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União empurra para estados o peso da criminalidade

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O GLOBO

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Domingo 10.8.2014

Atribuição constitucional dos estados, a segurança pública é um pesadelo dos brasileiros há décadas. No entanto, sucessivos governos federais preferem manter distância do problema, deixando o peso apenas sobre os ombros dos governadores. Em agosto de 2007, o então presi-dente Luiz Inácio Lula da Silva ensaiou mudar esse histórico ao lançar o Programa Nacional de Segurança com Cidadania (Pro-nasci), com quase R$ 7 bilhões disponíveis para estados e mu-nicípios desenvolverem projetos de combate à criminalidade.

O programa era tão ambicio-so que era chamado de PAC da Segurança. Sete anos depois, apenas R$ 1,2 bilhão foi repas-sado, segundo dados do Portal da Transparência. A maior par-te dos recursos se perdeu na fal-ta de projetos regionais consis-tentes e nos cortes de orçamen-to que enfraqueceram o progra-ma no governo de Dilprogra-ma Rous-seff (PT), sem que ele concreti-zasse a sua principal meta: re-duzir pela metade os crimes de morte no Brasil a partir de 2008.

10% MAIS ASSASSINATOS

Entre 2008 e 2012, a taxa de ho-micídios no Brasil subiu 7%, de 24,2 para 25,8 por 100 mil habi-tantes. Pelos padrões internaci-onais, mais de 10 por 100 mil habitantes já é considerado um quadro de violência epidêmica. Em números absolutos, o regis-tro de assassinatos no Brasil su-biu quase 10% entre 2008 e 2012, de 45.885 para 50.081, de acordo com o mais recente anu-ário do Fórum Brasileiro de Se-gurança Pública.

Não é difícil entender por que, a cada eleição, a seguran-ça figura entre os serviços pú-blicos com pior avaliação dos brasileiros. Numa pesquisa fei-ta pela Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas em seis regiões metropolitanas, publicada com exclusividade pelo GLO-BO em maio, 80% dos entrevis-tados se disseram insatisfeitos

com o combate à violência. Em sondagens do Datafolha e do Ibope, a segurança divide com a saúde a lista de maiores pre-ocupações dos eleitores.

UNIÃO INVESTE POUCO

Embora a gestão das polícias ci-vil e militar seja de responsabili-dade dos governadores, especi-alistas em segurança dizem que é preciso envolver o governo fe-deral para mudar o quadro. Do total de despesas da União, ape-nas 0,4% é direcionada para se-gurança pública. Esse percentu-al, apurado em 2012, fica bem abaixo do que é gasto pelo go-verno central de outros países com desafios similares.

Na Colômbia, essa proporção chega a 3,3%. No México, a 6,2%. A comparação foi feita por uma rede de pesquisadores li-derada pelos institutos Sou da Paz e Igarapé num documento com propostas para a seguran-ça que foi entregue às campa-nhas dos candidatos à Presi-dência. O grupo defende, inclu-sive, a criação do Ministério da Segurança Pública.

— Um ministério ajudaria a coordenar melhor as ações de segurança com as de justiça cri-minal, como a gestão dos presí-dios. Como vivemos uma situa-ção de emergência, são neces-sários o investimento e o com-prometimento do governo fe-deral — diz Ilona Szabó de Car-valho, diretora do Instituto Iga-rapé, centro de estudos do tema no Rio. — Como o déficit é enorme, o governo usa a prerro-gativa constitucional de que se-gurança é responsabilidade dos estados para evitar se responsa-bilizar pela redução da violên-cia que assola o país. O Brasil não será um país desenvolvido sem resolver isso.

CONTA PESADA PARA ESTADOS Enquanto o governo federal gas-ta pouco, a segurança pesa nas contas dos governos estaduais. Alguns chegam a direcionar mais de 10% de seus gastos ao combate à criminalidade. É o ca-so de Alagoas, Paraíba e Bahia. No entanto, a maior parte desse dinheiro vai para custeio e

paga-mento de salários. Um terço é gasto com pensionistas. Dessa forma, a maioria dos estados de-pende de repasses federais para fazer investimentos em equipa-mentos e instalações.

Para piorar, a polícia brasileira é uma das mais ineficientes do mundo. Apenas 8% dos homicí-dios são esclarecidos. Nos Esta-dos UniEsta-dos, essa taxa sobe para 64%. E passa dos 95% em países como Alemanha e Japão. Contri-bui para esse contraste a falta de estrutura de delegacias e institu-tos de perícia. Numa pesquisa re-alizada pelo Ministério da Justiça em 2012, só 17 estados tinham informações sobre a produção de exames balísticos.

