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Panorama da administração municipal brasileira

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Academic year: 2017

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/lrR[~SF-NTAÇ/I()

Durante o Clfrso de adlllillistnliJio pública q/le cOllljJ/etoll lia Universidade da Califórnia do S1fI, sob os auspícios do Instituto dc Negócios InteraNlericallus, do govhl/o do Estado do Paraná c da Fundação (,<eHlio Vargas, o autor da jJrcsellte lIlonografia, Dl{.

LORDEU.O DE MELW, rcali.::oll 'i'árias pesquisas c elaboroll 7!lÍrios

trabalhos sôbrc administração 111unicipal.

Um dêsses trabalhos, de'l'idamente adaptado, já foi incluído lia série dos Cadernos de Administração Púhlica e publicado sob o título Curso de Administração ~1 ulliripal: Programa e

J

l1stificação

(Caderno IlY 18).

lI/c! prescl/te 'lI1ol/o!Jl'llfia, ig/fullllc/I/l' ('s,Ti/a (011/0 partc dos estudos e pesquisas a que procede 11 pal'll elaborar li S1fa tese de doutorado, -- exalllino li alltor o jJrobleJllil da adlllinistração 111 li 11

i-fipal sol! dois aspertos IIm!os: ('11/ primciro l/fiJar, subllletc o assuntu a um tratalllcnto 1I/ois an//,lu. ao c01ltrário do qlle f,;.ó: 1/0 trabalho já publicado.

Em

seg1fndo lll!lar, C1l1 vez de analisar a 1IIatéria apcnas elll leorill, z'olla-se lIfcntalllcn!e para os problemas do Brasil. Daí o títlllo du Ir(!I-,II/;[): I'all"r:llll:l da .\dlllilli~tralJl!J :\1ullicipal lha,ikira.

Proclf1'<lIldo situar (I Illl/lIicípio Jl() qlludro !feral político e ad1llinistrativo, configurando-lhe Il estrrdura fl:nanceiro, bem como

(2)

os 1Iúcleos U}'f)lÚlicos de 1'[ls('. Jias é /lO cajJÍ/u!u em que cOllceitua a autonol/lia Inlflliei/,al que parlicular/llente execle o presente

Caderno, fluis analisa illCisiz'Cl/lICl1tC o !'roblclIlo c rellnc as principais

(ol1clus(}es a qU( os Icoristas têm chegado.

Cltmpre ressalvar <file (I presl'lllc Iruf,ollLu ú j'urle integrantc

de outro de maior jôleyo -- :\ Moderna Administração Municipal, (jue a Escola Brasileira de Administração Pública lançará dentro de poucos meses na série dos lit'ros e compêndios que ora tem em treparação.

De certo 1/lodo, o Caderl/o I'anorama da Administração

Muni-cipal Brasileira é lIl/la alllostra da o/'ra completa A l\loderna

Administração l\IulJicipal, elll que o D1Z. LORDELLO DE :MELLO

!r(lnSfOr7/IO/{, alendou/o à solicitação expressa d<~ E.n.A. r .. a sua lese de doutorado lia {ll1i7'crsidade da Califárnia do Sul. Apesar de ser purte de II/Il todo, (I presente ensaio cOllcreti:::a os o['jetivos

da Escola ao f'lfl>licâ-lo, pois. pelo mCI/OS, yi:::a os C01ltornos gerais dos problemas tratados, illdicalldo a intenção de 1t11l!l análise

poste-rior, mais abraJl,rJcllli' c profunda, que cs/'eraJllos o próprio autor leali:::e, sem folar 110 estimulo que esta contribuição poderá exercer 1I0S outros estudiosos da ud7llinistracclo II/unicipal em nosso país.

Rio, 1I/arço de? 1955.

(3)

.10 j 'IWF. DIL jUSl:: l'EIZEllC\ DE

(4)

fNDICE

I - INTRODUÇÃO ... 5

II - DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DO GOVí;RNO LOCAL NO BRASIL ... G No's tempos coloniais ... 6

O govêrno municipal durante o Império ... ~l O govêrno local de 1889 a 1946 ... 10

JII - O GOVí;RNO MUNICIPAL DESDE 1946 ... 14

O Município como unidade de govêrno local ... 15

Estrutura política ... 17

Conceituação da autonomia municipal ... 23

Estrutura financeira ... 29

Funções e organização administrativa ... 33

Condições políticas, econômicas e sociais ... 38

Relações com os governos do Estado e da União ... 42

IV - SUMÁRIO 46 INDICAÇõES BIBLIOGRÁFICAS ... 48

LER E ANOTAR

O leitor avisado lê sempre de lápis ou caneta em pu-nho, sublinhando, destacando, registrando, comentando o que lhe parece digno de atenção ou crítica.

A fim de criar ou estimular nos leitores o hábito inteli-gente da leitura anotada, os Cadernos de Administracão PÚ-blica contêm, na parte final, quatro ou mais páginas em branco, especialmente destinadas a recolher as anotações de cada leitor.

f:sse hábito capitaliza o esfôrço do leitor e estimula o processo de fixacão, no cabedal de conhecimentos de (·ada um, das coisas lidas e anotadas.

(5)

PANORAMA DA ADMINISTRAÇÃO

MUNICIPAL BRASILEIRA

I - INTRODUÇÃO

o

presente estudo é

princi-palmente um trabalho de sínte-se. .\ escassa literatura brasi-leira sôbre administração muni-cipal resume-se· a meia dúzia de livros ele escopo mais ou me-nos l11onográfico e a artigos

dis-persos por duas 011 três

revis-tas especializadas.

A natureza fragmentária

(!es-sa obra dificultava uma visão de conjunto do panorama da admi-nistraçfw municipal brasileira, a qual só se poderia conseguir me-diante o exame dos estudos par-ciais existentes, alguns, aliás, brilhantemente feitos pelas maio-res autoridades na matéria, el1-tre nós.

Precisou, um dia, o autor, de sintetizar em algumas páginas a evolução, a estrutura e o fun-cionamento das instituições

mu-nlclpais 110 Brasil. Dessa

neces-sidade resultou o presente tra-balho, cujo único mérito é o de ter articulado numa visão

pa-norâmica - e, por isso mesmo,

sem a preocupação elas minúcias

- aquêles quadros isolados da

110ssa organização municipal. As instituiçôes municipais têm recebido tal Ímpeto no Brasil, desde que foi votada a Consti-tuição ele 1946, que êsse aconte-cimento bem pode ser

conside-rado U11l marco na história

na-cional. Qste trabalho se divide

em tôrno dêsse marco. O

passa-cio será tratado na seção intitu-lada "Desenvolvimento Histó-rico elo Govêrno Local no Bra-sil" e a situação posterior a 1946

sob o título "O Goyrrno ~f

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11 - DESENVOLVIMENTO HISTóRICO DO GOVÊRNO LOCAL NO BRASIL

Se bem (iue os três períodos históricos em tôrno dos quais esta seçiio será dividida nflO

re-yelel11 diferenças f ltlldanwntais

entre si quanto a muitos aspec-tos da eyolução da "ida

munici-pal brasileira, a diYi:,~() serú,

Ol1l-tudo, adotada em face de su;, relação com íatos importantes da história do Brasil. llsses perío-dos são: 1) os tempos colo-niais; 2) a época imperial, e 3) o período repnhlicano até 1946.

Nos tempos coloniais

A s in sti tuições de govêrno

lo-cal foram trazidas ele Portugal

para o Brasil nos primeiros anos do século XVI pelos coloniza-dores portug'uêses. jltntamente

com outras instituiçiíes

jurídi-cas c SOCIaIS.

() \'elho conceito do

l1/1l11ici-f'il1!11 romano atraycssou a Idade :Vlédia, na PenÍllsula Ibérica, e, (lepois de ter sofrido modifica-ções import>lntes. sob os godos (' sob o feudalismo, evoluiu. em

Portugal, nos chamados

concc-lhos (do latim cOl1cilium). cuja

estrutura j á estava bem

defini-da nos fins do século XII (1). Na luta entre o rei e os senho-res feudais, os concelhos ou go-vernos locais desempenharam importante papel em favor da au-toridade central. Com carta de foral concedida pelo rei, consti-tuíam os concelhos um poderoso meio de defesa do po"o contra os abusos do clero e da nobreza. .:\Tas o crescimento do poder real

(7)

PANORAMA DA ADM. MUNICIPAL BRASILEIRA 7

resultou numa tendência de uni-formização e centralização dos governos locais, de modo que os outrora poderosos concelhos j;t estavam completamente sob o contrôlc ela coroa. por "01 ta de

1595.

