Universidade Federal de Mato Grosso
Instituto de Ciˆencias Exatas e da TerraDepartamento de Matem´atica
Inteiros que se escrevem na forma
x
2+
qy
2, q
= 1,
2,
3, ... .
Ricardo de Jesus Caldas Assis
Mestrado Profissional em Matem´atica: PROFMAT/SBM
Orientador: Prof. Dr. Martinho da Costa Ara´ujo
Cuiab´a - MT
Inteiros que se escrevem na forma
x
2+
qy
2, q
= 1,
2,
3, ... .
Este exemplar corresponde `a reda¸c˜ao final da dis-serta¸c˜ao, devidamente corrigida e defendida por Ricardo de Jesus Caldas Assis e aprovada pela co-miss˜ao julgadora.
Cuiab´a, 10 de setembro de 2015.
Prof. Dr. Martinho da Costa Ara´ujo Orientador
Banca examinadora:
Prof. Dr. Martinho da Costa Ara´ujo Prof. Dr. Jos´e de Arimat´eia Fernandes Prof. Dr. Daniel Carlos Leite.
Disserta¸c˜ao de Mestrado defendida em 10 de Agosto de 2015 e aprovada pela
banca examinadora composta pelos Professores Doutores
Prof. Dr. Martinho da Costa Ara´ujo
Prof. Dr. Jos´e de Arimat´eia Fernandes
`
A minha doce amada e meu amado
Agradecimentos
Aos que aqui chegaram, vale lembrar as palavras do ap´ostolo Paulo:
Posso todas as coisas,
naquele que me fortalece
(Filipenses 4 : 13).
Resumo
Nesta disserta¸c˜ao estamos interessados nos inteiros n que se escrevem na forma
x2+ 2y2 e x2+ 3y2. Problema proposto por Fermat em 1654. A prova do teorema
sobre os inteiros que se escrevem como soma de dois quadrados x2 + y2 pode ser
adaptada para determinar os inteiros que se escrevem na formax2+ 2y2 ex2+ 3y2.Neste
caso, precisamos do teorema da fatora¸c˜ao ´unica em produto de primos para n´umeros da forma a +b√−2;a+bξ3
ξ3 = −1+
√ −3 2
, juntamente com alguns t´opicos de teoria dos n´umeros.
Abstract
In this work we are interested in the integers n that are written in the form
x2+ 2y2 and x2+ 3y2. This problem was proposed by Fermat in 1654. The proof of the
theorem about the integers that are written as the sum of two squares x2 +y2 can be
adapted in order to determine the integers that can be writing in the formsx2+ 2y2 and
x2+ 3y2. In this case, we need to use the theorem of unique factorization on the product
of primes for numbers of the forma+b√−2;a+bξ3
ξ3 = −1+
√ −3 2
, together with some topics of Number Fields.
