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Mídia e gênero: análise crítica da violência contra a mulher no telejornalismo

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL

MÍDIA E GÊNERO: análise crítica da violência contra a mulher no telejornalismo

MARIA DE FÁTIMA JERÔNIMO MARQUES

(2)

MARIA DE FÁTIMA JERÔNIMO MARQUES

MÍDIA E GÊNERO: análise crítica da violência contra a mulher no telejornalismo

Dissertação apresentada à Pós Graduação em Serviço

Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte

como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre

em Serviço Social.

Orientador (a): Profª. Drª. Eliana Costa Guerra

Área de concentração: Serviço Social, Cultura e Relações sociais

(3)
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(5)

Á Flávia (in memoriam), eternamente em meu coração.

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AGRADECIMENTOS

Há tanto e tantos/as a agradecer...

À minha mãe Socorro que mesmo nos momentos mais difíceis e angustiantes me

recebeu sempre com um sorriso acolhedor e terno. Por me fazer compreender que a

distância e a saudade não são limites intransponíveis, que podemos superar as

dores e as angústias cotidianas, mantendo a simplicidade e a doçura em tempos tão

adversos e difíceis. Por transmitir em seus olhos o enorme orgulho me ver realizar

sonhos pelos quais lutamos juntas.

Ao meu irmão Fábio, pelo amor, compreensão e apoio dedicados a mim durante

toda minha vida, sempre preocupado e disponível a me ajudar. Por me proporcionar

momentos de afeto e conforto;

À minha querida e amada vó D. Ana, exemplo de coragem, delicadeza e afeto.

Agradeço por todas as orações a mim dedicadas.

Aos/as meus/minhas amigos/as do mestrado, em especial a Juliana, Maria

Francisca e Nuara com as quais compartilhei angústias e sorrisos durante a jornada

acadêmica, a vocês meu amor, carinho e amizade;

Ao João Paulo, companheiro sempre, e também aqui. Por entender as ausências

necessárias nesse difícil processo de elaboração de dissertação e, mostrar-se

sempre disposto a me ajudar no que fosse preciso. Para ti meu imenso amor.

Aos/as queridos/as amigos/as de Residência Universitária de Pós Graduação, que

com sorrisos e conflitos construímos relações de afeto e amizade, seguirão para

sempre guardados na memória e no coração;

À Leidiane (carinhosamente, Leidy), amiga-irmã que a vida me presenteou e com a

qual compartilhei sonhos, perspectivas, dores e momentos inesquecíveis. O orgulho

e admiração que sinto por você crescem a cada dia.

(7)

expressões de solidariedade e carinho.

À linda e doce Elizângela pelas conversas encorajadoras, pela paciência de ler e

contribuir com esse trabalho. Pela colaboração imprescindível à finalização dessa

dissertação.

Aos/as amigos/as de vida e luta, que mesmo distante, estiveram presentes em mais

essa jornada, todo o meu carinho;

À professora Eliana Guerra, orientadora e amiga, que ao longo da minha vida

acadêmica me incentiva a trilhar novos caminhos e buscar novas conquistas.

Agradeço pelas orientações e comprometimento nesse intenso processo de

investigação e elaboração teórica. Pela confiança e incentivos nos momentos de

dificuldades e desencorajamento, a você meu respeito, carinho e imensa admiração;

Às professoras Telma Gurgel, Mione Sales pelas valiosas e substanciais

contribuições na banca de qualificação, muito obrigada;

À professora Silvana Mara pela delicadeza e leveza com que sempre me acolheu,

tanto graduação como no mestrado. Pelas valiosas contribuições na banca da

qualificação e pela disponibilidade em participar dessa banca de defesa.

À professora Marlene Teixeira por haver se disponibilizado participar dessa banca

de defesa. Certa que as valiosas contribuições e reflexões serão substanciais no

aprimoramento da dissertação.

À professora Severina Garcia que tão prontamente aceitou compor a banca de

defesa apesar dos muitos compromissos já firmados.

As professoras do Programa de Pós Graduação em Serviço Social, pela

socialização contínua de conhecimentos imprescindíveis à concretização desse

estudo acadêmico.

A CAPES pelo incentivo financeiro que me possibilitou a permanência a

(8)

RESUMO

Este trabalho constitui-se de um estudo teórico e empírico sobre o tratamento dado pela mídia, em particular, pelo telejornalismo à violência contra a mulher. Objetiva analisar e refletir sobre o papel da mídia, em particular, da televisão, no processo de reprodução do sistema patriarcal de gênero no âmbito da sociedade brasileira, a partir de conteúdos e narrativas jornalísticas sobre os crimes cometidos contra Andréia Rodrigues e Eliza Samúdio. Nesse sentido, a luz da perspectiva crítica, buscamos apreender as particularidades do sistema patriarcal enquanto sistema de dominação do homem sobre as mulheres e, ainda desvelar a participação dos veículos de comunicação tradicionais como espaços de perpetuação e manutenção da desigualdade entre homens e mulheres. Para apreender tal realidade, tivemos como direcionamento a teoria social crítica, ancorada no materialismo histórico-dialético, que nos possibilitou aproximarmos e apreendermos o fenômeno investigado inscrito numa realidade dinâmica e contraditória. A pesquisa teve abordagem qualitativa. Recorremos à literatura especializada da área, a partir de autores clássicos e contemporâneos. Realizou-se a análise de conteúdo das matérias catalogadas, e entrevistas com sujeitos envolvidos nas temáticas de gênero, e/ou comunicação. O exame crítico das matérias indicou que o telejornalismo é perpassado pelas contradições inerentes a vida social, significa que, afirma e reafirma a ideologia das classes dominantes, seus valores e concepções de mundo, mas também, expressa os conflitos e demandas sociais. O estudo revelou que, na televisão, prevalece a reprodução de estereótipos e de desigualdades de gênero, que marcam sobremaneira a vida das mulheres. Pudemos verificar que a violência contra a mulher obtém uma abordagem espetaculosa e sensacionalista sem aprofundamentos sobre as relações sociais que a determinam e fundamentam.

(9)

ABSTRACT

This thesis is consisted of a theoretical and empirical study about the treatment given by media, particularly on telejournalism, to violence against women. It aims to analyze and reflect about the role of media, particularly television, on the process of reproduction of patriarchy system of gender on the context of Brazilian society, from content and narrative news about crimes committed against Andreia Rodrigues and Eliza Samudio. In light of the critical perspective, we seek to apprehend the particularities of patriarchy as a system of domination and subjugation of women, and also reveal the involvement of traditional means of media on reproduction and maintenance of inequality between men and women. To apprehend that reality, we had as guidance a critical social theory, grounded in historical-dialectical materialism which enabled us to apprehend the phenomenon under investigation actually enrolled in a dynamic and contradictory reality. The research had qualitative approach. We appeal to the specialized literature of the area from classical and contemporary authors. We conducted a content analysis of categorized matters, and interviews with individuals involved in issues of gender and / or communication. The critical examination of the matters indicated that television journalism is permeated by the contradictions inherent in social life, means that states and restates the ideology of ruling classes, their values and worldviews, but also express conflicts and social demands. The study revealed that prevails on television playing stereotypes and gender inequalities. We could also see that violence against women gets a sensationalist overblown approach and with no insights on the social relations that determine and base it.

