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Indústria de defesa: uma análise da rede nacional a partir da teoria da dependência de recursos

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Academic year: 2017

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(EBAPE)

ALEXANDRE SOARES MATHEUS

INDÚSTRIA DE DEFESA:

uma análise da rede nacional a partir da teoria da dependência de recursos

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INDÚSTRIA DE DEFESA:

uma análise da rede nacional a partir da teoria da dependência de recursos

Dissertação de Mestrado

Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas Área de concentração: Administração

Orientadora: profa Alketa Peci, dra

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Indústria de defesa : uma análise da rede nacional a partir da teoria da dependência de recursos / Alexandre Soares Matheus. – 2010.

120 f.

Dissertação (mestrado) - Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas, Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa.

Orientadora: Alketa Peci. Inclui bibliografia.

1. Indústria bélica - Brasil. 2. Brasil – Defesa. 3. Logística

nacional. 4. Benchmarking (Administração). I. Peci, Alketa. II. Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas. Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa. III. Título.

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INDÚSTRIA DE DEFESA:

uma análise da rede nacional a partir da teoria da dependência de recursos

Dissertação de Mestrado

Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas Área de concentração: Administração

Aprovado em: ____/ ____/ ______ Pela comissão organizadora:

---Profa Dra Alketa Peci

FGV – EBAPE (Orientadora)

--- Prof. Dr. Joaquim Rubens Fontes Filho

FGV – EBAPE

--- Prof. Dr. Gerson Silva

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Embora consciente de que a transcrição de tudo o que gostaria de expressar seja uma tarefa impossível, não posso deixar de registrar meus agradecimentos àqueles que também participaram desta jornada. Lembrar dessas pessoas é um dever de reconhecimento por suas inestimáveis contribuições.

Primeiro de tudo, agradeço à professora Alketa Peci, pela precisa e segura orientação. Mesmo nos momentos mais difíceis, soube compreender as dificuldades relacionadas à pesquisa e, com tranquilidade e sabedoria, ajudou-me a encontrar alternativas.

Ao Coronel Ozires Silva, agradeço pela forma consistente como apresentou os assuntos abordados durante a entrevista a mim concedida. As informações abordadas, contextualizadas em experiência, no profundo conhecimento do setor e alicerçadas em sólidos conceitos éticos, foram fundamentais para a execução da pesquisa científica.

Ao Contra-Almirante, Intendente da Marinha, Francisco José de Araujo, muito obrigado pelo incondicional incentivo. A amplitude obtida na pesquisa foi possível devido à contribuição de V. Ex.a

Ao Vice-Almirante Carlos Afonso Pierantoni Gambôa, meu sincero agradecimento pela forma integrada e transparente como explorou as questões relacionadas ao setor. O acesso à rede produtiva de materiais e serviços de defesa não seria possível sem o auxílio da Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança (ABIMDE).

Agradeço ao Comandante Coimbra, ao Coronel Schneider e ao Sr. Maurício Campello, que concederam entrevistas extremamente enriquecedoras, essenciais à argumentação deste relatório.

Gostaria de agradecer, especialmente, à Nely Lima. Sem sua ajuda e incentivo não seria possível concretizar este trabalho.

(7)

“Sem possuir armas próprias, nenhum Principado estará seguro; estará, antes, à mercê da sorte, não existindo virtude que o defenda nas adversidades.”

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A pesquisa tem como objetivo apresentar o estágio atual da rede produtiva de materiais e serviços de defesa. Inicialmente, é elaborada uma sucinta contextualização histórica que situa o leitor em relação ao problema de pesquisa. O sistema produtivo é analisado segundo três abordagens complementares. Primeiro, são identificados os recursos mais importantes aos componentes do sistema, destacando-se, principalmente, a dependência resultante. Posteriormente, por meio de uma análise de redes sociais, são explorados os elementos estruturais dos relacionamentos. Finalmente, os EUA são empregados como um referencial para fins de comparação e diagnóstico. Por conseguinte, visando atender aos diferentes requisitos da pesquisa, foram consultadas organizações envolvidas na atividade, entrevistadas pessoas com conhecimentos específicos do setor e realizada uma abrangente consulta bibliográfica e documental. Portanto, o relatório identifica os fatores que mais impactam a indústria de defesa nacional, um segmento produtivo ainda pouco explorado pela Academia.

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This research is aim to present the current stage of the network that produces materials and services for defense purpose. It starts by drawing up a brief historical overview that places the reader in relation to the research problem. The industrial system is analyzed through three complementary perspectives. First, the main resources for components of the system are identified, placing emphasis on the correlated dependence. Then, the structural aspects of the relationships are analyzed through a social network approach. Finally, the United States are explored as a benchmark for comparison and diagnosis. Furthermore, to meet the different requirements of the research, organizations related to the research activity have been consulted, and people with specific knowledge about the sector have been interviewed, besides the vast research conducted in bibliographic and documentary sources. Therefore, the current report highlights some of the critical factors that impact the defense industry, a segment which has been little scientifically explored.

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Figura 1 − ERJ-145 (comercial) e EMB-AEW&C (militar) ... 33

Figura 2 - Níveis para a análise interorganizacional ... 43

Figura 3 - Inclusão na rede de defesa nacional ... 59

Figura 4 − Relevância do relacionamento: a percepção dos atores ... 75

Figura 5 − Intensidade da rede: frequência de relacionamentos... 77

Figura 6 – Orçamento do Ministério da Defesa do Brasil (2001-2009) ... 79

Figura 7 – Orçamento de defesa dos EUA (2001-2010) ... 79

Figura 8 – Volume de exportações brasileiras de artigos de defesa (1987-2008) ... 89

Figura 9 – Volume das exportações globais, EUA e Brasil (1987-2008) ... 90

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Quadro 1- Síntese das abordagens e propósitos ... 23

Quadro 2 – Respostas recebidas aos questionários ... 51

Quadro 3 – Autoridades entrevistadas ... 52

Quadro 4 – Legislação relacionada com as atividades na BID ... 71

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Tabela 1 − Valor agregado ao produto por segmento industrial ... 32

Tabela 2 − Contratações efetuadas pelas Forças Armadas (2006-2008) ... 35

Tabela 3 – Os 15 países com maiores gastos militares ... 80

Tabela 4 – Composição dos orçamentos do MD e do DoD (2007-2009) ... 81

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ABDI – Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial

ABIMDE – Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança AECA – Arms Export Control Act

AIAB – Associação das Indústrias Aeroespaciais Brasileiras AMRJ – Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro

ASTROS – Artillery Saturation Rocket System

BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social CCL – Commerce Control List

CCOMSEX – Centro de Comunicação Social do Exército CLPC – Comissão de Limites da Plataforma Continental

CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNUDM – Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar

COCTA – Comissão de Organização do Centro Tecnológico da Aeronáutica COMDEFESA – Departamento das Indústrias de Defesa

CSR – Congressional Research Service CTA – Centro Tecnológico da Aeronáutica CTEx – Centro Tecnológico do Exército DCS – Direct Comercial Sales

DDTC – Directorate of Defense Trade Controls

DFAR – Defense Federal Acquisition Regulation Supplement DOC – Department of Commerce

DOD – Department of Defense DOS – Department of State EAA – Export Administration Act

EAR – Export Administration in Regulations

EBAPE – Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas ECA – Export Control Act

EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. ENGESA – Engenheiros Especializados S.A.

