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Educação popular, saúde comunitária e apoio social numa conjuntura de globalização.

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Academic year: 2017

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Cad . Saúde Púb lic a, Rio de Janeiro , 15(Sup. 2):7-14, 1999

Educação popular, saúde comunitária e apoio

social numa conjunt ura de globalização

Po pular e d ucatio n, co mmunity he alth, and so cial

s u p p o rt in a co nte xt o f g lo balizatio n

1 De p a rtam en to de En d e m i a s Sa m u el Pe s s o a , Es c o l a N a cion al d e Sa ú d e Pú bli ca , Fu n d ação Osw ald o Cru z. Ru a Leop old o Bu lh ões 1480, t é r re o, Rio d e Ja n e i ro, R J 2 1 0 4 5 - 9 0 0 , Bra s i l .

Vict or Vin cen t Valla 1

Abstract T h e au th or discu sses d ifficu lties exp erien ced by w ork in gclass grou p s in a crisis con -t ex -t , rela-tin g -to -th e d em an ds -th ey m a k e on au -th ori-ties. Pop u lar p ar-ticip a-tion h as -tra d i -t i o n a l l y re f e r red t o a ct iv it ies resu lt in g in p re s s u re on au th o rit ies for im p roved b a sic serv i c e s . On e can con t en d th at act ivities com m on ly k n ow n as p op u lar ed u cation an d com m u n ity h ealth a re cu r-ren t ly at a st alem at e. Th e social su p p ort th eory is p rop osed a s a form of n ot on ly d iscu ssin g th e crisis in h ealth serv i c e s , bu t a lso th e h ealth m od el as bein g basically cu ra t i ve . In th is sen se, c o n -cep ts su ch as “c o n t rol over on e’s life”, “life m ak in g sen se”, an d “s o l i d a r i t y”a re discu ssed as im p or-tan t factors for p re ven tion an d m ain ten a n ce in th e field of h ealth edu ca tion . Alth ou gh it w as a c o n t ext of crisis w h ich led to th e d iscu ssion of t h e socia l su p p ort t h eory, th e latt er’s valu e d oes n ot d ep en d on su ch a con tex t .

Key words Health Ed u c a t i o n ; Social Su p p o rt ; Health Se rv i c e s ; Pu b lic He a l t h

Resumo O au tor d iscu te a s d ificu ld ad es en fren tad as pelas classes p op u lares com relação à s re i-vin d icações aos govern os n u m a con ju n tu ra de crise. De n t ro da con cep çã o clássica d e p a rt i c i p a-ção p op u lar, é p ossível qu e as p ráticas d e ed u ca çã o p op u lar e saú d e com u n itária se en con t re m n u m im p asse. A teoria do ap oio socia l é p rop osta com o form a d e d iscu tir a crise dos serv i ç o s ,c o-m o tao-m b éo-m o o-m od elo d e sa ú d e essen cialo-m en te cu ra t i vo. N este sen tid o, estão ressa ltad as id éias ta is com o a relação corpo- m en te n o p rocesso sa ú d e d oen ça, bem com o a n ecessid ad e d e qu estio-n ar a h egem oestio-n ia m éd ica estio-n este m esm o p ro c e s s o. Categorias com o seestio-n tid o da vida , c o estio-n t role sobre a v id a e solid a riedad e são d iscu tid os com o fatores im p ortan t es p ara a pre ven ção e m an u ten ção n o ca m p o de ed u cação e saú d e. Em b o ra fosse u m con texto d e crise qu e su scita sse a d iscu ssão da teoria de ap oio social, seu va lor in d ep en d e d e u m a con ju n tu ra d e crise.

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C ad. Saúde Púb lica, Rio de Janeiro , 15(Sup. 2):7-14, 1999

I n t ro d u ç ã o

Este trab alh o visa relac ion ar os te m as d e ed u -c a çã o p op u la r e saú d e -c om un itár ia -co m o d e ap oio social e, p ara isso, ap resen ta algu n s d os re su lt ad o s p arciais d e u m a in vestigaç ão m ais a m p la d esen volvid a d ur an t e os estu d os d e p ó s - d o u t o rado do au tor (Valla, 1996a). A in ve s-tigação em q u estão tem com o u m dos seus ei-xos p rin cip ais a d iscu ssão d e ed u cação p op u-lar e saú de com u n itária à lu z da con ju n tu ra d e g l o b a l i z a ç ã o. O au to r te m co m o u m d os seu s p ressu p osto s q u e a p erp lexid a d e e m fac e d a qu estão da glob alização, q uestão esta q ue atin -ge a sociedade com o u m todo, m as em p art i c u-lar os p rofission ais d e ed ucação e saú de, in d ica a n e ce ssid ad e d e e xp lor ar n ova s p ist as d e in -ve s t i g a ç ã o.