(10)

LISTA DE SIGLAS

CODIMM – Coordenadoria de Defesa dos Direitos das Mulheres e das Minorias

CONNAR – Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária

CONFECOM – Conferência Nacional de Comunicação

CFEMEA – Centro Feminista de Estudo e Assessoria

CFESS – Conselho Federal de Serviço Social

CRESS – Conselho Regional de Serviço Social

CRIS - Communication Rights in the Information Society - Comunicação na Sociedade da Informação

DEAM – Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher

EBC – Empresa Brasil de Comunicação

FNDC – Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

MST – Movimento dos Trabalhadores Sem Terra

ONG – Organização Não-Governamental

PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios

PNDH – Plano Nacional de Direitos Humanos

SOF – Sempreviva Organização Feminista

SBT – Sistema Brasileiro de Televisão

TIC – Tecnologia da Informação e Comunicação

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 - Simulação de trabalho investigativo – TJ1 ...100 FIGURA 2 – Reportagem sobre a investigação TJ1 ...100 FIGURA 3 – Eliza é levada do Rio para Minas Gerais – TJ4 ...105 FIGURA 4 – Eliza sofre agressão durante a viagem, ficam marcas de sangue no carro – TJ4 ...105 FIGURA 5 – Bruno chega ao sitio – TJ4 ...105 FIGURA 6 – Eliza é levada até seu algoz – TJ4 ...105 FIGURA 7 – Momento em que Marcos Aparecido amarra os braços de Eliza e a sufoca – TJ4...105 FIGURA 8 – Corpo de Eliza é esquartejado, posto em um saco preto e jogado aos cães – TJ4 ...105 FIGURA 9 – Eliza: imagem exibida duas vezes na reportagem exibida no TJ5...122

FIGURA 10 – Eliza: Imagem exibida duas vezes na reportagem do TJ5 e três vezes no TJ3 ...122

(12)

LISTA DE TABELAS E GRÁFICOS

TABELA 1 – Emissoras de tv controladas por grupos religiosos) ...49

TABELA 2 – Crimes de Ampla veiculação nos anos 1990...77

TABELA 3 – Tempo das reportagens caso 1 ...98

TABELA 4 - Tempo das reportagens caso 2 ...98

(13)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 15

2 CONTRADIÇÕES E PARTICULARIDADES DA COMUNICAÇÃO NO

CONTEXTO DO CAPITAL CONTEMPORANEO ... 27 2.1 A apropriação, uso e controle dos meios de comunicação: particularidades da realidade brasileira ... 28

2.1.1 L´enjeu: apropriação e produção da informação na reprodução da vida social ..

...28

2.1.2 As mulheres e a mídia tradicional: defesa da diversidade nos meios de comunicação ... 33

2.2 A informação nos tempos contemporâneos: mercantilização versus informação crítica ...38

2.2.1 A informação mercadoria: a sociedade capitalista e a mercantilização das dimensões da vida social ... 39

2.2.2 Privatização do público e a defesa da regulamentação e democratização da comunicação no Brasil ... 43

2.3 A televisão brasileira: avanços tecnológicos e a espetacularização vida social...52

2.3.1 “A TV é tão importante que de janela passou a paisagem”: centralidade da televisão no cotidiano social ... 52

2.3.2 Violência e espetacularização: elementos centrais nas telas de TV ... 57

3 A REPRODUÇÃO DA VIOLÊNCIA E DAS DESIGUALDADES DE GÊNERO NA MIDIA ... 63 3.1 Criminalização da questão social e expressões da violência: terreno contraditório e multifacetado ... .64

3.2 Exploração e ocultação das determinações da violência na mídia... 71

3.3 Violência contra a mulher: expressão da questão social forjada e mantida pelo patriarcado e pelo capital ... 78

(14)

forjadas na e pela mídia. ... 91

4.1.1 Casos emblemáticos da cobertura de situações de violência de gênero pelos telejornais ... 92

4.1.2 “A questão é que a realidade não pode ser escondida”: dramatização e espetacularização da violência ... 97

4.2 “A dor da gente não sai no jornal”: violência contra a mulher no noticiário televisivo... 108

4.2.1 “Quem nunca saiu na tapa com uma mulher?”: expressões de naturalização e banalização da violência. ... 109

4.3 Os Fios (in)visíveis do patriarcado nas narrativas televisivas e jornalísticas.117 4.3.1 Reprodução de desigualdades e estereótipos de gênero na/pela televisão..118

(15)

Quimeras Latentes

No mapa secreto das palavras

Elas vão contando suas histórias

Silenciosamente vão forjando primaveras livres

Estão em todos os lugares,

São milhões, milhares

E também são seculares,

Sobrevivem no sertão árido dos homens,

Sonham com novos outubros,

Reproduzem-se na selva amazônica do capital

São femininas, elementares

E, ainda sim, são plácidas,

Nascem das desigualdades

E, por toda vida lutam

Contra a violência da carência fatigada

Fustigada por sinistras cantilenas

Têm corpos desertos e desejos obsoletos

Vontades subalternizadas, passivas de novas lutas

Onde arrefecer está no campo das impossibilidades

Invisíveis vão tecendo no orvalho da manhã

Quimeras de límpidos horizontes

E, silenciosamente, transformam-se em

labaredas entreabertas numa encruzilhada

sem fim contra todo tipo de exploração

Andam de peito aberto e olhar aguerrido

Trazem nos olhos páginas avulsas em branco

Quem sabe, sonhando um dia escrever

igualdades e liberdades num mundo emancipado.

(16)

1. INTRODUÇÃO

Como afirma Freire (2009), a mídia se constitui um excelente campo a ser

analisado por nós pesquisadores e pesquisadoras. O registro diário das notícias nos

possibilita de forma contínua e sistemática uma série de informações sobre os

valores, ideologias, relações e práticas sociais que compõem a realidade. Com esse

entendimento, nos propomos percorrer os sinuosos caminhos da comunicação, seus

limites e possibilidades na função social que assume, articulando nesse debate a

discussão sobre gênero e violência contra a mulher.

É diante da chamada “midiatização” da vida social que nos dispomos a analisar o papel da mídia no processo de reprodução e perpetuação do sistema

patriarcal. Buscamos desvelar os mecanismos mobilizados na produção e difusão da

informação pela mass media1 em particular, pelos telejornais que contribuem na construção e reprodução da ideologia dominante, a qual reforça e sustenta as

desigualdades sociais e, em especial, as desigualdades de gênero.

Tomamos matérias veiculadas pelos telejornais sobre os crimes cometidos

contra Andréia Rodrigues (2007) e Eliza Samudio2 (2010) para, a partir das coberturas destes casos, analisar em uma perspectiva crítica, a atuação da mídia

televisiva na sedimentação de relações desiguais de gênero, considerando que

existe um padrão de comunicação inscrito em cada tempo histórico, com

particularidades inerentes a cada formação social.

O interesse pela problemática inicia-se na graduação em Serviço Social com

a participação em disciplinas, oficinas e cursos sobre a temática de gênero. Ainda

influenciou o interesse pela discussão em foco, a inserção, por ocasião do estágio

curricular, na Coordenadoria de Defesa dos Direitos das Mulheres e Minorias –

1

Mass media corresponde a um conjunto de técnicas de difusão de mensagens (culturais, informativas ou publicitárias) destinadas ao grande público, tais como a televisão, a rádio, a imprensa; meios de comunicação social. O termo é sinônimo de Mídia, sendo este mais utilizado no Brasil. Ao logo do trabalho utilizaremos as duas terminologias. Ver Sales (2009)

2

(17)

CODIMM. Posteriormente, estas experiências influenciaram a elaboração do

Trabalho de Conclusão de Curso/Monografia. Neste estudo, buscamos apreender as

relações desiguais de gênero expressas nos programas televisivos,

problematizando-os enquanto mecanismo de reprodução das relações desiguais

entre os gêneros.

Analisar a dinâmica da violência que se objetiva nos processos de produção e

reprodução da sociedade contemporânea mostra-se um grande desafio, haja vista, a

diversidade e complexidade que a envolve. Estamos diante de um tema atual que

se “reproduz e sofre metamorfoses sob condições objetivas marcadas pela sociedade burguesa, considerando as particularidades assentadas nos marcos da

sociedade brasileira” (SILVA, 2006, p. 32).

