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A independência intelectual de Bandeira de Mello

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G E T U L I O

janeiro 2009

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uma marca de minha própria atuação como estudioso do direito e como pro-fessor. Jamais aceitei que meus alunos, sobretudo os orientandos de mestrado ou doutorado, aceitassem as minhas idéias apenas por serem minhas. Eles tinham de analisar diferentes pontos de vista, confrontar, contrastar, para inal-mente chegar às próprias conclusões, porque isso realmente foi uma lição que aprendi para sempre.

Alguém deveria sempre passar novas idéias e propostas pelo crivo da racio-nalidade, nunca se render ao chamado “magister dixit”. Isso explica também por que alguns alunos meus vieram a ter opiniões diferentes das minhas. In-dependência intelectual é um valor, a meu ver, muito prezável e que me foi instilado e também procuro fomentar entre os meus alunos.

O estudo do Direito Administrativo

O professor Oswaldo Aranha Bandei-ra de Mello escreveu uma obBandei-ra vasta, tanto no campo da teoria do Estado, no Direito Constitucional, como no Direi-to Administrativo, que foi sua área de predileção e especialidade. Sem dúvida, há um livro que se destaca, se salienta em relação a todos os outros, que é Prin-cípios Gerais de Direito Administrativo,

em dois volumes. É uma obra ampla e mesmo assim não abrange o Direito Administrativo de ponta a ponta, pois o autor morreu antes de chegar ao inal de seu projeto, que era produzir completo um exame do Direito Administrativo. Mas os dois volumes que conseguiu escrever não encontram no Direito

bra-sileiro nenhuma obra com o mesmo ní-vel de profundidade. Apesar de ter sido escrito há algumas décadas, ainda é um livro muito atual, tanto assim que foi fei-ta uma reedição do primeiro volume há dois anos. Nessa reedição foi conserva-do o pensamento conserva-do autor. O primeiro volume trata, sobretudo, de uma parte mais teórica do Direito Administrativo, sua teoria geral, os atos administrativos. Foi possível conservá-lo com uma ou ou-tra anotação inal, mas nada foi mexido no texto da obra, exatamente para que ela mantivesse o caráter autêntico, cor-respondente ao do tempo em que saiu a primeira edição. O segundo volume tra-ta dos sujeitos da administração pública. Essa obra fechou tudo o que ele havia realizado ao longo de sua carreira.

Bandeira de Mello deixou também dois outros trabalhos no campo do Direi-to Público, livros extremamente interes-santes. Um é a Teoria das Constituições Rígidas; o outro é A Natureza Jurídica do Estado Federal. Ambas são

aborda-gens mais ligadas ao campo da Teoria do Estado. Em Teoria das Constituições Rígidas ele procura analisar esse tipo de

constituição e mostrar suas caracterís-ticas, comparando com a constituição lexível. Já A Natureza Jurídica do Esta-do Federal é uma discussão sobre aquilo

que de fato caracteriza esse tipo de Esta-do. Como o Brasil é um Estado Federal, esse é um trabalho bastante interessante para entendermos a sua formação. Mas são livros bastante antigos.

Se fosse possível fazer alguma espé-cie de crítica a esse autor e a sua obra sobre Direito Administrativo, a única

que tenho é que se trata de um livro excessivamente profundo, por ser obra de um estudioso que possuía uma eru-dição muito grande e não aceitava tratar nenhum tema do Direito Administrati-vo pela rama, tinha de ser realmente aprofundado. É sabido e ressabido no Brasil que a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo teve uma in-luência muito marcante no país, e o meu homenageado é muito respeitado pelo trabalho que desenvolveu ali. Eu diria que o Oswaldo Aranha Bandeira de Mello fundou a escola de Direito Administrativo, uma linha que come-çou a ser implantada por ele, portanto, ele exerce até hoje uma forte inluência nessa área do direito. Direta ou indire-tamente, pelas suas obras ou por meio de mim, seu ilho, ele continua sendo ouvido em vários estados do Brasil. Certamente ele teve uma grande parti-cipação na formação do Direito Admi-nistrativo não autoritário, por ser muito respeitador dos direitos do cidadão. Essa é uma de suas marcas.