Sum´
ario
Agradecimentos v
Resumo vii
Abstract viii
Introdu¸c˜ao 1
1 Os conjuntos Z[i] e Z[√−2] 3
1.1 O conjunto Z[i] . . . 3
1.1.1 Norma em Z[i] . . . 4
1.1.2 Elementos Invert´ıveis em Z[i] . . . 5
1.1.3 Divisibilidade em Z[i] . . . 5
1.1.4 Divis˜ao Euclidiana em Z[i] . . . 6
1.1.5 Lema de Euclides . . . 7
1.1.6 Fatora¸c˜ao ´Unica emZ[i] . . . 9
1.1.7 Congruˆencias M´odulo n e o Conjunto Zn . . . 10
1.1.8 Elementos Primos em Z[i] . . . 15
1.1.9 Elementos Irredut´ıveis em Z[i] . . . 16
1.2 O conjunto Z[√−2] . . . 17
1.2.1 Norma em Z[√−2] . . . 18
1.2.2 Elementos Invert´ıveis em Z[√−2] . . . 19
1.2.3 Divisibilidade em Z[√−2] . . . 19
1.2.4 Divis˜ao Euclidiana em Z[√−2] . . . 20
1.2.5 Lema de Euclides . . . 21
1.2.7 Elementos Primos em Z[√−2] . . . 23
1.2.8 Elementos Irredut´ıveis em Z[√−2] . . . 24
2 Reciprocidade Quadr´atica 26 2.1 Res´ıduos quadr´aticos e n˜ao-quadr´aticos . . . 26
2.2 S´ımbolo de Legendre . . . 26
2.3 Crit´erio de Euler . . . 27
2.4 Lei de Reciprocidade Quadr´atica de Gauss . . . 29
3 Inteiros que se escrevem na forma x2+qy2, q = 1,2 e 3. 36 3.1 Inteiros que se escrevem na forma x2+y2 . . . 36
3.2 Inteiros que se escrevem na forma x2+ 2y2 . . . 40
3.3 Inteiros que se escrevem na forma x2+ 3y2 . . . 44
Introdu¸c˜
ao
Os n´umeros primos que se escrevem na formax2+y2 foram estudados,
primeira-mente, por Fermat, em 1654,e s˜ao abordados em v´arios cursos de Teoria dos N´umeros at´e os dias de hoje. Em seus estudos, Fermat caracterizou os n´umeros primos que se escrevem como soma de dois quadrados e, posteriormente, outros matem´aticos formularam novas demonstra¸c˜oes que caracterizaram tais primos. Na atualidade, vem sendo estudados os primos da formarx2 +qy2, onde r eq s˜ao inteiros livres de quadrados. Abordaremos os
primos na forma x2+qy2 com q = 1,2 e 3, buscando uma caracterizac˜ao para tais,
con-forme Clark (2003), de forma que os leitores compreendam esta caracteriza¸c˜ao. Faremos a fundamenta¸c˜ao te´orica baseada em alguns t´opicos elementares de teoria dos n´umeros como, por exemplo, inteiros gaussianos, reciprocidade quadr´atica, fatora¸c˜ao ´unica, etc. Posteriomente, `a fundamenta¸c˜ao te´orica, caracterizaremos os primos na formax2+y2,e,
logo ap´os, os primos na formax2+ 2y2 e x2+ 3y2.
Como este tema ´e alvo de muitos estudos na atualidade, ´e interessante apresent´a-lo aos leitores interessados, por meio deste trabalho. Ser˜ao desenvolvidas algumas etapas, as quais tem como objetivo nos levar a caracteriza¸c˜ao de primos que se escrevem na forma
x2+qy2 com q = 1,2 e 3. Cada etapa depende da teoria feita anteriormente e por meio
de casos particulares conjecturaremos um resultado e o demonstraremos. Esperamos que todos os leitores entendam o desenvolvimento de cada etapa, e juntos possamos obter uma caracterizac˜ao dos n´umeros primos que estamos procurando.
Trataremos no Cap´ıtulo 1 sobre os conjuntos Z[i] eZ[√−2], deixando claro as suas de-fini¸c˜oes e destacando algumas de suas propriedades. Este cap´ıtulo serve de alicerce para o resultado principal do trabalho e a teoria desenvolvida pode ser encontrada nas seguintes referˆencias bibliogr´aficas: Vitorino e ao (2013), Dias (2001), Stillwell (2003) e Moreira et al. (2012).
de Euler, Lei de Reciprocidade Quadr´atica de Gauss, entre outros. Estes conceitos de teoria dos n´umeros ser˜ao valiosos para o desenvolvimento do trabalho e podem ser encon-trados nas seguintes referˆencias bibliogr´aficas: Hefez (2011) e Santos (2007).
Cap´ıtulo 1
Os conjuntos
Z
[
i
]
e
Z
[
√
−
2]
Neste trabalho vamos usar os seguintes conjuntos:
Z={0,±1,±2,±3, ...}
Z+={x∈Z;x≥0}={0,1,2,3,4, ...}.