No Brasil, os índices de violência têm ganhado proporções alarmantes.

Segundo o Mapa da Violência 20113, entre 1998 e 2008, o número total de homicídios registrados passou de 41.950 para 50.113, representando incremento de

17,8%. A pesquisa aponta, ainda, que os jovens são os mais atingidos pela violência

no país. As causas externas são responsáveis por 73,6% das mortes, dentre as

quais os homicídios correspondem a 39,7%, para cada 100 mil jovens.

Ainda, o estudo evidencia que a violência contra a mulher continua em

crescimento em todo o país. Entre 1998 e 2008, 42 mil mulheres foram

assassinadas. As taxas anuais do período giram sempre entre 4,25 homicídios para

cada 100 mil mulheres. No período, em vários estados, principalmente do Nordeste4, a exemplo da Bahia, Maranhão, Rio Grande do Norte e Sergipe, o crescimento dos

homicídios femininos foi significativo. No Rio Grande do Norte, as cidades com maior

incidência de violência contra a mulher são: Mossoró (10,4%5), Parnamirim (5,4%), Açu (3,4%) e Natal (3,5%). A pesquisa revela igualmente que, no Brasil, 40% dos

crimes perpetrados contra as mulheres ocorreram na residência ou habitação das

mesmas.

3

Waiselfisz, Julio Jacobo. Mapa da Violência 2011. Os Jovens do Brasil. Brasília, Ministério da Justiça, Instituto Sangari, 2011.

4

A Bahia, 173%; Maranhão, 137%; Rio Grande do Norte, 154% e Sergipe, 110% (dados relativos ao aumento do índice assassinatos de mulheres em 10 anos). Caderno Complementar 2/Mapa da Violência 2011.

5

(18)

Esses dados revelam a crescente degradação da vida humana na sociedade

capitalista, condicionada dentre outros fatores, pelo agravamento da questão social

e das desigualdades sociais. O agravamento e a complexidade que assume a

questão da violência nas cidades e no campo e, em particular, as expressões da

violência contra mulheres, nos instigam a questionar a naturalização destes

fenômenos, muitas vezes, tomados como ação isolada e pontual, circunscrito á

esfera individual.

Os elevados índices de violência fazem com que o fenômeno esteja sempre

presente nos meios de comunicação, especialmente nos noticiários televisivos. Os

episódios mais chocantes constituem motivo de variadas reportagens tendo em vista

a capacidade de atrair a atenção do telespectador. Outros, por sua vez, são

simplesmente invisibilizados. Todavia, de forma majoritária, a mídia tende a

naturalizar e banalizar o fenômeno, ora situando-o geograficamente (típico das

periferias, de determinados segmentos da classe trabalhadora), ora subjetivando-a

(atos insanos, loucos).

No âmbito da sociedade brasileira os meios de comunicação, em especial a

televisão, se destacam pela centralidade na vida cotidiana. Segundo dados do IBGE

em 2009, 95,7% dos lares tinham pelo menos um aparelho de televisão (IBGE,

PNAD, 2009). Em 2010 a pesquisa Hábitos de Informação e Formação da

População Brasileira, verificou que 94% da população costumam assistir televisão, e

a maioria assiste TV aberta (77%)°(BRASIL, 2010).

Assim, entendendo a centralidade e o poder de alcance da mídia na

sociedade, nos inquietamos com a prevalência de discursos psicologizantes ou de

culpabilização da vítima nas abordagens sobre a violência contra a mulher ainda. A

reprodução de discursos ancorados no prisma da ideologia patriarcal naturalizam

formas de opressão historicamente construídas. Contudo, assim como a realidade

social, os veículos de comunicação são contraditórios e, portanto, podem possibilitar

tanto avanços no enfrentamento da violência, como retrocessos.

A complexidade atual na qual se gesta a formação societária promove uma

pluralidade de fatores de manutenção e perpetuação das relações patriarcais. Ora, o

patriarcado engendra-se no tecido social, circunscrito nos meios de produção e de

(19)

sociedade, no conjunto das relações sociais, espraiando suas hierarquias e relações

de poder em todos os espaços de sociabilidade.

Nesse sentido, o sistema ideológico patriarcal encontra nos veículos de

comunicação tradicionais, espaços propícios à sua perpetuação. Historicamente, o

sistema de comunicação brasileiro tem cumprido a função de reprodutor da ideologia

das classes dominantes. Assim, a mesma orientação é reiterada em seus produtos;

implícita e explicitamente, aparece nas relações de dominação, que afirmam o poder

dos homens sobre o corpo e a vida das mulheres.

Deste modo, as relações de gênero, construídas no decorrer do processo

histórico e social, forjadas nas diferenças observadas nos sexos são

sistematicamente, naturalizadas pelos diversos espaços sociais, dentre eles, os

canais televisivos. Ademais, o conjunto das relações sociais é condicionado pelos

processos de produção e reprodução da vida social. Deste modo, as dimensões

culturais, políticas e ideológicas estão submetidas à lógica do modo de produção em

curso.

De acordo com Saffioti (1987), a desigualdade entre homens e mulheres é

construída e naturalizada pela sociedade em distintos momentos históricos através

de variados papeis designados para as categorias de sexo. A situação de

subordinação das mulheres resulta de um longo processo histórico permeado por

determinações econômicas, religiosas, culturais e políticas. Ao longo do

desenvolvimento das sociedades, estes fatores possibilitaram a consolidação da

dominação masculina como um sistema que, embora passe por alterações,

mantém-se premantém-sente nas relações sociais (MOREIRA, et all, 2006).

Do ponto de vista teórico-metodológico as categorias gênero e patriarcado

são centrais na apreensão crítica do objeto de estudo. Com efeito, as categorias

gênero e patriarcado, inscritas em relações de classe são, pois, complementares na

compreensão das relações sociais entre homens e mulheres, como também nas

relações entre mulheres e mulheres, homens e homens. Elas nos ajudam a

apreender como são objetivadas as desigualdades e as diversas manifestações de

violência, que caracterizam as relações sociais, em particular, nas modernas

sociedades capitalistas, as quais marcam, sobremaneira, a vida das mulheres.

(20)

[...] constituem-se em possibilidades reflexivas sobre a condição das mulheres e ao mesmo tempo, possibilidades para a construção de uma história que seja capaz de enfrentas os preconceitos derivados destas questões.

Assim, observando a complexidade da problemática, buscamos particularizar

nosso objeto de estudo em um dos mecanismos que entendemos ser na atualidade

um espaço de divulgação, disseminação e legitimação de valores e ideias que

sustentam a estrutura societária vigente e, em particular, contribuem para a

reprodução da condição de submissão das mulheres, das situações de opressão e,

a naturalização das variadas expressões de violência.

Analisamos especificamente dois casos, não somente pela amplitude e

comoção social, mas, sobretudo pela forma espetaculosa com que foram tratados

pelos veículos de comunicação. Entendemos estes casos como particularidade da

totalidade social na qual se encontram inseridos. Assim, as características e

elementos presentes e mobilizados nos mesmos revelam dimensões da dinâmica

mais geral de nossa sociedade, no tempo histórico em análise.

Durante dias e dias, em diversos programas e, principalmente no noticiário

jornalístico, reportagens sobre a violência sofrida por mulheres são difundidas sem

conter elementos que esclareçam e possibilitem aos telespectadores uma

compreensão mais ampla dos casos tratados. Em geral, repetem-se informações,

imagens e são articulados elementos que findam por levar a conclusões apressadas

ou enviesadas sobre as matérias em pauta. Nesse sentido, se por um lado, a

veiculação dos crimes dá visibilidade às expressões de violência e a situação de

opressão vivenciada por tantas Elizas e Andréias, por outro, constatamos que não

esta não permite uma reflexão aprofundada sobre determinantes das expressões de

violência abordadas.