Ele foi o autor que me formou juri-dicamente e cuja inluência eu nunca deixei de sentir. Quanto mais passa o tempo, mais eu me aproximo de seu pensamento, apesar de nós não termos as mesmas bases ilosóico-jurídicas. Sua obra trouxe para mim, e acho que para muitos outros, uma percepção do Direi-to Administrativo sem a marca do auDirei-to- auto-ritarismo, uma visão muito preocupada com valores do bem-estar social, do bem comum, do interesse público, sem que isso signiicasse um amesquinhamento dos direitos dos cidadãos.

Formado em 1930 pela Faculdade de Direito da USP, Oswaldo Aranha Bandeira de Mello começou no ano seguinte a car-reira como promotor público na cidade de Pirassununga, a 270 km da capital paulista. Entre 1938 e 1956 dirigiu o Departamento Jurídico da Prefeitura de São Paulo, sendo o grande incentivador de sua biblioteca, com a aquisição de 2.733 volumes entre 1938 e 1940. Foi secretário dos Negócios Internos e Jurí-dicos de São Paulo entre 1946 e 1947. Em 1963 tornou-se o primeiro reitor lei-go da PUC-SP. No Tribunal de Justiça do Estado, foi desembargador entre 1956

e 1969. Falecido em 1980, suas obras continuam com elevado interesse. Além

de Princípios Gerais do Direito

Adminis-trativo, cujo primeiro volume, com 765

páginas, foi editado pela Malheiros em 2007, encontram-se a venda A Teoria das

Constituições Rígidas e da Licitação,

lan-çados pela Ed. José Bushatsky em 1980 e 1978, respectivamente. Obras como

Natureza Jurídica do Estado Federal (Ed.

Revista dos Tribunaes, 1937) ou Relação Jurídica entre o Estado e os seus

Ser-vidores (Prefeitura do Município de São

Paulo, 1945) podem ser encontradas em oferta em sites de livros raros.

ACI / PUC-SP

O homem e sua obra

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eu homenageado foi meu professor de Direito Administrativo, com quem estudei e muito aprendi: Oswaldo Aranha Bandeira de Mello. Durante muitos anos ele dirigiu o Departamento Jurídico da Prefeitura de São Paulo e foi um dos professores fundadores da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, foi reitor da PUC-SP, o pri-meiro reitor leigo que a universidade teve. Talvez o traço jurídico mais marcante da obra do professor Bandeira de Mello seja que ele era um homem de grande rigor cientíico e com ele eu aprendi isso.

Dentre as muitas qualidades que o professor tinha como cientista do Direito, uma era a sua erudição espantosa. Era já um homem de idade e continuava absolutamente atualizado. Não acontecia de eu ler um livro de Direito que ele já não tivesse lido e assinalado – ele costumava marcar todo o livro, anotando as passagens que considerava mais importantes. Tinha esse hábito. Entre alguns de seus atributos que me impressionavam muito estava a grande independência intelectual. Ele teve, ao longo da vida e em suas obras, a oportunidade de mani-festar pontos de vista originais. E o fez.

Aprendi com o professor Bandeira de Mello a não aceitar idéias, mesmo as que tinham trânsito corrente entre os juristas respeitados e respeitáveis, sem que elas passassem por um crivo, por um exame de racionalidade. Não era pela cir-cunstância de serem muito divulgadas nem por provirem de pessoas com elevada autoridade jurídica que essas idéias deveriam ser aceitas. Isso explica o fato de ele ter sido um autor com posições originais. Tudo examinava para ver se real-mente havia boas justiicativas lógicas, de maneira que isso se tornaria também

A INDEPENDÊNCIA INTELECTUAL

DE BANDEIRA DE MELLO

Um dos fundadores e primeiro reitor leigo da PUC de São Paulo, o jurista e desembargador do TJSP

Oswaldo Aranha Bandeira de Mello foi o criador dos estudos no campo do Direito Administrativo

Por Celso Antonio Bandeira de Mello

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