A forma em que o processo de globalização se apresenta na América Latina

Nos dias 16 e 17 d e feve re i ro d e 1996, p olíticos e in telec tua is se re u n i ram n a Cid ad e d o Méxi-c o e, Méxi-c om o ap oio d a Organ iza çã o d as Na ç õ e s Un idas (ONU), d eb ateram a segu in te qu estão: Qu al o p roje to d e re f o r m a d o Est ad o e d e d e-s e n volvim en to econ ôm ico altern a t i vo à econ o-m ia e à p olítica h oje h egeo-m ôn ica s n a Ao-m éri c a Latin a? In dep en den tem en te da su a origem p olítica, a gr an d e m aior ia d os p art icip an te s ob -s e r va r am q u e o -s gove r n o-s fe d erai-s ten d e m a aplicar m edid as sem elhantes: p ri vatizações s e l-va g e n s, p o líticas c om p e n sa tór ia s p a ra os p o-b re s, sem , n o en tan to, p reten d er in c lu í-los n a socied ad e for m al; a red ução d a cap acid ade in -d u t o ra e re g u l a -d o ra -d o Esta-d o e a socialização d as even tu ais p erdas d o cap ital fin an c eiro. Os p a r ticip a n t es d o d eb a te ch am ara m a a ten çã o p a ra o qu e seja p ossivelm en te a p rin cip al con -t ra d içã o d o p ro ce sso d e glo b a liza ção : se, d e u m lad o, c a d a p o lít ic a d e aju st e r esu lta n u m a u m en t o d e p o b reza e d e se m p rego em c ad a p a í s, de ou tro lado, a lógica d a globalização es-tá lon ge d e oferecer u m a solu ção, p ois exige a i n versão d e gran d es m assas de capital con cen -t ra d a s p a ra in -te gr ar a ec on o m ia n os p a d rõe s c o m p e t i t i vos p au tad os p ela re volu ç ão digita l-i n f o r m á tl-ica. E, fl-in alm en t e, a c o n sta taç ão d e qu e os gran des m eios d e com u n icação ten dem a reforçar essas m edid as com u m a n ova cu ltu -ra d esp olitizan te q u e p ro c u -ra con ven cer a so-cied ad e de q ue o p rocesso d e globalização n ão d eixa outra saíd a a n ão ser re s i g n a r-se à “exc l u

-são social” com o in evitável (Ge n ro, 1996).

A verba pública, reivindicações da sociedade civil e a proposta do “duplo caminho” peru a n o

As p rop o stas d e ed u cação p o p u la r e d e saú d e c o m u n i t á ria têm sid o vistas com freqü ên cia de f o rm a am bígua. Pa ra algu n s, são form as d e or-gan ização e p olitização p op u lare s, qu e p odem até ap on tar p ara reivin dicaç ões d ian te d a in o-p erân cia do Estado, en qu an to, o-p ara outro s, são f o rm as de desen vo l ver trab alh os qu e seriam da resp on sab ilid ade gove rn am en tal, e, n este sen -t i d o, aju d am os gove rn os a re d u z i rem os seu s g a s t o s. Qu an tos a este ú ltim o p on to, tal cr ítica aju d a a en ten d er p or q u e m u itos ten d em a ve r os t rab a lh o s d e sa úd e co m u n it ár ia co m o u m s e rviço de saúd e de segu n da classe, para os p o-b re s, q u e, n o fim , p erm it e q u e m a is d in h eir o p ú b lic o sob re p a ra a ten d e r p a rcelas d a socie-da de d e m elhores con d iç ões d e vid a. Na re a l i-d a i-d e, atrás i-d essa i-d iscussão, h á u m a ou tra q ue ap on ta p ar a as form as d e sigu a is d e d istri b u ção d o d in h eiro p úblico n a socied ade bra s i l e i-ra: de u m lad o, gran des som as d os im p ostos dirigid os a gr an d es p rojet os a p o ia d os p elos ca -p itais n acion ais e in tern acion ais (Valla &am-p; St o t z , 1992), e, d e ou tro, o p ou c o q u e sob ra p ara os s e rviços b ásicos n ecessários p ara a re p ro d u ç ã o da força d e trab alh o (Valla, 1997a).

Até re c e n t e m e n t e, a p rop osta h egem ôn ica e n t re aq u eles qu e se p reocu p am com a q u a lidad e e q u an tid ad e d os serviços básicos e, p or -t a n -t o, com o d es-tin o do d in h eiro p úb lico era a de reivin d ica ção e p ressão sob re os gove rn a n -tes ( Valla , 1997b ). Em b o ra se ju lgu e q u e ta l p rop osta seja correta, o qu e se observa e m q u a -se tod a a Am érica Latin a é um a certa p erp lexi-d alexi-d e q u an to ao s re su lta lexi-d o s o b tilexi-d os. O rígilexi-d o c o n t role fiscal exerc id o p elo Gove rn o Fe d e ra l e, con seq üen tem en te, p elos estad os e m un icí-p i o s, co m o ta m b ém o for te m on ito ra m e n t o qu e o Fun do Mo n e t á rio In t e rn acion al e o Ba n -co Mun d ial exercem sobre as -con tas bra s i l e i ra s g e ram u m a m b ien te d e p en ú r ia e con trole d e tal m od o, q u e o s gove rn an tes con tam com es-tes lim ies-tes p ara poder ign orar as re i v i n d i c a ç õ e s d os setores organ iza d os d a soc ied ad e civil d e caráter p op ular.

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-Cad . Saúd e Púb lic a, Rio d e Jane iro , 15(Sup. 2):7-14, 1999

cu r sos n ecessá rio s p a ra c om b ater ad eq u ad a-m en te a ep id ea-m ia, ia-m p le a-m e n to u u a-m a p olíti-c a p r ó p ria d e m u tirão p ara salva r os atin gidos (Valla, 1997b ).

Na últim a in stân cia, o qu e está em d iscu s-são é a p ossib ilid ad e d e u m c am in h o com p le-m en tar ao das reivin dicações e d ele-m an das p ara um a m elh or d istribu ição d o d in h eiro p ú b lic o, n ão p orq u e tal p olítica n ã o se ja ju sta e legítim a , legítim as p o rq u e p od e n ão se r viável p olitica -m e n t e. O “d u p lo ca -m in h o” n ã o ab re -m ã o d a reivin d icação com o p olític a, m a s q u estion a a “via ú n i c a” n essa con jun tu ra d e globalização.