O concelho, que a princípio designa\'a apenas o órgão gover-namental, passou depois a de-signar o próprio território do :',funicípio. Constituíam os con-cclhos as seguintes antoridades: 1) o alcaide, que repre~el1twa

() poder central e llUC exercia illnções admillistrati"a~ e judi-ciai:::; 2) os jIlÍ:::rs, também chamados a[z'a:::is, elcitos dcntre

(1;; lzo1l1f'lls-boI1S e illYestidos da

f:tculdade de deliberar e julgar. jllntamente com o alcaide; 3)

L'S aln:ofaeés, cujas innções eram de natureza puramente adminis-trativa, como a aferição de pe-sos e medidas, a manutenção das ruas e edifícios públicos, policia-mento das ruas e estradas, etc.;

~) funcionários sllbalternos, como

°

escrivão do concelho, o porteiro, o pregociro e o vozeiro.

f fa\'ia, ainda. os homcJls-bons,

'li!!' r()l1~lifllíall1 lI111a espécie de

órgão consultivo e de assesso-ramento da administração e que eram cscolhidos dcntre as pes-soas de relêvo na comunidade.

Com o crescimento do poder central sôbre os concelhos, a es-trutura administrativa dêstes modificou-se para atender à no-va situação. Assim, já no sé-culo XIV aparece a figura do j I/i:::-d c-f ora, autoridade judicial encarregada de aplicar, no Mu-nicípio. as leis gerais do reino.

Ol1tra~ modificações foram sen-do pouco a pouco introduzidas pelas Ordenações, no correr dos tempos. Com as Afonsinas a corporação dos homens-bons

ce-deu lugar ,[ dos juízcs pedâneo~

c vereadores, êstcs com as atri-lJlliç(-)cs administrativas dos an-tigos almotacés c com algumas

(Ia~ i ullçijes ele a~scssoramento

dos h07J!cl/s-bol/s, os quais fica-ram com as suas atribuições prà-ticamellte limitadas a escolher, pelo voto, os juízes e "ereado-res (2).

No tempo em que começou a colonizac;:ão do Braó'il, as Orc1e-nal;ões Filipims jú haviam trans-forl11arlo os c()!lccl1H1s nas

(8)

8

CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

ras, Cülllpo~tas dos jllí:::es

ordi-nários, com jurisdição cível c

criminal. elos vereadores, com

funções ilcllllinistrativas; do

pro-cllrador, espécie ele advogado do

l\lunicípio, e dos allllotacés, com

funções executivas subalternas. Tais foram as instituições de govêrt1o local introduzidas no

TIrasil (3). Todavia, o

ambien-te co101lial era totalmenambien-te diver-so elo metropolitano. :\ imensi-dão do país e a natureza rural ela população cedo começaram a operar uma 1l1utlança radical no sistema importado, tanto assim quc a própria existência cle um yerdadeiro espí rito

11lunicipalis-ta na colônia é sujeita a séria

dúvida. Diz 1l\RIlOSc\ Lnr A

So-llRINIIO:

"N a verdade não chegamos a ter, no período colonial, o que hoje se denomina Municipalis-mo. Conhecemos Senados de Câmaras Municipais e vimos que essas assembléias centrali-zaram movimentos históricos de extraordinário relêvo. Mas eram tão amplos os têrmos das vilas c possuíam elas poderes tão

cli-(3) lbid., págs. 12-14.

latadas, que devem ser conside-radas as suas assembléias, me-nos como autoridades propria-mente municipais, do que como ensaios de organização repre-sentativa, dentro dos governos regionais. O Senado da Câmara das "ilas criadas como que an-tecipa as assembléias estaduais. Suas preocupações, como tam-hém a matéria, de sua competên-cia, constituem () domínio co-mum da atividade das Câmaras Legislativas. O l\ll1nicipalismn, como hoje o entendemos, depen-deu da formação das cidades, com os seus interêsses próprio,.

~ens prohlemas característicos e. sobretudo, sua emancipação di-ante da iniluência dos clãs

lati-i undiários, tão bem expostos e

compreendidos na sociologia do SR. OLIVEIRA VIANA" (4).

Era, portanto, a propriedade rural, não as cidades, que for-mava a base do Município colo-nial. Havia poucos centros ur-hanos naqueles tempos e geral-mente serviam de sede para os governos regionais. As várias capitanias em que o Brasil se

di-(4) BARBOSA LIMA SOBRINHO, "Atualidade da Campanha Muni-cipalista ", Ret,isfa Rta.9ildi'l1 dos Municípios, .iulho-~ctembro, 1949,

(9)

PANORAMA DA ADM. MUNICIPAL BRASILEIRA 9

vidia eram governadas central-mente de Portugal e quase não mantinham relações oficiais

en-tre si. Nessas circunstâncias, as

instituições locais portuguêsas transplantadas para o Brasil fo-ram cedo modificadas pelas novas condições ambientes. O govêrno colonial tornou-se centralizado gcogràficalllentc (5). Sem ren-da, por não possuir quase ne-nhum poder de imposição, e

ad-ministrado diretamente pelos

agentes do rei de Portugal, o

::\1 unicípio colonial brasileiro

permaneceu, como comunidade, Ilum estágio bastante primitivo; c foi altamente ineficiente como :1Jlidac1c de govêrno (6).

() govêrno municipal

durante o Império

Só depois da Independência e

('um a Constituição de 1824 pas-saram as instituições municipais brasileiras a tomar uma forma definida e a apresentar alguma

originalidade . ~ as palavras de

CASTRO NUNES, a fase verda-deiramente brasileira da história municipal do Brasil começou com a Constituição de 1824 e

com a lei regulamentar de

1828 (7). Aquela Constituição estabelecia que tôda cidade ou vila deveria ter uma câmara

po-pularmente eleita, à qual

compe-tia o govêrno econômico e

m1l-nicipal

das ditas cidades ou vi-las (8). Estabelecia, ainda, que o vereador mais votado seria o presidente da câmara (9), car-go que equivalia ao de agente executivo. Mas a lei de 1828 restringiu grandemente os po-deres das câmaras municipais, cujas funções judiciárias foram, então, suprimidas com o estabe-lecimento do poder judiciário em órgão separado. Essa lei mostrava tendências francamen-te centralizadoras em relação aos municípios, pois declarava os atos das autoridades municipais sujeitos à aprovação dos

presi-(5) A. MACHADO PAUPÉRJO, "Evolução do Estado Brasileiro", RC1'isfa Brasileira dos MUlIicípio!l, abril-junho, 1951, pág. 189.

(6) Ibid., pá/r. 190.

(7) JosÉ DE CASTRO NUNES, Do Estado Federado e Sua Orga-niza.ção Municipal (Rio de Janeiro, Editôres Leite Ribeiro & Mauril1o, ]0Z0), pág. 4Z.

(10)

10

CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

dentes pro\'inciais, que eram de

nomeação do govêrno

cen-tral (10). "Declarando as

câ-maras corporações meramente

administrativas" - diz

ORLAN-lJO 1\1. CWVALIIO - ., reduziu os municípios a simples peças da engrenagem monárqUIca, arran-cando-lhes o exercício de um po-der judiciário que lhes po-dera, e1l1

tempo, prestígio singular" (11).

A reação contra êsse excesso de centralização veio com o Ato Adicional de l83·1, que trans-formou os Conselhos Gerais das ProvÍnc:as e11l Assembléias Le-gislativas Provinciais, estas de vitalizado poder, pois lhes foi transferida a autoridade sôbre os assuntos municipais, anterior-mente reservada aos presidentes de província. As províncias, to-davia. durante os longos anos da J\fonarquia. não lançaram mão daquela autoridade para criar novas instituições ele govêrno municipal nem para reorganizar, em novas bases. o sistema vi-gente. Em suma, o quadro da vida municipal durante () I

mpé-rio é um quadro de

obscuri-dade e apatia, até mesmo de

11t1-~1ilha{;ão, por causa da centrali-zação extrema de seus negócios nas mãos dos governos provin-ciais, bem como em virtude da

~ua quase total incapacidade

fi-n<lticeira (12).

o

govêrno

local de

1889

a

1946

1'1Oclamada a ]{epública, em

188~i, e promulgada a primeira

constituição republicana. em

1891, tornou-se o Brasil um

Es-taào Federal. O Poder Consti-tuinte conferiu certa autonomia política às antigas províncias, assim transformando-as em Es-tados Federados. As institui-\ões federais dos Estados Uni-dos foram tanto quanto possí-"el copiadas e adaptadas à si-tuação oposta de uma nação que passava do regime unitário para o federal, ao contrário do

modê-10 norte-americano, em que se

wrificou a associação de colô-nias autônomas, primeiro numa confederação e depois numa fe-(leração.