ESG – Escola Superior de Guerra

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FGV – Fundação Getulio Vargas

FIESP – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo FIRJAN – Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro FUNTEC – Fundo Tecnológico

FINAME – Agência Especial de Financiamento Industrial FMS – Foreign Military Sales

GOCNAE – Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais GPS – Global Positioning Satellite

IME – Instituto Militar de Engenharia

IPD – Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento ITA – Instituto Tecnológico da Aeronáutica ITAR – International Trade in Arms Regulations IBB – Indústria Bélica Brasileira

IDB – Indústria de Defesa Brasileira MAP – Military Assistance Program MCT – Ministério da Ciência e Tecnologia MD – Ministério da Defesa

MDIC – Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior MPOG – Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão

MRE – Ministério das Relações Exteriores PDN – Política de Defesa Nacional PIB – Produto Interno Bruto

PNEMEM – Política Nacional de Exportação de Material de Emprego Militar PNID – Política Nacional da Indústria de Defesa

SIPRI – Stockholm International Peace Research Institute TCU – Tribunal de Contas da União

(15)

INTRODUÇÃO ... 16

O problema ... 16

Objetivos .. ... 20

a) Objetivo principal ... 20

b) Objetivos intermediários ... 20

Delimitação do estudo...20

Relevância do estudo ... 21

1 REFERENCIAL TEÓRICO ... 23

1.1. Contextualização da indústria de defesa brasileira (IDB) ... 24

1.1.1. Formação da base industrial de defesa ... 24

1.1.2. Transformação do modelo produtivo brasileiro ... 28

1.1.3. O declínio da indústria de defesa nacional ... 30

1.1.4. A questão da dimensão atual da indústria de defesa nacional ... 32

1.2. Teoria da dependência de recursos ... 36

1.3. A análise de redes ... 41

1.3.1. Níveis para a análise interorganizacional ... 42

1.3.2. Análise de redes sociais ... 44

1.3.3. Dimensões e atributos para análise da rede social (whole networks) ... 45

2. METODOLOGIA ... 48

2.1. Tipo de pesquisa ... 48

2.1.1. Quanto aos fins ... 49

2.1.2. Quanto aos meios ... 49

2.2. Universo, amostra e seleção de sujeitos ... 50

2.3. Coleta de dados ... 53

2.4. Tratamento de dados ... 53

2.5. Limitações ao método ... 54

3. ANÁLISE DOS DADOS ... 57

(16)

a) Indústria (organizações produtoras) ... 60

b) Órgãos governamentais ... 65

c) Federações e associações industriais ... 67

d) Instituições de ensino, pesquisa e desenvolvimento ... 68

e) Instituições de fomento/financiamento ... 69

3.1.3. Formalidade ... 70

3.1.4. Complexidade... 73

3.1.5. Centralidade ... 74

3.1.6. Intensidade ... 76

3.2. Benchmarking com os EUA ... 78

3.2.1. Recursos governamentais aplicados em defesa ... 78

3.2.2. Controle e regulação setorial ... 81

3.2.3. Programas de fomento ao setor ... 85

3.2.4. Comércio internacional – exportações e importações ... 88

4. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES ... 92

4.1. Conclusões ... 92

4.1.1. Recursos escassos e críticos ... 92

4.1.2. Aspectos estruturais ... 93

4.1.3. Benchmarking ... 93

4.2. Recomendações ... 94

4.3. Considerações finais ... 96

REFERÊNCIAS... 98

APÊNDICEA – Importações e exportações: Brasil e EUA (1991-2008) ... 108

(17)

INTRODUÇÃO

Aqui, define-se o problema, explicitam-se os resultados a serem alcançados e as fronteiras observadas durante a pesquisa científica. A introdução compreende os aspectos que levaram à seleção do tema e é concluída com a formulação do problema. Ordenadamente, são discriminados o objetivo principal, os objetivos intermediários,, a delimitação do estudo e a sua relevância.

O problema

Em termos relativos,1 o Brasil já possuiu uma expressiva capacidade para desenvolvimento de tecnologia de interesse militar e produção de materiais ou serviços para emprego em defesa, período que se iniciou na década de 1960 e atingiu o apogeu no final da década de 1980 (SCHWAN-BAIRD, 1997, p. 54). Esse resultado, segundo Amarante (2005, p. 26), foi consequência do fomento à pesquisa e desenvolvimento (P&D) e de políticas industriais muito bem planejadas e executadas nas décadas de 1970 e 1980.

O nível de desenvolvimento atingido pela indústria nacional, em termos de autonomia e de competitividade, pode ser também atribuído ao importante papel assumido pelo governo federal na divulgação de produtos nacionais no mercado externo (FRANKO-JONES, 1988, p. 41). Naquele período, empresas como a Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A (EMBRAER), Engenheiros Especializados S.A (ENGESA) e AVIBRAS AEROESPACIAL S.A. respondiam por um percentual significativo das exportações brasileiras de materiais de defesa, que compreendiam, principalmente, carros blindados sobre rodas, aviões militares, armas leves e munições de grosso calibre.

A participação governamental foi essencial, também, na criação de centros de tecnologia, como o Centro Tecnológico da Aeronáutica (CTA) e o Centro Tecnológico do Exército (CTEX), ambos, ainda hoje, importantes na formação de recursos humanos qualificados para as Forças Armadas e para setores industriais especializados, como defesa e aeronáutico. Um dos projetos desenvolvidos pelos engenheiros do Instituto de Pesquisa e

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Desenvolvimento (IPD) do CTA, por exemplo, foi o avião Bandeirante, que completou 40 anos em outubro de 2008 e foi responsável pela criação e projeção da EMBRAER no cenário internacional (EMBRAER, 2008).

A indústria de defesa recebeu significativo suporte governamental porque o aparelho militar valia-se de elevado grau de autogerenciamento para atender a seus interesses. Tal autonomia era uma decorrência do regime político da época, que para atingir seus objetivos recorria a atos institucionais2 e complementares, decretos que modificavam a Constituição Federal então em vigor (OLIEIRA, 2005, p. 3).

A preocupação dos militares com o desenvolvimento do setor industrial de defesa decorre da missão definida no art. 142 da Constituição Federal, que atribui às Forças Armadas a missão de defesa da Pátria. No entanto, o cumprimento dessa responsabilidade constitucional é ameaçado pelo emprego intenso de equipamentos e serviços cujas tecnologias não são de pleno domínio da indústria nacional.

A indústria de defesa, evidentemente, tem o objetivo principal de atender às necessidades das Forças Armadas no que se refere às teses nacionais aprovadas de um modo geral; e, em particular, pela Constituição Federal, de proporcionar uma capacidade defensiva para o país. O Brasil não tem doutrina de ataque e requer que as Forças Armadas estejam razoavelmente equipadas para enfrentar ameaças externas, considerando os aspectos de Soberania. Agora, sob o ponto de vista das Forças Armadas, em particular, a indústria de defesa tem uma ligação clara em relação à capacidade defensiva que é prevista pela doutrina geral. (SILVA, 2009)

Juntos, os comandos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica são o principal cliente dessa indústria, não existindo outros fins para a maioria dos artigos e serviços de defesa na esfera nacional. A inexistência de produção doméstica implica dependência de fornecedores externos, fragilizando logisticamente o poder militar e, consequentemente, a capacidade de mobilização nacional.3

2 O ato institucional no 1, de 9 de abril de 1964, por exemplo, tinha o propósito de assegurar ao novo governo os meios indispensáveis à “obra de reconstrução econômica, financeira, política e moral do Brasil”. Ele preservou a Constituição Federal de 1946, mas com alterações que ampliaram os poderes do presidente da República, o qual podia então propor projetos de emenda constitucional, projetos de lei de qualquer natureza e alterações ao orçamento público. Esses projetos tinham que, compulsoriamente, ser apreciados pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados, ou, então, quando decorrido o prazo definido, serem automaticamente aprovados.

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O domínio tecnológico e uma indústria forte passam a ser essenciais para assegurar que os recursos estratégicos estejam oportunamente disponíveis. Na Guerra das Malvinas (Falklands), por exemplo, o suprimento logístico externo foi interrompido por causa de pressões internacionais, limitando sobremaneira o esforço de guerra argentino (LANGE, 2007, p. 243; SANTOS, 2007, p. 179).

Essa preocupação repercute na Política de Defesa Nacional4 (PDN), que prescreve como essencial o equilibrado fortalecimento da capacitação nacional no campo de defesa, com o envolvimento dos setores industrial, universitário e técnico-científico (BRASIL, 1996). Contudo, essa competência não deve ser limitada a questões internas, pois defesa somente faz sentido quando está imersa em um ambiente anárquico, repleto de conflitos, instável e imprevisível como o ambiente internacional (SAINT-PIERRE, 2006, p. 2). A defesa externa passou a ser, então, o objetivo prioritário da PDN, agregando valores arraigados na área militar (OLIVEIRA, 2005, p. 350).

O Brasil, por suas dimensões continentais, pela complexidade de sua sociedade, pelas imensas riquezas que possui, não pode, de modo algum, abrir mão de uma estrutura que esteja voltada, em última instância, para defender a sua soberania e a sua identidade. [...] As nossas amplas dimensões geográficas, de enormes vazios demográficos, a nossa extensa costa marinha e o nosso espaço aéreo exigem, obrigatoriamente, que o estado brasileiro dispense recursos e atenção, compatíveis à magnitude dessas questões, que se relacionam à sobrevivência nacional [...]. (VIEGAS5.

apud CÂNDIDO, 2005, p. 63).

