CAROLINA MATTAR JULIEN DE TOLEDO PIZA
Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo" Escola Paulista de Medicina, para obtenção de título de Mestre em Ciência
Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo" Escola Paulista de Medicina, para obtenção de título de Mestre em Ciência
Orientador: Prof. Dr. Orlando Francisco Amodeo Bueno
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Presidente da banca: Prof. Dr.
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr.
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Prof. Dr.
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Prof. Dr.
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Aprovada em: .../.../ 2009
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA DEPARTAMENTO DE PSICOBIOLOGIA
Chefe do Departamento: Maria Lucia Oliveira de Souza Formigoni
Coordenador do Curso de Pós"Graduação: Maria Gabriela Menezes de Oliveira
Em especial, ao querido Prof. Dr. Orlando pela sua calma, paciência e por sua grande sabedoria de nos ensinar simplesmente com seu silêncio!!
Ao mestre e amigo Elizeu, por todos os seus ensinamentos e por ter me introduzido à neuropsicologia. Sem dúvida todas as conversas, horas de estudo, congressos, aulinhas, etc. contribuíram (e contribuem) muito para minha formação profissional e pessoal.
Às companheiras e hoje, queridas amigas Thais e Camila, pela ajuda, paciência(!!), conquistas e pelo grande desafio que nos aproximou: o ambulatório de Distúrbios de Aprendizagem!
Aos admiráveis coordenadores do NANI: Claudia, Mônica e Mauro, que com tanto empenho e sabedoria realizaram um sonho, do qual hoje com orgulho faço parte. Ao querido amigo Dr. Carlos Osório, que em muitos encontros, cafés e discussões filosóficas, foi me aproximando das neurociências e do mundo clínico, que tanto aprecio.
Aos queridos Nayne e Tiago, por todo o empenho e dedicação, paciência e quebradas de galho!
Aos companheirões Giuly, Dani, Pri, Thiaguinho, por todos os projetos, papos
filosóficos, encontros, etc. Sem dúvida vocês tornaram este meu processo muito mais prazeroso.
Às amigas do NANI, em especial Gislaine, Mari, Alessandra, Tereza, Josi, Cazinha, Flavinha, Fer, Tati, Elayne, Ana Navatta: é uma delicia crescer e aprender com vocês! Aos amigos do CPN, em especial Sil, Verinha e Maira, que sempre se aproximaram com um sorriso acolhedor!
À Tâmara, por toda sua organização e flexibidade (!), aos amigos da Psicobio, em especial Leo, Ivanda, Sabine, Dani
Aos companheiros Mônica e Beto, Cacá, Fer, Katka – foi com vocês que tudo começou e acho que sabem o quão importante foram (e são) para mim em todo este processo de crescimento.
À secretaria da Psicobio: Nereide, Mara, Julio, Valéria, Natália, Mel, Junior. Vocês são incríveis, obrigada pelas inúmeras ‘ajudinhas’ e por toda a dedicação!
“Last but not least”, à minha querida família, Helinho e amigos, que sem dúvida agüentaram momentos de estresse, explosão, irritação e muitos “não dá..”. Love you all!
Agradeço ao Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) pelo financiamento
cedido para a realização da presente pesquisa.
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2.1. Processos de Leitura...3
2.2. Distúrbios de Aprendizagem e Dislexia do Desenvolvimento...9
2.3. Subtipos de Dislexia...14
2.4. A avaliação de Leitura e Escrita...18
.' '''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''',/ 3.1. Sujeitos...24
3.2. Material...24
3.2.1. Instrumentos utilizados para Critérios de Inclusão...24
3.2.2. Instrumentos utilizados para Comparação dos Grupos...26
3.3. Procedimentos...28
3.3.1. Aplicação da BALE"Computadorizada no grupo dos Disléxicos...28
3.3.2. Formação dos Grupos Controle...29
3.3.3. Procedimento para análises dos resultados...30
/' ''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''.* 4.1. Caracterização dos Grupos...31
4.2. Desempenho nas provas da BALE"Computadorizada...33
4.3. Padrão de leitura no TCLP...35
4.4. Correlações entre as provas da BALE"Computadorizada...37
0' + '''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''/1 2' 3 4 ''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''01 5 '''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''0.
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A análise dos processos cognitivos subjacentes aos processos de leitura e
escrita pode auxiliar na identificação de diferentes perfis de leitura. No presente
estudo o objetivo foi comparar crianças disléxicas a dois grupos controle: um
pareado por idade cronológica e outro pelo nível de leitura, a fim de verificar
possíveis diferenças no desempenho dos grupos em uma bateria de leitura e
escrita nacional. Método: foram avaliados 28 disléxicos (DX) de ambos os
sexos, com idade média de 9,82 (±1,44)anos, estudantes de escolas públicas
e particulares. Estes foram comparados com: 1)
(AC), composto por 26 leitores competentes, com idade média de 9,77 (±1,37)
anos, pareados por idade, série, sexo e tipo de escola; 2)
(RC), composto por 28 leitores com idade média de 7,82 (±1,06)
anos, pareados por sexo, tipo de escola e desempenho de leitura em tarefa de
compreensão de sentenças (TCSE). Os grupos foram avaliados em quatro
provas da Bateria de Leitura e Escrita Computadorizada " a BALE"
Computadorizada: o Teste de Competência de Leitura de Sentença (TCSE),
Teste de Competência de Sentença Falada (TCSF), Teste de Competência de
Leitura de Palavra (TCLP) e Teste de Nomeação de Figuras por Escrita
(TENOFE). Estas provas avaliam o padrão de leitura de palavras e
pseudopalavras, leitura de sentenças, compreensão de sentença oral e escrita
de palavras. Resultados indicaram que disléxicos apresentaram um total de
acertos inferior e tempo médio de execução mais elevado, quando comparados
ao grupo AC em todas as tarefas. Quando comparados ao grupo RC, não
foram observadas diferenças no total de acertos das provas de leitura, nem na
prova de compreensão oral. Entretanto, disléxicos permaneceram com uma
lentidão no tempo de execução da leitura e obtiveram um escore total na
escrita significativamente inferior, mesmo quando comparados aos leitores
mais novos. Análises detalhadas dos tipos de erro na prova de leitura de
palavras e pseudopalavras (TCLP) apontaram que disléxicos obtiveram
escores inferiores aos grupos na leitura de pseudopalavras, principalmente
as que envolviam um processamento fonológico, ou decodificação ortográfica.
mais novos no total de acertos de leitura de palavras e na compreensão oral de
sentenças, porém déficits específicos na decodificação fonológica e no
armazenamento visual (léxico), bem como na velocidade do processamento da
leitura, diferem estes grupos.
- - 9 dislexia do desenvolvimento, avaliação
computadorizada, estratégias de leitura, processamento fonológico
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A dislexia do desenvolvimento é um dos transtornos da infância de maior
prevalência, atingindo de 5 a 10% da população brasileira. (Santos e Navas,
2002; Capovilla e Capovilla, 2004). Este é um quadro que causa grandes
impactos no desempenho educacional e psicossocial do indivíduo, o que
reforça a necessidade de termos profissionais da saúde e educação
qualificados para lidar com esta população. (Ciasca, 2000; Capovilla e
Capovilla, 2002; Schoen"Ferreira et al., 2002; Bishop e Snowling, 2004; Franco
de Lima, 2006).