Em obediência ao princípio de

~,l1tonomia dos Estados-membJ'os

(11)

PANORÀMA DA ADM. MUNICIPAL BRASILEIRA

.li

ouservado pelos Estados Uni-dos, a Constituição de 1891 dei-xou aos nossos Estados-mem-bros a faculdade de organizar

~uas instituições de govêrno lo-cal, tendo-se limitado a decla-rar que a autonomia dos Muni-cípios devia ser assegurada em tudo quanto respeitasse ao seu peculiar interêsse (13). A Cons-tituição, entretanto, não definiu o que se devia entender por

au-tonomia municipal, nem escla-receu em que consistia o peculiar interêsse dos Municípios. A in-terpretação do texto constitucio-nal foi deixada a cada Estado e, exceto com relação ao Rio Gran-de do Sul, que conceGran-deu às suas municipalidades o direito de vo-tarem suas próprias leis orgâni-cas, essa interpretação nunca foi liberal (14).

A natureza precária de uma autonomia assim tão vagamente estatuída evidenciou-se, entre outros, por dois fatos importan-tes. O primeiro dêles foi a per-manência no estado de incapa-cidade financeira, que desde as origens caracterizara o govêrno

local no Brasil. O segundo con-sistiu na interpretação dada por vários Estados-membros ao con-ceito de autonomia do

Municí-pio, no que se referia à

eletivi-da de do chefe do Executivo mu-nicipal. A figura do prefeito eleito se estava então firmando nas instituições municipais bra-sileiras, mas somente em oito dos vinte Estados a eleição do prefeito era a regra. ":\ os outros doze o prefeito era de nomeação

do governador, senão em todo~

os Municípios, pelo menos na capital do Estado e naqueles em que o govêrno estadual tinha in-vertido grandes somas em es-tâncias hidrominerais ( 15 ) .

Durante o período

revolucio-nário de 1930 a 1934, isto é,

du-rante o primeiro regime Vargas. o govêrno era grandemente cen-tralizado. Tôdas as câmaras le-gislativas foram dissolvidas, in-clusive as câmaras municipais. Os Estados eram governados por interventores nomeados pelo che-fe do Govêrno Provisório e os Municípios por prefeitos nomea-dos pelos intef\'entores. Essas

(13) Constituição Brasileira de 1891, Título lU.

(14) FRANCISCO BURKINSKI, "Govêrno Municipal", Revista do Serviço Público, março, 1958, pág. 64.

(15) ORLANDO M. CARVALHO, op. cit., pái's. 82-83.

(12)

12

CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

autoridades exerciam. então, tan-to o poder executi\'o como o le-gislativo.

Com a Constituição de 16 de

julho de 1934 o país voltou à

normalidade constitucional. Foi mantida a Federação, mas a au-tonomia dos Estados-membros foi reduzida, inclusive no que se referia às suas relações com os l\Iunicípios. A nova Constitui-ção deu um passo decisivo para o fortalecimento da autonomia municipal, estabelecendo que os Municípios deviam ser organi-zados de modo que lhes ficasse assegurada a autonomia em tu-do Cjue dissesse respeito ao seu peculiar interêsse e

garantindo-lhes especialmente: 1) a

eleti-vidaue do prefeito e dos verea-dores, sendo que aquêle poderia ser eleito indiretamente por ês-tes; 2) a decretação de certos impostos e a arrecadação e apli-cação ue suas renuas; e 3) a organização de seus servi-ços (16).

A estrutura básica do govêrno municipal foi, portanto,

estabe-lecida pela Constituição Federal,

mas asminucias furam deixauas para as constituições estaduais. a serem votadas em hreve pelos Estados.

Ao fazer uma divisão tripar-tida da competência entre a União, os Estados e os Muni-cípios, o Brasil inaugurava o que desde então tem sido considera-do uma peculiaridade considera-do seu sis-tema federal (17).

Todavia o país mal teve tem-po de experimentar o novo pla-no de revitalização elas

institui-ções municipais: o illtcrmeI/::o

constitucional durou apenas três anos. A 10 de novembro de 1937 o PRESIDE:KTE GETÚLIO VARGAS tornou-se novamcnte chefe abso-luto do Govêrno e. então, estabe-leceu-se um regime altamente centralizado no Brasil. Tôdas as càmaras legislativas foram dissol-vielas novamente. Os governa-dores estaduais se transforma-ram em agentes do govêrno cen-tral ou interventores e os pre-feitos passaram a governar como prepostos dêsses interventores. A discriminação das rendas em favor dos Municípios foi, porém,

(16) Constituição Bra8ileira de 1934, art. 13.

(13)

PANORAMA DA ADM. MUNICIPAL BRASILEIRA 13

pràticamente mantida pcl:t Cl1t;l

de 1937 (18).

Tal situação prevaleceu até a restauração do regime

democrá-1 icu peb COllsLituiçau \ uLaJa a

18 de setembro de 1946, quando

foi restahelecido o sistema fe-derativo.

(18) VALENTIM F. BOUÇAS, "Sistema Tributário Municipal", Revista Bl'asileim dos Municípios, abril-junho, 1950, pág. 447.

"Cada operação diferente na leitura exige um novo passo no pensamento, e, assim, as notas feitas nos vários estágiOS dêste processo exprimem a variedade de atos intelectuais realizados. Se uma pessoa procura apreender a estrutura de um livro, pode fazer várias tentativas de resumo de suas partes principais, antes de contentar-se com a apreensão do todo. Resumos esquemáticos e diagramas de todos os tipos são úteis para separar os pontos principaiS dos secundários ou tangenciais. Quem pode e quer marcar um livro deve

sublinhar as palavras e sentenças importantes, à medida em

que forem surgindo. Mais do que isso, deve anotar as mu-danças de significado, enumerando as páginas em que as palavras importantes são usadas, sucessivamente, em sentidos diferentes. Se o autor parece contradizer-se, deve fazer-se

alguma anota~ão nos lugares em que essas inconseqüências

ocorrem, marcando o contexto para possíveis indicações de ser a contradição apenas aparente."

(14)

IH - O GOV~RNO MUNICIPAL DESDE 1946

À medida que o país

marcha-va nomarcha-vamente para a normalic1a-de constitucional, uma intensa campanha municipalista era le-yada a efeito tanto fora como dentro da Assembléia Consti-tuinte. Como conseqüência des-sa campanha, foram inscritos na . nova Con:;tituição tantos dispo-sitivos em favor ela autonomia política e financeira dos Municí-pios que muitos dizem ter ha-vido uma verdadeira revolução 111unicipalista no Drasil, a partir de 1946 (19). Outros,

entre-tanto, são menos enfáticos.

RA-FAEL XAVIER, um cios líderes da campanha municipalista, diz, por exemplo, pensando, talvez, em tênnos dos objetivos finais do movimento, qlle "a Constituição

ele 1946, com suas reivindicações 1l1unicipalistas, mostrou o cami-nho de uma evolução indispen-sável", mas que, "na realidade, os dispositivos aprovados ainda estão muito longe de represen-tar uma grande reforma" (20).

E' fácil compreender-se tal

re-sen'a, se se pesarem bem os ob-j etivos últimos da campanha. Tais objetivos, êle próprio os teria definido, ao dizer:

"A Campanha Municipalista deixa de ser, assim, uma coisa nova, para ser a continuação da luta sustentada no último quar-tel do século passado, pela de-mocracia rural, pelo crédito agrí-cola, pela fixação do homem à terra mediante a propriedade de

11m lote onde promover o

be111-(19) YVES ORLANDO TITO DE OLIVEIRA, A Revolução Municipa-lista na Constituição de 1946 (Salvador, edição particular, 1953), pág. 109.

(15)

PANORAMA DA ADM. MUNICIPAL BRA'SILEIRA 15

estar da família, pela descen-tralização administrativa, pela educação popuhr r

profissio-nal" (21).

Referindo-se, em complemento,

:t maneira como se tem abusado

da expressão autonomia.

1IIuni-cipal, acrescenta RAFAEL X

A-VIER:

"Entre nós, lllullicipalistas, o

significado é mais especial. A

autonomia municipal que defen-demos significa o aproveitamen-to local dos recursos locais, vida própria e não vida reflexa, de-senvolvimento elo espírito de co-l11unidade, de modo a fazer, com a terra e o povo de cada Muni-cípiu. um organismo

autopolíti-co, tanto (lu:l11to possível" (22).