Em 2008, a revista Época veiculou um artigo focando em algumas limitações materiais das Forças Armadas. Com o descobrimento de novas jazidas de petróleo no pré-sal e a instabilidade em determinadas regiões da América Latina, os autores ressaltam que o escopo do problema foi ampliado para muito além da tradicional preocupação com o patrulhamento do vazio demográfico da região Amazônica (LOPES; PASSOS, 2008). Apesar de não ser uma revista especializada em assuntos de defesa, o artigo, em particular, aborda algumas das necessidades imediatas de meios militares, como a aquisição de viaturas blindadas leves para o Exército Brasileiro e para o Corpo de Fuzileiros Navais, além de embarcações e aeronaves

4 PDN é o documento condicionante de mais alto nível para o planejamento de defesa. Tem por finalidade estabelecer objetivos e diretrizes para o preparo e o emprego da capacitação nacional (BRASIL, 2005b, p. 1). 5 Exposição realizada pelo ministro de Estado da Defesa, embaixador José Viegas Filho, na Comissão Especial

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para patrulhamento da Amazônia Azul,6 onde estão situadas jazidas petrolíferas estratégicas para o país.

Nos EUA, observamos que os assuntos de interesse militar são prioridade na agenda política e absorvem recursos públicos substanciais. Portanto, nos países ditos desenvolvidos, predomina a consciência da importância de se preservar um patrimônio nacional: recursos tecnológicos, industriais, científicos e culturais (CÂNDIDO, 2008). De acordo com o então ministro de Estado Roberto Mangabeira Unger da Secretaria de Assuntos Estratégicos (2008), todos os grandes países têm um regime especial para as suas indústrias de defesa. É necessário resguardá-las do curto-prazo mercantil e afirmar a primazia dos objetivos estratégicos.

Não obstante, os EUA mantêm rigoroso controle sobre a aplicação dos recursos governamentais destinados à defesa. Todas as exportações e importações de produtos e serviços com potencial aplicação militar são previamente autorizadas pelo Departamento de Estado, visando assegurar que estejam em conformidade com os interesses nacionais, que a vantagem competitiva das empresas seja preservada e que as relações regionais de poder permanecerão estáveis.

Uma questão emergente é definir quem custeará o equilíbrio entre as necessidades do setor e a capacidade de satisfazê-las. Esse balanceamento7 requer uma análise multidisciplinar de aspectos estratégicos, políticos, econômicos e sociais. A redução desse custo, nos EUA, representa um desafio que tem sido fundamentalmente atribuído à sociedade, uma vez que o governo arca com a maior parte do ônus necessário para manter o setor de defesa economicamente viável (GHOLZ; SAPOLSKY, 1999).

Portanto, os recursos necessários às organizações passam a ser críticos para a sobrevivência do sistema. Normalmente, eles estão dispersos por organizações autônomas que compõem o ambiente externo, definindo uma estrutura não hierarquizada de relacionamentos. Com esse foco, a pesquisa científica propõe-se a analisar essa rede interorganizacional e a responder à seguinte pergunta: Quais fatores influenciam o atual estágio de desenvolvimento da indústria de defesa nacional?

6 Espaço marítimo de aproximadamente 3,5 milhões de km2. Pode ser ampliado para 4,5 milhões de km2, uma vez aceito o pleito brasileiro dirigido à Comissão de Limites da Plataforma Continental (CLPC), da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), para a extensão dos limites da plataforma continental além das 200 milhas náuticas (370 km), correspondente a uma área de 963 mil km². Esta é maior do que a Amazônia verde e detém inestimáveis recursos naturais (BRASIL, 2009).

(21)

Objetivos

a) Objetivo principal:

Explicar o atual estágio de desenvolvimento da indústria de defesa nacional.

b) Objetivos intermediários:

9 Identificar as organizações que integram a base produtiva de materiais e serviços de defesa;

9 analisar as dimensões funcionais e o fluxo de recursos críticos entre as organizações que compõem a rede produtiva nacional de artigos de defesa;

9 avaliar a interdependência decorrente dos relacionamentos entre as organizações e o impacto para o sistema social;

9 comparar com dimensões específicas da base produtiva dos EUA, de forma a identificar melhores práticas passíveis de emprego no Brasil.

Delimitação do estudo

O enfoque da pesquisa está fundamentado no relacionamento entre as organizações e no desempenho da rede como sistema social. Questões macroeconômicas, mercadológicas e tecnológicas foram exploradas de forma contextual, argumentativa e exemplificativa, objetivando evidenciar a importância relativa do setor, sobretudo, nas comparações e conclusões.

Os dispositivos legais em vigor que regulam e contribuem para o fomento setorial também são analisados quanto ao impacto e à influência no comportamento organizacional; aspecto extremamente importante para a análise da formalidade regulatória do setor. É oportuno destacar que o ambiente legal está intimamente vinculado ao político, pela expressão dos anseios e objetivos deste sob a forma de novas legislações.

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passaram a integrar o estudo, uma vez constatada sua importância para a solução do problema.

Diante de limitações de tempo e recursos, a pesquisa foi fundamentada em análise interorganizacional e restrita ao Brasil, tendo apenas os EUA como um referencial comparativo. Eventualmente, para dimensionar os valores e os percentuais apresentados no contexto global, de forma específica, outros países significativos foram referenciados. A série temporal analisada foi limitada a um período de 21 anos, a partir de 1987, pois alguns dados relativos a 2009 ainda não estavam disponíveis.

A solução foi perseguida considerando-se a atual estrutura das Forças Armadas, ou seja, como parte do Ministério da Defesa, cuja criação foi analisada levando-se em conta seu impacto na definição da autoridade e do relacionamento político-militar. Portanto, não são considerados esforços individuais ou necessidades específicas relacionadas à atividade de cada Força, mas sim dentro de uma realidade conjunta comum.

Relevância do estudo

O Brasil tem aumentado significativamente sua participação no cenário político e econômico internacional, com o objetivo de manter seu status de potência regional e conseguir um assento permanente no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). Em busca dessa nova posição, o país tem participado ativamente de missões de paz, como a atualmente realizada no Haiti, onde responde pelo maior contingente e pela coordenação militar.8 O Brasil tem também enviado representantes a regiões de conflito como observadores militares da ONU.

A disponibilidade de recursos naturais significativos − como água, petróleo e minerais preciosos, muitos ainda não mapeados no país e já escassos em outras regiões do mundo − requer atenção governamental para que a soberania nacional seja plenamente exercida. Portanto, a defesa territorial e o alcance dos objetivos nacionais demandam capacidade de dissuasão. O Brasil precisa de um Poder Nacional adequado para sua defesa, quando necessário.

As expressões do Poder Nacional atuam juntas para conter quaisquer tipos de ameaças, predominando ora uma, ora outra. Por exemplo, contra ameaças puramente

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econômicas, é esperado que a expressão econômica lidere a resposta, reforçada pelas demais; contra ameaças militares, a expressão militar deve ser empregada, coordenando, normalmente, a aplicação das demais expressões (mobilização) (CUNHA, 2007, p. 46). A indústria nacional de defesa insere-se nesse contexto, garantindo que as demandas operacionais sejam atendidas sem subordinação a pressões externas.

Embora seja objeto de crescente preocupação governamental e compreenda diversas áreas do conhecimento cujo desenvolvimento é de interesse estratégico nacional, não foram identificados trabalhos científicos recentes contemplando a análise dos recursos necessários e a estrutura de relacionamentos da indústria de defesa brasileira. Provavelmente, a percepção distorcida de que esse tema seja de interesse exclusivamente militar ou de que as conclusões decorrentes do estudo tenham aplicação restrita ao setor contribua para que a Academia pouco o explore.

A indústria de defesa também apresenta um papel subsidiário a outras atividades econômicas. Por exemplo, como pensar em prospecção de petróleo ou no comércio marítimo internacional, se houvesse ameaças constantes às embarcações e às plataformas de prospecção petrolífera A viabilidade econômica do negócio requer condições adequadas de segurança, sob pena dos custos operacionais e riscos tornarem-se demasiadamente altos. Estas são algumas das preocupações tratadas nas discussões de nível estratégico envolvendo essas atividades.