Ou t r a exp lica ção p a ra a p er p lexid a d e q u e assola p olíticos, in telectu ais e p rofission ais d e ed u c aç ão e saú d e é a d a n atu reza d o Est ad o p rovedor (Mo i s é s, 1982). A b aixíssim a qu alida-d e alida-d e vialida-d a alida-d e u m a gran alida-d e p ar te alida-d a p op u la ção b ra s i l e i ra justifica em gra n d e m ed id a a n oção d o Est ad o p rove d o r. Na d a m ais ju sto d o q u e exigir q u e os im p ostos sejam d evo lvid os à so-cied ad e c om o u m t od o n a for m a d e serv i ç o s p úb licos d e qu alidade. Prop or qu e o p oder p ú -b lico ofereç a m en o s d o qu e isso é p rop or q u e as c on d iç ões m ín im a s d e vid a n ã o seja m ga -ran tid as p ara tod a a p op u lação. Mas é p ossíve l tam b ém qu estion ar se a m an eira com o o Esta-d o oferec e toEsta-d os os seu s ser viç os a o p ú b lico é s e m p re b en éfica p ara o m esm o. A m edicaliza-ção do fracasso escolar é um exem p lo q ue ilus-t ra b em esilus-te p o n ilus-to (Co l l a res & Mo i s é s, 1995; Co l l a res et al., 1985; Valla & Hollan d a, 1995).

O impasse criado pela crise de saúde no Brasil

In d ep en d e n tem en t e d a con ju n t u ra at u al d e p olíticas n eolib erais n o Brasil e a con seq ü en te c r ise n a área d e saú d e, h á u m a q u est ão an t e-r io e-r q u e é co m u m a algu n s p aíses d a Am ée-ri c a Latin a. Tratase d o com p rom isso form al a ssu -m ido p or gove rn os a fi-m d e garan tir u -m a assis-tên cia m édica u n iversal e gratu ita às su as p o-p u l a ç õ e s. À m ed id a q u e h aja co n d ições m ín i-m a s d e h igien e e alii-m en t açã o p ara u i-m a p art e c o n s i d e r á vel d e q u alq u e r p op u la ç ão, a te n -dên cia é qu e m en os crian ças m orram an tes d e com p letar um an o, e q ue m ais adultos ultra p a s-sem a idade de 65 an os. E ju stam ente porq ue as con d ições d e h igien e e alim en taç ão são m ín im as é q u e os p rob leim as con seqü en tes d e saú -d e on era m ain -d a m a is os recu rsos -d isp on íve i s p a ra a área d e saú d e p ú b lica. No ca so d o Bra-sil, tal qu ad ro é agra vad o p elos b aixos salári o s e p re c á ria s co n d içõ es d e t rab a lh o ofere c i d o s aos p rofission ais d e saúd e, d essa form a leva n -do-os a d eixar o serviço p ú blico. As lon gas f i l a s

q u e se for m a m , tan to as d os cen tr os d e sa ú d e n a s m ad ru g a d a s, co m o a s d e to d a h o ra n o s h osp itais p ú blicos, criam um a situ ação que tor-n a a “escolha de Sofia” um fetor-n ôm etor-n o freqüetor-n te. Um p rob lem a qu e atin ge m ilhões d e bra s i-l e i ro s, p or exem p i-lo, sã o a s m ú i-ltip i-las exp re s-sõ es de sa ú d e m en tal: cob rin d o u m a gam a d e sin t om as q u e vão d esd e o q u e a cla sse m éd ia se re f e re co m o “a n s i e d a d e” ao q u e as c lasse s p o p u l a res cham am de “n e r vo s”. Dados re c e n t e s da Argentin a in dicam q ue m ais d e 50% dos m e-d ic am en to s co n su m ie-d o s p ela p o p ulaçã o sã o p s i c o f á rm a co s (Be rm an n , 1995). É d e se p er -g u n t a r, m esm o que o sistem a d e saú de n o Bra-sil estivesse fun cion an d o satisfatori a m e n t e, se s e ria p o ssíve l a ten d er t od os esse s ca sos ad e-q u a d a m e n t e.

É c la ro q u e, em vista d o q u ad ro a n t eri o r-m en te descri t o, é n ecessário trab alhar para q u e s e t o res d a socied ad e civil p reocu p ad os co m a saú d e n o Bra sil se o rg a n i zem e d em an d e m m ais in vestim en tos dos gove rn an tes p ara con -t o r n ar a cri s e. En -t re -t a n -t o, a p rofu n da crise d aí d e c o r ren te d eve estim u lar reflexões e p ro p o s ições cap azes d e red im en sion ar as relaições en -t re o Es-tado e a sociedade, p ar-t i c u l a rm en -te p ara favo recer a am p la m aioria dos que se en con -t r am exc lu íd os d os b en efícios d a ri q u eza e d o b e m - e s t a r.

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Cad. Saúde Pública, Rio d e Jane iro , 15(Sup . 2):7-14, 1999

A p e rp le xid ad e c ert am en te in clu i, d e u m l a d o, um a p reocu p ação com a d im en são gigan -tesca d o p roblem a a ser su p erad o e, de outro, o recon h ecim e n to d o com p rom isso de “f a zer al-g o”, em bora ten do com o re f e ren cial u m a socie-d asocie-d e civil socie-d eb ilitasocie-d a. Po s s i ve l m e n t e , a sen sa-ção d e estar “b aten do em p on ta de faca” seja o sin al de q ue a discussão ch egou a um certo im -p a s s e. Não q ue o fato d e reivin dic ar u m a -p olí-t ic a m ais co ere n olí-te d o s gove r n an olí-t es n ã o se ja n e c e s s á ri o, m as ta lvez ha ja ou tras d im en sõe s d o p ro b lem a a serem vist as. Nesse sen t id o, é p o s s í ve l ta m b ém q u e a s cat ego ria s u t iliza d a s p a ra discutir os trabalhos d e edu cação p op u lar e saú de co m u n itária sejam in ad eq uad as, p o is “é com u m con fu n d ir a qu estão qu e n ós elabora-m os coelabora-m o elabora-m étod o qu e u t ilizaelabora-m os para ob ter a re s p o s t a . . .( e )a m an eira em qu e se form u la u m a qu estã o d eterm in a em q u e d ireçã o se bu sca a re s p o s t a” (Cassell, 1976a:37).