Segundo alguns autores (Manis et al., 1996; Shaywitz & Shaywitz, 2005), a
dislexia pode ser classificada por meio de um modelo dimensional, ou seja, faz
parte de um continuum no qual indivíduos com distúrbios de aprendizagem
(D.A) localizam"se na ponta inferior do espectro e leitores fluentes e
competentes no extremo oposto. De tal forma, verifica"se que o distúrbio se
manifesta em diferentes níveis e graus de severidade, o que faz com que os
indivíduos acometidos apresentem variações nas habilidades de linguagem, na
aquisição da leitura e escrita, bem como nos processos cognitivos associados
(Bryant e Impey, 1986; Manis et al. 1996; Griffiths e Snowling, 2002).
Seguindo tal pressuposto, o presente estudo pretende investigar os
processos relacionados ao desenvolvimento de leitura e escrita, em indivíduos
com transtornos específicos de leitura. Para tal, é necessário primeiro
compreender como se estabelece o processo de aquisição de um sistema de
leitura e escrita no leitor iniciante e proficiente, para em seguida compreender o
que ocorre nos quadros de dislexia.
Para investigar estes processos, foram utilizados instrumentos que fazem
parte da Bateria de Leitura e Escrita Computadorizada (BALE"
Computadorizada), desenvolvida por Macedo et al. (2005). Tal bateria é
composta por um total de sete testes que avaliam o desenvolvimento de
competências lingüísticas e acadêmicas de leitura e escrita. É um instrumento
brasileiro, normatizado e padronizado para crianças da 1ª a 4ª série, que
fundamenta"se na psicologia cognitiva e permite investigar o padrão de acertos
utilizada para identificar crianças com dificuldades no processo de
alfabetização, o que possibilita uma maior compreensão sobre o
desenvolvimento destas habilidades e quais os principais aspectos a serem
trabalhados em um plano de intervenção.
Entretanto, até o presente momento existem poucos estudos com
utilizando a BALE"Computadorizada (Capovilla, Macedo e Capovilla, 2004;
Lukasova et al., 2008). Investigar o desempenho desta população clínica,
utilizando um instrumento nacional é de grande valia, uma vez que a BALE"
Computadorizada focaliza"se na análise dos processos subjacentes à
habilidade de ler, seja no leitor competente, no leitor iniciante, ou nos com
distúrbios de leitura. Desta forma, o presente estudo teve por objetivo comparar
o desempenho de crianças disléxicas a dois grupos controle: um pareado pela
idade e outro pelo nível de leitura. Por meio de tal comparação, pretende"se
analisar o perfil de leitura e escrita dos grupos a fim de verificar possíveis
diferenças entre disléxicos e bons leitores de diferentes faixas etárias.
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A análise da história da escrita mostra que houve uma mudança ao
longo dos séculos dos diferentes sistemas de escrita. Tais mudanças
contemplam diferentes sistemas que vão desde os pictogramas aos
ideogramas, passando aos silabários, e finalmente, chegando à forma usada
atualmente na nossa cultura, que é denominada de alfabeto. A evolução do
sistema alfabético, com a diminuição progressiva do número de sinais (ou
unidades) usados para escrever, tornou a escrita cada vez mais acessível a um
maior número de pessoas. Entretanto, diferentes sistemas de linguagem escrita
coexistem com o sistema alfabético. A adoção e rejeição destes diferentes
sistemas parece estar bastante ligada às variáveis sociológicas e políticas
(Ellis, 1995; Lecours e Parente, 1997).
O processo de aquisição do código escrito de uma língua depende do
tipo de sistema de escrita. Assim como o desenvolvimento da escrita, todo o
processo de alfabetização também passa por fases evolutivas até que o
indivíduo encontre"se alfabetizado por completo (Ellis, 1995; Lecours e
Parente, 1997). Entender o processo de aquisição de um sistema de leitura e
escrita por uma criança inserida na nossa cultura é de extrema importância,
pois boa parte do conhecimento produzido pela nossa sociedade é transmitido
por meio da representação escrita.
Teorias da neuropsicologia e da psicologia cognitiva, há algumas
décadas, descrevem as diversas etapas do processo de alfabetização com
base na abordagem de Processamento de Informação (Ellis, 1995; Sternberg,
2000; Capovilla, 1998; Salles, Parente e Machado, 2004). Por ,
entende"se a transformação da informação, desde seu estado inicial, passando
por uma série de etapas, até um terminal. Os modelos de Processamento de
Informação tipicamente descrevem os processos perceptuais, cognitivos e
motores, representando"os esquematicamente em fluxogramas, que
descrevem o fluxo da informação e suas transformações sucessivas ao longo
internacionais ao investigar os processos cognitivos relacionadas ao
desenvolvimento da leitura e escrita da dislexia. (Nunes, Buarque, Bryant,
2001; Santos e Navas, 2002; Capellini e Ciasca, 2003; Capovilla et al., 2004;
Barbosa et al., 2009a; Salles e Parente, 2006 e 2008).
Na neuropsicologia cognitiva, um dos pressupostos básicos, intrínseco a
esta abordagem é o de que sistemas cognitivos funcionam em módulos de
relativa independência (Luria, 1981; Salles et al., 2004). Tendo em visto tal
postulado, pode ocorrer um dano em um módulo sem que o funcionamento de
outros módulos seja afetado (ex: linguagem oral, memória, percepção visual,
etc.). Cada módulo se organiza em sistemas, de maneira que alguns processos
podem estar prejudicados enquanto que outros se mantém preservados. Um
exemplo seria os casos em que alguns processos de leitura estão adequados,
enquanto que outros estão deficitários (por exemplo, a leitura de palavras de
alta freqüência está adequada, enquanto que a leitura de pseudopalavras, ou
palavras irregulares está prejudicada) (Salles et al., 2004).
Desta maneira, pela ótica da neuropsicologia cognitiva, avaliar as
habilidades de leitura em quadros de dislexia, envolve não só definir se o leitor
é ou não capaz de decodificar o estímulo, mas sim identificar como estão
funcionando os módulos, ou seja, as habilidades cognitivas subjacentes a este
processo (Manis et al, 1999; Griffiths e Snowling, 2002; Bishop & Snowling,
2004, Salles et al., 2004; Salles e Parente, 2006).
Ainda com base na abordagem de Processamento de Informação,
teorias da psicologia cognitiva (Ellis, 1995; Fritz, 1997; Capovilla e Capovilla;
2000) descrevem que o processo de aquisição da leitura e escrita desenvolve"
se a partir de três estratégias básicas: a , a e a
. A primeira etapa, denominada de , caracteriza"se pelo
reconhecimento da palavra por meios de esquemas idiossincráticos. Neste
processo o indivíduo utiliza"se de pistas contextuais em vez de decodificação
alfabética (Capovilla e Capovilla, 2000).
A segunda estratégia, que se desenvolve na fase é chamada
e implica em analisar as palavras fazendo uma correspondência
entre letras e fonemas. Na escrita alfabética, as crianças tornam"se capazes de
individuais e de mapeá"los nas letras correspondentes. Contudo, para poder
fazê"lo, elas precisam conhecer as transposições entre os grafemas e os
fonemas. De tal maneira, elas passam inicialmente pela leitura alfabética sem
compreensão, na qual se tornam capazes de converter uma seqüência de
letras em fonemas, mas ainda não identificam seu significado. Em seguida,
adquirem o significado, caracterizando a leitura alfabética com compreensão.
(Capovilla e Capovilla, 2000)
Finalmente, a terceira e última etapa é a , que implica na
construção de unidades de reconhecimento nos níveis lexicais e morfêmicos.
Neste processo, as crianças lêem reconhecendo as unidades morfêmicas.
Sendo assim, o reconhecimento visual ortográfico está relacionado diretamente
ao sistema semântico.