De acordo com Queiroz (2008), no senso comum, a violência é entendida

como o uso agressivo da força física. Contudo, afirma a autora (op. cit. p. 20), “[...] a violência não se limita ao uso da força física, mas a possibilidade ou ameaça de

usá-la [...] constitui a dimensão de sua natureza”. Assim, associa-se intrinsecamente a

ideia de poder, ao ressaltar a “possibilidade de imposição de vontade, desejo ou

projeto de um ator sobre o outro”. Para a autora

(21)

fazer algo que não está com vontade; é constranger, é tolher a liberdade, é incomodar, é impedir a outra pessoa de manifestar seu desejo e sua vontade, sob a pena de viver gravemente ameaçada ou até mesmo ser espancada, lesionada ou morta, enfim, é uma violação dos direitos essenciais do ser humano (QUEIROZ, 2008, p. 20).

Os estudos de violência contra as mulheres já somam mais de três décadas

no Brasil. Segundo Passinato (2006), o debate sobre violência contra a mulher

ganha relevância na década de 1970, momento em que ocorrem denúncias de

crimes passionais e da impunidade penal. Aos poucos, o tema ganha destaque e

passa “[...] a representar bandeira de luta do movimento de mulheres brasileiro”.

Nos anos 1980, amplia-se o debate político, e ao mesmo tempo, crescem as

mobilizações e denúncias de agressões e maus tratos nas relações conjugais.

Essas lutas são propulsoras da criação dos serviços de atendimento às mulheres

em situação de violência6 (PASSINATO, 2006; QUEIROZ, 2008). Passinato (2006,

p. 131) enfatiza, que “[...] o fenômeno da violência contra as mulheres foi sendo construído [politicamente] ao mesmo tempo em que era denunciado pelo Movimento

Feminista”.

Entendemos a violência cometida contra a mulher enquanto expressão das

relações desiguais de gênero que, associadas às desigualdades de classe e etnia

estruturam as relações sociais entre homens e mulheres. É ainda apreendida como

uma relação de poder, de dominação do homem e de submissão da mulher.

Evidencia que os papeis impostos às mulheres e homens, consolidados e

reforçados, ao longo do processo histórico pela ideologia patriarcal, criam condições

para as relações violentas entre os gêneros, as quase se constituem relações

baseadas na dominação e na exploração. Nessa perspectiva, a violência perpetrada

contra as mulheres não se reproduz como um processo natural, mas enquanto parte

constitutiva da socialização dos sujeitos.

A partir desse entendimento, podemos afirmar, que a violência cometida

contra Eliza e Andréia, que vitimiza centenas de mulheres no Brasil, tem constituição

histórica, sofrendo modificações nas variadas conjunturas. A historicização da

violência nos possibilita apreendê-la enquanto complexo elaborado no processo de

6

(22)

formação de sociabilidades e, portanto, passível de desconstrução. Trata-se de um

fenômeno que, embora não tenha sido gerado pela sociedade capitalista, encontra

no terreno da sociabilidade do capital condição concreta à reprodução e

perpetuação (SANTOS, 2010).

Pensar a relação entre as categorias, mídia, gênero e violência a partir da

perspectiva de totalidade requer desvendar suas contradições, antagonismos e

identificar a multiplicidade de significados que adquirem na realidade social. Fazê-lo,

significa evidenciar o conjunto das relações que os envolvem contrapondo-se a

análises particularistas e fragmentadas da realidade.

Nessa dissertação pretendemos analisar o desenvolvimento dos veículos de

comunicação, em especial da televisão, e a relação no processo de disseminação

da ideologia burguesa, mais precisamente, sua participação na reprodução das

relações desiguais entre homens e mulheres sob a lógica do sistema patriarcal.

Buscamos identificar os aspectos culturais, políticos e econômicos presentes

na produção jornalística, os quais, majoritariamente tendem a culpabilizar a mulher

pela situação de violência por ela vivenciada e/ou atribui ao agressor, distúrbios

psicológicos, contribuindo deste modo, para a ocultação dos aspectos históricos,

sociais, econômicos e culturais determinantes das diversas expressões de violência

vivenciada pelas mulheres.

No âmbito do Serviço Social o debate sobre comunicação vem se

aprofundando desde a década de 1990 culminando com a Política de Comunicação

do conjunto CFESS/CRESS elaborada em 2001. Nessa perspectiva acreditamos

que para o conjunto da categoria, o debate político sobre a temática abordada é

bastante profícuo. Ainda, enquanto expressão da questão social, a violência contra a

mulher se constitui objeto de análises e de constantes intervenções no exercício

profissional do Assistente Social. Dessa forma, aprofundar tais categorias significa:

imbuir à categoria profissional de conhecimentos para a apreensão da reprodução

das relações sociais e, portanto, a desnaturalização das desigualdades.

Nesse sentido, para que possamos percorrer tal caminho sem incorrer em

equívocos importa-nos desvelar as contradições constitutivas do nosso objeto de

estudo. Assim poderemos apreender o universal que incide nas particularidades da

(23)

identificar os encadeamentos recíprocos no jogo das relações estabelecidas pelos

veículos de comunicação no enfrentamento ou, ao contrário, na reprodução acrítica

das desigualdades determinantes da violência vivenciada pelas mulheres.

Mediante a complexidade da realidade, investigar e analisar processos sociais

não se constitui uma tarefa fácil. No movimento do real a mídia contribui na

disseminação de valores, ideologias e práticas sociais que permitem “sustentar e avalizar a lógica do grande capital”, fortalecendo o conformismo e a passividade

diante das “transformações societárias em curso” (SIMIONATO, 2003, p. 273), mas numa lógica inversa também possibilita a veiculação de informações e a interação

de grupos e indivíduos em um contexto assolado pelo individualismo.

Como afirma Minayo (1993, p. 23), a pesquisa constitui uma “atividade básica das ciências na sua indagação e descoberta da realidade. É uma atitude e uma

prática teórica de constante busca que define um processo intrinsecamente

inacabado e permanente”. Destaca-se ainda, como atividade que propõe uma

“aproximação sucessiva da realidade que nunca se esgota” (ibidem). Trata-se, portanto de um processo de aproximações sucessivas mediante o qual nos

debruçamos sobre o fenômeno em análise para desvelarmos os determinantes e

suas particularidades materializadas.

Assim, por compreender não apenas a complexidade da temática proposta,

mas, sobretudo sua natureza histórica e as dimensões econômica, cultural e política

que a envolve, desenvolvemos nossa pesquisa a luz perspectiva crítica-dialética.

Consideramos que tal perspectiva nos possibilita analisar a realidade social

identificando como nela se estruturam as relações entre homens e mulheres;

permite-nos apreender contradições e antagonismos presentes na sociabilidade

capitalista, seus rebatimentos sobre a mídia e, em particular, sobre a televisão e,

como este tipo de mídia participa da construção ideológica que sedimenta e contribui

para a reprodução de tais contradições.

Os procedimentos metodológicos compreendem pesquisa bibliográfica,

entrevistas e análise das matérias arquivadas em meio digital e catalogadas. Como

fonte secundária, utilizamos matérias relacionados aos dois casos divulgadas por

(24)

divulgados em sítios da internet e armazenados em nossos arquivos. Porém, o

nosso foco de análise são as reportagens cujos conteúdos referem-se à morte de

Andréia Rodrigues e ao desaparecimento de Eliza Samudio – imagens e depoimentos, análises, e interpretações dos episódios pelos sujeitos arrolados nas

notícias.