Para se compreender exata-mente o que tem sido consegui-do através dessa revolução

--011 evolução - 1l1unicipalista e

o CJue ainda resta por fazer, é

preciso estudar o 1\1 unicípio

bra-sileiro analisando suas caracte-rísticas como unidade de govêrno

local, sua estrutura política e

fi-(21) Ibid., pág. 15. (:;:'2) Ibid., pág. 17.

llancei 1'a, o conceito de sua auto-nomia, sua organização e suas

fllnções administrativas, suas

cnndições soclO-econômicas e

suas relações com as órbitas su-periores de govêrno.

Eis o que será tentado de

for-ma sumária nas próxifor-mas

pá-ginas.

o

Município como unidade de govêrno loca]

() ]\f ll11icípio te1t1 sido, por tra-dição, a única unidade de

govêr-110 local no Brasil. A 31 de

de-zembro de 1950 havia, no Bra-sil, mil oitocentos e noventa e q\1al ro dessas unidades (23), mas por meados de 1953 o seu número seria de cêrca de dois mil, em face da criação de novas comunas desde 1950.

O Município brasileiro

C0111-preende tanto as zonas rurais C01110 as comunidades urbanas que se encontram dentro de suas

fronteiras, isto é, ambas

consti-tuem uma única unidade

gover-(23) Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, A.nuário Estatístico do Brasil, Ano XII, 1951 (Rio de Janeiro, I.B.G.E., 1952), pág. 18. Até dezembro de 1954, o número de Municípim; hra~ilri1'o;;

(16)

16

CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

namental. O Município pode ser subdividido em distritos, mas a organização distrital brasileira carece presentemente de qualquer

importância C01110 fator

relevan-te no govêrno local, por isso que a aclmini stração distrital não passa de mero prolongamento da administração municipal, já que os distritos "não têm sombra de

govêrno local" (24).

A comunidade urbana onde está localizada a sede do govêr-no municipal tem o govêr-nome de ci-dade, enquanto que à sede do distrito se dá geralmente o no-me de vila. Dêste modo, pelo menos telJricamente, há tantas cidades no Brasil quantas são as unidades de govêrno local.

A área dos :\lunicípios varia grandemente. A maior é de du-zentos e oitenta e dois mil e se-tenta quilômetros quadrados; e a menor, de vinte e um quilôme-tros quadrados (25).

São desconhecidos no Brasil os distritos para fins especiais, como os existentes nos Estados

Unidos. Se bem que exista, nos Estados, uma divisão territorial diferente para fins judiciários, é todavia com base no Município (lue tal divisão é feita.

A Constituição da República 1lão menciona explicitamente o :'Iunicípio como elemento essen-cial do sistema federativo, nem

impõe aos E~tados a obrigação

ele se dividirem em Municípios, o que todos os Estados têm feito, porém, por tradição de longa da-ta. Mas, a despeito da omissão constitucional, crê-se, hoje, que o Município autônomo constitui uma ordem política e adminis-trativa inerente ao sistema fe-det1al brasileiro, ipclusive por-que a Constituição estabeleceu, entre outros pertinentes à ma-téria, o princípio da intervenção iederal nos Estados, para defesa

ela autonomia municipal (26).

Desde que o território brasi-leiro é totalmente dividido em l\Iunicípios, novas unidades mu-nicipais somente podem origi-nar-se do desmembramento ou

(24) GUSTAVO LESSA, O Distrito na Organização Municipal (Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1952), pág. 10.

(25) Respectivamente os Municípios de Altamira, no Pará, e de Nilópolis, no Estado do Rio de Janeiro.

(17)

PANORAMA DA ADM. MUNICIPAL BRASILEIRA 17

ela fusão ,dos já existentes. As

condições para sua criação são prescritas nas constituições es-táouais e nas leis orgânicas dos

:-1

unicípios. Os requisitos mais

comumente exigidos para a cria-ção de uma nova comuna são a existência de um mínimo de população e de um mínimo de

renda na região que aspira

à

au-tonomia. Em alguns Estados é ainda exigida a existência de um número mínimo de casas no local destinado à sede do futuro govêr-no; ou a existência de edifícios para a instalação do govêrno mu-nicipal e de certos serviços pú-blicos. Somente alguns Estados requerem o voto das populações diretamente interessadas para a

constituição de novo M

unicí-pio (27).

Estrutura política

Antes de se entrar na dis-r:ussão da estrutura política do

1\[ unicípio. convém mencionar

alguns dos mais importantes princípios de govêrno represen-tativo que são aplicados indistin-tamente a todos os três níveis de govêrno no Brasil.

De acôrdo com o princípio da unificação dos direitos polí-ticos adotados pela

Constitui-ção, não há distinção entre

elei-tores federais, estaduais e

mu-nicipais (28). Qualquer

parti-do legalmente registraparti-do é li-vre ele participar de qualquer eleição, em qualquer ponto do

país (29). Os direitos de

ci-dadania são estabelecidos pela Constituição Federal, não ha-vendo senão uma cidadania

úni-ca (30). Compete

exclusiva-mente à União legislar sôbre

di-reito eleitoral (31). Os

candi-datos a cargos eletivos são in-dicados em convenções de seus partidos, não sendo permitidos candidatos independentes, já que

~ partidos políticos são o único

instrumento ele representação

(27) FLÁVIO LEME, "CondiçtÕes Mínimas para Criação de MUll!-dpio", Ret'Í,sfa. Brasildra án8 Município8, julho-setembro, 1950, pa-g'inll. 7fi8.

(28)

(29)

(30) (:11)

FRANCISCO BURKINSKI, op. cit., pág. COllstituicão Brasileira de 191;6, art. Ibid., Tít.iIlo IV, Cap. I.

[bid., art. 5.0. XV, a.

(18)

18

CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLlf.;A

popular para aquêles cargos

(32). Além de só haver uma

cidadania - a nacional - , não

se exige dos candidatos a con-dição de residentes da unidade governamental para cujos car-gos vão concorrer. O sistema presidencial, adotado pela União

(33), e caracterizado pela

sepa-ração de poderes com o predo-mínio do Poder Executivo sôbre os demais, é impôs to aos Esta-dos pela Constituição Federal

(34). Assim, será

inconstitu-cional até mesmo a exigência de que a nomeação dos Secretários de Estado seja aprovada pela

as-sembléia legislativa estadual,

conforme decisão do Supremo

Tribunal Federal (35).

Tal uniformidade dati insti-tuições políticas do país se re-flete na estrutura do govêrno lo-cal. Daí terem todos os Muni-cípios brasileiros a mesma for-ma de govêrno, isto é, a forfor-ma

de prefeito-e-câmara. Tanto o

i

prefeito como os vereadores são

eleitos por ~L1flJgio_ universal, em

eleições di~etas e pelo sistema de

representação proporcional dOS) partidos políticos. Somente em alguns Municípios é o prefeito nomeado em vez de eleito, como se verá adiante.

A Câmara dos vereadores é o

órgão deliberativo do govêrno municipal, não lhe cabendo

ou-tras funções administrativas

além das referentes à sua

orga-nização interna (36).

(32) Código Eleitoml Brasileiro, 1950. (33) Constituição Brasilei·ra de 1946, art. 36.

(34) Ibid., art. 7.°, VII, b.

(35) PINTO FERREIRA, Princípios Gm"ais do Direito Constitu-cional Modc·rno, 2.a edição (Rio de Janeiro, José Konfino, editor,

1951). págs. 792-93. •

(19)

de-PANORAMA DA ADM. MUNIClf'AL BRASILEiRA 1fl

A chefia do Executivo se acha integrada no prefeito, que tem exclusiya responsabilidade pela ~dministração do 1\1 unicípio, como a única autoridade eletiva do ramo executivo do govêrno municipal. De acôrdo com a tra-dição do sistema presidencial 1Jrasileiro, o vrefeito tem o di-reito de veto e a competência para iniciar leis, competência claramente expressa nas leis or-gânicas municipais de dez Esta-dos, sendo-lhe, ainda, reserva-da em algumas unireserva-dades reserva-da Fe-deração a competência privativa em certas matérias, especialmen-te as que dizem respeito à pro-posta orçamentária e ao quadro do funcionalismo. A referência aqui feita ao sistema presidencial se justifica, não porque tal sis-tema, a rigor, seja cabível em se tratando de Municípios, nem porque lhes tenha sido impôsto, mas porque os seus princí pios têm indubitàvelmente inspirado a moderna estrutura do gO\'êrt10 municipal no Brasil.