O processo de decodificação fonológica, utilizado em fases alfabéticas, é
fundamental para a aquisição subseqüente das representações ortográficas
das palavras, pois o acesso à pronúncia e ao significado pode ser obtido por
meio de dois processos, um direto, e outro indireto. O modelo da dupla rota,
proposto por Ellis e Young (1988) (Ellis, 1995; Morais, 1996; Pinheiro, 2001),
surge a partir de modelos cognitivos, com base no processamento de
informação. Tem como pressuposto a existência de duas principais rotas
envolvidas nos processos de leitura; são estas a rota e a rota .
A leitura pela rota fonológica baseia"se na correspondência entre grafemas e
fonemas possibilitando a decodificação das letras em seus sons. Já a leitura
realizada pela rota lexical se dá por um sistema direto de leitura, que utiliza
mapeamentos das palavras impressas e o acesso direto ao seu significado.
Ou seja, na rota fonológica a palavra sofre processos de segmentação e
decodificação fonológica, sendo feita a conversão grafema"fonema. Depois da
conversão, as unidades são combinadas, resultando na formação de um todo
fonológico. Por outro lado, se este todo fonológico já tiver sido ouvido antes, e
seu padrão auditivo for conhecido (por exemplo, o leitor já tem a representação
fonológica da palavra armazenada em seu léxico auditivo), todo o fonológico
ativa sua correspondente forma ortográfica e/ou sua correspondente
representação semântica (i.e: o significado da palavra). De tal forma, a palavra
pode ser pronunciada.
da aplicação de regras de correspondência grafo"fonêmicas. O acesso ao
significado é alcançado mais tarde, quando a pronúncia da palavra (sua forma
fonológica) ativa o sistema semântico. Contudo, pode haver leitura sem que
haja acesso ao significado. Assim sendo esta rota possibilita a leitura eficiente
de pseudopalavras e de palavras de baixa freqüência de ocorrência na língua,
desde que as relações grafo"fonêmicas envolvidas sejam regulares. (Griffiths &
Snowling, 2002).
À medida que o leitor torna"se mais competente, o processo de
conversão grafema"fonema torna"se progressivamente mais automático, e as
seqüências de letras passam a ser usadas como unidades de processamento.
Na rota lexical de leitura, o item também sofre uma análise visual inicial,
antes de ser processado pelo sistema de reconhecimento de palavras. Para
que o item escrito seja reconhecido como palavra, sua forma ortográfica já tem
que estar representada no léxico ortográfico. Quando o item for reconhecido
como palavra, suas formas ortográficas (ex: morfemas e palavras) são
ativadas. Neste ponto, há dois possíveis caminhos para alcançar a pronúncia.
1) A primeira possibilidade é que a forma ortográfica ative sua
representação semântica, antes de ativar a forma fonológica, até que a
pronúncia ocorra. Esta rota e chamada léxico"semântica, pois a fala ocorre por
mediação do sistema semântico, ou seja, por meio do significado da palavra.
2) A segunda possibilidade é que a forma ortográfica ative diretamente a
forma fonológica, a qual ficara armazenada no buffer fonológico, até que a
pronúncia ocorra. De tal forma, a pronúncia ocorre a partir da forma ortográfica
das palavras, e não por seu significado. Esta rota chama"se rota lexical direta,
pois a pronúncia é obtida diretamente, sem acesso ao sistema semântico.
Para exemplificar, esta é a rota utilizada para a leitura de palavras do tipo
irregular ou regra, assim como para a leitura de palavras regulares de alta
freqüência (Pinheiro, 2001; Griffiths e Snowling, 2002).
No início do processo de alfabetização a rota fonológica é geralmente a
mais usada, tendo um papel fundamental na aquisição da lecto"escrita. A
aquisição deste primeiro processo, de analisar e segmentar as palavras, é uma
condição indispensável para a subseqüente leitura de palavras irregulares, ou
aprendizagem normal, a própria prática da leitura proporciona à criança a
oportunidade de familiarizar"se visualmente e memorizar as palavras com
exceções à ortografia natural da língua. Desta forma, com o aumento da
competência da leitura e do léxico ortográfico e semântico, a rota lexical passa
a ser a rota preferencial (Cervera"Mérida e Ygual"Fernández, 2006).
Estudos sobre as estratégias de leitura e escrita de palavras em crianças
brasileiras (Pinheiro, 2001; Salles e Parente, 2006 e 2007) evidenciaram que
há um uso equilibrado dos processos de decodificação lexicais e fonológicos
na leitura de crianças da primeira à quarta série. Entretanto, nos estágios
iniciais de alfabetização, há um uso predominante da rota fonológica, apesar de
serem observados sinais de influência lexical desenvolvendo"se
concomitantemente. No estudo de Salles e Parente (2007), com crianças da 2ª
série, observou"se que estas obtiveram um escore mais baixo na leitura de
palavras irregulares, quando comparadas às regulares, pois neste estágio,
crianças ainda têm menor conhecimento destes estímulos, principalmente dos
de baixa freqüência. Assim sendo, observou"se que nesta etapa as crianças
ainda não tiveram oportunidade de desenvolver um conhecimento lexical a
ponto de reconhecer estes estímulos visualmente.
Isso demonstra que as estratégias fonológicas e lexicais não são
mutuamente excludentes, porém sua aplicação e importância relativa
diminuem, continuando a existir mesmo no leitor competente. Este fará uso ou
lançará mão de cada uma delas dependendo do item a ser lido ou escrito.
(Capovilla e Capovilla, 2000)
Ainda com relação à importância da decodificação fonológica para a
aquisição de leitura e escrita, faz"se necessário citar que o processamento
fonológico envolve três principais habilidades. São estas: o acesso ao léxico
mental, a memória operacional fonológica e a consciência fonológica. (Capellini
& Ciasca, 2000; Grifiths e Snowling, 2002; Capovilla & Capovilla, 2002;
Baddley, 2003; Gathercole et al., 2006; Barbosa et al., 2009).
O acesso ao léxico mental diz respeito à habilidade de ter acesso fácil e
rápido às informações armazenadas na memória de longo prazo. Também
envolve uma adequada capacidade metalingüística, uma vez que essa
nos processos de decodificação e codificação durante a leitura e a escrita
(Santos e Navas, 2002).
A memória operacional fonológica refere"se tanto ao processamento
ativo quanto ao armazenamento transitório de informações fonológicas
(Baddeley, 2003; Gathercole et al, 2006; Barbosa et al., 2009) e reflete as
habilidades de representar mentalmente características fonológicas da
linguagem.
A consciência fonológica refere"se à capacidade de perceber, ou ainda,
estar consciente, de que os sons da fala podem ser fragmentados em unidades
menores e que estas unidades podem ser manipuladas para formar novas
palavras com um novo sentido (Capellini & Ciasca, 2000; Santos e Navas,
2002; Capovilla & Capovilla, 2002). Este processo é um dos componentes
fundamentais para o desenvolvimento da fala, assim como está intimamente
relacionado à aquisição da leitura e escrita.
Portanto, os processos subjacentes à leitura, como a consciência
fonológica, a memória operacional fonológica e a recordação visual das
palavras, ou seja, o acesso ao léxico visual, semântico e ortográfico, estão
intimamente relacionados à aquisição da leitura e da escrita (Capellini &
Ciasca, 2000; Santos e Navas, 2002; Capovilla & Capovilla, 2002; Cervera"
Mérida e Ygual"Fernández, 2006).
Identificar estes processos auxilia a discriminar qual o padrão de leitura
esperado para um leitor em estágio inicial e para um em estágio avançado,
considerado um “leitor competente”. Sendo assim, é possível determinar em
que fase deste continuum a criança se encontra, e se há ou não um atraso. De
tal forma é possível utilizar estas informações para a prevenção, identificação e
intervenção precoce, com um plano de remediação para as habilidades
deficitárias (Gregoire, 1997; Orsati et al., 2005, Salles e Parente, 2006).