As matérias sobre a morte de Andréia foram cedidas por uma emissora local

(oito matérias) e, posteriormente, transcritas e analisadas. Obtivemos as notícias

que tratam do desparecimento de Eliza de seis telejornais distintos disponíveis em

sítios da internet (globo.com, youtube.com, R7.com). Algumas dificuldades se

interpuseram nesse processo, dentre elas, destacamos: a) disponibilização das

reportagens pelas emissoras locais, ocasionando atrasos em nosso processo de

pesquisa. Apenas uma emissora nos concedeu as reportagens; nas mesmas, foram

cortados os enunciados dos apresentadores, elemento a nosso ver importante nas

análises, b) obtenção de reportagens na integra disponíveis na internet, sem cortes

que comprometessem as análises. Estas dificuldades nos levaram a rever várias

vezes cada matéria, a confrontar cada uma com um conjunto de informações obtidas

em outras matérias ou em sítios. Os vídeos obtidos foram visualizados

sistematicamente para seleção daquele que nos pareceu mais completo, portanto,

sem cortes, passíveis de comprometer nossa investigação. No caso das reportagens

cedidas pela emissora local, procedemos à análise dos conteúdos, desconsiderando

os enunciados do apresentador.

A pesquisa bibliográfica esteve presente em todo o percurso da pesquisa,

possibilitando o “desvelar do objeto”. A leitura sistemática de pesquisas e textos

teórico-metodológicos revelou-se imprescindível para esclarecer categorias e

conceitos, além de fornecer instrumental teórico-metodógico para processo de

investigação e nos guiar nas aproximações sucessivas com relação ao nosso objeto

de estudo. Permitiu-nos ainda o gradativo e processual distanciamento com relação

à dimensão fenomênica e identificar os diversos elementos que envolvem o objeto

estudado.

As entrevistas (semi-diretivas) foram utilizadas para ampliar e aprofundar o

conhecimento sobre o tema pesquisado, a partir de questões previamente

(25)

sido elucidadas através do material bibliográfico e das análises por nós realizadas.

Entrevistamos sujeitos efetivamente inseridos nos processos analisados, envolvidos

nas questões investigadas: um jornalista, um militante da área da comunicação e

duas feministas. As entrevistas semi-estruturadas foram, portanto conduzidas com

base em uma estrutura flexível a partir de questões abertas relacionadas à temática

pesquisada. Os sujeitos das entrevistas são identificados com pseudônimos

escolhidos dentre títulos de jornais de esquerda e de jornais feministas (Pasquim7, Versus8, Mulherio9 e Nosoutras10).

Os seguintes eixos de investigação conduziram as entrevistas realizadas: a

importância da comunicação e da televisão para a sociedade contemporânea; o

crescimento da quantidade de reportagens relacionadas à violência, apresentado

dimensões do sensacionalismo; as relações desiguais entre homens e mulheres na

sociedade e sua reprodução pela mídia; violência cometida contra as mulheres e a

repercussão do fenômeno nos telejornais.

A análise das matérias pautou-se em alguns aspectos previamente escolhidos

que, direcionaram nossa apreensão do conteúdo explicito e implícito das notícias

catalogadas: imagens veiculadas nas matérias, evidenciando a forma espetaculosa

com a qual foram tratados os episódios selecionados; termos recorrentes nas falas

dos sujeitos envolvidos; análises e interpretações que indicavam formas ideológicas

do sistema patriarcal, reprodução do machismo e sexismo; declarações sobre a

violência contra a mulher e a condição da mulher na sociedade.

Dentre os veículos de comunicação, escolhemos a televisão dada à

importância que adquire no cotidiano social11. Particularizamos no gênero telejornalístico, tendo em vista que não raras vezes, é caracterizado por sua

confiabilidade, seriedade e neutralidade no tratamento e transmissão de

7

Pasquim jornal semanal veiculado de1969 a 1991, reconhecido por seu papel de oposição ao regime militar.

8

Versus jornal alternativo cultural em circulação entre 1975 e 1979 com tiragens de até 35 mil exemplares.

9

Mulherio, um dos periódico feminista da época. Circulou de 1981 a 1987, com até 12 mil tiragens por mês.

10

Nosotras, periódico Feminista editado de 1974 a 1976. A proposta era discutir a condição da mulher e aprofundar a consciência de gênero de suas integrantes.

11

(26)

informações.

Historicamente, os jornais têm tido a função social de veicular informação

sobre os acontecimentos sociais, culturais, políticos e econômicos de nossa

sociedade. Diversos segmentos sociais utilizam jornais, folhetins, rádios como

instrumentos estratégicos para propiciar, ao conjunto da sociedade, informações

relacionadas aos processos sociais que os envolvem. Nos últimos anos, as

mudanças ocorridas nos marcos dos processos de mundialização do capital, com

destaque para o crescimento dos fluxos de capitais, mercadorias e de pessoas,

concorreram para valorizar ainda mais as notícias e reforçar seu caráter mercantil.

Ademais, nas sociedades marcadas pela mercantilização de todas as dimensões da

vida social, a exemplo das modernas sociedades capitalistas, a informação constitui

matéria de consumo por excelência. Ora, para torná-la matéria de consumo é

preciso torná-la atrativa, envolvê-la em narrativas dramáticas com forte apelo

emocional (indignação, comoção, euforia, passividade).

Considerando nosso foco de interesse – as expressões de violência contra mulheres tratadas pela mídia, em particular pelos telejornais -, tivemos que adentrar

o universo das comunicações para entender sua gênese e desenvolvimento no

contexto histórico brasileiro. Esse movimento foi necessário para apreendermos os

elementos universais que conformam os processos comunicacionais, e suas

incidências sobre a construção das agendas telejornalísticas.

Analisando a transmissão de notícias sobre violência contra a mulher nos

preocupamos em identificar os interesses implícitos e explícitos naquelas notícias,

os fundamentos e aportes ideológicos que permeiam sua veiculação. Preocupa-nos

especialmente, os elementos contidos nas narrativas e as imagens que reforçam e

banalizam a opressão-exploração vivenciada pelas mulheres.

O trabalho ora apresentado compreende uma introdução, três seções

intrinsecamente articuladas, considerações finais, referências e anexos. O projeto de

pesquisa obteve assentimento do Comitê de Ética da Universidade Federal do Rio

Grande do Norte (Protocolo n. 100)

Na primeira seção que constitui a introdução, situamos de forma sucinta

nosso objeto de estudo, assim como a vertente teórico-metodológica na qual a

(27)

aprofundar nossos estudos sobre o tema, sua relevância social e acadêmica

(Serviço Social) e o percurso metodológico que nos permitiu alcançar alguns

resultados expostos nas considerações finais.

Na segunda seção discorremos sobre a comunicação e a formação de

conglomerados de midiáticos a partir da fase monopólica do sistema capitalista.

Discutimos o papel da televisão, suas principais particularidades no contexto de

contradições e ampliações dos antagonismos e desigualdades na sociedade

brasileira. Em seguida, tratamos do debate sobre democratização da comunicação e

as formas alternativas de comunicação, dentre as quais a feminista na perspectiva

de apreender processos contraditórios que marcam os sistemas de comunicação no

nosso país.

Na terceira seção, prosseguimos o debate sobre comunicação,

problematizando, a rotineira criminalização da questão social e das expressões da

violência no telejornalismo brasileiro. Abordamos, sucintamente, a discussão sobre a

questão social e suas manifestações na sociedade brasileira, dentre as quais,

enfatizamos a violência contra a mulher. Em seguida, realizamos uma explanação

conceitual sobre relações sociais de gênero e patriarcado na perspectiva apreender

os aspectos que sustentam e mantém as relações desiguais entre homens e

mulheres na sociedade contemporânea, na sua particularidade brasileira.

