Paulo. A proposta, sucessivamente espalhada por toda a América Latina, é a de defen-der a responsabilidade e a reciprocidade das em-presas perante a sociedade, bem como a adoção de elevados padrões éticos de con du ta comercial. O grupo propõe-se a colaborar com o Estado, em pro-gramas destinados a reduzir a desigualdade social, participar de debates legislativos e contribuir com o programa nacional da Com unidade Solidária.

Nos anos 1990, a década em que as empre-sas buscavam reestru tu rar-se para au men tar su a competitividade no mercado internacional, alguns diretores – e especialistas em gestão de empresas –

associaram as iniciativas de responsabilidade so-cial da empresa com propostas para racion alizar (reduzir) custos, aumentar as vantagens competiti-vas e admin istrar os riscos e a repu tação de su as empresas. As repercu ssões in tern acion ais de al-guns indicadores sociais (incidentes de trabalh o, trabalh o infantil, trabalh o forçado, entre outros), ao proporcionarem uma imagem desfavorável, le-varam algumas empresas brasileiras a priorizar seu envolvimento em algumas áreas específicas, entre as quais a pobreza, a violência, a educação e a pro-teção ao meio ambiente. A responsabilidade social da empresa torn ou -se, assim, parte de u ma estra-tégia mais ampla de legitimidade, uma maneira de limpar a imagem maculada dos empresários e das empresas, considerados por muitos como respon-sáveis pela concentração da riqueza e pelo caráter cada vez mais especu lativo dos in vestimen tos fi-nanceiros. Em outras palavras, muitas empresas e seus dirigentes brasileiros utilizaram-se do lema da responsabilidade social da empresa para restabele-cer a confiança dos trabalhadores – aqueles que ti-nham permanecido empregados – após as signifi-cativas fusões, reestruturações e modernizações in-ternas para aumentar sua competitividade e, sobre-tudo, consolidar a fidelidade dos consumidores e a aceitação da coletividade. Numa época de merca-dos de trabalho flexíveis e de desregulamentação dos cu stos da mão-de-obra, a respon sabilidade social permite às empresas amen izar os efeitos desses processos.

A ampliação da agen da de RSE, du ran te a década de 1990, se dá pelo circu ito de doações empresariais, com recu rsos u sados para realizar programas sociais voltados para atender à popula-ção em situ apopula-ção de pobreza. Em ou tras palavras, as empresas e entidades empresariais dirigiram suas ações sociais para fora de seu s mu ros. Em con -traste, são raros os investimentos para aumentar a qualificação dos trabalhadores, e, assim, alcança-rem o grau de edu cação n ecessário para acompa-n h ar a moderacompa-n ização das técacompa-n icas de produ ção usadas nos locais de trabalho, sobretudo nos seto-res metalú rgico, qu ímico, têxtil e de con stru ção civil.

9 Em 1992, a en tid ad e teve u m p ap el d e lid eran ça n o p

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Essa segunda onda da difusão da responsa-bilidade social da empresa n o Brasil su rge n u m contexto de desregulamentação e deterioração das normas e direitos do trabalho. Enquanto há a ênfa-se em discu rsos e práticas de tal respon sabilida-de, várias empresas, diferentes associações e fede-rações empresariais fazem pressão sobre o Estado para que as normas de trabalho e os direitos traba-lh istas sejam exclu ídos da legislação n acion al e transferidos para a órbita da negociação coletiva direta. Essa proposta das grandes empresas, de se abandonar o paradigma universalista da legislação trabalh ista é u ma forma de redu zir, com amparo legal, a formação de empregos protegidos por re-gras e garantias previdenciárias, enxugar o volume de trabalhadores contratados e, graças à substitui-ção e à rotatividade da mão-de-obra, até diminuir os salários. Vista n esse con texto, a respon sabili-dade social da empresa aparece como uma “abor-dagem paliativa”, a fim de mitigar, utilizando me-didas filan trópicas, os dan os maiores qu e acarre-tam para a sociedade.

AS INICIATIVAS INSTITUCIONAIS RECENTES

As cin co redes citadas (ADCE, Amch am, FIDES, PNBE e GIFE) estão na raiz da concepção atual do papel positivo das empresas privadas na sociedade. Delas saíram muitas análises e motiva-ções para a articulação entre objetivos econômicos e objetivos sociais, que dizem respeito, sobretudo, a valores políticos e espirituais, e também às inter-pretações relacionadas com as demandas cívicas pela transparência das ações estatais e empresariais.