Em quadros de distúrbios da leitura e escrita, estas investigações são de
extrema importância, pois ajudam a identificar se existe uma rota de leitura
predominante e/ou um prejuízo específico no processo de decodificação, bem
como nas habilidades cognitivas subjacentes. Também possibilita distinguir
crianças que apresentam dificuldades especificas na leitura de textos, daquelas
decorrente de problemas de linguagem oral, por exemplo (Griffiths e Snowling,
2004). Portanto, compreender como ocorre o desenvolvimento da lecto"escrita
em leitores saudáveis gera maior compreensão acerca do que ocorre quando
há um desvio no desenvolvimento destas habilidades.
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Após uma breve descrição dos processos de aquisição da leitura e
escrita em leitores competentes, serão discutidos a seguir conceitos
relacionados aos quadros de dificuldades de aprendizagem, nos quais o
desenvolvimento da leitura e/ou escrita encontra"se prejudicado. Será dada
maior ênfase aos fatores etiológicos e cognitivos, principalmente observados
na dislexia do desenvolvimento. Para tal, faz"se necessário distinguir os
diferentes quadros que compõe este vasto espectro.
Dados revelam que no Brasil, 30% a 40% das crianças das primeiras
séries apresentam dificuldades de aprendizagem (Ciasca, 2003). De acordo
com alguns autores, essas dificuldades, juntamente com a adaptação escolar,
representam 35% dos motivos para consultas pediátricas na fase dos seis aos
vinte quatro anos de idade e são responsáveis por 45% dos atendimentos em
saúde mental no mundo (Muñiz, 2001).
Entretanto, dentre os quadros de dificuldade de aprendizagem, há duas
distinções importantes: a primeira seria de indivíduos com dificuldades
escolares, que refere"se à alterações de origem e ordem pedagógica, ou
ambiental. Nestes quadros, surgem problemas com matérias escolares de uma
forma geral, sem prejuízos em módulos específicos. Já a segunda, refere"se
aos transtornos, ou distúrbios de aprendizagem (D.A), que se caracterizam por
um quadro de origem neurobiológica, relacionado a uma alteração no sistema
nervoso central, que interfere no processo de aquisição e desenvolvimento das
habilidades escolares especificas (leitura, escrita e/ou matemática), mas que
apesar disso apresentam prejuízos no desenvolvimento do nível intelectual
As dificuldades na aprendizagem de leitura e escrita são bastante
divergentes e nem toda dificuldade de leitura pode ser caracterizada como um
distúrbio de aprendizagem, ou ainda, uma dislexia (Capovilla et al., 2004).
Medidas exclusivamente quantitativas para avaliar quadros de distúrbios da
aprendizagem podem gerar confusões diagnósticas com quadros de
dificuldades escolares, outros quadros de linguagem mais globais, ou até
distúrbios específicos de linguagem (DEL), uma vez que diferentes transtornos,
com origens causais distintas, geram perfis comportamentais similares. (Bishop
e Snowling, 2004; Scuccimarra et al., 2008). No nível comportamental, uma
criança pode ser identificada com dificuldades em habilidades de leitura, escrita
e compreensão oral, etc. Porém, sobreposições no nível comportamental, não
necessariamente significam que os transtornos sejam os mesmos. Falar,
compreender, ler e escrever são processos complexos e prejuízos nestas
habilidades podem refletir déficits em diferentes habilidades subjacentes.
(Bishop e Snowling, 2004).
Um quadro de distúrbio de aprendizagem é identificado por um conjunto
de sinais sintomatológicos que provocam uma série de comprometimentos no
aprender da criança, interferindo principalmente nos processos de aquisição da
leitura. De tal maneira, são observadas dificuldades em tarefas específicas
(Ciasca, 2003; Salles et al., 2004).
Nos D.A, há fatores referentes à história familial positiva
(hereditariedade), presença de disfunção neuropsicológica originada por
alterações do funcionamento cerebral como desencadeante dos problemas
específicos de aprendizagem (Capellini, 2005). Já, as dificuldades escolares
têm como causa principal: fatores emocionais, familiares, ambientais, sócio"
econômicos e pedagógicos, estando os fatores biológicos e cognitivos
preservados (Ciasca, 2003). Segundo Campos (2001), a dificuldade não
necessariamente se origina de causas orgânicas e o quadro é visto como uma
condição de vulnerabilidade psicossocial que, quando trabalhado, pode ser
removida.
Além disso, quadros de D.A são muito menos freqüentes que casos de
dificuldades escolares e o primeiro se caracteriza por uma maior especificidade
com dificuldades escolares tenham de fato um distúrbio de aprendizagem, que
pode ser dividido em três principais subgrupos: a dislexia, ou transtorno
específico de leitura; a disgrafia, ou transtorno da expressão escrita; e a
discalculia, ou transtorno específico de matemática.
Dentre os subtipos de D.A os quadros de transtorno específico de
leitura, também chamados de dislexia, são os que ocorrem com maior
freqüência. Existem algumas variações quanto às incidências do quadro na
população, entretanto não existem diferenças entre dados brasileiros e as
estimativas mundiais. Autores nacionais e internacionais apontam que os
distúrbios de leitura e escrita sejam um dos quadros neuro"comportamentais
que mais afeta crianças, com uma prevalência de 5 a 10% da população
mundial, chegando a 17% (Shaywitz, 1998; Santos e Navas, 2002; Bishop e
Snowling, 2002; Capovilla et al., 2004). Estudos apontam que
aproximadamente quatro em cada cinco casos de D.A são de dislexia, podendo
ou não, ocorrer concomitantemente com distúrbios de matemática (discalculia),
ou da expressão escrita (disgrafia) (DSM"IV).
O National Institute of Health USA (Orton Dislexia Society, 1995),
define a dislexia como um “transtorno específico da linguagem de origem
constitucional e caracterizado por dificuldades em palavras
isoladas, geralmente refletindo habilidades de processamento fonológico
deficientes, freqüentemente inesperadas em relação à idade e outras
habilidades cognitivas e acadêmicas. Essas dificuldades não são resultantes
de um distúrbio geral do desenvolvimento ou de problemas sensoriais”.
Definições mais atuais, recomendadas pela Associação Internacional de
Dislexia, enfatizam que tal transtorno é caracterizado por dificuldades
significativas no reconhecimento fluente e/ou preciso de palavras (leitura) e por
um pobre desempenho em provas de ditado (escrita) e decodificação em
indivíduos que apresentam um nível de inteligência dentro da média e uma
motivação considerada necessária (Lyon et al. 2003; Shaywitz & Shaywitz,
2005).
Esta atualização enfatiza que a maior dificuldade não se restringe a
decodificação de ‘uma só palavra’, mas sim à falta de desenvolvimento de uma
persiste na fase adolescente e adulta. Outra modificação esclarece que apesar
do distúrbio ser específico de leitura, as dificuldades mais freqüentes abrangem
também o espectro da escrita e ortografia (Shaywitz & Shaywitz 2005).
Tal divergência na definição da dislexia surge porque as dificuldades
de aprendizagem e de leitura nestes quadros se modificam com o tempo e
indivíduos disléxicos não apresentam as mesmas características ao longo de
toda vida. Um perfil muito comum é o do estudante, que no inicio da educação
primária apresenta grande dificuldade para analisar e segmentar palavras, com
o uso inadequado de correspondências grafo"fonêmicas. Conforme já citado,
em uma criança com o desenvolvimento adequado, a prática da leitura
possibilita que esta criança se familiarize com as palavras e memorize a forma
visual, tanto de palavras regulares, como de palavras irregulares. Entretanto,
uma criança que apresenta dificuldades neste primeiro estágio da
aprendizagem alfabética, dependerá de todos os seus recursos de atenção
para conseguir executar exclusivamente a decodificação grafema"fonema.