A média de atendimento dos pedidos era de 44,4%, fruto da baixa qualidade de equipamen-tos e da falta de pessoal: apenas 14% dos peritos do país estavam nessa função. Em todo o país, os pesquisadores encontraram 22 mil pedidos de laudos que não foram produzidos. Na prática, in-quéritos que terminaram sem provas para além de

testemu-nhos, dificultando a condenação. Outro problema é a falta de in-formação e de parâmetros de avaliação das políticas de segu-rança nos estados. Desde 1995, o governo já está na sua quarta tentativa de fazer funcionar o compartilhamento de dados cri-minais, através do Sistema Naci-onal de Informações de Segu-rança Pública, Prisionais e Sobre Drogas (Sinesp). O Mapa da Vio-lência, publicação anual muito utilizada por pesquisadores, usa como base informações de mor-talidade do Ministério da Saúde.

NOVO PROGRAMA FOI LANÇADO A falta de subsídios para o pla-nejamento do Pronasci foi o que levou o governo Dilma a esva-ziá-lo. Em junho de 2012, um novo programa, o Brasil Mais Seguro, foi lançado para financi-ar a modernização e qualifica-ção das polícias e do sistema de justiça criminal, com o foco em melhoria da investigação de ho-micídios, policiamento ostensi-vo e controle de armas. Mas os resultados demoram a aparecer.

Para o cientista político Guarcy Mingardi, especialista do Fórum de Segurança Pública que integrou a equipe do Minis-tério da Justiça no governo Lula, o Pronasci significou um passo à frente na participação do go-verno federal na segurança, mas Dilma não deu o seguinte.

— A ação prática, nas ruas, é realmente dos estados. O gover-no federal pode incentivar, mas não pode controlar a taxa de ho-micídios. O lado bom do Pronas-ci era o dinheiro para ações soPronas-ci- soci-ais, como os de prevenção com jovens, mas ninguém consegue controlar 94 ações em todo o Brasil. Acabou perdendo o foco.

A secretária nacional de Segu-rança Pública, Regina Miki, não deu entrevista. Em nota, infor-mou apenas que, a partir de 2011, incorporou todos os prin-cípios e diretrizes do Pronasci à política do governo federal para segurança pública. “Isso signifi-ca que o conceito do Pronasci deixou de ser restrito a um dos programas da União e passou a direcionar todas as ações”. l

Governo destina para segurança

apenas 0,4% do que gasta e não

cumpre meta de reduzir homicídios

ALEXANDRERODRIGUES

alexandre.rodrigues@oglobo.com.br

União empurra

para estados

o peso da

criminalidade

ELEIÇÕES 2014

_

VIOLÊNCIA SEM TRÉGUA

ASSASSINATOS NO BRASIL* 2008

45.885

2012

50.081

FONTE: FBSP – * Homicídio doloso, lesão corporal seguida de morte e latrocínio – ** Pelo critério de variação da taxa de homicídio.

Em vez de reduzir à metade, como era a meta do Pronasci, índice de homicídios cresceu no Brasil

Taxa de homicídios por 100 mil habitantes

Taxa de homicídios por 100 mil habitantes em 2012

Vítimas de homicídio por etnia

2012 2008

UNIÃO ESTADOS

ESTADOS QUE MAIS

PIORARAM** ESTADOS QUE MAISMELHORARAM** O GASTO COM SEGURANÇANO BRASIL (2012)

JUVENTUDE AMEAÇADA O PESO DA CRIMINALIDADE NO ORÇAMENTO

A COR DA VIOLÊNCIA

24,4

42,5

24,3

27

11

20,8

31,3

40,7

68

61,8

34,4

50,1

47,4

33,6

1

3,8

45,7

37%

das despesas com segurança pública vão para o pagamento de pensões e seguridade

social das polícias.