_ \5 duas funções mais impor-tantes da CânlJra dos vereadores consistem: - na formulação da política do go\êrno lI1unici-pal em relação a tudo que diga respeito aos interêsses peculiares cio Mu-nicípio; e na fiscalização e con-trôle do ramo executivo do go-vêrno. tsse contrôlc a Câmara () exerce através dos três pode-lTS seguintes, Cj\le lhe são ge-ralmente atribuídos: 1) o de cassação do mandato do prefei-to. cluanc!o êste incorrer em cer-tas falcer-tas enumeradas na lei or-gânica; 2) o cle revis;LQ elas de-cisões do prefeito com referên-cia à aplicação cle penalidades aos funcionários. quando houver recurso da medida sob a alega-ção de penalirlade ilegal; e 3) o cle tomar as conTas do prefeito, anua lmen te.

Por sua vez, C01110 chefe do Exemtiv(). o prefeito é investido cle todos os poderes executivos e administratiyos llecessários à gestão dos ncgóóos municipais. tsses poderes inclucm: 1) a

vendo a palavra ]Jodel' ser tomada como sillônimo de fllil';LIO. As leis municipais não seriam, assim, leis no sentido formal, mas apenas no material. Ver, sôbre o assunto: PONTES DE MIRANDA, Comentários à Constituição de 1946, 2.a edição, voI. II, págs. lHJ-134; FRANCISCO MACHADO VILLA op. cit., págs. 35-39; CRISTIANO MARTINS DA SILVA, 01'. cit., págs. 329-330; VÍTOR NUNES LEAL, o]J. cit., págs. 68-73.

(20)

20 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

elabora(:;\u e a execução do

or-l~al11ent(J; 2) a pul>licação e a execução das leis municipais;

3) a Ilomeação, exoneração e

uemis,;ão, nos limites ela lei, de todos os chefes ele elepartamento e demais funcionários

munici-pais; 4) a imposição (le

mul-tas pela violação das leis e

COi!-tratos do Município, e 5) a

re-presentação legal do ~lunicí­

pio (37).

São três as fontes donde pro-vém a estrutura política do go-vêrno municipal no Brasil: a Constituição Federal, as consti-tnições estaduais e as leis orgâ-nicas municipais yotadas pelos Estados, sendo de notar que, no Estaelo do Rio Grande do Sul, cada município vota sua própria

lei orgânica (38).

Seguindo as tradiçi'íes do fe-deralismo brasileiro, a Assem-bléia Constituinte ele 1946 colo-cou sob a égide da Lei Magna do país aquêles princípios bási-cos considerados pelos

mnsti-tuintes como essenciais à

confi-guração da autonomia

munici-pai, deixando os p0r111eUOres ao,-;

Estados. As constituições esta-duais que se seguiram abordaram

a matéria, ;l qual dedicaram

vh-rios artigos. Além di,;oo, cada

Estado, exceto () Rio Grande elo

Sul, votou uma lei orgànica para os seus 1Vlunicípios ou revigorou sua lei anterior sôllre organiza-ção municipal. O Rio Grallck

(10 Sul manteve, porém, suas

tradições ele honlC ntle.

dei-xan do a cada ;, I unicí pio a vota-ção de sua própria lei orgânica.

A Constituição da Repúhlica devotou um número considerfl-vel de artigos aos ;-'1 t1llicípios. N o seu artigo 28 foi estabelecida a estrutura fundamental do go-vêrno municipal soh a forma de

uma delimitação à faculdade dos

Estados-memhros ele se organI-zarem internamente. Diz () ar-tigo 28:

"A autonomia dos ~Iunicípios

será assegurada:

I. Pela eleição cio prefeito e

dos vereaclores.

II . Pela administração

pró-pria, no que concerne ao seu pe-culiar interêsse e, especialmente:

(37) A enumeração das atribuições confel'idas ao prefeito e à Câmara é fundamentalmente semelhante em tôdas as leis orgânicas municipais promulgadas pelos diferentes Estados.

(21)

PANORAMA DA ADM. MUNICIPAL BRASILEIRA

21

li) à decretaçãu e arrecadação

dlJ~ trib\ltos de sua competência

e

à

aplicação elas suas rendas:

b) à organização dos serviços

púhlicos locais.

§ 1.0 Poelerão ser nomeados

pelos governadores dos Estados ou dos Territórios os prefeitos

das capitais, bem C01110 os dos

:\Iunicípios onde bom'er

estân-cias Ilidrominerais naturais,

(;uando beneficiadas pelo Estado ou pela União.

~ 2.0 Serão nomeados pelos

governadores elos Estados ou dos Territórios os prefeitos elos "\fullicípios q\1e a lei federal, me-diante parecer do Conselho de

Segurança N acionaI, declarar

lnses 0\1 portos militares de ex-cepcional importância para a

de-r

eSé! externa do país" (39).

Outro;; dispositivos constitu-cionais completam a regra dêsst'

artigo, especialmente aquêles

que discrimina11l os tributos da

competência do 1\1 unicípio ou

que estahelecem a participação

cio T\f unicípio em impostos f

e-derais e estaduais.

Us dois parágrafos llue encer-ram o artigo 28 foencer-ram inspira-dos no receio ele Cjue a eleição popular do prefeito pudesse pôr em perigo os superiores in te rês-ses da segurança do país ou os interêsses financeiros dos Esta-dos ou ela União naqueles Mu-nicípios. Tais restrições ao fun-cionamento elo processo <le1110-crúticc em geral e elo princípio da autonomia municipal e111 par-t icular par-têm sido, na prápar-tica, ele reduzidas proporções, por isso que muitos Estados não fizeram uso da permissão constitucional para nomear prefeitos, Outros, que se yaleram daq\1ela

facul-dade, emendaram mais tarde suas constituições, clesistindo de exercê-la. Ademais, o próprio Congresso Fecleral tem "atado sucessivas leis excl\linclo ela lista ele bases ou portos ele excepcio-nal importância militar f]uase to-cios os dezoito 11 unicÍ pios ante-riormente classificados como tais pela lei federal e restituindo-lhes, assim, o direito ele eleger os se11S prefeitos (40).

(39) ConstitU/:ção Brasileira de 1946, art. 28.

(40) LEVI CARNEIRO, Organização dos Municípios c do Distrito

(22)

no-22 CADERNOS DE ADM.1NTSTEAr:ÃO PÚBLICA

Us di~positi\,(J~ da~ l' )ll~titlli­

ções estaduais relativos à

orga-nização municipal consistem na

repetição das regra~

estabeleci-das na Constituição Federal e na adição de alguns outros J))-in-cípios sôbre os quais se deve fundamentar aquela organização_ Dentre éles, os mais importantes

(lizem respeito a~ seguintes

(!uestões: competl'llcia <la

Câ111;:-ra e do prefeito; nÚllleros

mÍni-mo e múximo ele vereadores em

cada CÚ11la1'a; proc(,'C;o de i

nttT-vençào do Estad{) 1J() Município;

inelegibilidade c i i Ilpcdilllen t ()

do prefeito e dus Y(,lTadore~;

d\1-ração dos mandatu,·. a qual é ck

quatro anos ('111 dezesseis

Esta-dos. sendo ele cinco allus ()

ma11-dato do )JI"('feito 110S Estados de

Alagoa.s, Rio Grande do Norte, Santa Catarina e jlaranhão; (', finalmente, () modo de eontrôlc

da administrz\çãu financeira dos

1\1 unicípios.

As leis orgânicas lllunicipais,

por sua vez, rCl'roc1tlzem as

1101'-111;[" du:, tc"\.lu:, cunstitllciul1ai~

acima, acrescentando-lhes por-menores que ahrangC'111 pràtica-111ente todos os aspectos impor-tantes ela organização municipal. tais como; o número ele verea-(lores para caela :Município, de

actmlo C0111 a sua população;

a rClll\lneraçflo devida aos edis

( -t

1 ) ; os vencimentos elos

pre-feito;.;; as principais normas a

~C're1ll observadas para o

fun-cionamento da Câmara e a

vota-\}o das leis; casos de perda el()

JJ1andato de prefeito e vereador ; l'rincípios gerais ele aelministra-<:;[0 orçamentária; pré-requisitos da validade dos atos

administra-t i"os; condições para criação de

1l1l1nicípios e distritos; e proibi-\:('Jcs de di\'ersas naturezas

visan-do ú moralização da

administra-ção local. /\pesar de votados pe-los órgãos legislativos de vinte Estados diferentes, aquêles dis-positinJs constitucionais e essas leis orgânicas são

extraordinà-riamente semelhantes entre si,

meação, sendo quase metade dêles constituída de estâncias hidromine-l'ais do Estado de São Paulo.