No fim dos an os 1990, em u ma n ova con -juntura política, as iniciativas empresariais de respon sabilidade social au men taram o lequ e de en -ten dimen to desse lema. Os programas sociais se orientam pelas recentes mudanças institucionais que abrem novos compromissos, viabilizados pela descentralização das políticas de educação, trans-portes, saú de e meio ambien te, a criação do Esta-tu to da Crian ça e do Adolescen te, do Código de Defesa do Consumidor e a lei federal de incentivo

fiscal aos in vestimen tos de apoio à cu ltu ra. Mais ainda: conectam-se, em 1994, com a política naci-onal do governo Fernando Henrique Cardoso no interior do programa “Mãos à Obra Brasil”. Nesse momen to, é ampliada a parceria en tre Estado e sociedade, estimulando-se o desenvolvimento do ch amado Terceiro Setor. Inspiradas no modelo norte-americano, muitas empresas privadas (naci-onais e multinaci(naci-onais), no Brasil, abraçaram essa política, aumentando o número de fundações em-presariais, financiando organizações sem fins lu-crativos e instituindo departamentos de responsa-bilidade social nas empresas. Um pequeno núme-ro de empresas já havia incorporado essas teses, e algumas firmas e associações empresariais procu-raram adaptá-las aos seus objetivos, elaborando e divulgando iniciativas sociais.

Durante as eleições presidenciais de 1994, alguns empresários que faziam parte do Fórum da Média e Pequena Empresa (Fopeme) fundam a Associação Brasileira de Empresários pela Cida-dania (Cives). Essa entidade política tem por fina-lidade, segundo o seu programa, o desenvolvimen-to da cidadan ia, o aperfeiçoamen desenvolvimen-to da democra-cia, a defesa da justiça social e da ética. Nas déca-das de 1980 e 1990, o gru po Cives participou de várias iniciativas políticas tais como: o Movimen-to pela Ética n a Política e o Pen samen Movimen-to Nacion al das Bases Empresariais – PNBE. Em 1994, defin e como seu principal objetivo a reforma estrutural do Estado, inclusive a reforma fiscal, a adoção de um sistema progressivo de imposto de renda e a defesa da universalização dos direitos trabalhistas.

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empresas deveriam ser capazes de promover a mu-dança cultural, isto é, de levar novos valores às co-munidades. Em consonância com a missão do Ins-tituto, a responsabilidade social deveria aumentar a capacidade de as empresas fazerem investimentos que fortaleçam, ao mesmo tempo, as redes sociais e econômicas, além de disseminar esse conceito para as redes de seus stakeholders. Por isso, o Instituto Ethos recomenda que seus membros promovam a imagem das empresas como agentes civilizadores das condições comunitárias que as cercam.

Para exemplificar a visão empresarial qu e interpreta a responsabilidade social no Brasil no período de maior resson ân cia de su a divu lgação nacional, citamos alguns depoimentos divulgados no jornal carioca O Globo, que, em 2003, inaugura o suplemento mensal: Razão Social. Essa iniciati-va fomenta a criação de uma cu ltura positiiniciati-va do comportamento e das práticas sociais das empre-sas, demonstrando que elas têm instrumentos para adotar uma postura proativa junto à sociedade, colaborando com o bem-estar da população.

Entrevista a Antonio Ermírio de Morais – Grupo Votorantim:

A respon sabilidade social é fu n damen tal para o país crescer de man eira ordeira e in teligen te.... Nós compramos essa compan h ia Brasileira de alu mín io em 1955 e tin h a 75% de fu n cion ários an alfabetos. Hoje n ão tem n en h u m. Pelo con trá-rio: 80% têm en sin o completo. E mu ita gen te está se forman do pela compan h ia. Naqu ela épo-ca não se falava de responsabilidade social como se fala h oje. Isso é u m sen timen to h u man o, de aju dar o próxim o, tem qu e estar n o DNA do empresário. (Razão Social, n .6, n ov., 2003.)

Entrevista a Arthur Sendas – Presidente do Grupo Sendas:

Eu acho que o empresário tem o dever de colabo-rar, de participar, fazer a parte dele. Mas n ão dá p ara assu m ir totalm en te. Até p orqu e, com a globalização, as m aiores em presas n o m u n do e s t ã o a t u a n d o a q u i livr e m e n t e , h á m u it a competitividade e elas pagam ju ros bem dife-rentes. Enquanto lá fora são juros de 3,4%, aqui é 25 vezes mais. Portan to o empresário faz o qu e pode, mas tem limites. E o govern o também pre-cisa atuar. Afinal nós contribuímos para ele. (Ra-zão Social, n .7, dez., 2003)

Entrevista a Marcos Magalhães – Presiden-te da Ph ilips

Nosso grande guarda chuva é a educação, para aju-dar o público externo, mas com chances de benefi-ciar nossos funcionários também. Lá atrás, quando começamos a estruturar nossas ações, foi pela filantropia. Até que decidimos focar na educação, pelo motivo óbvio de contribuir mais com o país. O Brasil tem um espaço grande demais entre o poder econômico (15º do mundo) e o índice de desenvol-vimento humano (72º). Essa distância tem que di-minuir. (Razão Social, n.15, ago., 2004)