Na quarta seção problematizamos o tratamento dado pelos telejornais à

violência contra a mulher; sua participação na reprodução de estereótipos e

preconceitos sobre as mulheres e, para a manutenção e perpetuação do sistema

patriarcal. Apresentamos as análises das matérias catalogadas, sobre a

naturalização e banalização da violência nos veículos de comunicação e

identificamos das expressões patriarcais de gênero nos conteúdos e narrativas

jornalísticas ao se referirem à violência contra a mulher.

Nas considerações finais, retomamos as principais questões identificadas a

partir das análises das matérias selecionadas, enfocando o papel da mídia, em

particular da televisão, na construção de percepções e apreensões sobre as mais

(28)
(29)

2.1 A APROPRIAÇÃO, USO E CONTROLE DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO: PARTICULARIDADES DA REALIDADE BRASILEIRA

Tomando a sociedade capitalista como totalidade em seu movimento

contraditório de reprodução, entendemos que a mídia desempenha papel de

destaque. Enquanto particularidade desta totalidade, ela expressa as contradições

que marcam cada tempo histórico e, ao mesmo tempo, é perpassada por estas

contradições.

Analisar as formas de apropriação uso e controle dos meios de comunicação

no contexto da sociedade brasileira implica considerar a dimensão da luta de

classes, a disputa de projetos políticos e societários, seus determinantes e

implicações nos processos de construção e veiculação de notícias, na formação das

empresas de comunicação, assim como nas expressões de disputa de hegemonia

da classe trabalhadora.

Deteremo-nos na análise da conformação do sistema de mídia brasileira,

objetivando fornecer elementos subsidiários à apreensão de sua constituição,

desenvolvimento, e ainda, as contradições que perpassam os processos

comunicacionais no âmbito da sociedade brasileira, haja vista o destaque e

centralidade que têm no dia a dia de seus/suas espectadores/as, leitores/as.

Assim, ao longo do texto delinearemos mais precisamente nosso objeto,

inscrevendo-o em um contexto socioeconômico e político mais amplo do capitalismo,

considerando a particular inserção do Brasil neste contexto.

2.1.1 L´enjeu: apropriação e produção da informação na reprodução da vida social

Para discutir a temática em foco, pareceu-nos necessário problematizar a

comunicação a partir de sua constituição histórica, especificamente, sua expansão

no contexto de desenvolvimento do capitalista (era dos monopólios) e do

desenvolvimento da indústria cultural12. Esses dois elementos revelam-se

12

(30)

imprescindíveis para apreendermos o desenvolvimento do modelo midiático

brasileiro, sobretudo, suas configurações no momento histórico atual.

Em tempos de crise estrutural e de mundialização do capital, a mídia expressa através de seus diferentes espaços/instrumentos de comunicação, a luta

de classe e as disputas por hegemonia no seio da sociedade. Como destaca Fontes

(2010, p.14), nesse terreno contraditório, as lutas de classes também “sofrem

inflexões”, contudo, permanece o fundamento primário do capitalismo que “opõe a

concentração da propriedade à socialização expandida e internacionalizada da

produção”.

Assim, a face “bárbara” do capitalismo é senão elemento necessário para sua

manutenção e continuidade. Contraditoriamente, o capitalismo mantém forças

produtivas arcaicas e ultrapassadas; as misérias herdadas, são incorporadas às

misérias modernas, promovem a desigualdade social, exploração, opressão e a

mercantilização em todas as esferas da vida social.

No sentido de frear e amenizar os processos reivindicativos dos grupos

subalternizados, o capitalismo atualiza e/ou reedita valores, regras de

comportamento, formas de ver e estar no mundo. Dimensões que atuam na

redefinição das correlações de forças entre as classes. Assim, segundo Simionatto

(2003, p. 276), as novas configurações das relações sociais, não se referem apenas

à criação de uma nova forma de organização do trabalho e do capital, mas também

à formação de novos pactos e consensos entre capitalistas e trabalhadores, já que o

controle do capital não incide somente na extração da mais-valia, mas implica,

ainda, no consentimento e a adesão das classes à nova ideologia.

Decerto, as formas de organização do capital e as estratégias de

fortalecimento de seu projeto hegemônico são múltiplas e multifacetadas. Assim, o

conjunto das transformações econômicas e sociais ocorridas do final no século XIX

e durante o século XX promoveram “novas formas de organização do capital, do trabalho e do Estado” (SIMIONATTO, 2003, p. 277). Contribuem para isso, os avanços tecnológicos nas áreas da microeletrônica e informática, que permitiram

tanto o aumento da exploração do trabalho, quanto à elaboração de meios de

comunicação altamente sofisticados.

(31)

sociabilidade capitalista. Os meios de comunicação, sob o comando das classes

dominantes, têm contribuído para a promoção do consenso e do controle da classe

trabalhadora. São responsáveis pela disseminação do arcabouço ideológico que

procura universalizar interesses particularistas, em nome de conceitos supostamente

universais. Dessa forma, os mass media exercem papel relevante na manutenção de consensos e de controle voltado, notadamente, para pobres, negros, jovens e

ainda sobre as mulheres.

Como salienta Moraes (2010, p. 94), a manutenção de uma concepção

dominante implica em assegurar unidade ideológica para todo um grupo social.

Assim, “do ponto de vista das corporações midiáticas, trata-se de regular a opinião através de critérios de agendamento de temas que merecem ênfase, esvaziamento

ou extinção”; temas que recebem igualmente determinados tipos de tratamento, de

abordagem. Assim, as mídias buscam veicular conteúdos que contribuam para

unificar e organizar uma consciência coletiva a partir de valores e princípios

estabelecidos pelas classes dominantes. Formar opinião é, sobretudo, uma

intervenção ideológica, diretamente ligada à hegemonia política. Tais aspectos nos

parecem centrais na problemática em tela.

Quando falamos em hegemonia13, estamos nos referindo à capacidade de uma classe ou conjunto de classes articular dimensões (política, ideológica e

cultural) que permitam dirigir moral, cultural e economicamente a sociedade. Para

Moraes (2010), um grupo hegemônico não é aquele que detém o poder econômico,

mas aquele que além das bases econômicas congrega percepções e juízos de valor

“aceitos” por todos ou pela maioria. Segundo Gruppi (1978)

Para Gramsci uma classe é hegemônica, dirigente e dominante, até o momento que consegue manter articulado um grupo de forças heterogêneas, consegue impedir que o contraste existente entre tais forças exploda, provocando assim uma crise na ideologia dominante14.

Trata-se, portanto da capacidade de elaborar uma concepção de mundo que

guie o senso comum e estabeleça uma aparente harmonia entre as classes. Mas,

apenas na aparência, pois enquanto perdurarem contradições originadas no

13

Cf Gruppi, 1978; Gramsci, 2002 14

(32)

antagonismo capital/trabalho sempre haverá rebeliões, movimentos reivindicatórios,

mesmo que estes sejam seguidos de momentos de passividade e retrocessos.

Tendo em vista a inserção dos meios de comunicação na vida cotidiana dos

sujeitos sociais, na condição de transmissores de informação e de formadores de

opinião, estimamos indispensável analisar o protagonismo que desempenham na

formação da consciência coletiva. Tal análise implica em desvelar as formas de

convencimento, visões de mundo, formas de ser coletivas e os valores implícitos no

processo de construção e de difusão da informação. Como ressalta Moraes,

[...] A referência de valores e modos de ser e pensar tem a ver com o fato de que é no domínio da comunicação que se esculpem os contornos da ordem hegemônica, seus tentáculos ideológicos, suas hierarquias, suas expansões contínuas no bojo da mercantilização generalizada dos bens simbólicos (2010, p. 94).