(23)

PANORAMA DA ADM. MUNICIPAL BRASILEIRA 23

explicando-se, assim, a extrema uniformidade que se observa nas instituições de govêrno local no Brasil. Mesmo no Estado do Rio Crande do Sul onde, como jú foi dito, cada Município vota sua própria lei de organização muni-cipal, não se têm verificado ino-\'ações de maior vulto que afas-tem a estrutura dos governos municipais gaúchos do modêlo tradicional adotado pelo resto do país.

Conceituação da

autonomia\

municipal

:\Jatl:ria :--tljeita a \Tll,;[, ("11-tw\'érsias, () conceito tIL' ~lllt()- \ 1l01l1ia 11ltll1iciVtl nunca fui satic -'.

fatorial!lente deiinido na literaJ fura jurídica brasileira. Os tex-. (os das diferentes constituições; iederais, por sua vez, se têm ca-! racterizado por certa imprecisão: quand(), ao enumerar os c1emenc: tos dessa autonomia, recorrem a cláusulas mais ou menos va~ gas e gerais, tais como "peculia\-itlterêsse do ll1unicípio" e "orga; llização dos serviços públicos

!o-(~;J is" I"":t-l). f)csO'a imprecisão

(42) Supra, p~gs. 11 (' 12. (43) Supra, pág. 20.

têm-se aproveitado constante-mente os Estados para restrin-g-ir a autonomia municipal. As-sim tem sido no passado e asAs-sim continua sendo sob o regime da Constituição de 1946, na qual reaparecem

,'lúnsnlas. -" ,

A em1ll1l'raç;W l'C)llstÍtllcional

elos tributos que podem ser

arre-caebdos fl gastos pelo govêrno municipal constituiu, todavia, p "1 j;:, ,so importante para a con-l'cit ll:!l~:!" (h alltonomia munici-pal no 'l11e se refere ao direito do 1\[ llllicípio h "administração l'rllpria, 110 Cjue Ctmcer!l(' ao seu pec11liar illterêssc" (43). se bem I[tH' tantll ;1 prf'pria C"nstituição

Federa] ('nillO "(Irias

C'ollstitui-çiJ('~ estaduais estabeleceram

Ii-111itaçl1

f'_,

eXl)ress:cs a êssc

prin-cÍ pio, CUlll() sc \'cr;l adiante. "\ pcsar de tud(), a Constitui-cito delimitou llma área ele

com-l~etêl1cia expressa e exclusiva do :\Tut1icípio CJue barra tanto a competi"l1cia da lei federal

onli-n;'trÍi'l C01t10 a da constituição e ela lei nrdinária elos Estados. Pa-rece, jlortalllo, CUIllO j;'t foi di-to (~-I l. qllc, CIl1 fart' des';:l

(24)

24 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

limit:.tçftu de competência, o sis-tema federal brasileiro assumiu características peculiares que o colocam em posição única den-tre os demais regimes federati-yos. Segundo êsse ponto de

vis-ta, () Brasil seria o único país

em qne foi feita uma divisão

tri-partida ele competência nacional

entre a l 'niúo, os Estados e os

~I unicípios. X essas condições,

teria sido alterada a natureza unitúria elos Estaelos-me11l hros. que passaram a ser, de certo mo-do, Estados feelerados constituí-dos ele Municípios sêlbre os quais o sen poder e a sua competência são decididamente limitados pela Constituição Felleral (45). A teoria é sujeita a profundas con-trovérsias. Sua aceitação impli-caria, em última análise, na re-jeição do velho princípio segun-do () qual, estritamente falansegun-do,

;1, autonomia municipal é de

na-tureza puramente administrati-va, ao contrário da autonomia do Estado-membro no regime federal, que se reveste de subs-tância política e constitucional, no sentido estrito dêste último

Ibid., págs. 67-73.

tênno. E' precisamente esta

au-tonomia constitucional o que dis-tingue o Estado-membro de uma ieclcração elas coletividades terri-toriais inferiores como o Muni-cípio, por isso que essa auto-nomia constitucional confere ao

Estado-membro o poder de

auto-organização e de

participa-ção na formação (la vontade

fe-deral (46).

Seja como f(n', essa~

tendên-cias <lo federalismo brasileiro merecem atenção e devem ser le-\'adas em conta para que se com-preenda o funcionamento do go-Il:rno local no Brasil. Elas ex-plicam, também, porque uma das maiores autoridades do direito municipal hrasileiro afirmou que em nenhum outro país é tão am-pla a autonomia municipal ('+7).

A Constituição de 19.+6 nãu se limitou a declarar e a caracte-rizar o princípio da autonomia municipal. Foi muito mais lon-ge, pois não só permitiu a in-tervenção federal nos Estados para proteger o princípio (48), como também limitou a

interven-ção do Estado 110 Município ao

(45) (46) (47)

PINTO FERREIRA, O]). cit., págs. 748-750.

gina 158. (48)

ODILON DE ANDRADE, citado por LEVI CARNEIRO, 01). cit.,

(25)

PANORAMA DA ADM. :;'WNICIPAL BHASILEIRA 25

ca~,) elll que seja necessário a re-gularização elas finanças

l11unici-1JJ:s em face ela impontualidade

(lO :\Junicípio no pagamento ele

SL,a dÍ\'icla fundada ou de em-préstimo garantido pelo

Esta-do (49).

Deixando de lado possíveis

ar-&~T11l1elltações ele caráter

doutri-nário, FHANCJSCO EHOCHADO DA

EOCHA conseguiu formular o que se pode considerar uma das definições mais objetivas da au-tonomia municipal, fundamen-tando-a apenas no direito posi-tivo escrito brasileiro. Ei-Ia:

"Como é o Estado que orga-lliza os ';\lunicípios, cabe-lhe,

res-peitada a regra cio artigo 28 ela

Constitui(;iio da República, defi-11ir a esfera ela competência mu-nicipal, especiiicanclo as

respcc-ti\':~s atrillui(;ões e, pois. o que se entende por serviço público local e peculiar interêsse.

"ror isso, podemos dizer CJue a al'tollomia do Município brasi-Irira consiste na capacidade para

(,10) Ibid., ~]1t. 23.

eleger o prefeito e os vereado-res, bem como na administração própria, no que concerne à de-cretação e arrecadação elos tri-1)11tos de sua competência, à apli-cação cle suas rendas, à organi-zação cios serviços que a Consti-tuição elo Estado, ou a Lei

Or-gúnica por êste promulgada,

C011-~idera de natureza local, como a tudo que a citada Constituição, ou Lei Orgânica, defina como do

seu peculiar interêsse" (50).

~ste conceito de autonomia municipal. na SUa compreensão mais ampla, se acha, porém, res-tringido tanto pela própria Cons-tituição Federal como pelas cons-tituições estaduais, tendo estas chegado mesmo a violar o espí-rito e a letra ela Carta Magna

da República 110 CJue se refere

à faculdacle de autodeterminação elos Municípios. Um estudo da

questão feito por VÍTOH NUNES

LEAL (51) chega às seguintes conclusões, que vão aqui resu-micbs:

(50) FRANCISCO BROCHADO DA ROCHA, "Incorporaçào, Subdivisão c Desmcmbramento do Munieípio", Revista Brasileira dos ,7I,funicípio8, janeiro-março, 1950, pág. 10 /1.