R$

44,8

milhões

R$

7,9

milhões

Ceará

Paraíba

Sergipe

Minas Gerais

Bahia

Alagoas

Rio de Janeiro

Pernambuco

Espírito Santo

Menor de 10 anos

Amapá

40

39,3

10,4

28,1

36,2

24,5

De 10 a 14 anos

De 20 a 24 anos De 25 a 29 anos De 30 a 34 anos De 35 a 39 anos De 40 a 44 anos

Alagoas Pernambuco Distrito

Federal

Minas Gerais

Ceará

Paraíba

Bahia

São Paulo

Rio de Janeiro

12,3% 8,9%

10,4%

9%

De 15 a 19 anos

Branca Preta Parda

Ignorado Outros

63,7

54

43,7

33,9

26,3

27

7,7

0,3

59

6

10%

9,3% 3,5%

5,6%

Rio Grande do Sul

5,5% 9,1%

Proporção de gastos com segurança pública em 2012

Medo acompanha os

passos de gerente

de contas pelas ruas

de São Paulo

MARCOS ALVES

Medo evidente.Maíra foi assaltada, com o marido e o filho, por três menores

-SÃO PAULO- “Meu celular fica dentro da bolsa. Não fico no metrô com ele, nem na rua, igual à maioria das pessoas. Morro de medo”; “ando o tem-po inteiro atenta ao que está acontecendo”; “vivo o tempo todo insegura”. Em meia hora de conversa com O GLOBO, a gerente de contas Maíra Masi Lopes, de 27 anos, mostrou seu medo, acentuado após o assal-to do qual foi vítima com o ma-rido, também gerente de con-tas, e o filho de 4 anos, ano pas-sado, na região do Ipiranga, em São Paulo, onde mora.

Com uma condição financeira melhor do que no passado, Maí-ra e o marido trocaMaí-ram recente-mente o carro fabricado no Bra-sil por um importado asiático, compraram telefones celulares caros e vão a cinemas, clubes, restaurantes e shoppings com mais frequência. Vivem numa área onde o preço de aparta-mentos chega a R$ 1 milhão.

O aumento na renda e a aquisição de bens, porém, não trouxe a ela e à família a segu-rança esperada. Só na capital paulista, os crimes contra o pa-trimônio estão crescendo a ta-xas em torno de 40% nos últi-mos meses, em relação a 2013. — Não ando com dinheiro. No carro, é o tempo todo vidro fe-chado. Qualquer pessoa é sus-peita. Moto, então... — diz Maíra. No fim do ano passado, ela, o marido e o filho voltavam para casa quando foram abordados, por volta de 20h, numa ladeira

às margens da Via Anchieta, por três menores. Ela conta que os adolescentes usavam armas de brinquedo, mas houve violên-cia psicológica. Os menores le-varam o iPhone 5 do marido.

Maíra conta que ele já fora assaltado duas vezes na mes-ma região. Numes-ma, levaram o seu carro.

— Meu marido parou na porta de casa com o carro da tia dele, um Siena, e foi abordado por um homem de mochila nas costas, que levou relógio, carteira e ou-tros pertences. Uma semana de-pois, estava com um outro carro da tia dele, um EcoSport, que também foi levado.

Segundo ela, há muitos assal-tos na mesma ladeira. Os mora-dores colocaram uma placa com o aviso: “Cuidado, aqui tem assalto o tempo inteiro”.

No primeiro semestre deste ano, segundo a Secretaria de Segurança Pública, o número

de roubos na capital paulista (82.490) foi 38% maior do que no mesmo período de 2013.

O secretário de Segurança Pú-blica de São Paulo, Fernando Grella Vieira, diz que o aumento de crimes contra o patrimônio “é um fenômeno nacional, de causas multifatoriais, entre elas econômicas e sociais”:

— São várias frentes de com-bate. Uma delas, estamos ten-tando junto à Anatel: o bloqueio de códigos de aparelhos celula-res produtos de furto ou roubo, para que eles sejam inutiliza-dos. No estado, o roubo de celu-lares corresponde a 17% das ocorrências desse tipo. Outra frente, aqui no estado, é a lei de desmanche. Tivemos 22 fecha-dos em duas semanas na capi-tal. A meta é derrubar o furto e o roubo de veículos e os latrocíni-os. Em média, 50% dos latrocí-nios têm relação com roubo de veículos.l

Após ser assaltada com o marido e o filho, a receita: ‘Todo mundo é suspeito’

LEONARDOGUANDELINE

leonardo@oglobo.com.br

“Como vivemos

uma situação de

emergência, são

necessários o

investimento e o

comprometimento

do governo federal.

(...) O Brasil não

será um país

desenvolvido sem

resolver isso”

Ilona Szabó de Carvalho

Diretora do Instituto Igarapé

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