Entrevista a João Brandão – Diretor da Rio Polímeros:

...A respon sabilidade social faz parte do proces-so de proces-sobrevivên cia das empresas. A empresa qu e exerce a respon sabilidade social é mais fa-cilmen te aceita pela comu n idade. Dessa forma, é mais fácil se perpetu ar. É u m comportamen to qu e está se dissemin an do largamen te.” (Razão Social, n .24, maio, 2005)

Desse conjunto tão diverso emerge uma con-vivência de diferentes entendimentos, de filosofias

que nem sempre coincidem entre si.10 A ênfase dos

programas implementados permanece demarcada por metas de responsabilidade voltadas a oferecer serviços gratuitos (alimentação, assistência, etc.) às pessoas excluídas de vínculos formais de emprego. Tais iniciativas e programas não incluem proposta alguma para reverter as políticas seletivas de oferta de empregos, com o fim de reduzir a persistente taxa de emprego informal.

RENOVANDO A FUNÇÃO SOCIAL DAS EM-PRESAS NA UNIÃO EUROPÉIA

A introdução do tema da responsabilidade social da empresa n as diretrizes da Un ião Eu ro-péia – UE – tem início em 1995, quando um grupo de vinte empresas assinou, junto à presidência da

10 Não qu erem os dim in u ir a colaboração da sociedade civil

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eu , o docu men to European Business Declaration against Social Exclusion. Nesse docu men to estão contidas as mais importantes diretrizes que moti-vam, do pon to de vista empresarial, a adesão das empresas à luta contra a exclusão social. Para lutar e preven ir a exclu são social, o apelo da UE à em-presa é fazer com que elas renovem sua finalidade: ser fon te de empregos. É graças a esse laço qu e as empresas encontram formas de restabelecer os vín-cu los de reciprocidade ju n to à sociedade. Mais ain da: afirma-se qu e “o setor privado e as empre-sas pú blicas, ao preven irem e combaterem a ex-clu são, podem elevar su a produ tividade e su as metas de lucratividade” (União Européia, 1995). Essa meta é assim assu mida como u m compro-misso que exige uma interação estreita e dinâmica, na Europa, entre as políticas econômicas e as polí-ticas sociais, visto qu e se deve fazer fren te a mais de 17 milh ões de pessoas desempregadas, 53 mi-lhões vivendo abaixo da linha da pobreza, e de 3 a 5 milhões sem adequadas condições de habitação. A convocação de empresas européias na adesão à respon sabilidade social como compromisso, em

1999, inclui os territórios nacionais,11 os países do

Eastern Europe e os países em desenvolvimento. Em segu ida, em 2000, n a ocasião do En -con tro de Lisboa, é redigido um apelo a favor da respon sabilidade social. Nesse fóru m, h á u ma ampliação das entidades envolvidas, já que o pri-meiro min istro da UE, a Comissão Eu ropéia e a primeira direção da CSR Europe (Responsabilida-de Social Corporativa), se comprometem a elabo-rar um atualizado programa de metas para 2010. O desafio é saber con ju gar o tripé: excelên cia e sustentabilidade do desenvolvimento econômico; mais e melhores empregos; e o aumento da coesão social. O docu men to, PARTNERSHIP ALCHEMY. New Social Partnerships in Europe (União Euro-péia, 2000) é um dos primeiros textos que resume

os desafios de algu n s países da Eu ropa,12 editado

pelo The Copenhagen Centre – TCC – em 2000. Nesse docu men to, são ressaltados os desafios n o momen to em qu e a n ova realidade da econ omia global, as transformações tecnológicas e as mudan-ças demográficas se manifestam em consonância com a transição política dos últimos anos do milê-nio. Nessa complexa combinação, estão sendo cri-adas n ovas e in espercri-adas oportu n idades para algu n s cidadãos eu ropeu s, lado a lado com o au -mento da insegurança e da desigualdade para ou-tros. Em cada realidade nacional, constata-se que uma abertura cosmopolita de possibilidades, o uso de alta tecnologia e o acesso a serviços sociais são acompanhados pela existência de áreas onde há o aumento do desemprego, a persistência de habili-dades de trabalh o não apropriadas aos desafios tecnológicos, baixos rendimentos, precárias con-d ições resicon-d en ciais, in su cessos fam iliares, crim in alidade, con flitos étn icos e degradação ambiental. A profundidade dessa distância social en tre qu em é ben eficiário e qu em está exclu ído ameaça o su cesso da in tegração eu ropéia, assim como seu almejado desenvolvimento. No conjun-to dos desafios que os países devem enfrentar, são também in clu ídos os processos de privatização, da liberalização e da abertura das comunicações, o qu e, n os ú ltimos qu in ze an os, tem colocado em evidên cia o setor privado. Para os au tores deste Relatório, essas questões sugerem o envolvimento tan to dos empresários e de su as lideran ças como das organ izações sin dicais e das in stitu ições lo-cais. É ju stamen te n o in terior das in stân cias qu e envolvem o Estado, o mercado e a sociedade civil, que é possível o equilíbrio dos poderes e a assunção das responsabilidades que, anteriormente, consti-tu íam tarefas exclu sivas dos govern os n acion ais. Estes processos, continua o relatório, têm evidenci-ado o aumento da atenção pública em direção às atividades do business e, conseqüentemente, solici-tam o estreisolici-tamento das relações e dos compromis-sos das empresas no interior da sociedade. O de-senvolvimento é, assim, escolhido como centro das práticas do business em toda sociedade européia. Finalmente, como parte da exigência de coesão, no Relatório faz-se explícita menção ao papel dos par-11 Até 1999, m ais d e 50 em p resas ad erem ao lem a d a