I n t roduzindo a quest ão do apoio social como subsídio para o debate

O qu e se p rop õe é lan çar m ão d e um d ebate d a saú de p úb lica q ue ocorreu com m u ito in ten si-dade n os Estados Un idos n a década de 80. O de-bate em torno do q ue se cham a s ocial support, is-to é, apoio social, está relacion ado com a crise d e saúde p ública n aq u ele p aís, m as q ue foi desen -volvid o n u m a con ju n tura diferen te à d a globa-lização n o Brasil. Neste sen tido, p rop õe-se u m a re l e i t u ra do deb ate n ort e - a m e ri c a n o, m as à luz dos aspectos p art i c u l a res da sociedade bra s i l e i ra . Apoio social se d efin e com o send o q ualq uer i n f o rm a ç ã o, falad a ou n ão, e/ ou a u xílio m ate-rial oferecid os p or gru p os e/ ou p essoas q u e se con hecem e que resultam em efeitos em ocion ais e / ou com p or t am en tos p o sitivo s. Tr ata -se d e u m p rocesso re c í p ro c o, ou seja, qu e gera efeitos p o s i t i vos tan to p ara o re c i p i e n t e, com o tam bém p a ra q u em oferece o ap oio, d essa form a p erm itin do q ue am b os ten h am m ais sen tid o de con t role sobre suas vidas. Desse p rocesso se ap re e n -d e qu e as p essoas n ecessitam u m as -d as ou tra s ( Mi n k l e r, 1985). Essen cialm en te, o d ebate acer-ca da q uestão do apoio social se baseia em in ve s-tigações que ap on tam p ara o p ap el deste n a m an utean ção d e saú de, an a p re vean ção coan tra doean -ça e com o form a d e facilitar a con valescen -ça.

Um a das p rem issas p rin cip ais d a teoria é a d e q ue o ap oio social exerce efeitos diretos so-b re o sistem a de im u n id ade do corp o, ou com o

b u ff e r, n o sen tid o d e a um en ta r a ca p acid a d e d e as p essoas lid arem co m o s t ress ( Be rm a n n , 1995). Ou t ro p ossível resu ltad o d o ap oio social s e r ia su a con tribu ição geral p ara a sen sação de

coerên cia d a vida e o con trole sobre a m esm a, que, p or sua vez, afeta o estado de saúde de um a p essoa d e u m a form a b en éfica (Cassell, 1976a). In ve r s a m e n t e, en tão, p od er-se-ia dizer que, q u a n d o o a p o io socia l d im in u i, o sistem a d e defesa é afetado, fazen d o com q u e o in d ivídu o se torn e su scetível à doen ça. Em m om en tos de m u ito s t re s s, o ap oio social con tribui p ara m a n -ter a saú de d as p essoas, p ois d esem p en h a um a fu n ção m ed iad ora. Assim , p erm ite qu e as p es-soas con tor n em a p ossibilidad e de adoecer com o resultad o d e d et ercom in a d os ac on tec icom en -t o s, com o, p or exem p lo, a m or-te d e alguém d a fam ília, a perda da cap acidade d e tra b a l h a r, ou u m d esp ejo d a casa on d e se resid e p or m u itos a n o s. Um a decrescen te op ortu n id ade com ou -t ras p essoa s, ou d e p a r -ticip ar n o p ro ce sso d e tom ad a d e decisões p od em ter o efeito de con -t ribu ir p ara u m d im in u ído sen -tid o de con -tro l e, q u e, p or su a vez, afeta a m orbid ad e e m ort a l i-dad e (Mi n k l e r, 1992; Go t t l i e b, 1983).

Cassell leva n ta a h ip ót ese d e q u e, n o ca so de algu m as en ferm i d a d e s, lu gares d e alta d en -sidad e p op u lacion al n ão au m en tam a su sceti-b ilid ad e à d oen ça p or cau sa d a d en sid ad e em si. Um a sen saç ã o d e n ão p od e r co n trola r su a p r ó p ria vid a ju n ta m e n te c om a sen sação d e isolam en to pod em ser relacion ad os com o pro-ce sso d e sa ú d e-d o en ç a. A p r op o sta d o ap o io social sugere que as con seq üên cias d os pro b l e-m as sociais, c oe-m o d esee-m p re g o, violên cia, p or e x e m p l o, n ão n ecessariam en te afetam da m es-m a for es-m a to d a s as p e ssoa s n eles e n vo l v i d a s. Estu d os t êm d em o n stra d o q u e os ap oios d is-p o n í veis de d eterm in adas organ izações sociais p o d em in flu ir b en e fic a m e n t e, n o sen tid o d e p ro p o rcion ar fatores de p roteção con tra o ap a-recim en to de doen ças, oferecen do m elhorias de saúde física, m en tal e em ocion al (Cassell, 1974). Trata-se d a n oção dee m p ow e r m e n t, isto é, u m p rocesso p elo q ual in divídu os, gru p os sociais e o rga n izaç õe s p a ssam a gan ha r m ais co n tro l e s o b re seus pr ópr ios d estin os (Mi n k l e r, 1985).