Desta forma, tende a demorar mais tempo para automatizar esta tarefa, uma
vez que dispõe de poucos recursos livres para memorizar as palavras
irregulares ou regras, que exigem conhecimentos ortográficos e a
aprendizagem de regras da língua (Cervera"Mérida, 2006). Tal circunstância
atrasa a aprendizagem de palavras que envolvem a automatização, como é o
caso da ortografia.
Pesquisas com disléxicos adolescentes e adultos (Cervera"Mérida,
2006; Berninger et al, 2008), cada vez mais documentam problemas de escrita
e ortografia como sintomas deste quadro que permanece durante toda a vida.
A compreensão e aquisição de regras ortográficas depende de um sistema de
ensino apropriado, com instruções adequadas, que ajudem o indivíduo a
automatizar este processo. Isto envolve estimular mecanismos de
metacognição e de memória visual, possibilitando que o disléxico automatize
as informações ortográficas. De tal forma, pode"se perceber que conhecer as
estratégicas cognitivas intrínsecas à alfabetização também auxilia o
clínico/pesquisador a conhecer melhor os déficits encontrados na dislexia,
assim como nortear os processos de intervenção necessários para trabalhar o
Ainda revisando critérios diagnósticos clássicos como o DSM"IV ou o
CID"10, observa"se que tais definições pressupõe uma discrepância de um ou
dois desvios padrão entre rendimento em provas de leitura padronizadas e o
coeficiente intelectual (QI), pois partem do pressuposto que um déficit
específico (na leitura) ocorre na ausência de prejuízos em habilidades
cognitivas gerais. Entretanto, tais critérios não especificam quais são as provas
padronizadas de leitura que devem ser utilizadas para o diagnóstico, fato que
pode gerar diferenças primordiais na hora de identificar se há ou não um déficit
no perfil de uma criança. Por exemplo, em provas de precisão de leitura, os
indivíduos classificados certamente não seriam os mesmos do que os
identificados por meio de uma prova de compreensão de leitura. Isso indica
que a falta de provas padronizadas gera subjetividade no diagnóstico. Indo
além, é importante levarmos em conta que o QI verbal de um disléxico pode
ser rebaixado em decorrência da leitura empobrecida, tornando esta uma
medida pouco confiável para se comparar com a habilidade de leitura. (Bishop
e Snowling, 2004; Olson et al., 2002)
Nas ultimas décadas, cada vez mais teóricos (Lyon, 2003; Shaywitz e
Shaywitz, 2005; Stanovich et al., 1999) vêm demonstrando insatisfações com
critérios que utilizam medidas de QI para diagnosticar dislexia. Estudos
apontaram que tal medida é importante para excluir possíveis deficientes
intelectuais, porém, em algumas situações, também acabam eliminando
potenciais disléxicos. Para substituir tal insatisfação, têm selecionado crianças
que apresentam um nível de leitura abaixo do esperado para a idade, mas que
obtenham medidas de QI não"verbal dentro dos limites da normalidade. Esta é
uma possibilidade, porém tal critério não exclui a possibilidade de haver outros
déficits cognitivos, além das dificuldades de leitura (Stanovich et al., 1999;
Bishop e Snowling, 2004).
A hipótese do marcador cognitivo (Frith, 1997; Snowling, 2000), é um
modelo alternativo, que como a abordagem de Processamento da Informação,
argumenta que na dislexia o importante é investigar os diversos processos de
alfabetização, ou seja, as habilidades cognitivas relacionados à aquisição da
leitura e escrita (Sternberg, 2000; Capovilla e Capovilla, 2002; Salles, Parente e
Machado, 2004).
Portanto, duas crianças com dislexia podem apresentar diferentes
prejuízos no perfil cognitivo, que se manifestam em diferentes níveis e graus de
severidade, além de sofrer influência de aspectos emocionais, ambientais
(pedagógicos) e socioeconômicos (Shaywitz & Shaywitz, 2005).
Tendo isto em vista, pesquisadores, há algumas décadas, passaram a
investigar como se manifestam os diferentes perfis cognitivos nos quadros de
dislexia, a fim de discriminar se existem, ou não, diferentes subtipos do quadro.
(Stanovich et al., 1997; Manis et al, 1999; Griffiths e Snowling, 2002; Bishop &
Snowling, 2004, Salles et al., 2004; Salles e Parente, 2006).
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Já existe uma longa historia de pesquisas que visam classificar crianças
disléxicas em perfis distintos (Manis, Seidenberg, Doi, McBride"Chang e
Petersen, 1996; Stanovich, Siegel & Gotardo, 1997; Griffiths & Snowling, 2002).
No campo dos distúrbios específicos da leitura, distinções são feitas
principalmente entre quadros de dislexia fonológica e dislexia morfêmica (de
superfície). Prejuízos nas pseudopalavras, sem prejuízos na leitura de palavras
irregulares, corroboram o quadro de dislexia fonológica, enquanto que
prejuízos na leitura de palavras irregulares, sem prejuízos na leitura de
pseudopalavras, equivalem à dislexia morfêmica (Stanovich et al, 1997,
Snowling, 2002, Bishop, 2004, Capovilla et al., 2006).
Detalhando um pouco melhor: na dislexia fonológica ocorre uma
alteração predominantemente na rota fonológica, que caracteriza"se por
dificuldades na conversão grafema"fonema. Ou seja, há um prejuízo na leitura
de palavras de baixa freqüência e pseudopalavras, sem prejuízos na leitura de
palavras irregulares. Neste quadro, devido ao déficit nos processos fonológicos
(consciência fonológica, memória operacional e acesso ao léxico), ocorre um
pobre desenvolvimento destas habilidades específicas, fazendo com que a
transposição letra"som não consiga ser fixada e armazenada de forma
eficiente. Tais prejuízos interferem no desenvolvimento da alfabetização, o que
gera uma série de sintomas típicos da dislexia: leitura lenta, silabada, confusão
entonação adequada e respeito à pontuação (Manis et al, 1996; Stanovich et
al, 1997; Ramus et al., 2003; Shaywitz e Shaywitz, 2005).
Já na dislexia morfêmica o principal déficit ocorre na rota lexical, tendo
como conseqüência uma dificuldade na leitura da palavra como um todo. Desta
forma, o prejuízo maior ocorre na leitura de palavras irregulares e regra, sem
prejuízos na leitura de pseudopalavras e palavras regulares (Griffiths e
Snowling, 2002; Bishop & Snowling, 2004; Capovilla et al., 2006).
Existe uma terceira divisão, denominada de dislexia mista; neste subtipo,
os leitores apresentam alterações nas duas rotas de leitura, portanto manifesta"
se como uma dificuldade tanto na rota fonológica, como na rota lexical.
O problema que surge com estas taxonomias é que muitos pacientes
ficam desclassificados, e poucos se enquadram nos subgrupos. Há uma
variação contínua nas diferenças individuais encontradas em leitura e escrita,
melhor conceitualizadas em termos de um modelo multidimensional. Isso se
dá, pois os componentes de linguagem, as habilidades de alfabetização, bem
como os aspectos cognitivos encontram"se prejudicados em diferentes níveis e
graus nos indivíduos disléxicos. (Griffiths e Snowling, 2002). Diferenças podem
ocorrer nas habilidades cognitivas subjacentes, assim como no perfil do
desenvolvimento da leitura.
Indo além, estudos de diferentes nacionalidades, revelam que o tipo de
dislexia também está relacionado à regularidade da língua falada, o que fez
com que muitos deles abandonassem tais classificações, dando maior
prioridade aos processos cognitivos subjacentes.