Empresas do setor de defesa normalmente desenvolvem projetos e atividades que permeiam outros segmentos da economia. Isso é claramente perceptível no setor aéreo, onde empresas como EMBRAER, Boeing Company e Lockheed Martin possuem linhas de produção de aeronaves e sistemas de emprego militar, mas também de aplicação civil. Nesse sentido, deve ser lembrado que tecnologias desenvolvidas prioritariamente para aplicação em defesa também podem ter uso comercial.

(24)

1.

REFERENCIAL TEÓRICO

Esta seção é dividida em três subseções, a contextualização da indústria de defesa nacional, a teoria da dependência de recursos e análise de redes sociais. A primeira, sem pretender esgotar o assunto, atende ao propósito desta dissertação na medida em que situa o leitor quanto à evolução da indústria de defesa brasileira, apresentando algumas de suas características específicas e concluindo ao tratar a problemática de sua atual dimensão.

A segunda refere-se ao fundamento teórico da dependência de recursos, que influencia as decisões e as relações interorganizacionais. Partindo do posicionamento de que as organizações não são autossuficientes, de que necessitam de insumos diversos, o entendimento é o de que elas tornam-se interdependentes com os atores com quem transacionam no ambiente, inclusive, com outras organizações (ALDRICH; PFEFFER, 1976, p. 83; PFEFFER, 1982, p. 192).

Já a terceira seção complementa a teoria anterior, fornecendo as ferramentas metodológicas para evidenciar os relacionamentos e os fluxos de recursos entre os diversos atores sociais. A análise de redes permite melhor qualificar o sistema em termos de suas dimensões funcionais e estruturais, contribuindo para a seleção de parâmetros específicos ao

benchmarking, análise final no diagnóstico do setor.

Abordagem Propósito Contextualização Situa o leitor em relação à Indústria de Defesa Brasileira, evidenciando suas características singulares.

Teoria da Dependência de Recursos

Evidencia os recursos críticos ou os escassos às organizações que compõem o setor, fatores essenciais ao sucesso desse segmento produtivo. Analisa as interdependências decorrentes dos relacionamentos entre as organizações e o decorrente impacto para o sistema social

Análise de redes sociais

Identifica as organizações que integram a base produtiva de materiais e serviços de defesa. Analisar as dimensões funcionais e o fluxo de recursos críticos entre as organizações que compõem a rede produtiva nacional de artigos de defesa;

Benchmarking Compara dimensões específicas da base produtiva dos EUA, de forma a identificar melhores práticas, passíveis de emprego no Brasil Quadro 1- Síntese das abordagens e propósitos

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1.1 Contextualização da indústria de defesa brasileira (IDB)

Historicamente, a indústria de defesa nacional tem apresentado um desempenho irregular. Essa trajetória decorre de fatores diversos, cuja análise explica esse desenvolvimento inconstante do setor.

A contextualização é subdividida em dois estágios: a formação da base industrial e o aperfeiçoamento do modelo produtivo. A Revolução Militar,9 de 31 de março de 1964, destaca-se como o marco divisor, uma vez que acarretou mudanças conjunturais muito significativas para as relações entre os principais atores. A importância desse referencial histórico é ilustrada pelas palavras de Schwam-Baird (1997):

[...] sob o governo militar, não só o desenvolvimento da indústria bélica brasileira foi bem-sucedido sob quase todos os critérios, ele também teve papel central para o sucesso de políticas gerais de industrialização do governo. Em meados de 1980, o Brasil emergia como o principal exportador de armas entre os produtores do Terceiro Mundo. (SCHWAM-BAIRD, 1997, p. 54, tradução nossa)

A partir da Revolução de 1964, a indústria de defesa passou a ocupar uma posição de vanguarda no avanço científico, tecnológico e industrial do país. Esperava-se que outros segmentos fossem arrastados pelo desenvolvimento atingido, ou seja, que a tecnologia decorrente pudesse ser também aplicada em outros setores da economia.

Franko-Jones (1988) destaca que o sucesso daquele modelo esteve fundamentado na relação entre o governo federal e as organizações produtoras. O Estado atuava como agente tecnológico e embaixador para novos mercados externos, enquanto a indústria concentrava-se prioritariamente no desenvolvimento e na inovação de sistemas de armas competitivos internacionalmente.

1.1.1 Formação da base industrial de defesa

A Casa do Trem (1762) e a Fábrica Real de Pólvora da Lagoa Rodrigo de Freitas (1808), ambas no Rio de Janeiro, são consideradas os registros mais antigos da atividade industrial-militar no Brasil (DELLAGNEZZE, 2008, p. 18). No entanto, a seleção de um

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marco específico é questionável pela sua conotação de atividade subsidiária à segurança, como no caso do transporte de mercadorias.

Durante muito tempo, essa indústria demonstrou uma forte relação com a economia nacional,10 compreendendo desde a produção de armamentos e canhões para atender às demandas portuguesas até a construção de embarcações para segurança e transporte. Portanto, seu desenvolvimento era praticamente subsidiário a outras atividades econômicas.

Inicialmente, navios eram construídos para proteção ao comércio de açúcar na Bahia. Posteriormente, a produção naval deslocou-se para o polo comercial do Rio de Janeiro, em função da descoberta de ouro em Minas Gerais (CONCA, 1993, p. 176; O’ DE ALMEIDA, 2001, p. 10). Em 1763, foi criado o atual Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (AMRJ), que produziu o seu primeiro navio de guerra em 1897 (CONCA, 1997). Até os dias atuais, ele é essencial ao reparo e à construção de meios operativos para a Marinha do Brasil, incluindo submarinos convencionais.

A habilitação de recursos humanos, entretanto, iniciou-se somente com a Real Academia de Artilharia, Fortificação e Desenho, na Ponta do Calabouço, em 1792 (O’ DE ALMEIDA, 2001). Essa academia deu origem ao atual Instituto Militar de Engenharia (IME). A Guerra da Tríplice Aliança (1865-1870) representou um marco importante para a indústria de defesa. Ela impulsionou a produção de cartuchos, de projéteis e de pólvora, como consequência do aumento da demanda por munição (CONCA, 1993, p. 177). Foi responsável, também, pela produção de encouraçados, para controlar a navegação nos rios paraguaios (CONCA, 1997, p. 22). Assim, o Brasil tornou-se a segunda nação, depois dos EUA, a empregar esses meios (CONCA, 1997, p. 22; DAGNINO, 1989, p. 126).

O Exército emergiu desse conflito politicamente fortalecido, consciente de suas necessidades e enfático quanto aos assuntos que impactavam os militares (CONCA, 1993, p. 177, 1997, p. 22). A partir do final do século XVIII, as Forças Armadas tentaram fomentar a indústria bélica nacional visando atingir relativa independência de fontes estrangeiras (SCHWAM-BAIRD, 1997, p.54).

A atividade cafeeira, então principal atividade econômica, teve um efeito adverso para a produção de bens manufaturados. A política cambial adotada para maximizar rendimentos representou um obstáculo ao desenvolvimento de uma base industrial (ROETT,11 1984 apud

10 Normalmente, a atividade econômica era definida por ciclos, de acordo com o produto mais importante para o país, como o ciclo do açúcar, do ouro e o do café. Cada uma dessas atividades impactava de forma diferente a produção de materiais de defesa.

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CONCA, 1993; SCHNEIDER,12 1991 apud CONCA, 1993). Por outro lado, a importação de produtos manufaturados britânicos a preços baixos igualmente inibiu o desenvolvimento de uma base manufatureira doméstica (CONCA, 1997, p. 22).

Com o surgimento de novas técnicas industriais para a produção de aço e com a sofisticada tecnologia empregada nos sistemas de armas, a indústria brasileira perdeu competitividade e ficou ainda mais atrasada em relação aos países condutores da Revolução Industrial (O’ DE ALMEIDA, 2001). Conca (1997, p. 23) enfatiza que o número limitado de contratos para expansão da esquadra brasileira, nesse período, foi adjudicado a firmas estrangeiras (países europeus e EUA).

Durante a presidência de Getúlio Vargas, contudo, o governo federal consolidou-se como principal ator na coordenação da atividade política e econômica, principalmente, no fomento à industrialização do país. O presidente Vargas, por exemplo, negociou com os EUA crédito para a aquisição de bens de capital e a instalação de uma usina siderúrgica em Volta Redonda (SCHWAM-BAIRD, 1997).