L o g o, u m en volvim e n t o c o m u n it ári o, p or e x e m p l o, p od e ser u m fator p sicossocial sign i-fican te n a m elh ora ria d a con fian ça p essoal, da sa tisfaç ão c om a vid a e d a ca p acid ad e d e e n -f ren tar p ro b l e m a s. A p a rticip açã o social p od e refor çar o sistem a d e d efesa d o co r p o e d im i-n uir a su scetibilidad e à doei-n ça.

Uma discussão lat ente atrás da questão do apoio social

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Cad. Saúde Púb lic a, Rio d e Jane iro , 15(Sup. 2):7-14, 1999

d ú vid a d e q u e se t ra ta d e u m d eb a te, n ão so m en te an tigo, m as tam b ém de litera t u ra exten -sa. Mesm o recon h ecen do isso, p ro p õ e - s e, p ara fin s d est e tra b a l h o, ap resen t ar a lgu m a s d as id éias q ue serv i riam com o su bsídios p ara a d is-cu ssão d o ap oio social.

O d esen volvim en to da m edicin a volta, p elo m e n o s, até o an o d e 400 a.C., q uan d o os m édi-cos rela cion ad os com o p en sam en to d e Hi p ó-c ra t e s, n o esforç o d e se d esvin ó-cu la r d e q u al-qu er con exão com m ed icin a p op ular e sup ers-t i ç ã o, d eers-tive ram -se às m en su rações ob jeers-tiva s, d im in u in d o a im p ort ân c ia d a p a la vra d o p a -c i e n t e. Ta l vez te n h a sid o u m a d a s p ri m e i ra s m an ifestações qu e ap on tava p ara u m a con cepção de m edicin a que sep ara va o corp o da m en -t e. Sécu los m ais -tard e, u m a form a m ais exp líci-ta d e exp re s s ã o, o h om em en ten d id o com o ser d u a l, p od ia ser vista n o esfor ço d os c ien tistas do sécu lo XVII, agru p ad os em torn o d o d eb ate en ca beça do p or De s c a rt e s. A d ualid ade cart e-sian a foi tam b ém u m a solu ção p ara u m im p as-se p olítico q u e em p erra va o d eas-sen vo l v i m e n t o da ciên cia – a p osição da Ig reja Católica. Com a d ivisão d o h om em e m m en te e co r p o co m o realid ad es d istin tas, foi p ossível a ciên cia ficar c om o co r p o e a filosofia co m a m en te. Se , d e u m lad o, foi p ossível su p erar o im p asse p olític o, de ou tro, a heran ça foi a de u m a olíticiên olíticia olíticu -jo p a p e l er a o d e m e d ir o fin ito, p a ra a q u a l a doen ça se torn a o cen tro d e aten ção e o doen te ocup a u m lu gar secu n d ário (Cassell, 1976a).

O d ese n volvim e n t o d a m ed icin a n o Oc i-d e n te t em oca sion ai-d o u m i-d e b a te i-d e m u it os a n os e n t re d ois ca m p os: o s q u e se in tit u la m f isio lo gista s e os on to lo gista s. Os p ri m e i ro s m an têm qu e a doen ç a é o resu lta do d e u m esta d o d e d ese q u ilíb r io d os “ h u m o re s” d o p a -c i e n t e, isto é, d e u m a r ela çã o d e se q u ilib ra d a e n t re o h o m e m e o m e io am b ie n t e. Co m o se p od e ve r, os fisiologistas foram os p re c u r s o re s d a teoria d o m iasm a, ou seja, d e qu e as d oen ça s su r gem d o a r e d a águ a estagn ad os e c on -t a m i n a d o s. No ou -tr o lad o d essa d isp u -ta in -t e-lec tu a l e p o lít ic a q u e p erp assa sécu lo s, e st ão os on tologistas, qu e acre d i t a vam qu e as d oen -ças t in h am u m a vid a p róp ria e q u e o s c or p os d as p essoas d oen tes eram in vad id os p or ela s. Um p e n sam e n t o q ue , n o séc u lo XIX, d e sd o -b ra r-se-ia n a teor ia vitoriosa d o germ e, com a con seqü en te d errota d os fisiologistas (Ca s s e l l , 1 9 7 6 a ) .

Vale a p en a destacar du as p erdas com a d e r-rota dos fisiologistas: torn am -se secun dários o d oen te e o san eam en to d o m eio a m b ien te, fa-ze n d o, d e ssa for m a , com q ue a d oen ça e su a elim in aç ão p or m eio d a vacin ação e/ ou m ed i-cam en to s su rjam p ri o ri t á rios n a m ed icin a. Se

os efeitos n egativos dessa vitória n ão têm sid o tão gran d es n os p aíses do cap italism o ava n ç a-d o, têm sia-d o a-de sastro s o s, em com p en sação, em p aíses com o o Brasil, com su a s vala s n e gra s e a b e r ta s e sua fa lta p eren e d e á gu a e m m u ita s f a velas e bairros p ob re s.

Hoje em d ia, o d eb ate con tin ua ac erc a das m esm a s q u estõe s, m as obviam en te e m con -j u n t u ras difere n t e s. É claro, p orém , q ue as p es-soas q ue p rop õem a teoria d o ap oio social são h e rd e i ros d os fisiologistas. Cassell (1976a) afir-m a, p o r exeafir-m p lo, q ue h á p o u ca s evid ên cia s h i s t ó rica s p ar a afirm ar q u e as m elh o rias n a saúde de p op u lações se devem aos m édicos e à ciên cia m éd ica. Cita, co m o e xem p lo, a q u ed a d a m ortalidade in fan til n os Estados Un id os d u-ran t e a s p ri m e i ras d éc a d a s d o séc u lo XX. A g ra n d e r ed u çã o d o c om p le xo d ia rré ia- p n e u-m on ia ocorre u an tes d o u so de q ualq u er dro g a a n t i m i c rob ial ou vacin a, e a qu eda ocorreu n u-m a ép oc a eu-m q u e u-m e lho ra vau-m o s p ad r õe s d e e d u c a ç ã o, n utrição e san eam en to básico.