Nas ultimas três décadas, evidencias se acumularam para justificar a
forte associação entre habilidades fonológicas e o aprender a ler (Frith, 1997;
Capovilla e Capovilla, 2002; Ramus et al., 2003). Já na perspectiva de
Sternberg e Grigorenko (2003), as dificuldades de leitura e escrita são
decorrentes de uma interação entre fatores biológicos, cognitivos e sociais.
Estudos em línguas regulares, como é o caso do português, também
têm mostrado que a principal dificuldade em disléxicos encontra"se na
codificação e no processamento de representações fonológicas, o que nos
reaproximou da hipótese do déficit fonológico como uma das principais causas
da dislexia do desenvolvimento (Stanovich e Siegel, 1997; Frith, 1997; Ramus
et al., 2003; Mody, 2003).
Frith (1997) propõe um modelo causal da dislexia centrado no déficit de
processamento fonológico, manifestado pelo baixo desempenho em tarefas de
consciência fonológica, memória fonológica, velocidade do processamento e
nomeação automática. Ramus et al. (2003), também identificaram este como o
principal déficit causal da dislexia. Em seu estudo revisaram as principais
teorias explicativas para a dislexia. Seus achados afirmaram que toda a
amostra de disléxicos avaliada, apresentou um déficit na habilidade fonológica;
entretanto também apontou para outros prejuízos associados, que surgem em
proporções muito menores. Entre os identificados, destacaram"se déficits
visuais e/ou auditivos, conforme explicita a Teoria Magnocelular, e alterações
motoras, descritas na Teoria Cerebelar. Seus resultados mostraram que mais
da metade da amostra de disléxicos também apresentou déficits de percepção
auditiva, o que foi considerado como um agravante do déficit fonológico e não
como a principal causa do distúrbio.
Porém, relatos de crianças disléxicas que não apresentam um déficit no
processamento fonológico apontam para a dislexia morfêmica e põe em
questão a hipótese do déficit fonológico (Castles e Coltheart, 1993; Griffiths e
Snowling, 2002). Entretanto, vale ressaltar que alguns teóricos (Bryant &
Impey, 1986; Manis et al., 1996; Stanovich et al., 1997) alegam que o
desempenho de crianças com dislexia morfêmica é muito similar ao observado
em crianças mais novas, com um leve prejuízo nas habilidades fonológicas,
combinado a experiências inadequadas em leitura. De tal forma, sugerem que
a dislexia morfêmica pode ocorrer devido a uma falta de experiência em leitura,
o que significa que são leitores menos experientes que as crianças de sua faixa
etária. Tal idéia reforça o postulado de que a dislexia pode ser classificada por
meio de um modelo dimensional, ou seja, faz parte de um continuum no qual
os distúrbios de aprendizagem localizam"se na ponta inferior do espectro e
leitores fluentes e os competentes no extremo oposto (Manis et al., 1996;
Shaywitz & Shaywitz, 2005).
A fim de verificar tal hipótese, Bryant e Impey (1986) passaram a
comparar crianças disléxicas com controles pareados pelo nível de leitura. Eles
foram um dos precursores no uso desta abordagem, pois criticavam estudos
em que disléxicos eram pareados com leitores da mesma série e idade,
reconhecimento de palavras e que esta habilidade é muito diferente no
disléxico e no leitor competente, que não está prejudicado. Portanto, alegam
que comparações e extrapolações entre estas duas amostras podem gerar
resultados enviesados, uma vez que disléxicos se comportam como leitores
mais novos.
Em seus estudos, quando os disléxicos fonológicos e morfêmicos eram
comparados a controles por nível de leitura, muitas das diferenças observadas
inicialmente, com os controles da mesma idade, desapareceram. Entretanto, os
disléxicos fonológicos continuaram a ter um desempenho pior que os controles
por nível de leitura em tarefas de pseudopalavras. Já os morfêmicos
desempenharam tão bem quanto os controles, não apresentando nenhum
desvio. Tal resultado apontou que este segundo grupo de disléxicos
representava crianças com um atraso do desenvolvimento normal, ou um leve
déficit em habilidades fonológicas. Já os disléxicos fonológicos apresentaram
um déficit especifico na decodificação fonológica, compreendido como um
do desenvolvimento, uma vez que tal desempenho era raramente
identificado em leitores normais (Bryant e Impey, 1986; Manis et al. 1996).
Apesar de inovadora, tal abordagem gerou muita controvérsia, uma vez
que parear grupos por nível de leitura não equivale a pareá"los por faixa etária
(Manis et al., 1996). Críticas surgiram quanto aos instrumentos usados para
avaliar o nível de leitura das crianças, pois a escolha de como o nível de leitura
era medido para parear os dois grupos certamente influenciou as conclusões
obtidas. Discussões entre teóricos perduraram durante alguns anos, sem
chegar a conclusões definitivas (Stanovich et al., 1997; Manis et al., 1996;
Griffiths e Snowling, 2002). Entretanto, estudos atuais permanecem adotando o
pareamento por nível de leitura, além de incluir controles por idade (Stanovich,
Siegel e Gotardo, 1997; Salles e Parente, 2004, 2006, 2008).
Até o presente momento, existem poucos estudos nacionais que utilizam
esta metodologia. Salles e colaboradores (ver Salles et al. 2004; Salles e
Parente, 2006 e 2008) há algum tempo vêm adotando desenhos de estudo do
tipo quase experimental, por grupos contrastantes, na qual comparam crianças
com dificuldades de leitura e escrita a dois grupos controles. Em um de seus
estudos verificaram que, quando crianças com dificuldades de leitura e escrita
específicas do que quando comparadas a controles da mesma idade (Salles e
Parente, 2006).
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No Brasil, existem poucos estudos que criam um consenso sobre o
desempenho de leitura e escrita esperado para cada série. Sendo assim, os
instrumentos utilizados são imprecisos e subjetivos. Isso ocorre, principalmente
por não se fundamentarem em modelos teóricos consistentes com os
processos envolvidos na leitura e escrita (Capovilla e Capovilla, 2002).
A criação e padronização de testes que auxiliem na investigação de
aspectos da lecto"escrita e das habilidades cognitivas associadas nos permite
quantificar e comparar o desempenho de indivíduos em relação a outros da
mesma idade, sexo, nível de escolaridade e nível de inteligência. Portanto,
pode"se identificar aqueles que apresentam um desempenho abaixo do
esperado, assim como uma maior compreensão sobre como ocorre a interação
entre as habilidades cognitivas e os aspectos da leitura e escrita.
Atualmente, estudos comparando formas tradicionais e
computadorizadas de avaliação tem sido cada vez mais conduzidos, a fim de
comprovar a eficácia do uso da tecnologia, como uma maneira precisa de
investigação e avaliação de habilidades cognitivas (Macedo et al., 2005;
Lukasova et al., 2008).
Um dos instrumentos computadorizados, desenvolvido no Brasil por
Macedo e colaboradores (2002 e 2005) para avaliar os processos de leitura e
escrita foi a Bateria de Avaliação de Leitura e Escrita (BALE"
Computadorizada). A bateria é composta por sete testes, sendo que cada um
deles avalia componentes específicos de leitura ou escrita. Como teste
psicométrico, apresenta tabelas com dados normativos que permitem investigar
o padrão de lecto"escrita da criança e avaliar o grau de desvio entre o padrão
de leitura desta e o padrão de leitura normal de seu grupo de referência, de
acordo com o nível de escolaridade e idade.