Essas iniciativas não eram limitadas à indústria de defesa, mas faziam parte de um programa abrangente de industrialização. Não obstante, os níveis de infraestrutura ainda estavam aquém do necessário para dar suporte a empreendimentos privados voltados ao segmento de defesa, que frequentemente eram infrutíferos. Vargas foi responsável, também, pelo fortalecimento de setores industriais importantes à produção de artigos militares, sendo esta a sua maior contribuição ao setor (FRANKO-JONES, 1988).

O fomento à pesquisa e desenvolvimento passou a ser prioridade no âmbito das Forças Armadas. Em 1946, foi instituído na esfera do Ministério da Guerra, atual Comando do Exército Brasileiro, o Serviço de Tecnologia, órgão responsável pela normatização e evolução industrial e tecnológica de material de guerra. Somente em 1979, passou a ser conhecido como Centro Tecnológico do Exército (CTEx), após passar por diversas denominações (CCOMSEX, 2008).

Em 1946, também foi criada a Comissão de Organização do Centro Tecnológico da Aeronáutica (COCTA), embrião do CTA, oficialmente estabelecido em São José dos Campos, em 1954. O Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), que recebeu professores da Escola Técnica do Exército e equipamentos, materiais para laboratório e livros dos EUA, tivera suas obras oficialmente concluídas em 1950 (CTA, 2009).

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Ainda na década de 1950, com o propósito de fomentar a produção nacional, as Forças Armadas adotaram medidas para que as aquisições militares privilegiassem produtos nacionais, como os contratos firmados com fornecedores europeus que incluíam cláusulas estabelecendo a transferência de tecnologia (CONCA, 1993, p. 190). Entretanto, o Programa de Assistência Militar (MAP), juntamente com a crise internacional que então assolava o setor, foi responsável pela redução dos investimentos na produção doméstica, permitindo que sistemas de armas americanos continuassem a chegar ao Brasil.

Em 1951, foi criado o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), inicialmente, para coordenar a atividade nuclear no país, mas que posteriormente, assumiu um amplo papel no suporte à tecnologia e à pesquisa. O Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais (GOCNAE), por exemplo, estabeleceu uma ligação entre o CNPq e as pesquisas de balística de foguetes desenvolvidas pelo CTA (CONCA, 1993, p. 190).

Em 1953, durante o segundo governo de Getúlio Vargas, foi fundada a Petrobras. Na segunda metade daquela década, o governo Juscelino Kubitscheck foi responsável pelo estabelecimento de montadoras de automóveis no país. Ambas as iniciativas foram essenciais para a qualificação de mão de obra e para o desenvolvimento de outros setores da economia (CONCA, 1993, p. 187).

Os EUA mantiveram-se como o principal fornecedor mundial de armamentos do final da II Guerra Mundial até a Guerra do Vietnam, quando a sua mobilização para este conflito reduziu a disponibilidade de materiais para venda a outros países, entre os quais o Brasil. Os países da Europa, necessitando de novos mercados para seus produtos e visando obter economia de escala que reduzisse os custos de sua produção, passaram a atender à demanda brasileira em condições menos restritivas do que as oferecidas pelos norte-americanos (SCHWAM-BAIRD, 1997, p. 104).

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1.1.2 Transformação do modelo produtivo brasileiro

Até a década de 1960, o desenvolvimento da indústria de defesa brasileira observado refletia simplesmente o padrão auferido pela indústria nacional como um todo. No entanto, diante das frustradas tentativas do setor privado de desenvolvê-la, da pequena economia de escala, de considerações políticas e de sua percepção como bem público, o Estado assumiu um papel bem mais ativo na promoção industrial do setor (FRANKO-JONES, 1988).

No momento da Revolução Militar de 1964, o Brasil virtualmente não possuía indústria de defesa, cujo desenvolvimento passou então a ser uma das prioridades do novo regime político. Quando os militares deixaram o poder, contudo, a indústria nacional projetava-se como a mais desenvolvida entre os países do Terceiro Mundo (FRANKO-JONES, 1988). Conca (1992, p. 169) entende que a amplitude política dos governos militares contribuiu para a construção da significativa indústria de defesa.

No entanto, o abrupto sucesso do setor não pode ser explicado sem que se entenda o papel mais abrangente que as Forças Armadas assumiram no que diz respeito ao desenvolvimento nacional, como é expresso pelo general de Exército Góis Monteiro, que posteriormente viria a ocupar o cargo de Ministro da Guerra:

O Exército é essencialmente um órgão político; e como tal, está interessado em políticas verdadeiramente nacionais, em todos os seus aspectos, de onde, em certo grau, emanam a doutrina e o potencial para a guerra. Política geral, econômica, política industrial e agrícola, o sistema de comunicações, a política internacional, todos os ramos de atividade, incluindo instrução e educação do povo, o regime político-social – tudo que enfim afeta a política militar do país. (SCHWAM-BAIRD, 1997, p. 73; MONTEIRO, 1934 apud CONCA, 1993, p. 185, tradução nossa)

A esse papel mais abrangente que as Forças Armadas assumiram, deve se acrescentada a frustração diante do atraso material e tecnológico constatado durante a II Guerra Mundial. Mais uma vez, por meio de comparações com outras forças militares, reforça-se a importância do desenvolvimento de uma indústria de defesa essencialmente nacional.

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decorrente às empresas públicas e privadas, e a Agência Especial de Financiamento Industrial (FINAME), que ficou com a competência sobre os financiamentos de bens de capital para a indústria (SCHWAM-BAIRD, 1997, p. 100).

No final da década de 1960, o Estado foi capaz de promover o desenvolvimento de cada uma das principais empresas do setor. A EMBRAER foi criada na forma de sociedade de economia mista, vinculada ao Ministério da Aeronáutica; a AVIBRÁS foi contratada pela Aeronáutica para participar do programa aeroespacial SONDA, onde desenvolveu know-how

suficiente para o desenvolvimento de seu bem-sucedido sistema ASTROS; e a ENGESA passou a atuar no desenvolvimento de um veículo de reconhecimento e de transporte de pessoal para o Exército (FRANKO-JONES, 1988). Havia uma convergência de interesses, em que setores de alta tecnologia eram valorizados pela sua aplicação militar e, também, como catalisadores da promoção industrial. Portanto, o setor recebeu suporte e atenção constantes pelo seu valor estratégico.

A política norte-americana, entretanto, continuou a privilegiar a exportação dos excedentes de guerra (munições, armas, equipamentos), que em sua maior parte eram usados e/ou recondicionados e que chegavam ao Brasil por meio do Acordo de Assistência Militar Brasil–EUA (1952-1976). A importação desses equipamentos provocou uma estagnação, até mesmo um retrocesso, em alguns setores da indústria nacional (CUNHA, 2005).

Segundo Conca (1992, p. 143), na década de 1970, aproveitando a expansão dos mercados globais, a indústria de defesa nacional construiu a reputação internacional de fornecedor de produtos duráveis, de baixo custo e de fácil manutenção (incluindo blindados, lançadores de foguetes e aeronaves de pequeno porte).

Scham-Baird (1997, p 171) assume que o desenvolvimento da indústria de defesa foi dependente de uma “Doutrina de Segurança Nacional”, a qual influenciou os principais atores do governo. Entretanto, ele também reconhece que fatores ambientais adversos, como restrições ao comércio internacional de armamentos e a oposição ao regime militar por parte de alguns segmentos da sociedade, influenciaram as decisões do governo.

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Em geral, setores avançados tecnologicamente e importantes para os militares também eram vistos como componentes relevantes à promoção industrial, à expansão econômica e ao aumento das exportações pelos responsáveis pelo planejamento econômico (CONCA, 1992, p. 145). Portanto, a rede permanecia equilibrada, uma vez que interesses comuns contribuíam para que os relacionamentos fossem congruentes, em sua maioria, favoráveis ao desenvolvimento da indústria de defesa nacional.

Franko-Jones (1988), entretanto, atribui o sucesso da indústria de defesa a uma estratégia abrangente de industrialização do governo. Os investimentos públicos privilegiaram as indústrias de base, a automobilística e o desenvolvimento dos centros de pesquisa e desenvolvimento, que foram absolutamente essenciais para o sucesso do setor. Especificamente, o governo atuou na diminuição dos riscos da atividade produtiva, promovendo e participando do desenvolvimento tecnológico, garantindo a demanda mínima para efetiva economia de escala e facilitando a comercialização de artigos de defesa.