A n t o n ovsky (1979), p or su a vez, dem on stra q u e os casos d e tu b ercu lose tin h am c a íd o n o m un d o e m 95%, d e 1945 a 1973, ao con t rá ri o d a afir m a çã o d e q ue tal q u e d a se d era c om a i n t rodu ção de drogas esp ecíficas. Na re a l i d a d e, o d ec lín io vin h a oco rren d o p o r m a is d e ce m a n o s, e, n a In g l a t e r ra e n o Pa ís d e Ga l e s, p or e x e m p l o, n o p er íod o d e 1850 a 1971, ap en a s 14% d o d e clín io d a m o r talid a d e ca u sad a p or t u b e rc u lo se oc o rre ram a p ó s a in t ro d u çã o d e d ro g a s.

Ma s, se os herd e i ros d os fisiologistas e p ro-p on en tes da teoria do aro-p oio social d ão u m valo r m u ito gra n d e p ara a q u estão d o m eio a m -b ien te com o u m a q u estão-ch ave p ara a exp li-c a çã o d o p roli-c esso sa ú d e-d o en ç a, en fatiza m t am b ém q u e se t ra ta d e u m a relaçã o d o m eio a m b ien t e c om o h o m e m in te gral, d e co rp o e m e n t e. Ex e m p l i f i c a n d o, pod er-se-ia qu estion ar q u e ou o sofrim en to é exc l u s i vam en te su bjeti-vo e, n esse sen tid o, n ão c ab e d en tro do d om í-n io d a m ed icií-n a , ou é e xc l u s i vam eí-n te id eí-n ti-fica d o c om a d o r físic a. Assim , n o c a so d o s m o ri b u n d o s, p or exem p lo, tan to os p acien tes, co m o a s su a s fam ília s e am igo s, n ão fa ze m u m a d istin ção en t re o sofr im en to físico e n ã o físico d a m esm a m a n eira q u e os m éd ic os fa -zem . E, m esm o n o caso d e qu em con va l e s c e, o s o f rim en to n ão ocorre exc l u s i vam en te du ra n t e o d ec orr er d e u m a d o en ç a, m a s tam b é m freqü en tem en te com o resu ltado do seu tra t a m e n -to (Cassell, 1976b).

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sas m aiore s, qu e vão além d a existên cia dos in -d iví-d uos – u m a evi-dên cia -d a -d im en são u n ive r-sa l d a tran scen d ên cia. É p or esr-sa razão qu e se s o f re t an to com a p erd a d a s p esso as am a d as, o u com os sen tim en tos d e ab an d on o, tra i ç ã o, m e d o, ou a p erd a d e um trab alho de u m a vid a. A re c u p e ração d e u m acon tecim en to qu e gero u m u ito sofrim en to freqü en tem en te im p lica aju-d a, e é p o ssível q ue q u em p eraju-d e u p ar te aju-d e si p ossa se r m an tid o p e las q ua lid ad e s p esso ais d e outras p essoas, até qu e sua p arte p erdida se re c u p e re. A tra n scen d ên cia é p r ova velm en te a f o r m a m ais e ficaz em qu e a s p e ssoa s afetad a s p or p erd as são re s t a u rad as à in tegrid ade (Ca s-sell, 1976b).

Tecendo as partes e sugerindo pistas

A p rop osta d e apoio social n ão seria u m a solu-ção p on tu al p ara a cri s e, m as o tram polim p ara re ver a relaçã o da saú d e com a q u estão m éd i-ca. Se, de u m lad o, o apoio social oferece a p os-sib ilid ad e d e rea liza r a p re ve n çã o a tra vés d a s o l i d a riedad e e apoio m útu o, de ou tro, ofere c e tam b ém u m a d iscu ssão p ara os gr up os sociais s o b re o con trole do seu p róprio d estin o e auto-n om ia d as pessoas p eraauto-n te a h egem oauto-n ia m éd i-ca, através d a “n ova” con cepção d o hom em co-m o uco-m a u n idade (Togn on i, 1991; Valla, 1997b). É n e sse sen tid o q u e a d iscu ssão d o ap oio socia l, d en tro d e u m con texto d e u m a re l a ç ã o h om e m in tegral e m eio am b ien te, ca b e com o q u estão n o s c u rrícu lo s d as esco la s p úb licas, n a s p la ta for m as d os p a rtid o s p olític os, e, e m p a rt i c u l a r, em t rês áreas rela cion a d as c o m e d uca ção p op u lar e saú d e com un itár ia: as as-sociações de m ora d o re s, as igrejas e os agen tes d e saúde.