Por exemplo, estudos prévios, com alunos de escola pública e particular,
progrediu ao longo das séries, discriminando entre as séries escolares
sucessivas. De tal maneira, crianças das séries iniciais apresentaram menores
escores e maiores tempos de execução no teste. Entretanto, no estudo de
Macedo (2005), realizado com alunos de escola particular, não foram
identificadas diferenças no escore da 3ª e 4ª série, uma vez que a pontuação
máxima foi obtida já na 3ª série. (Macedo et al., 2005; Nikaedo et al., 2007)
Sendo assim, pode"se identificar o estágio de desenvolvimento no qual o
individuo se encontra e ao identificar estes perfis é possível não só obter um
diagnóstico de dislexia com mais precisão e detalhe, como também torna"se
possível estabelecer divergências nos quadros identificados, o que também
contribui para a questão do diagnóstico diferencial.
Tal instrumento foi construído levando em conta as críticas à restrição de
uma nota média para a avaliação de crianças com dificuldades de leitura e
escrita. Assim sendo, firmou"se como um instrumento discriminativo, que
permite mapear o perfil de cada indivíduo, incluindo os diferentes componentes
que integram uma habilidade mais geral como a linguagem escrita (Capovilla e
Capovilla, 2000).
No presente estudo serão utilizados quatro dos sete testes que compõe
a BALE"Computadorizada. São estes o TCSE, o TSCF, o TCLP e o TNF,
descritos a seguir de maneira mais detalhada.
O Teste de Compreensão de Sentenças Escritas ( ) e o Teste de
Compreensão de Sentença Falada ( 4) são duas das provas que compõe a BALE"Computadorizada e tem por objetivo avaliar o nível de compreensão de
sentenças. A compreensão de leitura é avaliada através do TCSE e a
compreensão auditiva oral, ou seja, falada, através do TCSF. Ambos os testes
são compostos pelos mesmos estímulos e diferem apenas na forma como é
apresentada a sentença: escrita ou falada. São instrumentos sensíveis para
discriminar e identificar os padrões apresentados por crianças com transtornos
de aprendizagem, como a dislexia, e como estas se desviam de um leitor
competente (Nikaedo et al., 2007). No TCSE, a tarefa é ler a sentença e
escolher a figura que melhor corresponde ao seu significado. Já no TCSF a
figura alvo é selecionada a partir de uma sentença falada, de forma que a
compreensão oral é avaliada. A interpretação da natureza do déficit no TCSE
habilidades lingüísticas gerais, relacionadas à compreensão de linguagem
primária (ou seja, da fala em português), ou se estão relacionadas a
habilidades lingüísticas secundárias, que diz respeito à compreensão da
linguagem escrita (ou seja, leitura). Para avaliar tais dificuldades e identificar
dissociações entre déficits de compreensão de informação escrita e na
decodificação de informações auditivas (ou seja, se o problema é
especificamente de leitura, e não meramente de linguagem em geral), é preciso
demonstrar que o sujeito é capaz de compreender as mesmas sentenças
quando as ouve, mas não quando a lê (Viggiano, 2003).
Pesquisadores apontam a eficácia do instrumento para auxiliar no
diagnóstico diferencial de problemas de leitura (Nikaedo et al, 2007). Outros
autores (Griffiths e Snowling, 2004) também reforçam a importância destas
duas provas como alternativas aos critérios diagnósticos tradicionais (DSM IV,
CID 10), que se baseiam na discrepância entre QI e o nível de leitura.
O Teste de Competência de Leitura de Palavras ( ) avalia o
desenvolvimento da competência de leitura de palavras isoladas. Representa
precisamente este tipo de teste analítico que permite a avaliação e validação
de funções e a interpretação da natureza do processamento cognitivo
subjacente (Capovilla et al., 2004; Capovilla e Capovilla, 2006; Macedo et al.
2005). Este teste, em sua versão computadorizada (Macedo et al., 2002), foi
desenvolvido para avaliar o estágio do desenvolvimento da leitura e escrita na
qual o aluno se encontra, além de ajudar a compreender as estratégias de
leitura que prevalecem no seu desempenho (Capovilla & Capovilla, 2002).
Estudos prévios com o instrumento (Macedo et al., 2005; Diana, 2007),
aplicado em crianças do ensino fundamental, demonstraram que há um
aumento no número de respostas corretas e uma diminuição no tempo total de
execução do teste, com o aumento das séries escolares. Ainda, neste e em
outros estudos (Capovilla et al., 2004), pode"se observar que os subitens do
teste, avaliam as diferentes habilidades de processamento de palavras, ou
seja, as estratégias de leitura logográfica, fonológica e lexical.
De tal forma, o padrão de erros em cada tipo de item gera um indicativo
das estratégias de leitura usadas pelo sujeito, bem como daquelas em que ele
processamento de leitura é identificada pela leitura puramente logográfica, ou
seja, pelo alto índice de erros no escore do teste, inclusive nos itens de
pseudopalavras estranhas (PE). Estas são palavras que não apresentam
semelhança qualquer com a figura alvo e nem com palavras reais, pois não
fazem parte do léxico da língua portuguesa (são exemplos de PE as palavras
“MITU”, ou “ASPELO”). De todos os subtestes, os itens PE são os mais fáceis
de serem discriminados (Macedo, 2005; Capovilla et al., 2004; Diana, 2007).
A leitura puramente logográfica também é identificada quando os
sujeitos não identificam trocas visuais (TV) no meio da palavra"alvo (por
exemplo, “CAEBÇA” ao invés de cabeça, ou “CADEIPA” ao invés de cadeira),
obtendo um escore próximo do acaso neste item. Se o sujeito já fosse capaz
de realizar a decodificação grafo"fonêmica, perceberia que existe uma letra
alterada na sua forma escrita e rejeitaria corretamente o item. Porém, ao
decodificar o estímulo utilizando a estratégia logográfica, baseia"se na
da palavra, ou seja, no aspecto visual global, que se assemelha com palavras
existentes no léxico da nossa língua e não percebe a troca.
Quando um leitor encontra"se na etapa alfabética, na qual predomina a
decodificação fonológica, ou seja, uma conversão grafema fonema, consegue
ler adequadamente o subitem de palavras corretas regulares (CR) (por
exemplo, “CASA” e “FADA”), pois são estes itens compostos por palavras de
alta freqüência na nossa língua, que apresentam uma transparência na
correspondência grafo"fonêmica. Entretanto, com o uso exclusivo dessa
estratégia, observa"se que o sujeito ainda tende a confundir"se, com acertos
próximos do acaso, nos itens de palavras pseudo"homófonas (PH) (por
exemplo, “PAÇARU” ao invés de ‘pássaro’, ou “AUMOSSU” ao invés de
‘almoço’). Isso ocorre pela similaridade fonológica que estes itens apresentam
em relação às palavras reais, assim como pela falta de conhecimento e
experiência que têm das regras ortográficas e morfológicas da língua nesta
fase da leitura.
Outro tipo de resposta, bastante observado em indivíduos com uma
leitura incipiente, no nível meramente fonológico, mas com dificuldades de
decodificação, é o de falhas na pontuação significativamente acima do acaso
no subteste de pseudopalavras com trocas fonológicas (TF) (por exemplo,
itens, pois não consegue discriminar o item apresentado da palavra real,
existente na língua portuguesa, devido à similaridade fonológica entre as duas
palavras. À medida que adquire bom domínio de decodificação grafo"fonêmica,
deixa de se enganar por trocas fonológicas, embora ainda se engane por itens
pseudo"homófonos. Isso ocorre até o momento em que desenvolve um bom
léxico ortográfico, de forma que passa a discriminar visualmente a forma
ortográfica das palavras. Entretanto, observa"se que indivíduos com dificuldade
de processamento fonológico, como ocorre na dislexia do desenvolvimento ou
no distúrbio de processamento auditivo central, continuam a apresentar
dificuldade na discriminação destes estímulos, mesmo quando já adquiriram
um léxico mental (Capovilla, 2002; Capovilla et al., 2004).