Res-p on sabilid ad e Social, con ectan d o 15 Res-p aíses eu roRes-p eu s.

12 As in form ações d etalh ad as d as in iciativas p rom ovid as

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ceiros sociais, que “deveriam inovar suas tradicio-n ais itradicio-n terações” (TCC, 2000, p.20). Os parceiros, isto é, os represen tan tes dos empregadores e dos trabalhadores, são mencionados como atores que fomen tam o diálogo social, en volven do n u mero-sos setores industriais e milhões de trabalhadores n a Eu ropa, n os diferen tes países e em diferen tes territórios locais. O tradicional envolvimento des-ses atores é evidente pelo legado dos procedimen-tos de diálogo, de consultas, de negociações cole-tivas, de represen tações diretas n as en tidades e, em alguns casos, como na Bélgica e na França, re-presen tações n os fu n dos de segu ro social. Tais práticas deveriam permanecer ativas, justamente p o r q u e p o d e m e s t i m u l a r u m a m a i o r competitividade internacional, aliada à coesão so-cial. Além de ser mencionado como prática tradi-cional européia, o diálogo social é incentivado vi-sando a aumentar sua eficácia e criatividade e objetivando instaurar parcerias entre empregados e empregadores na Europa, em âmbito nacional e local (TCC, 2000, p.20). Nesses termos, fica claro que há uma preocupação em chamar a atenção da empresa, a fim de qu e ela aprimore a capacidade d e s o m a r s u a s fu n ç õ e s , r e n o v a n d o s e u en volvimen to n a recu peração dos elos sociais de reciprocidade n a sociedade con temporân ea. O emprego, nesse contexto, é apontado como a ques-tão central. As empresas, como agentes econômi-cos, são solicitadas a tran sformarem-se em espa-ços em qu e essa meta é adotada como parte da respon sabilidade social. En tre os exemplos de ações a serem promovidas, são citadas: estimular e incentivar o aumento da qualificação dos traba-lhadores; oferecer fontes de trabalho referentes ao controle de acidentes, criar um ambiente seguro e capaz de proteger física e psicologicamente quem nele trabalha; proporcionar a igualdade de oportu-n idades eoportu-n tre os sexos oportu-n o acesso à asceoportu-n são e à carreira. Essas metas de responsabilidade não iso-lam a empresa do contexto social, mas justamen-te, por solicitarem u m aprofu n damen to de seu papel social, recuperam os vínculos, as conexões institucionais, isto é, solicitam o envolvimento em respeito às regras e às n ormas legais qu e foram

pactuadas, juntamente às instâncias reguladoras: o Min istério do Trabalh o, as Prefeitu ras, as en ti-dades de represen tação de in teresses, dos traba-lhadores, dos empregadores, dos consumidores.

Esse con ju n to de objetivos é solicitado a todos os agen tes econ ômicos, ou seja, a todo e qu alqu er tipo de empresa: as pequ en as e médias empresas e as multinacionais, em todos os setores de atividades.

As reu n iões promovidas n o âmbito da Co-missão Eu ropéia, desde 1999, deságu am n a edi-ção final da primeira diretriz européia, o Livro Ver-de, cujo título é Prom over um quadro europeu para a responsabilidade social das em presas, editado em 2001. A proposta de responsabilidade social, nes-se Livro, coloca as empresas em contato direto com um ulterior desafio da sociedade contemporânea: aprimorar relações solidárias. Isto é, compete aos agentes econômicos favorecer os mais altos níveis de coesão social entre os setores da sociedade. Esse objetivo se expressa na definição de responsabili-dade social: “integração voluntária de preocupa-ções sociais e ambien tais por parte das empresas n as su as operações e n a su a in teração com as ou -tras partes interessadas” (União Européia, 2001).