Com relação às associações d e m ora d o re s, l e van ta- se a hip ótese d e qu e o cham ad o “re t ro-c e s s o” dos m ovim en tos de b airros e favelas n ão se deve exc l u s i vam en te à recusa d as au tori d a -d es em a te n -d er as -d em an -d as. Em b o r a, c om o foi afir m a d o a n ter i o rm e n t e, c erta m en te h aja e lem en to s d e ve rd a d e n esse a rg u m e n t o, p er-gu n ta- se se a p rop osta d e som en te re i v i n d i c a r ao p oder p ú blico, jun tam en te com a m ilitân cia q u e a acom p an ha, n ão acabam sen d o p ro p o s-t as in su ficien s-te s p ara u m a gr an d e p ar ce la d a p o p u l a ç ã o. Ou seja, e xp lic aria em p ar te a freq üen te p resen ça de p efrequ en os gru p os m ilitan -tes q ue atu am d e um a form a isolad a. Cabe p er-gu n tar se a p rop osta d e a p oio so cial n ão seri a u m a for m a m e n os p o n tu al, m as, ao m e sm o t e m p o, m ais du ra d o u ra, d e lidar com a q u estão d a saúd e. De um lado, a bu sca d e com p re e n d e r q uais p rob lem as de saú de têm solu ções n o âm

-b it o d a p róp ria com u n id a d e; d e ou tro la d o, a p ossib ilidad e d e socializar a con cepção de au-ton om ia e do con trole sobre o seu p rópr io d es-t i n o, de p erceber q ue a “e f ic ácia m édica... n ão é o aspecto m ais sign ifican te d e qu alqu er sistem a d e saú d e” (Bastien , 1992).

Na lín gu a p o rtu gu esa, a p a lavra “c o m u n i-d a i-d e” tem se tra n s f o rm ai-d o n u m a referên cia às p o p u laçõ es p o b re s, m ora d o re s d e fa ve l a s, d e b a i r ros d e in fra - e s t ru t u ra p re c á ria . Ma s n ão é so m en t e a lín gu a q u e tem m od ific ad o a id é ia de com u n id ade; as m u d an ças sócio-econ ôm cas d a vid a u rb a n a b ra s i l e i ra, seja p elo cre s c i-m en to d as favela s a o p on to de n ã o coi-m p ort a r u m a com u n idad e só, seja p elo grau d e violên -cia n estes locais, tam b ém lim itam o d esen vo l-vim en to d a s o rgan iza çõ es p op u la re s (Ce n t ro de Defesa dos Di reitos Hum an os Ben to Ru b i ã o, 1994). Esta d eve ser co n sid er ad a c om o u m a d as exp lic a çõ es p a ra o ext ra o rd i n á rio cr e s c i-m en t o d a p rese n ça d a s c lasse s p op u lares n as i g reja s d e t od as as re l i g i õ e s, m a s, p r i n c i p a lm e n t e, n as c h a lm ad as e va n gé lic as ou p en te -costais (Ba r ros e Si l va, 1995).

Se n ão há com o n egar q u e a lgu n s p astore s ta m b é m visam à m a n ip u laç ão p olític a e/ ou e n riqu ecim en to própr io às cu stas d os fiéis, tais a rg u m e n t o s, por si, n ão oferecem su bsíd ios su-ficien tes p ara com p reen d er p or q u e tan tas p es-soas d as classes p op ulares pro c u ram as igre j a s. Exp lícita ou im plicitam en te, a qu estão d e saú -d e está p re s e n t e, seja p ela b u sca -d a c u ra , seja p ela id éia sub jacen te d o ap oio social. Leva n t a -se a h ip ótse, in clu sive, d e q u e as igre j a s, m e-dian te a p rop osta esp iritual e/ ou religiosa, ofe-rec em ao s fié is u m sen tid o d e solid ari e d a d e, respeito e p re s t í g i o, com o tam b ém um sen tido de coerê n cia d a vida e con trole sobre a m esm a ( En g et al., 1985). Ce rt a m e n t e, cab e um a in ve s-tigação sobre o ap oio social qu e as igrejas p ro-p o rcion am e com o isso se relacion a com a m a-n utea-n ção e/ ou re c u p e ração da saú de, seja pela p re ve n ç ã o, seja p ela cura .

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Cad. Saúde Púb lic a, Rio de Janeiro , 15(Sup . 2):7-14, 1999 h ea lth w ork e ra g e n t e s,agen t es d e sa lu d com u

-n i t a r i o, acab a escam otean d o sua exp ressão loca l em d e ter m in a d a s c on ju n t u ra s sóc io ec o -n ô m i c a s.

No Rio d e Ja n e i ro, n u m en con tr o d e a ge n -tes de saú d e, fo i c on firm a do q u e, em algu m as f a ve l a s, d ad o o grau d e violê n cia, ele s sã o o ún ico vín culo de saúd e com os m ora d o res (Ol i-ve i ra & Ca rd o s o, 1995). Na re gião An d in a d o Pe r u , n o co m b a te à s e n d em ias n um a c on ju n -t u ra de globalização, os es-trei-tos lim i-tes da p ro-p osta biom éd ica são con traro-p ostos ro-p or agen tes d e saú d e com u n itários; lá, a q u estão d a cultura e r eligio sid a d e p op u la re s ofe rec e m solu -ções s u p e ri o res p or in term édio do ap oio social (Wo n g - Un , 1997). Algu m as exp eriên cias n a Blívia têm d em on strad o a im p or tân cia da etn o-m e d icin a, p a r a a q ua l as re laçõe s socia is, a qu estão religiosa, a doen ça e a m an uten ção da saúd e fazem p ar te de u m tecid o só. Nesse sen t i d o, os resu lta d os o b tid os p or algu n s c u ra n d e i r os b olivian os in d ica m q u e m éto d o s ap a -ren tem en te “m á g i c o s” têm u m for te efeito p si-c o l ó g i si-c o, afetan do, assim , d e u m a form a b en é-fica, os sistem as de im un idade de algum as p es-soas doen tes d a p op ulação (Bastien , 1992).

Tais exper iên cias lem b ram ou tras tra n s m itid as p elas agen tes d e saúd e d o Grup o Se m e n -tin h a, d as favelas d a re gião d a Leop old in a, n o Rio de Ja n e i ro, on d e o trab alh o com chás e xa-rop es d e er va s, c om o t am b ém o u so d a “rez a” tê m p r od u zid o result ad os b e n éfic os p ar a os m o ra d o res (In f o rm a t i vo do CEPEL, 1993).