(26)

26

CADERNOS DE ADMINISTRAí;Ao PÚBLIC\

1. Rc,l!rlçôes II/ifio,,"!s flela COI1Stitlfi~ão Federal: a) a Constituição ela l{epú-h1ica estendeu aos ~IuniC'Ínios os mesmos disj)()sitiyos proihitivos, inclusive os referentes às isen-Ções trilmtúrias, que foram im-1,ostos à Cni;io e aos Estados;

li) estabeleceu, ainda. a Cons-tituição, diver,sas limitações ao enmrê"o d;.s rendas municipais, sob a fumla de destinação espe-cífica de )Jarte oeesas rendas, a saber: <lnlicação obrilYatória pelo :\Iunídpio de cinClüenta por cen-to (la cota (10 imnôsto ele ren-da que lhe é atrihuírla pela mes-ma Constituiçiio em henefícios de OrdC!,l r\1ral ; regulamentação, pela lei federal. do emprêg'o (la cota dn imllôsto único sôbre cOlllhusj í\'l'is e luhrificantes (lue a COllstitl1idío man(la entregar aOs M l1nicípios; ohrigação de os 'l\Iunicíllios ela res~iã() amazôni-ca reservarem ;\l1\1;1JIl]('l1te trê" por cento de suas renelas trilJ11-túrias 1Jélra aplicação, pel" ),(0-vêrl10 federal, na eXl'C\lCâo do plano de Y;t1orização da' Ama-zônia e, finalmente, a c1etennin:l-ç.'io ele Clue os ::\!nni\.'Íllios apli-quem, anualmcnte. pelo menos vinte 1'nr cento da reJ1tla resul-tar.je dr impostos na

man\1ten-çiío l' cL-sem'(l!\,illlen(o elo

en-Sino;

(') a Constituição permItiu a intervenção dos Estados nos

M ullicípios para regularização elas finaw;;13 nlt1nicipais e reser-\'0\1 aos Estados o direito de fis-calizar a administração financei-ra de :'nas comunas, especial-mente no que se refere à exe-cnção elo orçamento.

Hfstriçuesilllpostas ptlas rOllstitlliçues estaduais: a) no exercício da facl1ldade, fJlle lhes foi conferida, ele fisca-lizar a administração financeira

elos 1111l1icípios, incl\1íram os

Es-tados em suas constituições di-versas limitações à autonomia municipal. Todavia, o contrôle ela execução orçament{tria foi. C01110 reg-ra quase geral, deixado

3S próprias câmaras municipais, ora com exclusividade, ora C0111 a colahoração elo órgão técnico estadual ele assistência aos :.YIu-nicípios, ora C0111 a possihilidacle de ser interposto recurso dos atos (' decisões da Câmara municipal ;\ Assembléia Le,~'is1ati\'a ou au Tribunal ele Contas do Estado.

;-~ómel1te no Estado do Parú t'

(27)

PANORAMA DA ADl\1. MUNICIPAL BRASILEIRA 27

Contas a atribuição de j11lgar as contas dos prefeitos:

b) para que se mantenham

dentro do espírito da Constitui-ção Federal, os Estados devem limitar a fiscalização das finan-ças municipais tão somente ao exame da legalidade dos atos fi-nanceiros dos Municípios, não lhes cabendo, porém, exercer o

contrôle da conveniência ou ch.

oportunidade dêsses atos. Fazen-elo uso daquela atribuição, diver-sos Estados resolveram inserir em suas constituições certos

pré-requisitos para a legalidade da~

npera(;ões financeiras das llluni-cipahlades. tais como a obrig:\-toriedacle ele concorrência púhli-ca para serviços, fornecimentos. ohras. concessEíes e alienaçüo de hens municipais, e ele p11hlicaçü() dos halancetes, cOlltratos e

011-tros atos financeiros. Ou011-tros e~­

tabeleceram restrições à

conces-são de isenções e favores fiscais pelos Municípios: e outros, ain-da, procuraram limitar as des-pesas com pessoal

proporcional-mente à receita do Município.

3. I ~:'(}la(ü() da autollont.Ía 1I11f-llin'/Jal 1)('10.1' COI1Stitlfi(i)('s estadl/ais:

Tôdas as constituiçõe~

esta-duais yiolarum, de algum modo,

o princípio da autonomia muni-cipal. Umas o fizeram mediante o contrôle, pelo Estado, da con-veniência e oportunidade das operações financeiras do l\funi-cípio. outras através do contrôle

da legalidade de atos e lei:;

11111-11 icipai s ele caráter

n;lO-financei-ro. Eis alguns exemplos:

11) Ú, assembléias legislativas

de vários Estarlos f\,i atribuído pelas respecti\'as constituições estaduais o poder de clecidirem :-,ôhre a con\'enil'ncia ele atos fi-nanceiros do :.\Iunicípio. a11l1-Jamlo ou submetendo tais atos ;\ sua prévia aprm-ação. Foram ()lJjet'J dessa interferência indé-I,ita elo Estado na aclministraçãn l1111nicipal. entre ou1ras, l[uestlies emno tributação gravosa 011 ex-ces:;iva. em]ll'l-stillloS interllos, desapropriação, conces.·;ão ele

pri-\'ilégios e isenções, \Tnda, hipo-teca. pUllluta. afora1l1ento e ar-rCllc1alllen to de hens

pertencen-tes ao :\f unicípio ;

(28)

ca-28

CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBL1CA

50S, as rendas municipais foram

limitadas pelos Estados através da reduçflo de impostos, da con-cessão cle anistia fiscal e do per-dão ele dívidas, ela limitação sô-1)re o "alur elas multas e do es-tabelecimento de limites e

proi-hições ú participação dos fiscais

e denunciantes no produto des-tas. O Supremo Tribunal

Fe-cleral, entretanto, já fulminou

C01110 inconstitucionais

dispositi-\'os da Constituição paulista que, estabelecendo isenções fiscais e concedendo o perdão de dívidas, lirnitayam a receita mu/nicipal, proclamando o Supremo

Tribu-nal que essa receita não é

sus-cetí vel de redução por ato do Es-tac!o :

() finalmente, algumas consti-tuições estaduais deram destina-ção específica a percentagens das rendas municipais. especialmen-te para aplicação dessas percen-tagens em serviços rurais, de educação, de assistência social,

ele saúde, de saneamento, de construção e manutenção de es-tradas e ele obras públicas. E ainda tornaram obrigatória a prestação ele certos serviços

pe-los l\í unicípios, como hahitaçflO

popular, hôlsas cle estuclos e bi-bliotecas, sem contudo lhes for-necer recursos espeCIaIS para

ISSO.

Parece haver duas razi'íes

prin-cipais para essas restrições à

au-tonomia municipal e para essas \'iolações da Constituição F e-(leral. Uma delas é a fôrça ela

tradição - de uma longa

tra-dição de centralização elos negó-cios municipais nas mãos do go-"êrno dos Estados e da União. .\ outra decorre de uma crença sincera e generalizada de que a maioria elos administradores mu-nicipais não possui competência técnica e maturidade política su-ficientes para gerir os dinheiros municipais sem o freio dos

con-trôles mencionados acima (52).

(29)

PANORAMA DA ADM. MUNICIPAL BRASILEIRA 28

Estrutura financeira

.\ mais importante reforma introduzida pela Constituição de

1946 110 regime 111l1nicipal bra~i­

!eiro foi sem dúvida a reestrn-turação das finanças municipais. Seguindo o exemplo de seus an-tecessores de 1934. os

constituin-tes dé~ 19·1-6 discriminaram ao;

rellda:; jJú1Jlicl s pelas três ór-bitas ele gü,,"êrno, mas o fizeram aquillhoando os ::\I unicípios de maneira tão gencro:,a, em com-paração com a situação de pc-núria c1:íssica dos :\h1l1icípios do interinr, que a nova

discrill1ina-(:ão de rendas reilete, melhor (F1C

tudo Jl1ais, () e~píritu

lllunicipa-li sta da Constituição ele 1946. Cinco espécies de illlpostos fu-ram reservados cxc1usi va1l1enie aos l\Iunicípios: 1) o predial

e o territorial urbanos; 2) o de

licença; 3) o ele indústrias e

profissões; 4) o impôsto sôbre

diversões públicas, e S) o

im-pôsto sôbre os atos de sua

eco-nomia ou assuntos de sua

C0111-petência (S3).

Foi ainela permitido aos go-\'ernos municipais lançar cOlltri-lluição de melhoria, cohrar taxas

c arrecadar quaisquer outras

ren-das resultantes do exercício cle

Sl1as atribuições e da utilização

dos bens e dos sE'rviços elo M

u-11 icípio (S4).

Essas fontes de renda não pa-receram, porém, aos constituin-tes, suficientes para fortalecer a economia municipal e preparar os l\Iunicípios para a tarefa que

lhes esUrn sendo reservada no

novo regime. Para se tornarem ll1embros eficientes da comuni-dade brasileira e para poderem participar eficazmente das res-ponsabilidades ela vida nacional, era mister que aos l\Iunicípios, principalmente aos do interior. couhesse parte dos dinheiros que

;1 inda eram arrecadados pela

l'niào e pelos Estados. A ri-queza brasileira vinha sendo tra-dicionalmente drenada elo inte-rior para os grandes centros ur-llanos, para o Rio de Janeiro e

São Paulo em particular.