Encontraremos maiores conexões dessa di-retriz se articu larmos o Livro Verde com os n ovos prin cípios e valores da Carta dos Direitos Funda-m entais13 (2000). São outros exemplos dessa arti-cu lação os p arâm etros já em voga d o Global Com pact, os prin cípios diretivos da Organ ização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE – e as próprias convenções resumidas na assim ch amada agenda social da Organização In-ternacional do Trabalho – OIT. A meta é unificar e h armonizar, no diversificado território europeu, algu n s p rin cíp ios d e fu n cion am en to a serem adotados. Caberia às empresas:

! “Adotar um comportamento socialmente

responsável, in do além das prescrições legais, se en -volvendo em práticas voluntárias como parte de seus interesses de mais longo alcance”;

13 A Carta d os Direitos Fu n d am en tais d a Un ião Eu rop éia

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! Con sid erar qu e “a RS é in trin secam en te

conectada ao conceito de desenvolvimento sus-tentável: as empresas deveriam integrar os efei-tos econ ômicos, sociais e ambien tais, n a su as práticas de gestão”;

! Perceber que “a RS não é uma opção a ser acres-cida às atividades centrais da empresas, mas está vin cu lada a escolh as e desafios de su a gestão interna”.

Dessas ên fases, fica claro qu e se está mol-dan do critérios in ovadores, assu midos como fer-ramentas de gestão do assim chamado governo da

empresa,14 de grande utilidade para se

enfrenta-rem as transformações contemporâneas. É aqui que a inserção no mercado não requer o abandono das regras e normas para concorrer internacionalmen-te, mas refin a as postu ras a serem segu idas, para que as empresas possam se movimentar no amplo con texto intern acion al. Se a con ju n tu ra mu n dial envolve desafios, é importante que sejam adotadas novas e apropriadas posturas empresariais. No texto do Livro Verde, são citados alguns exemplos:

! A globalização tem aberto para as empresas no-vas perspectino-vas, mas estas têm modificado tam-bém a sua estrutura interna, fazendo-a mais com-plexa. Su a movimen tação n os espaços de mer-cad o in tern acion al exige m aiores e m ais aprofu n dados compromissos ju n tamen te aos países em via de desenvolvimento.

! A força dos mecan ismos de elaboração da ima-gem da empresa e da reputação funcionam para enfrentar o ambiente competitivo justamente quando os consumidores e as organizações não governamentais ficam mais atentas às informa-ções sobre as condiinforma-ções de produção dos bens e sobre seus efeitos para o desenvolvimento. Nes-te sentido, esNes-tes mecanismos da imagem podem ajudar a recompensar as empresas em seus com-p ortam en tos e em su as atitu d es sociais e ambientais.

! As conseqüências das modificações exigem que

também as intervenções e investimentos finan-ceiros sejam mais tran sparen tes, para melh or permitir a iden tificação dos fatores de risco, do su cesso, para en fim aten der às deman das da opinião pública que requer o fornecimento de informações mais extensas daquelas clássicas do desempenho financeiro.

! O con h ecimen to e a in ovação são h oje sempre mais cru ciais para aprimorar a competição e, conseqüentemente, adquirirem maiores interes-ses se con tratam pessoas competen tes e bem qualificadas.

Finalmente, nesse Livro Verde, são renova-dos os compromissos de adesão à responsabilida-de social por parte das organizações. O primeiro compromisso da empresa é fomentar “parcerias para

o crescimento e para o emprego”. Dessa forma, em

um ambiente público europeu, os empresários são apreciados não apenas pelos lucros obtidos, mas também por oferecerem uma contribuição

impor-tante na resolução dos problemas da sociedade.15

Su cessivamen te, todas as práticas sociais promovidas pelas empresas não devem ser consi-deradas como uma substituição das regulamenta-ções e da legislação referentes aos direitos sociais ou n ormas ambien tais. Ao con trário, n os países on de tais regu lamen tações n ão existem ain da, a orientação da Responsabilidade Social das Empre-sas Eu ropéias é a de promover esforços para “a criação de um contexto que ajude a regulamentar as fon tes legislativas, com o fim de ch egar a u ma base eqüitativa, fonte para sucessivos

desenvolvi-men tos de práticas sociais respon sáveis”.16 Após

14 Ad otam os a d efin ição d o sociólogo L. Gallin o (2005),

qu an d o faz referên cia ao govern o d a em p resa, isto é, à estru tu ra d o ch am ad o govern o d a em p resa, con h ecid a n o âm bito teórico com o “govern an ça corp orativa [qu e se fu n d a] em u m a articu lação bastan te com p lexa d a d is-tribu ição d o p od er d e d ecisão en tre os acion istas, os d irigen tes ad m in istrativos e os d irigen tes técn icos.”