O CTA e o CTEx integram o modelo nacional como organizações de pesquisa e desenvolvimento, atuando no aperfeiçoamento de recursos humanos, na promoção industrial, na certificação e no teste de artigos, sem participar, contudo, do processo produtivo (FRANKO-JONES, 1988). Na missão do CTA, por exemplo, “não está prevista a industrialização, só a pesquisa e o desenvolvimento, chegando até o protótipo” (DA SILVA, 2008).

Conca (1992, p. 142), entretanto, ressalta que, mesmo após a saída do governo, uma parcela substancial das atividades de ciência e tecnologia nacionais ainda ficou sob controle dos militares, influenciando vários aspectos da política industrial voltada à produção de artigos de defesa.

1.1.3 O declínio da indústria de defesa nacional

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A IDB, contudo, foi muito impactada pela perda do suporte estatal quando os militares deixaram o governo em 1985. A partir daquele período, instaurou-se uma crise decorrente de divergências entre a indústria e o governo, entre a necessidade de ocupar um nicho de mercado e preencher requisitos operacionais das Forças Armadas (PROENÇA JÚNIOR, 1993, p. 44). Uma série de programas mais ambiciosos tecnologicamente foram iniciados, como o AMX (aeronave subsônica), o tanque Osório, o Veículo Lançador de Satélites (VLS) e o programa submarino da Marinha, que eventualmente conduziria à produção de submarino de propulsão nuclear (CONCA, 1992, p. 143).

A tecnologia decorrente desses projetos tem aplicação muito específica e não atendia aos interesses econômicos da indústria. Eles passaram a absorver recursos valiosos, considerando o retorno econômico estimado e a escassez de crédito para pesquisa e desenvolvimento. Consequentemente, muitas empresas diversificaram sua produção ou até mesmo deixaram de produzir materiais de defesa (BMI, 2008).

A exceção do AMX, nenhum desses projetos foi efetivamente concluído. O tanque Osório, cujo custo de desenvolvimento foi extremamente elevado, não chegou a ser produzido em escala comercial e a ENGESA faliu em 1988, devido ao não pagamento das dívidas pelo Iraque (WHITAKER13 apud SILVERBERG, 1994). O VLS e o submarino de propulsão nuclear, contudo, permanecem entre os projetos estratégicos nacionais e que apresentam resultados significativos, a despeito da perda de suporte governamental. O programa nuclear, por exemplo, foi formalmente enterrado com uma pá de cal pelo presidente Collor, na Serra do Cachimbo, sul do Pará (DAGNINO, 2009; VASCONCELLOS, 2010).

Na década de 1990, o cenário global não mais apresentava condições favoráveis aos produtos brasileiros. Segundo Schwam-Baird (1997, p. 186), o término da guerra entre o Irã e o Iraque, o final da Guerra Fria e a decorrente contração do mercado de armamento, contribuíram para a limitação das opções de exportação dos produtos brasileiros. Isso impactou muito a indústria nacional, que teve seus planos de carga reduzidos subitamente, sobretudo, em sua componente voltada para o mercado internacional. Não obstante, Dagnino (op. cit.) entende que é difícil dissociar o início da crise na indústria de defesa do fim das exportações para o Iraque.

Conca (1997, p. 11) sugere que o declínio da indústria de defesa reside, principalmente, em sua dificuldade de se ajustar a essas novas condições ambientais. As mesmas instituições que favoreceram o rápido crescimento do setor tornaram-se rígidas

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demais para se ajustarem a essa nova realidade, tanto na esfera doméstica quanto na internacional, ocasionando a instabilidade que perdura no setor até os dias atuais.

1.1.4 A questão da dimensão atual da indústria de defesa nacional

Atualmente, o Brasil ocupa o oitavo lugar na exportação de produtos de defesa. No entanto, esse percentual é relativamente pequeno quando comparado com o dos EUA, que detêm quase 50% do mercado mundial. O Brasil destaca-se, também, em termos de importações, posicionando-se entre os 15 maiores compradores de material de defesa. França, Inglaterra e EUA são seus principais fornecedores, sobretudo, de sistemas tecnologicamente avançados (BMI, 2008).

A indústria de defesa, quando comparada a outros setores, apresenta elevados índices de tecnologia incorporada aos bens produzidos e serviços ofertados. Ela supera segmentos reconhecidamente importantes econômica e socialmente, como o automotivo, que apresenta uma cadeia produtiva extensa com grande capacidade de absorção de mão de obra qualificada.

VALOR AGREGADO

Segmento US$/kg

Mineração (ferro) 0.02

Agrícola 0.30

Aço, celulose etc. 0.30 – 0.80

Automotivo 10.00

Eletrônico (áudio, vídeo) 100.00

Defesa (foguetes) 200.00

Aeronáutico (aviões) 1,000.00

Defesa (mísseis)/tel. celulares 2,000.00

Aeronáutica (aviões militares) 2,000.00 – 8,000.00

Espaço (satélites) 50,000.00

Tabela 1 Valor agregado ao produto por segmento industrial

Fonte: Tecnologia & Defesa (2008).

Nota: dados da Associação das Indústrias Aeroespaciais Brasileiras (AIAB).

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investimento governamental. O primeiro refere-se ao desenvolvimento de artigos duais,14 cuja conotação é a de um item com aplicação tanto militar quanto civil. O segundo, entretanto, compreende a transferência de tecnologia de bens desenvolvidos especificamente para fins militares para emprego no meio civil, processo conhecido como spin-off.15

Os artigos duais passaram a ser o foco de políticas governamentais para o desenvolvimento do setor, onde países como EUA, Inglaterra e Rússia priorizavam esse tipo de tecnologia como forma de reduzir os custos e redundâncias na rede produtiva, principalmente, após o término da Guerra Fria. O Brasil, formalmente, prioriza o emprego de tecnologias duais, como amplamente estabelecido em sua Estratégia Nacional de Defesa (BRASIL, 2008).

O próprio trabalho da EMBRAER, que eu conheço melhor no caso da Força Aérea, nós temos exemplos de alguns produtos desenvolvidos para aplicação puramente civil e que passaram para o lado militar, quer dizer, houve uma inversão de processo. E produtos militares que passaram para o setor civil – reconhecimento de todos os envolvidos e criados a partir de contratos firmados pelas Forças Armadas. O grande exemplo disso hoje no mundo é os Estados Unidos, que têm isso em escala absolutamente diferenciada em relação a diferentes países. (SILVA, 2009, grifo nosso)

Um exemplo dessa aproximação entre a produção civil e a militar é a aeronave EMB-AEW&C, desenvolvida a partir da plataforma comercial do ERJ-145. Destaca-se que, naturalmente, os ganhos são enormes em termos de economia de escala e de conhecimento técnico. Existem mais de 900 ERJs entregues a diversas companhias aéreas, resultando em considerável economia no custo das peças e serviços para manutenção (EMBRAER, 2010).

Figura 1 ERJ-145 (comercial) e EMB-AEW&C (militar)

Fonte: EMBRAER (2010).

14 O termo dual surgiu em 1948, quando a demarcação da Guerra Fria estava se tornando mais rigorosa. Os EUA negociavam com seus aliados da Europa e o Japão formas de controlar a exportação de artigos com potencial aplicação militar. A formalização de acordos para armamentos não representava problema; contudo, a negociação de produtos duais resultava em divergências constantes (REPPY, 1999, p. 269).

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A real dimensão da indústria de defesa nacional ainda não parece estar bem definida. O próprio desempenho dessa indústria tem sido objeto de controvérsias. Há estimativas conflitantes em termos de produção e de exportações, de absorção de mão de obra e de investimento em pesquisa e desenvolvimento. Conca (1997, p. 259) explica que devido ao sigilo em suas atividades, informações públicas acabaram severamente comprometidas.

As informações a seguir refletem os dados apresentados por Conca (1997) sobre o setor. A partir de projeções de diferentes autores, ele apresenta uma estimativa mais consistente com os dados apresentados, por exemplo, por Carlos A. P. Gambôa16 (2009b) e pelo BMI (2008) em termos de composição do setor e absorção de mão-de-obra qualificada.

¾ Pesquisa e Desenvolvimento (P&D):

9 15%-20% recursos destinados a P&D – US$ 300 milhões/US$ 400 milhões;

9 17.500 engenheiros e técnicos (1.500 da Marinha, 6.000-6.500 da Aeronáutica e 10.000 do Exército).

¾ Número de firmas no setor:

9 Conca (1997) afirma que, de um modo geral, consta que o setor seja composto por cerca de 300 a 350 firmas. No entanto, outras estimativas17 apontam para um número entre 100 e 150 firmas, das quais somente 50 estariam voltadas exclusivamente à defesa.