Uma leitura fonológica incipiente, sem automatismos no processo de
decodificação grafo"fonêmica, também faz com que os recursos centrais de
atenção e memória fiquem de tal modo dedicados ao processo de
decodificação que não sobram recursos suficientes para fazer acesso ao
significado da palavra. Nestes casos, é esperado que o tempo de execução da
prova consumido pelo sujeito seja significativamente mais longo que o da
média para a sua faixa etária ou série escolar.
De uma forma geral, é importante verificar o padrão geral do sujeito nos
sete itens do TCLP uma vez que é o conjunto de dados que vai fornecer
maiores informações a cerca do processamento predominante. Porém, dados
anteriores (Diana, 2007) revelaram que o grau de acertos no TCLP variou, das
mais fáceis às mais difíceis na seguinte ordem: TS=PE>CR>CI=TV>TF>PH,
indicando que tal seqüência se relaciona com o desenvolvimento dos
processos de leitura.
O Teste de Nomeação de Figuras por Escrita ( 4 ) (Capovilla et al., 2000), em sua versão computadorizada (Macedo et al., 2002), avalia o
desenvolvimento da competência de escrita, através da nomeação de figuras
isoladas, que representam objetos e animais, mais ou menos conhecidos. O
objetivo do teste é avaliar a habilidade do sujeito de escrever livremente
palavras que correspondam a figuras, sem cometer erros ortográficos (fazendo
adição, troca ou omissão de letras), ou semânticos (escrevendo palavras com
ser nomeada), ao escrever uma palavra diferente (não"relacionada), ou
deixando espaços em branco, sem resposta. O teste fornece um escore geral
de competência de nomeação de figuras, por produção de escrita livre, obtido a
partir de critérios estabelecidos que verificam a qualidade da ortografia da
escrita. (Viggiano, 2003).
Estudos prévios com disléxicos e a BALE"Computadorizada (Capovilla et
al., 2004; Capovilla e Capovilla, 2006; Lukasova et al, 2008), compararam o
desempenho de disléxicos com um grupo controle, pareado por faixa etária e
série escolar. As duas amostras de disléxicos eram compostas por
aproximadamente dez crianças. Resultados dos estudos de Capovilla e
colaboradores (2006) identificaram um pior desempenho dos disléxicos no
TCLP, principalmente nos itens de pseudopalavras homófonas (PH) e palavras
com semelhança fonológica (TV), justificando tal desempenho por meio da
teoria do déficit fonológico. Também no estudo de Lukasova (2008), achados
indicaram que disléxicos obtiveram um maior tempo de execução para
completar tanto provas de leitura de palavras como a de compreensão de
sentenças, sem diferenças significativas no escore geral da leitura e
compreensão oral de sentenças. Neste estudo, concluem que se os disléxicos
tiverem mais tempo para realizar a leitura, terão maiores possibilidades de
apresentar um bom desempenho.
De forma geral, pesquisas com a BALE em diversas amostras clínicas
vêm confirmando que a bateria é um instrumento sensível para a investigação
dos processos cognitivos subjacentes à leitura e escrita, bem como uma forma
eficaz para realizar o diagnóstico diferencial de distúrbios de aprendizagem.
Porém, até o presente momento, ainda existem poucos estudos com a BALE"
Computadorizada que comparam disléxicos a leitores mais novos. Indo além,
ainda não foram realizados estudos que utilizaram uma metodologia de grupos
contrastantes. No presente estudo temos por objetivo comparar o desempenho
de crianças disléxicas com dois grupos controle: um pareado pela idade e outro
pelo nível de leitura. Por meio de tal comparação, pretendemos analisar o perfil
de leitura dos grupos em provas da BALE"Computadorizada, a fim de verificar
possíveis diferenças entre disléxicos e bons leitores.
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Foram avaliados 28 disléxicos, de ambos os sexos, com idades variando
entre 8 e 14 anos, provenientes de escolas públicas e particulares do estado de
São Paulo. Todos os participantes foram convocados e diagnosticados no
ambulatório de Distúrbios de Aprendizagem do Núcleo de Atendimento
Neuropsicológico Infantil Interdisciplinar do Centro Paulista de Neuropsicologia
(NANI/CPN). A pesquisa foi desenvolvida em dependência do NANI e do
Departamento de Psicologia da UNIFESP.
Para o processo diagnóstico, os sujeitos foram encaminhados ao
ambulatório de Distúrbios de Aprendizagem, do mesmo serviço, onde foram
avaliados por uma equipe interdisciplinar composta por neuropsicólogas,
fonoaudiólogas e psicopedagogas e diagnosticados, segundo critérios
classificatórios do DSM IV e CID"10 (para maior detalhamento do processo
diagnóstico, ver Rodrigues et al., 2009).
Os critérios de exclusão adotados para a amostra foram: 1) a presença
de comorbidade com o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade; 2)
Coeficiente Intelectual Total (QI total) no WISC"III, abaixo da média (<80); 3)
discrepância de menos de um ano, entre o desempenho de leitura e a série
cursada, na prova de leitura do Teste de Desempenho Escolar (TDE); 4)
suspeita de deficiências visuais ou auditivas sem correção; 5) crianças com
lesões cerebrais, histórico de doenças clínicas neurológicas ou psiquiátricas; 6)
atraso no desenvolvimento neuropsicomotor e deficiência intelectual.
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Para a formulação dos critérios de inclusão dos disléxicos no presente
de Desempenho Escolar (Stein, 1994). Ambas as provas fazem parte da
avaliação neuropsicológica do Ambulatório de Distúrbios de Aprendizagem e
serão melhor descritas a seguir.
A Escala de Inteligência Wechsler para Crianças – Terceira Edição
(WISC"III; Wechsler, 1991) é composta por 10 subtestes, dos quais cinco
avaliam os domínios verbais e cinco os de execução. Ambos geram,
respectivamente, um QI Verbal e um de Execução.
Como parte dos procedimentos do ambulatório, foram utilizados quatro
subtestes de cada domínio. Os subtestes verbais utilizados foram: Vocabulário,
Dígitos, Semelhanças e Aritmética. Os subtestes de execução foram: Arranjo
de Figuras, Completar Figuras, Cubos e Código.
A soma total destes dois domínios gera um escore ponderado,
equivalente ao QI total da criança/adolescente. Só foram incluídos neste
estudo, sujeitos que obtiveram um escore total (QIT) igual ou maior que 80, por
ser este considerado um nível intelectual geral dentro da média esperada para
a idade e a série.
O Teste de Desempenho Escolar (TDE; Stein, 1994) é composto de três
subtestes, os quais avaliam a linguagem escrita de palavras isoladas, leitura de
palavras isoladas e cálculos de aritmética. Para compor os critérios de inclusão
dos disléxicos, foi utilizado o subteste de leitura, na qual são apresentadas 70
palavras isoladas, sendo atribuído um ponto para cada palavra lida
corretamente. Ao final do teste é possível obter um escore individual para cada
subteste, bem como um escore geral do teste. Esses escores indicam se o
sujeito apresenta desempenho médio, inferior, ou superior ao esperado para
sua série e faixa etária, assim como indica a que série o desempenho atual
corresponde. Os participantes dessa amostra tinham uma discrepância de mais
de um ano entre o desempenho apresentado e a série cursada.
Após esta fase, os sujeitos que não foram excluídos, foram submetidos a
bateria de leitura e escrita utilizada para comparar os grupos.