A lógica mercantil que perpassa a comunicação no nosso país limita a

capacidade da população ao acesso à informação crítica sobre a realidade. A forma

fragmentada, manipulatória e espetacular com que as notícias são tratadas,

minimizam os elementos de análise que permitam à população ver para além da

imagem reproduzida, ou da fala anunciada. Conforme Abramo (1988), a imprensa

tende a induzir a outra realidade, embora as notícias enunciadas tenham relação

com a realidade concreta e, por essa razão exponha mesmo que sutilmente, as

contradições da realidade social.

Vivenciamos um tempo histórico onde os meios de comunicação assumem

lugar de destaque na vida cotidiana. Está nos lares, trabalho, lazer... Inscrevem-se

como fonte de formação e de informação dos indivíduos; através destes, a maioria

das pessoas se informa dos acontecimentos do país. Conforme Salles (2008) é

preocupante a dimensão da televisão no cotidiano dos sujeitos sociais, constituindo

fonte quase exclusiva de informação em um país onde 20,3%15 da população, não conseguem entender o que lê. Destaca o autor,

15

Segundo dados do PNAD, a taxa de analfabetismo funcional (percentual de pessoas de 15 anos ou mais de idade com menos de quatro anos de estudo) vem diminuindo entre 2004 e 2009, mas ainda mantém índices elevados. O Nordeste é a região com maior índice de analfabetos na população maior de 15 anos, embora venha reduzindo os índices os percentuais de 2004 a 2009(IBGE, PNAD,

2009). Disponível em

(33)

[...] a televisão e o rádio ganham ainda mais poder, já que para transmitir suas mensagens não dependem que o público seja alfabetizado. Esta característica da mídia de massa poderia ser um dado positivo, já que no Brasil os veículos de radiodifusão são concessões públicas e, portanto, deveriam ser controlados pelo povo brasileiro – e em seu benefício (SALLES, 2008, p. 53).

À medida que os media ditam costumes, criam novas necessidades de consumo, influenciam nos rumos políticos das sociedades, enfim, afirmam-se como

necessários ao desenvolvimento da sociabilidade e não raras vezes, se constituem

instrumentos de negação de valores humanos genéricos como o respeito às

diversidades étnicas, sociais, sexuais e de gênero (RUIZ, 2009). Contraditoriamente,

em um movimento oposto, os veículos de comunicação independentes constituem

alternativas às grandes corporações e a suas pautas. As rádios comunitárias figuram

como bons exemplos de resistência à comunicação empresarial, mesmo sofrendo a

repressão do poder público e a falta de recursos tecnológicos e

financeiros (VELOSO, 2005).

Apesar das dificuldades encontradas pela comunicação alternativa, é inegável

a importância que tais veículos têm para a disputa de ideias no seio da sociedade.

No Manifesto Comunista, Marx e Engels (1998) já afirmavam o valor dos veículos de

comunicação para a socialização de informações entre grupos sociais. Segundo os

autores, em dado momento, a união crescente dos trabalhadores em torno de lutas

coletivas foi facilitada pelos meios de comunicação, permitindo o contato entre os

trabalhadores de localidades distintas. Panfletos, jornais, folhetins destacam-se

como exemplos de veículos comumente utilizados por se diversos segmentos para

veicular ideias, valores e projetos políticos.

Ressaltando a relevância da comunicação, Gramsci (2007, p. 67) afirma que,

o surgimento da imprensa escrita provocou uma revolução “[...] no mundo da cultura,

dando a memória um subsídio de valor inestimável”. A imprensa possibilitou a

socialização da produção intelectual e cultural até então transmitida através da

linguagem falada. Para a humanidade significou ganho inestimável.

Todavia na sociedade capitalista parte da imprensa escrita e dos meios

visuais de comunicação está sob o comando de poucos grupos empresariais. Como

estes detêm o poder econômico e ideocultural, se sobrepõem aos movimentos

(34)

histórica abre a possibilidade da construção de uma vontade coletiva, ou seja, de um

projeto transformador da sociedade, “apesar do instrumento organizativo oferecido

pelos excepcionais meios de comunicação postos em funcionamento pelo sistema

do capital, enfatizar a negação [...] de novas formas de luta política comum”

(SANTUCCI, 2003, p. 254-255).

Podemos aqui fazer duas observações: inicialmente, pensar os veículos de

comunicação sob as bases da sociabilidade do capital nos remete a própria

formação destes, ou seja, implica entender que não surgem do nada, não são

autônomos, são elaborados e desenvolvidos sob condições concretas segundo a

direção ideológica de uma classe (burguesa). No Brasil, diferentemente de outros

países, os meios de comunicação “já nasceram privatizados”, fortemente ligados às elites políticas de cada região e, assim, seguem até os dias atuais (SALES, 2007,

p. 99). A segunda é que os meios de comunicação não são homogêneos. Mesmo

que as instituições midiáticas sejam comandadas por grupos empresarias, também

são compostas por profissionais com visões distintas e por vezes divergentes. Tais

instituições situam-se, portanto, em terreno contraditório, respondem à lógica

mercadológica e por vezes, demandas e anseios da sociedade. Diferentemente da

compreensão amplamente presente no senso comum não trazem a marca da

“neutralidade” ou da “objetividade” nem mesmo nos seus programas informativos

ou nos noticiários.

Essas análises preliminares nos permitiram refletir sobre a orientação

ideológica que perpassa a constituição dos grandes grupos de comunicação e,

comandam as empresas midiáticas numa totalidade dinâmica e contraditória

permeada por valores e concepções antagônicas. Passamos, então, a trilhar os

caminhos da crítica feminista à comunicação de massa, além de apontar alguns

exemplos da mídia alternativa feminista construída no seio do movimento para

pensar estratégias de inserção e interação com a mídia tradicional.

2.1.2 As mulheres e a mídia tradicional: defesa da diversidade nos meios de comunicação

(35)

movimento feminista sobre a comunicação buscando evidenciar o modo como o

movimento tem se apropriado desse mecanismo para socializar ao conjunto da

sociedade suas reivindicações, e ao mesmo tempo, visibilizar à opressão e à

exploração a que as mulheres estão submetidas.

Historicamente, através da ocupação do espaço público, o movimento

organizado de mulheres vem problematizando a condição feminina na sociedade.

Desde seu nascedouro, o movimento feminista reconhece o papel da mídia na

produção de estereótipos de gênero. Dessa forma, a crítica ao modo como as

mulheres eram representadas nos meios de comunicação, em especial na segunda

metade do século XX, acompanha o processo organizativo do movimento

(WOITOWICZ, 2011).

Segundo Veloso (2005), consciente da lógica que orienta a indústria cultural,

o Movimento Feminista16 reconhece os veículos de comunicação de massa como espaços de reprodução dos valores patriarcais onde são perpetuadas as

desigualdades de gênero, raça, orientação sexual e onde a sexualidade feminina é

cotidianamente explorada nos programas dos mais variados gêneros (novela,

propaganda, programas de entretenimento). Assim, entende que desconstruir o

sexismo presente tanto na programação, quanto nas redações implica

necessariamente adentrar nesse universo e dialogar com os meios massivos e

comunitários.

Ademais, entende que os meios de comunicação contribuem na importância

dada aos temas sociais e políticos do momento. Estima que estes podem vir a

promover17 o debate sobre os direitos humanos, incluindo ou não os direitos e a posição das mulheres na sociedade. Para a autora,

As feministas reconhecem que podem contestar não só a concentração nas redes de comunicação, mas também o sistema econômico, que as exclui, e o patriarcado, que agudiza as desigualdades de gênero (VELOSO, 2005, p. 52).