¾ Emprego:

9 nesse parâmetro, Conca (1997) demonstra a dificuldade de dimensionar o segmento com exatidão. Ele apresenta estimativas que vão de 30.000 (principais firmas somente) a 200.000 empregos. Conclui sua estimativa apresentando um estudo de Saraiva (1989) que quantifica o setor como responsável por 50.000 empregos (empresas de primeiro e segundo níveis).

De acordo com a ABIMDE (2008), o setor industrial brasileiro é composto por cerca de 300 empresas, das quais apenas 25 são exportadoras. Elas responderiam por cerca de 5.000

16 Vice-presidente executivo da ABIMDE – Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança.

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empregos diretos e 30.000 indiretos. O Business Monitor International (2008), não obstante, estima que a indústria de defesa seja um pouco maior, envolvendo cerca de 350 empresas.18

A dificuldade em dimensionar precisamente a base industrial de defesa decorre das diferentes conotações que o termo pode assumir, variando muito a gama de produtos abarcados pelo conceito. A abrangência do termo varia consideravelmente em termos da complexidade dos artigos produzidos, compreendendo desde avançados sistema de armas de grande porte, cujos custos de produção são extremamente elevados, até armas pequenas e de baixo custo. Há, inclusive, uma série de outras commodities também consumidas pelos militares (DUNNE, 1995, p. 402).

QUANTIDADE DE EMPRESAS NACIONAIS CONTRATADAS

2006 2007 2008

Força Aérea Brasileira 1.443 1.980 2.073

Exército Brasileiro 2.932 3.673 4.065

Marinha do Brasil 3.366 4.751 4.887

Total 7.741 10.404 11.025

Tabela 2 Contratações efetuadas pelas Forças Armadas (2006-2008)

Fonte: Departamento da indústria de defesa (COMDEFESA) da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP-COMDEFESA, 2009).

Nota: dados da Secretaria de Logística e Mobilização do Ministério da Defesa apresentados em palestra da FIESP sobre a indústria de defesa nacional.

Se os dados não forem criticados, podem ser confundidas empresas estratégicas com organizações que produzem materiais de uso regular, como de higiene, limpeza, papelaria, construção; também adquiridos pelas Forças Armadas. Os dados apresentados na tabela 2 demonstram que as Forças Armadas interagem com um universo bem mais amplo de empresas para aquisição de materiais e serviços. Nem todas as empresas contratadas são produtoras de armamentos ou de sistemas de armas, comprovando que os relacionamentos transcendem a base produtiva de materiais de uso exclusivo em defesa.19

Entre as empresas estratégicas, o segmento aéreo brasileiro permanece como o de maior projeção, onde a EMBRAER desponta como a terceira maior exportadora nacional (SECEX, 2010) e uma das maiores fabricantes globais de aeronaves. Um desempenho similar

18 De acordo com Schwan-Baird (1997, p. 1), em 1980, existiam cerca de 350 empresas envolvidas na produção de armamentos.

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não é observado pela indústria naval, onde a tecnologia é, em sua maior parte, importada (BMI, 2008).

Já existem algumas iniciativas para melhor compreender o setor. A Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), por exemplo, lançou um edital com esse propósito. No corrente ano, foi publicado o convite 01/2010, cujo título é Indústria de Defesa, pelo qual se pretende conseguir um diagnóstico da base instalada de empresas do complexo industrial de defesa brasileiro (ABDI, 2010). As associações e federações industriais são fontes indispensáveis de informação, devido ao contato frequente com suas associadas, e podem contribuir para que se disponha de mais dados sobre o setor.

No que se refere a este estudo, as informações apresentadas sobre a indústria de defesa são ampliadas pela análise dos dados coletadas na pesquisa de campo. São explorados, também, os aspectos estruturais e os recursos mais importantes para a base industrial de defesa. Da comparação com os EUA emergem insights surpreendentes que, sem dúvida, levantam questionamentos quanto à necessidade de maior atenção ao setor por todos os agentes envolvidos, principalmente, pelo Governo20.

1.2 Teoria da dependência de recursos

A teoria da dependência de recursos fornece o suporte teórico adequado à pesquisa científica porque permite evidenciar os recursos mais importantes para as organizações, analisar o efeito da disponibilidade de recursos em determinado segmento produtivo ou atividade, bem como adotar a perspectiva de que as organizações ativamente perseguem os recursos de que necessitam, criando oportunidades e alternativas. Portanto, a teoria da dependência de recursos representa “um esforço em explicar o quanto da realidade empírica observada nas organizações e em seus ambientes poderia ser justificado por uma única, razoavelmente inclusiva, abordagem” (PFEFFER, 2005, tradução nossa).

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Essa teoria evoluiu a partir da perspectiva da teoria de sistemas21, onde organizações são dependentes de trocas constantes com o ambiente, num relacionamento de input-output. Essa abordagem modernista atribui características essenciais à relação entre a organização e seu ambiente, incerteza quanto à satisfação de suas demandas e dependência com relação aos recursos (HATCH; CUNLIFFE, 2006). Não é possível, portanto, concentrar-se exclusivamente em organizações individuais, pois o que se passa fora da organização influencia o que acontece em seu interior. As fronteiras são mais permeáveis e, até mesmo, questionáveis (CLEGG; HARDY, 2001, p. 298).

No ambiente, existem oportunidades e soluções para problemas que estão além dos limites e da capacidade de uma única organização. Phillips (1960) entende que é inapropriado às organizações tentarem unilateralmente maximizar qualquer coisa, sejam ganhos, vendas ou preferência geral, considerando somente dimensões ou variáveis internas à organização. Aldrich (1979) e Hall (1984a) também enfatizam a importância do ambiente para a atuação organizacional,22 influenciando decisivamente o desempenho, que não é determinado apenas por fatores internos.

Os recursos escassos ou críticos23 para a atividade organizacional demandam maior esforço para seja garantido contínua disponibilidade e acesso a tais recursos. Portanto,

a vulnerabilidade das organizações em relação ao ambiente resulta, sobretudo, da necessidade desses recursos, tais como matérias-primas específicas, mão de obra, capital, equipamentos, conhecimento e mercados para seus produtos e seus serviços. (HATCH; CUNLIFFE, 2006, p. 81, tradução nossa)

Eles não estão prontamente disponíveis, mas no interior de organizações autônomas. De acordo com Van de Ven e Ferry (1980, p. 296), o ambiente é composto por clientes, provedores (equipamentos, materiais, trabalho, capital e espaço físico), competidores e grupos regulatórios (agências governamentais, sindicatos e associações). Portanto, as organizações têm que gradativamente estabelecer relacionamentos coordenados, criando, de fato, organizações de organizações (redes). A dificuldade para garantir o acesso aos recursos

21 De acordo com o modelo teórico de Katz e Kahn (1966), organizações são sistemas abertos dependentes de trocas constantes com o ambiente.

22Para Aldrich (1979), organizações são sistemas de atividades, orientados para objetivos e que buscam manter as suas fronteiras.

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críticos ou escassos reside no grau de complexidade, no dinamismo e na riqueza desse ambiente (MOTTA; VASCONCELOS, 2006).

Relações de interdependência são construídas, com as organizações podendo assim exercer impacto e influência mútuos no seu desempenho. De acordo com Pfeffer (1982, p. 193), as respostas são mais intensas com relação às demandas de atores que controlam recursos críticos. Portanto, o nível de análise adequado é o interorganizacional, onde recursos são obtidos, essencialmente, a partir de outras organizações (HALL, 1984b, p. 227).

A influência que uma organização B terá sobre uma organização A dependerá do controle que B tiver dos recursos vitais para a outra. Quanto mais especializados e raros forem esses recursos, maior será o poder e a influência da organização B, que dela depende para obtenção desses recursos. Bens de alta tecnologia, difíceis de serem produzidos e substituídos, aportam mais recursos para a organização que os produz. (MOTTA; VASCONCELOS, 2006, p. 377)

O potencial de influência de uma organização é resultado de sua capacidade para conseguir os recursos de que necessita, os quais estão disponíveis ou são produzidos por outras organizações. A dimensão das organizações apresenta-se como outro elemento importante na análise do relacionamento interorganizacional. Hall (1984b, p. 229) afirma que as organizações maiores apresentam maior capacidade para impactar o ambiente, alertando para o poder relativo sobre os demais integrantes da rede. Segundo Yuchtman e Seashore (1967), isso define a posição de barganha da organização dominante. Entretanto, se os recursos forem explorados em todo o seu potencial, em longo prazo, a sua própria sobrevivência pode ser comprometida.