15 Ap ós as reu n iões d e Lisboa, fala-se: “Mais qu e n u n ca, a

Eu rop a p recisa d e em p resários ativos, atitu d es p ositivas em relação ao esp írito em p resarial e con fian ça n as em -p resas. A Eu ro-p a n ecessita d e u m clim a -p ú blico n o qu al os em p resários sejam ap reciad os n ão ap en as p elos lu -cros qu e têm , m as tam bém p or d arem u m ap oio im p or-tan te p ara a resolu ção d e certos p roblem as d a socied ad e” (Un ião Eu rop éia, 2006).

16 “A visão eu rop éia d e p rosp erid ad e, solid aried ad e e segu

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a divulgação do Livro Verde, multiplicam-se as ini-ciativas de debate e de articulação junto ao

Parla-mento Europeu.17 Em síntese, emergem diferentes

comentários recolhidos juntos às organizações que acolhem esse lema (União Européia, 2002):

! A respon sabilidade social é destacada pelas

empresas como sendo de natureza voluntária e estas consideram que o conceito não poderá ser aplicado de maneira uniforme, dada a diversi-dade das abordagens nacionais.

! Os sin dicatos e as organ izações da sociedade civil salientam que as iniciativas voluntárias não são suficientes para proteger os trabalh adores. Requ erem, assim, às empresas qu e torn em co-n h ecidas as su as atividades co-n o domíco-n io social, através de mecanismos eficazes.

! Os in vestidores su blin h am a n ecessidade de melhorar a divulgação de informações e a trans-parência quanto às práticas das empresas.

! As organ izações de con su midores salien tam a importância de dispor de informações confiáveis sobre as con dições de produ ção e ven da dos bens.

! As in stitu ições eu ropéias – como o Con selh o, o Comitê Econ ômico e Social Eu ropeu , o Comitê das Regiões e o Parlamen to Eu ropeu – assin a-lam a importância de uma abordagem européia sobre o assu n to.

A Comissão Eu ropéia, ain da em 2006, es-ten de seu compromisso, fazen do u m apelo para qu e as empresas n ão se percebam “su bstitu in do as ações dos poderes pú blicos” (União Européia, 2006). É n essa ocasião qu e são ren ovados e deta-lhados os mais atuais objetivos e iniciativas de res-ponsabilidade social, tais como:

! Maior integração dos mercados de trabalh o e

melh ores níveis de in clu são social, na medida em que as empresas procurem ativamente recru-tar mais pessoas de grupos desfavorecidos.

! In vestimen to n o desen volvimen to das

compe-t ê n c i a s , n a fo r m a ç ã o c o n compe-t í n u a e n a empregabilidade, que são necessários para man-ter a competitividade na economia do conh

men to em n ível global e em face do en velh eci-mento da população ativa na Europa.

! Melh orias n a saú de pú blica, em con seqü ên cia de in iciativas volu n tárias das empresas em do-mín ios como a comercialização e a rotu lagem dos alimen tos e das su bstân cias qu ímicas n ão tóxicas.

! Um melh or desempen h o em matéria de in ova-ção, n o qu e se refere às in ovações dirigidas a problemas da sociedade, em con seqü ên cia de u ma in teração mais in ten siva com os agen tes externos e da criação de ambientes de trabalh o mais propícios à inovação.

! Maior respeito pelos direitos humanos, pela pro-teção do ambiente e pelas normas trabalh istas básicas, n omeadamen te n os países em vias de desenvolvimento.

! Redu zir a pobreza e evolu ir n o sen tido de con -cretizar os objetivos de Desen volvimen to do Milênio.18

Finalmente, há uma particular atenção em se reconhecer o uso de ferramentas que ampliam a transparência das práticas de responsabilidade social, a fim de qu e as práticas volu n tárias sejam visíveis e de fácil análise comparativa (União Eu-ropéia, 2002). Nesse âmbito, são in clu ídos os

có-digos de con du ta,19 as n ormas de gestão,20 as n

or-mas de performance e os relatórios de validação,21

os rótulos e etiquetas,22 e os investimentos

social-mente responsáveis.23

Em 2007, o processo de difu são da CSR con segu e en volver os vin te e cin co países qu e fa-zem parte da União Européia (União Européia,

17 Essas etap as d e con su lta estão registrad as n o d ocu m en

-to (2002).

18 É tam bém m en cion ad a a p reocu p ação d e as em p resas

p rom overem a in corp oração d a igu ald ad e d e gên ero. Ver Docu m en to: Un ião Eu rop éia, COM (2006), n .136.

19 Cód igos d e con d u ta: d ireitos d os trabalh ad ores, d ireitos

h u m an os, p roteção d o am bien te, etc.

20 Norm as d e gestão: in tegração d os asp ectos sociais e

am bien tais n as ativid ad es qu otid ian as d as em p resas.

21 Aferição d os d esem p en h os, elaboração d e relatórios e

valid ação (red ação, p elas em p resas, d e relatórios in ter-n os sobre as su as ativid ad es ter-n o d om íter-n io d a RSE).