16

A partir das leituras e entrevistas realizadas identificamos que a imagem da mulher na mídia, a forma estereotipada e preconceituosa como as mulheres são abordadas nos meios de comunicação, principalmente, nas propagandas é preocupação comum (com maior ou menor intensidade) às diversas correntes do Movimento Feminista.

17

(36)

Ao abordar a importância da criação ou apropriação da mídia pelo movimento

feminista, Woitowicz (2011) observa que na década de 1970 foram sendo criados

novos espaços de publicização de propostas e demandas das mulheres, a partir de

variados meios: revistas, boletins, jornais alternativos, luta por espaço dentro da

grande imprensa, do rádio, da televisão e do cinema.

Nesse contexto, surgiram as primeiras publicações feministas. No primeiro

momento, as produções voltava-se para as questões de classe, trabalho, economia

entre outros assuntos mais gerais, que agitavam aquele momento histórico.

Posteriormente, os temas se tornam mais específicos, voltados ao debate de

gênero, trabalho feminino, orientação sexual. Nesse período, as feministas

começam a se apropriar das leituras de gênero com repercussões em suas

publicações, que passam incorporar reflexões sobre a categoria.

Entre a década de 1970 e os dias atuais, inúmeras publicações feministas

foram lançadas. Nós Mulheres, Brasil Mulher e Fêmea, destacam-se como os principais exemplares da imprensa feminista no Brasil (CARDOSO, 2004). Produzir

seus próprios meios de comunicação se tornava relevante para dar visibilidade às

demandas das mulheres, e ao mesmo tempo, contrapor-se ao machismo e ao

sexismo presentes nas grandes corporações midiáticas.

A impunidade diante dos crimes cometidos em “nome do amor”, a

participação das mulheres nas decisões políticas do país, as relações desiguais no

âmbito do trabalho e no espaço doméstico, foram problemáticas alvo de diversas

campanhas elaboradas pelo movimento feminista as quais conquistaram a opinião

pública. A campanha “Constituinte pra valer tem que ter palavra de mulher

configurou uma ação que possibilitou articular e sistematizar as demandas das

mulheres e apresentá-las à sociedade e aos/as constituintes através da “Carta das Mulheres à Assembléia Constituinte”. As campanhas “quem ama não mata”,“16 dias de ativismo pelo fim da violência contra a mulher” e, mais recentemente, a campanha “quem financia a baixaria é contra a cidadania”, compõem o leque de exemplos dentre tantos outros de produções noticiosas do movimento feminista.

Estas campanhas foram amplamente divulgadas em revistas, jornais e folhetins

alternativos.

(37)

das feministas a forma estereotipada e depreciativa como as mulheres eram

expostas nos veículos de comunicação. Desde então, o Movimento Feminista vem

pautando e se apropriando do debate sobre comunicação.

Segundo Woitowicz (2011), uma das primeiras tentativas de discutir

comunicação ocorreu no Encontro do Movimento das Mulheres no Brasil, realizado

no Rio de Janeiro em agosto de 1981, que dentre as temáticas discutidas no evento

destaque à comunicação. O evento enfatizou o papel educativo dos media,

considerando que cumprem “não apenas o seu sentido conservador de reprodução da ideologia dominante, mas também, o seu sentido de mudança enquanto focos de

resistência e propagadores das novas ideias e valores” (WOITOWICZ, 2011, p. 04)

A partir da IV Conferência da Mulher, em Pequim/China – 1995, o movimento feminista intensifica a crítica à concentração de propriedade e poder nas grandes

redes de comunicação. Como ressalta Veloso (2005, p. 7), doravante, o movimento

passa a analisar a conformação de grandes conglomerados midiáticos como

engrenagens da formação social capitalista, que podem “agudiza(r) as opressões de

classe, gênero, raça e orientação sexual”.

As reflexões feministas apontam a necessidade de compromisso por parte

dos estados na adoção de políticas de comunicação que possibilitem ao conjunto

dos sujeitos coletivos, a participar das instituições midiáticas - sejam as grandes

redes, ou os meios comunitários. Ainda, tais reflexões permitem evidenciar a

urgência da criação de mecanismos democráticos de monitoração e controle de

conteúdos, atentando para aqueles de caráter discriminatório e vexatório que

agridem as mulheres e sua subjetividade (VELOSO, 2005).

Certamente, veículos de comunicação não determinam as condições e

subordinação das mulheres. As causas têm raízes profundas nas estruturas

econômicas, políticas, culturais socialmente determinadas e só poderão ser extintas

através de transformações sociais, cuja finalidade seja a construção de outra forma

de sociabilidade e de novas relações entre homens e mulheres. Contudo, os meios

de comunicação têm até certo ponto, o poder de estimular ou, ao contrário, atrasar

tais transformações, tendo em vista sua capacidade de formação de opinião e de

consciências.

(38)

veículos de comunicação, nos mais diversos formatos e suportes (impresso, sonoro,

audiovisual, on-line). Estes meios atuam numa perspectiva de alternativa frente ao

discurso hegemônico promovendo o debate e apresentando as reivindicações das

mulheres. Destacam-se ainda como instrumentos de articulação das lutas das

mulheres (WOITOWICZ, 2011 p. 6).

O jornal Fêmea18 (CFEMEA), a Folha Feminista19 (SOF – Sempreviva Organização Feminista) e o Jornal da Rede (Rede Feminista de Saúde) são

exemplos de produções feministas que, nas suas edições, trazem temáticas

relacionadas aos direitos das mulheres: direitos sexuais e reprodutivos (o aborto e

políticas públicas); enfrentamento à violência de gênero; diversidade sexual;

economia feminista, além de problematizarem a forma estereotipada e

preconceituosa como as mulheres são representadas nos veículos de comunicação

tradicionais.

Mesmo dispondo de alguns meios e instrumentos de articulação, politização e

enfrentamento as relações desiguais de gênero, o movimento de mulheres encontra

inúmeras barreiras para inserir-se nos meios tradicionais de comunicação. Como

Afirma a entrevistada “Mulherio” militante feminista Marcha Mundial de Mulheres,

A questão da mídia é um problema, porque o que temos de visão dominante na sociedade, faz parte dos grupos dominantes detentores dos meios de comunicação. A gente ainda não tem uma democratização da mídia, isso faz com que os movimentos sociais como um todo, e não só o movimento feminista sejam criminalizados.

Porém, apesar da prevalência dos interesses dominantes e patriarcais,

segmentos do Movimento Feminista, entendem que estar presente nesses espaços

revela-se importante para visibilizar a questões que lhe são caras. Nesse sentido,

salienta “Nosoutras”, militante feminista da Articulação de Mulheres Brasileira,

Não vale só dizer que a Rede Globo é uma grande massificação, que são apenas interesses [burgueses], porque a gente já sabe de tudo isso, mas como fazer essa contra hegemonia, de como agir de forma contra cultural?. [...]Talvez seja criando pautas e metas contra culturais mesmo que esteja na contra mão do que a gente tá

18

O Fêmea possui uma tiragem de 13.000 exemplares (além dos acessos on-line), abrangência nacional e a periodicidade, que já foi trimestral, é atualmente mensal (desde 2008).

19

Imagem

TABELA 1  – EMISSORAS DE TV CONTROLADAS POR GRUPOS RELIGIOSOS
TABELA 2  – CRIMES DE AMPLA VEICULAÇÃO NOS ANOS 1990
TABELA 4  – TEMPO DAS REPORTAGENS CASO 2
Figura 1. Simulação da investigação caso Andreia  Fonte TJ1
+4

Referências

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