C o n c l u s ã o

Este art i g o, em bora d esen vo l va u m a d iscu ssão s o b re ed u cação p op u lar, saú d e com u n itária e ap o io soc ial, ap o n ta ta m b é m p a ra a c rise d a saú de n o Brasil. Nesse sen tido, discorre sob re o a g ra vam en to de um qu ad ro já crítico d o acesso d a p o p u laçã o ao s ser viç o s d e saú d e. Ou se ja, n ão h á garan tia d e q ue todos terão assistê n cia, e, para aqu eles qu e serão aten d idos, o p eso d as d em an d as e a s exp ec ta tiva s d a p op u la çã o fa -zem c om q u e o aten d im e n t o se ja n ec essa ri a-m e n te a-m ed ica liza n te, q u ase exc l u s i va a-m e n t e visan do ap en as ao corp o.

O q u e se p ro p õ e, en tão, é ab r ir u m d eb at e s o b re co m o en fren tar o d ilem a. Re i v i n d i c a r u m a p olítica d e saúd e m elhor coloca o d eb ate n o cen tro da q ue stão orçam en tár ia, cert a m e n -te n ecessária, m as ain d a d en tro de u m en foqu e e xc e s s i vam en te cura t i vo e sem garan tia d e tra-ta m e n to un iversa l e igu a litári o. O im p a sse é p rop ício à p rop osta d e u m n ovo olh ar n a d ire-ção d a saúd e com u n itária e ed u caire-ção p op u lar.

Não n u m a p ersp ectiva d e “q u e b ra - g a l h o” p ara um a p op u lação tida p or m u itos com o “d e s c a r-t á ve l”, m as p a ra rep en sar a q u esr-t ão d a saú d e com b ase n a cri s e.

As p rop osta s d a ed ucação p op u lar e saú d e c o m u n i t á ria são vist as so b a p e r sp ec tiva d o ap oio social, e, assim , a q u estão ap on ta p ara o m esm o d ilem a d a glob alização e d o em p re g o. A n ã o ser q u e h a ja u m a m u d an ça su b stan cial n a so cied ad e b ra s i l e i ra , h averá e m p rego som en te p ara u som a p arcela d a p op u lação, have n d o, p ara l e l a m e n t e, assistên cia n a área d e saú -d e som en te p ara u m a p arc e l a .

O im p asse criad o exige p ressão org a n i z a d a s o b re o s gove rn a n t e s, m as exige tam b é m q ue se p ergu n te se se q u er, n u m fu turo hip otético, u m a o tim izaç ã o d o tip o d e p o lít ic a d e saú d e q u e aí e stá h oje. A in trod u ção d a q u estã o d o ap oio social já tra z im p lícita a p osição d e q u e d ific ilm en te o q u ad r o d e scr it o a cim a vai se m od ific ar n o fu t u ro p ró xim o, a n ão se r p a r a t o r n a r o q u ad ro d e saú d e m a is d ifíc il p a ra a m a i o ria da p op u lação.

To d a via , ao se p ro p o r a q u estã o d o ap oio soc ial, n ão se b u sc a ap en a s u m a re s o l u ç ã o p on tual p ara os cham ad os “e xc l u í d o s”; em b u -tid o n a p rop osta está o qu estion am en to sob re se ta l p rop o st a n ão m er ece ser c on sid era d a t am b ém e xc l u s i vam en te p or seu s m éri t o s. O rac iocín io assem elh a -se a u m ou t ro sob re er-va s m ed icin ais: in t ere ssam p o rq u e sã o m ais b a rat as d o q u e o s m e d ic a m en t os, ou in tere s-sam p or seu pr ópr io va l o r ?

De ssa for m a , a cr ise e o im p asse a q ue se c h e go u é q u e p erm it em q u e o d eb a te sob re o a p o io socia l seja re l e va n t e. É c laro q ue, n a atu al con ju n tu ra, as p olíticas de solidari e d a d e e a p o io m ú tu o, isto é , d o ap oio so cial, re p re-sen ta rã o a s ú n ica s solu çõ es p ar a m u it os d os “e xc l u í d o s”, en qu an to re p re s e n t a rem solu ções a l t e rn a t i vas p ara algu n s p ro f i s s i o n a i s. Mas ca-b e p ergu n ta r t am ca-b ém se a p r op osta d o ap oio social, com su as im p licações em au m en tar a s d e fe sa s d a im u n id ad e d o co rp o, n ã o é re l e -va n te ju st a m en t e p o rq u e le -va em co n t a q u e os h o m e n s n ão são a p e n a s “c o r p o s” a sere m c u rad os e p orq u e o esta d o d e saú d e d a qu eles re p re s e n ta u m a relação in tegrad a en tre o cor-p o e a m e n te. E, em b o ra seja a c rise a o b ri g a r qu e se lan ce m ão desta p roposta, n ão é sign ifi-c a t i vo qu e a p rop osta d e ap oio soifi-cial n eifi-cessa- ecessa-riam en te im p lica um a p articip ação com u n itá-r ia q ue é n ecessaitá-riam en te dem ocitá-rática?

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Cad. Saúde Pública, Rio d e Jane iro , 15(Sup . 2):7-14, 1999

crise d e com preen são é n ossa” (Valla , 1996b ), a

d e s c o b e rt a d a p rop osta d o ap oio so cial se ja m ais im p or tan te p ara aq ue les p rofission ais d e ed ucaçã o e saú d e p reocu p ad os com o destin o d essa s p arce las d a c h am a d a p op u laç ão “d e s-c a rt á ve l”.

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