22 Rótu los (d ireito d os con su m id ores à in form ação sobre

os p rod u tos, através d a rotu lagem ).

23 ISR (in vestim en to socialm en te resp on sável, esp

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2007). As diferentes modalidades de organização, qu e modalidades estão ativas, qu e in cen tivos es-tão disponíveis para as empresas e que ferramen-tas de transparência e visibilidade são encaminha-das são algu n s dos tópicos do Com pendium on national public policies on CSR in the European Union, o mais recen te docu men to do balan ço in -terno da União Européia sobre a Responsabilida-de Social (2007).

CONCLUSÕES

As perspectivas, as políticas e as redes institucionais não parecem ser uniformes quanto à proposta da Respon sabilidade Social n os EUA, no Brasil e na União Européia. Se, por um lado, as dinâmicas da globalização ampliam esse lema, por outro, os estímulos de adesão não homogeneízam os en ten dimen tos qu e acabamos de relatar. Com efeito, a difusão de iniciativas de responsabilida-de social é parte do ajuste do comportamento em-presarial n os EUA. No Brasil, con stitu i-se como uma pluralidade de iniciativas encampadas dire-tamente pelas empresas até o início dos anos 2000. E, na UE, é uma solicitação central das instâncias multilaterais que estimulam as empresas a respon-derem à atu al crise do emprego. Esses exemplos con stituem três portas de en trada para a proble-mática da responsabilidade social. É interessante n ão su bestimar as din âmicas qu e explicitam os camin h os pelos qu ais tais organ izações trilh am. Às vezes, acolh em as reivin dicações qu e se formam n o con ju n to da sociedade (USA e UE), ou -tras vezes, põem resistências a usar o emprego como meta da responsabilidade social e se deslocam para várias iniciativas de assistência social, elaborando programas discricionários e unilaterais, como no caso do Brasil. Provavelmen te é a partir desses encaminhamentos tão variados que faz sentido fa-lar de interações nacionais e regionais da Respon-sabilidade Social das Empresas. O olhar sociológi-co pode fixar as din âmicas e os processos através dos quais, na sociedade, as estruturas das organi-zações se moldam às exigências plurais,

econômi-cas e extra-econômieconômi-cas, de modo a colaborar com o desenvolvimento e para a coesão social.

No EUA, a respon sabilidade se impôs à empresa com o fim de con trolar política e social-mente seus poderes e para delimitar as fronteiras da sua fabulosa expansão econômica e política. Nos Estados Un idos, n o decorrer dos an os 1930, n o início do debate sobre a responsabilidade social, os gran des con glomerados mu ltin acion ais – as corporações – detinham sempre mais poderes, in-terferin do até mesmo n a esfera política n acion al (Kaufman; Zach arias; Karson, 1995). Hoje, o estí-mu lo à lealdade dos con su midores n o mercado am erican o se estabelece a p artir d e relações contratuais que incluem critérios e procedimentos de in den izações, obrigações e segu ros, os qu ais fomentam o desenvolvimento da área disciplinar do “direito de responsabilidade” (Engel, 1992).

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da in tegração ao emprego é ampliada até pelo en volvimen to do terceiro setor. As empresas de-nominam, como práticas de responsabilidade so-cial, vários programas de assistência a essas popu-lações, os qu ais vêm sen do desen h ados com pro-cedimen tos de frágil diálogo pú blico, sem in tro-duzir mecanismos de monitoramento das relações de reciprocidade en tre elas e seu en torno social (Peliano, 2001; Cappellin; Giuliani, 2004). O que as nossas pesquisas indicam é que a ampla divul-gação da respon sabilidade social coin cide com o desenvolvimento do movimento empresarial Cus-to Brasil, que sugere a diluição das garantias traba-lh istas, até então dirigidas pelo ideal dos direitos u n iversais, a serem in clu ídas agora n as n

egocia-ções contratuais coletivas.24

Trata-se de metas privadas de bem-estar so-cial, na medida em que as áreas de intervenção, as fin alidades dos serviços e a defin ição dos pú bli-cos assistidos não são fruto de tímidas práticas de diálogo ou negociação direta com atores sociais (tra-balhadores, população local, sindicatos, agências

do poder estatal).25 Frente aos contextos

internaci-onais (USA e UE), h á certa resistência por parte das empresas, no Brasil, de se envolverem direta-mente na reversão da relação assimétrica en tre a acu m u lação d e riqu eza e o bem -estar geral, assimetria que elas próprias fomentam. O que pa-rece claro é qu e as empresas, mesmo realizan do programas e serviços de assistên cia social, man -têm uma postura impermeável ao diálogo ju nto aos trabalh adores. Poderíamos até afirmar qu e é ainda muito arraigada e difu sa a cren ça de qu e a empresa é uma estru tu ra autocrática, u ma ilh a

sociotécnica, um sistema relativamente autônomo de governo.