ALIO-}\[AR BALEEIRO, um elos líderes da campanha municipalista na Constituinte, disse, no que equi-vale a uma interpretação autên-tica da Constituição, que era uma q11estão de solidariedade

nacio-(53) Constitucição BmRil,,;m d(' 19-46, art. 29.

(30)

30

CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

na! fôsse distribuída a receita pú-blica de maneira mais eql1itativa

e fôssem protegidos, as~im, Os

NIunicípios do interior, isto (', t()-dos aquêles que não são capitais

de Estado (55).

Foram cuidadosamente consi-deradas as dificuldades que re-sultariam da criação ele novos impostos municipais e da trans-ferência. pam o Município, de

certos tributos já existentes,

considerações essas feitas não só

il luz do critério da cOllvenii"ncia

e da produtividade (56), como

em face da oposição cerrada de certos setores ela .\ssemhléia

Constituinte (57).

A melhor soluçãu enco]ltrada COlbi.c;tiu m. participação, pelus

\Ir

ullicípio.,. de certos impostos

cobrado,; pela União e pelos F~­

tados, tendo a Constitllição dc-cretado que:

a) dez por cento du total ClUC

a União arrecadar do impôsto sôbre a renda serú entregue aus

Municípios, exceto os das capi-ta is. devendo a distribuic;âo

des-sa cota ser feita e111 partes

iguais (58);

h) elo impôs tu único feeleral

~úhre a proelução, o comércio, a distrihuição, o consumo e a

im-portação de lubrificantes e

C0111-hustíveis líquidos ou gasosos e, ainda, ]lO que fôr aplicável, de minerais do país c ela energia elétrica, doze por cento deverão :;cr entregues aos Municípios, em

c"tas rmjJorciOIlZtis à sua área

e população, ao seu consumo e

produ<;;io elêsses bens (59);

r') qt1ando a arrecada<;ão

c:;-t:u lual de impostos, exceto a d,) illljJ()slo de expurtação, exceller, ('lll :\Junicípin que não seja o da capital, n tulal das rendas mn-nicipais de qualquer natureza, o

J':stadn entreg;l.l'-lhe-ú anualmen-te trillta por cento elo exccss()

a rrecaclaclo ( 60) ;

d) dos novos tributos que

ve-nham a ser criados pela União

(55) ALIOMAR BAu:Emo, Mnnicipalis/110 em Tênnos FinClllcci;'o:l

I Série Finanças em Debate, vol. 4, Affonso Almil'o, editor, Rio d" Janeiro. Ediçõc~ Financeiras, S. A., 1(51), págs. 26-28.

(56 ) VALENTIM F. BOUÇAS, Oj). clt., págs. 448-49. (57) ALIOMAR BALEEIRO, op. cit., pág. 23.

(SS) Constituição llrasileil'Cl de 1946, art. 15, VI, 4.

(59) lbid., al't. 15, § 2.°. A cota exata de doze por eento foi

!'stabe!ecida maL; tarde Tll'lu Lpi i'etlcnd n.o 1. ;':'72-A, dl' 12 de dPZi Ill-bro de 1950.

(31)

PANORAMA DA AVl\1. MUNICIPAL BRASILEIRA 31

(' lJt'los Estauus, /juarellta jJur cento dl'\'rrão ser entregues aos I\Iuni,·ípio., ullcle se tivrr

re:11i-z:1do a cu!ml11ça (61).

As cláusulas constitucionais excluindo os Municípios da ca-pital se justificam em face da situação financeira privilegiada

dêsses 1J unicí pios em relação aos

do interior. De fato, apesar de sC'n número ser apenas de yinte e um, suas rendas foram. em

1 CJ50. e incluindo as do Distrito

Federal. duas __ êzes a SOl1la das

rlo~ outros 1.873 l\I unicípios. SÚ () Distrito Federal arrecadol1

mais do que todos os 1.873

M\1-Ilicípios do interior; e as vinte capitais de Estado, mais da me-tade do que arrecadaram tod()s

:1ljtlêles l\lunicípios (62).

:!\Ias, comparando-se a recei-ta at\1al dos l\lunicípios com a da União e a dos Estados, te111-se novamente um grande dete111-se- dese-quilíbrio em desfavor dos pri-meiros, situação crônica q\1e a Constituição de 19·tó não

altc-(61) Ibid., art. 21.

rou profundalllente, apesar dl' tndo, e (jue continua a fornecer o mais forte argumento dos 111U-llicipalistas para uma nova dis-criminação de rendas em hvor dos Municípios.

Ao tempo do presente estudo, a principal fonte de receita m\1-nicipal era o impôsto de

indús-trias e profissões. O impôsto

predial e territorial url )ano "i-n ha em segu"i-ndo lugar, as taxas em terceir(l, e o ill1pôsto de

li-cença em quarto lugar (63).

Entretanto. para o Município brasileiro típico, a cota do im-])()sto sôbre a renda representa a sua maior fonte de receita, dei-xando longe llualquer das outras

acima. E1I1 1950 aquela cota,

(Jue é igual para todos os Mu-I !icípi()~, [ui ele rên'a ele ... .

Cr$ 256. 5~8,OO, Elas, segundo

dcchraçiiu feita ;l imprensa (64)

1 ,elo Diretor elo Impôsto sôbrc

;l l{cn<1a, a mesma seria de

cêr-ca ele seisce11tos mil cruzeiros em

1 f) 53 (Cl.'í).

(62) Instituto Brasileiro de Ueog'rafia e Estatística, Anuá1'io Estatístico do Brallil, Ano XII, 191)1 (Rio de Janeiro, I.B.G.E., 1952), págs. 491-512.

(63) Ibid., págs. 491-512.

(64) Despacho da Agênci,l Meridiona1, O Estado do Parauá (Curitiba), 25 de agôsto de 1953.

(32)

exer-32

CADERNOS DE AD~HNU3TRAÇÃO PÚBLICA

U siglliiicaclo dc:)sas impurtàn-oas, aparentemente pe4uenas, para os orçamentos l11unicipais, eleve ser compreendido em têr-mos da completa incapacidade iinanceira qne caracterizava o Município brasileiro típico an-tes da reforma ele 1946. ;.J o ye-lho e populoso Estado da Bahia, por exemplo, oitenta e três elas suas cento e cinqüenta e 11111a comunas tinham, em 1939, Ullla renda total de menos ele CC111 contos cada uma e muitas den-tre elas tinham um orçamento anual de menos de quinze

cou-tos (66). Não foi sem razft()

que alguém apelidou a cota do impôsto sôbre a renda de salário

mínimo dos Municípios (67). Todavia, muitos dos problemas financeiros municipais continuam insolúveis. Alguns dêsses pro-blemas têm suas causas em difí-ceis condições econômicas de na-tureza geral, cujo contrôle e~t;í

fora elo âmbito ele ação elos go-vernos locais. O

subelcsel1\'ol\'i-lil\:ll1." l'c"ll'lllli,,) c ~l ;.(cllcraliza-da jlo1Jreza do país tornam im-produtivos os tributos 11 lt1l1 i c i-pais: daí o sistema ele participa-ção dos municípios nas renelas icderais e estaduais, acima expli-cado. Ontras diiiculdadcs resul-tam ela falta ele uma política fis-cal cle âmbito nacional. assunto da competência elo govêrno fe-deral. Desejam as \l1unicipalis-tas a elaborac;ão (\, Ulll Cócligu Trilmtúrio ?\ acionai que' venha a t, ,rt1ar () sistema trilmtúrio du país ma is racional c bem assim alencler ús rejyinrlicac,tíes 111\1-nicipalistas (68). Xão são me-110S sérios us problemas que de-correm cla própria organizaçãu e administração financeiras dos \Iunicípios, especialménte no '1ue concerne à carência de co-nhecimentos e de seni(;os téc-lJicos. EI1l geral. os métodos 11 sacias pelos :'1 ullicípios são os mais rudimentares, mesmo el1l assuntos tecnicamente comple-xos, como lançamento de

impos-cício de 1953, foi de Crili 478.338,90. Talvez o otimismo daquela auto-ridade tenha sido devido ao fato de não haver êle previsto o aumento do número de Municípios e a conseqüente diminuição do valor da cota. (66) "Bibliografia", Revista Brasileira elos Municípios, janeiro-junho, 1948, pág. 139.

(67) VALENTIM F. BOUÇAS, o]l. eiL, pág. 451.

(68) Carta de Dcclamção de Princípios, Direitos e

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