Deve ser observado que as organizações não têm condições de gerar todos os recursos necessários, por conseguinte, elas têm de efetuar transações com elementos do ambiente para tentar garantir o suprimento desses recursos. Elas passam a ser identificadas como seres ativos, capazes de mudar e responder a imposições do ambiente (ALDRICH; PFEFFER, 1976, p 79; HALL, 1984b, p. 228). Define-se, portanto, outra visão do ambiente, que passa a ser resultado de um processo de estruturação interorganizacional (MOTTA; VASCONCELOS, 2006, p. 377).

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estratégica24 de seus membros em diferentes contextos (ALDRICH; PFEFFER, 1976, p. 84). Não há apenas uma estrutura organizacional ou opção que seja considera ótima, ou seja, existem diversas alternativas para lidar com o ambiente, vinculando as decisões organizacionais aos seus executivos (HALL, 1984b, p. 228). Portanto, afasta-se definitivamente a possibilidade de determinismo ambiental ou a perspectiva de que exclusivamente a posse de recursos seja suficiente para conferir poder (HARDY; CLEGG, 2001, p. 266).

A decisão estratégica, contudo, não será objeto de análise neste estudo, por não se enquadrar na abordagem proposta e transcender os limites impostos à pesquisa. O estudo das decisões adotadas pelas empresas requer uma análise das empresas do setor durante determinado período. Trata-se de tempo e informações que transcendem os limites impostos à pesquisa. Tal análise exigiria um nível de acesso dificilmente possível num setor ainda bastante cercado de sigilo.

A teoria da dependência de recursos enseja a análise dos focos de dependência e de poder em determinada rede. Segundo Aldrich e Pfeffer (1976, p. 79, tradução nossa), ela “defende maior atenção aos processos internos de decisão política e também para a perspectiva de que as organizações buscam administrar ou, estrategicamente, adaptar-se ao ambiente”. Além das dependências decorrentes da diferenciação funcional e divisão do trabalho, existem interdependências que são buscadas ou evitadas, em função do poder e do controle inerentes à relação (BLAU, 1964 apud ALDRICH; PFEFFER, 1976, p. 83). Portanto, essa perspectiva antecipa prováveis fontes de influência e sugere alternativas para evitá-las, por meio da criação de dependências de compensação (HATCH; CUNLIFFE, 2006, p. 80).

Pfeffer (1982, p. 193) subdivide as relações em dois tipos de interdependência: de resultados e de atividades. Na primeira categoria, o resultado de um ator social depende do resultado de outro; na segunda categoria, as atividades de um ator dependem das ações executadas por outro para existirem. Na interdependência de resultados, aquele autor ainda faz distinção entre o relacionamento cooperativo − no qual o resultado de um ator é o insumo para outro − e o relacionamento competitivo, no qual os indivíduos sobrevivem do mesmo conjunto de recursos disponíveis.

Independente de classificações, o contínuo fluxo de recursos é fundamental para a permanência das organizações na rede. Sem a existência de atividades instrumentais para a

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1.3 A análise de redes

Uma rede consiste em todas as interações entre as organizações de uma população, independente de como é organizada (WHETTEN, 1981). Brass et al (2004) define a rede como “um conjunto de nós e conexões representando existência ou ausência de relacionamento entre os nós”. Enquanto alguns são compulsórios, a maioria dos relacionamentos é iniciada localmente pela necessidade dos integrantes da rede (BOJE; WHETTEN, 1981).

A abrangência do conceito permite a relação com outras abordagens para o estudo interorganizacional. Whetten (1981) destaca que esse campo tem recebido atenção de diferentes disciplinas, que procuram entender aspectos distintos desses relacionamentos. Dependendo da abordagem, o termo “redes” pode ser substituído por conotações mais específicas, como parcerias, alianças estratégicas e arranjos cooperativos. Portanto, o estudo da rede pode ser efetuado por diferentes prismas, um dos quais, o da dependência por recursos.

O relacionamento interorganizacional25 ocorre sempre que duas ou mais organizações trocam recursos (financeiros, materiais, clientes, recursos humanos e técnicos). Ele pode ser temporário ou duradouro, dependendo da frequência com que as trocas ocorram (VAN DE VEN; FERRY, 1980, p. 297). De acordo com Mota e Vasconcelos (2006, p. 372), as estruturas em rede são mais flexíveis, permitindo economizar custos e facilitar a coordenação.

Essas estruturas são particularmente adequadas aos ambientes complexos, com elevado grau de incerteza − onde predominam conexões horizontais −, em oposição às custosas estruturas hierárquicas tradicionais. Essa característica decorre de sua estrutura, que integra subsistemas densos interligados por conexões menos rígidas, as quais são compostas por apenas alguns de seus elementos. Portanto, a rede apresenta máximo potencial de adaptação, pois alterações em um de seus subsistemas não prejudicam seriamente os demais (WHETTEN, 1981).

A análise interorganizacional não é completamente análoga à intraorganizacional, onde a teoria relacionada à coordenação26 é ampla. No entanto, muitas forças presentes no

25Relacionamento organizacional envolve tanto a coordenação quanto a cooperação, em que os relacionamentos são menos estáveis e formais. A essência da coordenação consiste em processo decisório e ação conjuntos em relação aos seus ambientes de atividade comuns (ROGGERS; WHETTEN, 1982, p. 14).

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estudo intraorganizacional estão presentes também no ambiente externo. Roggers e Whetten (1982, p. 10) ressaltam que essas análises são complementares e que estratégias e ferramentas designadas para a coordenação interna, podem ser também úteis quando se muda a perspectiva de uma organização para redes organizacionais.

1.3.1 Níveis para a análise interorganizacional

Na análise de redes, o estudo dos fatores contextuais do processo evolucionário dos relacionamentos em pares e no interior dos grupos funcionais27 é essencial para a compreensão estrutural dos relacionamentos (WHETTEN, 1981, p.8). De acordo com Van de Ven e Ferry (1980, p. 297), a análise organizacional pode ser efetuada em três diferentes níveis ou formas.

Relação interorganizacional aos pares ou diádica

Conjunto interorganizacional (sets)

(tradução livre do autor deste estudo). Eles destacam que a coordenação é percebida como um dos meios para lidar com recursos escassos e evitar redundâncias.

27 Whetten (1981, p. 8) considera, além das formas já apresentadas, um nível intermediário para a análise interorganizacional, os “action sets", que são grupos propositalmente organizados visando determinado fim.

A A A

F

A A

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Rede interorganizacional

Figura 2 - Níveis para a análise interorganizacional

Fonte: Van de Ven e Ferry (1980, p. 298).

Os mesmos autores explicam que os relacionamentos em pares permitem dimensionar recursos transacionados, tendo como parâmetro a dependência percebida, a frequência da comunicação, awareness e o consenso entre as partes envolvidas (VAN DE VEN; FERRY, 1980, p. 297). Apesar dos outros dois níveis serem nada mais do que um conjunto de relacionamentos em pares, eles são capazes de fornecer substancialmente mais informações sobre determinada população.

O foco é ampliado ao conjunto de organizações. Por exemplo, um sistema de ação social é definido como um padrão estrutural que atua como uma unidade para se atingir metas coletivas e objetivos individuais de uma população específica. Ele é capaz de tomar decisões e executar ações em busca de interesses comuns, similarmente a um indivíduo autônomo (VAN DE VEN; FERRY, 1980, p. 300). Destarte, segundo estes autores, para que a estrutura organizacional seja considerada um sistema de ação social, os seguintes elementos de comportamento devem estar presentes:

a. o comportamento entre membros visa atingir objetivos coletivos e de autointeresse;

b. processos interdependentes emergem por meio da divisão de tarefas e funções entre membros;

c. a estrutura interorganizacional atua como uma unidade e tem identidade própria, distinta de seus membros;

A1

A2

A3 A4

Imagem

Tabela 1  − Valor agregado ao produto por segmento industrial
Figura 1  − ERJ-145 (comercial) e EMB-AEW&C (militar)
Tabela 2  − Contratações efetuadas pelas Forças Armadas (2006-2008)
Figura 2 - Níveis para a análise interorganizacional
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Referências

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