No âmbito da União Européia, o uso do conceito de responsabilidade circula nos ambien-tes empresariais com um novo marco regulatório qu e reitera o fortalecimen to de propostas em cir-cu lação, já estabelecidas ao lon go da h istoria das relações entre empresas, estado nacional e socie-dades locais. É ju stamen te essa ten tativa política que fortalece a crítica sobre a autonomia da gestão das empresas, sugerida pelo mercado dos acionis-tas e in vestidores. É u m a ten tativa qu e bu sca reordenar a política de bem-estar que foi colocada em risco, fragilizada pela prática de abandonar os pactos com as con qu istas sin dicais dos trabalh a-dores.

Os lemas de maior transparência adminis-trativa e financeira aliam-se às solicitações de que as empresas saibam atender a exigências ambientais e a cau sas sociais. No âmbito da Un ião Eu ropéia, o u so do con ceito de respon sabilidade começa a circular nos ambientes empresariais como um apoio

à regulação social,26 de forma a fortalecer a

propos-ta já em voga ao longo da h istoria das políticas do Estado Social (Castel, 1995). Essa preocupação, já presen te n o fim da década de 1960, é reiterada hoje, por ter de atualizar e reforçar, sob nova plata-forma discu rsiva, as exigên cias já con qu istadas, mas hoje fragilizadas pelos ajustes à concorrência internacional e pelos recentes comportamentos de extern alização (escolh a d e ou tros con textos territoriais de produ ção e de mercado) de mu itas empresas européias. Nesse contexto, parece claro qu e a plataforma de maximização dos lu cros, fo-men tada pelo maior poder dos in vestidores n a gestão das empresas, fez alen tar a agen da do de-senvolvimento e bem-estar. É justamente essa ten-tativa política de reaproximar os desafios do cres-cimen to do bem-estar qu e eviden cia o qu an to é 24 A reform a con stitu cion al foi en viad a ao Min istério d o

Trabalh o e ap resen tad a p ara a Com issão de Assu n tos

Sociais do Sen ado Federal, d esd e 1997. Com isso,

abrir-se-ia u m cam p o p ara se n egociar u m a série d e en cargos, esp ecialm en te aqu eles d os cap ítu los referen tes à rem u -n eração d o tem p o -n ão trabalh ad o: férias, abo-n o d e féri-as, 13º salário, d escan sos rem u n erad os, etc. Nessa n ego-ciação, n ad a garan te qu e eles serão m ais baixos ou m ais altos d o qu e os atu ais.

25 Relem bram os qu e, p ara O. De Leon ard is, a trajetória d o

Welfare State oferece u m legad o ao estatu to p ú blico d as

p olíticas sociais. Para a au tora, isso se exp ressa p elo fato d e a form atação d as p olíticas sociais fazer referên cia, sobretu d o, a p rocessos e p lan ejam en tos qu e alim en tam o d ebate d as qu estões a serem assu m id as coletivam en -te, d os fin s, d os sign ificad os, d as escolh as e d os in teres-ses em jogo (Leon ard is, 1999).

26 Referirm o-n os à regu lação com o: “o p rocesso d in âm ico

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explícito o desejo, por parte das diretrizes da UE, de reordenar os processos que têm reduzido a co-es ã o s oc ia l: a ex p a n s ã o in t er n a c ion a l d a s privatizações e a liberalização do mercado.

Recuperando as atitudes empresariais que visam a responder às necessidades da sociedade, dever-se-ia afirmar que a responsabilidade social é u m lem a q u e s e m old a à s in t er p r et a ç ões sociopolíticas em vários espaços, nacionais e mul-tilaterais. O lema de responsabilidade social suge-rido na União Européia acentua o fomento de em-prego de qualidade, a ampliação de cuidados con-tra práticas não discriminatórias de recrutamento, a salvaguarda dos direitos trabalh istas, o aprimo-ramento da profissionalização, a modernização dos processos de produ ção, a parceria e o diálogo so-cial de desenvolvimento local. No contexto brasi-leiro, essas metas parecem pouco enfatizadas. As práticas filantrópicas nem sempre conseguem su-perar o imediatismo das proposições assistenciais

e corrigir seu instável e irregular alcance social.27

É interessante acompanhar e detalhar, ten-do como pano de funten-do o contexto internacional, a maneira como as instituições econômicas brasi-leiras se dispõem a alterar sua cultura autocrática, redefinindo-se entre os muitos atores sociais que, na sociedade contemporânea, inovam sua respon-sabilidade no seio da regulação social pública.

Recebido para pu blicação em setembro de 2007) (Aceito em n ovembro de 2007)

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27 Lem bram os a ên fase específica registrada n o Livro Verde:

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