Neste cap´ıtulo destacaremos alguns resultados sobre os conjuntosZ[i] e oZ[√−2].
Estes resultados nos auxiliar˜ao no resultado desejado do trabalho.
1.1
O conjunto
Z
[i]
Defini¸c˜ao 1.1 O conjunto dos inteiros de Gauss (ou inteiros Gaussianos) ´e o
Z[i] ={a+bi| a, b∈Z}, onde i2 =−1.
Dados z =a+bi, w =c+di ∈Z[i], definimos z+w∈Z[i] e z.w ∈Z[i], por: 1. z+w= (a+bi) + (c+di) = (a+c) + (b+d)i
2. z.w = (a+bi).(c+di) = (ac−bd) + (ad+bc)i.
As opera¸c˜oes de adi¸c˜ao e multiplica¸c˜ao em Z[i] tem as seguintes propriedades, e para todoz, w, u∈Z[i], temos
1. Associativa da adi¸c˜ao: z+ (w+u) = (z+w) +u;
3. Elemento oposto da adi¸c˜ao: ∃ −z ∈Z[i] tal quez+ (−z) = 0 = (−z) +z; 4. Comutativa da adi¸c˜ao: z+w=w+z;
5. Associativa da multiplica¸c˜ao: z.(w.u) = (z.w).u; 6. Comutativa da multiplica¸c˜ao: z.w =w.z;
7. Valem as leis distributivas da multiplica¸c˜ao: z.(w+u) = (z.w) + (z.u) e (w+u).z = (w.z) + (u.z);
8. Elemento neutro da multiplica¸c˜ao: ∃1∈Z[i] tal quez.1 = 1.z =z.
Observa¸c˜ao 1.1 Os elementos0 = 0+0.i,1 = 1+0.i e −a−bis˜ao ditos, respectivamente, elemento neutro da adi¸c˜ao, elemento neutro da multiplica¸c˜ao e elemento oposto em Z[i].
Exemplo 1.1 Sejam z= 3−i, w = 5 + 2i∈Z[i], temos:
z+w= (3−i) + (5 + 2i) = 8 +i z.w= (3−i).(5 + 2i) = 17 +i.
Defini¸c˜ao 1.2 Dado z =a+bi∈Z[i],dizemos que z =a−bi ´e o seu conjugado emZ[i].
Exemplo 1.2 Sejam z= 2−i, w = 3 + 2i∈Z[i], temos:
z= 2 +i e w= 3−2i.
Exemplo 1.3 Verificar que para todo z, w∈Z[i] tem-se z.w =z.w.
Com efeito, sejam z =a+bi, w =c+di∈Z[i], temos
z.w= (ac−bd) + (ad+bc)i= (ac−bd)−(ad+bc)i= (a−bi).(c−di) =z.w.
Veremos, agora, algumas propriedades e resultados importantes dosInteiros Gaus-sianos. Por quest˜oes did´aticas, dividiremos o que vem a seguir em subse¸c˜oes. Come¸caremos com a defini¸c˜ao de norma.
1.1.1
Norma em
Z[
i
]
Defini¸c˜ao 1.3 A fun¸c˜ao N : Z[i] → Z+ dada por N(z) = z.z,∀z ∈ Z[i], ´e dita norma
Observa¸c˜ao 1.2 Dado z =a+bi, temos N(z) =z.z = (a+bi).(a−bi) =a2+b2.
Exemplo 1.4 Dado z = 3 + 4i∈Z[i], temos N(z) =N(3 + 4i) = 32+ 42 = 25.
Na proposi¸c˜ao a seguir, veremos que a norma ´e multiplicativa em Z[i]. Proposi¸c˜ao 1.1 Se z, w ∈Z[i], ent˜ao N(z.w) =N(z).N(w).
Demonstra¸c˜ao:
De fato, temos que N(zw) =zwzw =zzww =N(z)N(w).
1.1.2
Elementos Invert´ıveis em
Z[
i
]
No conjunto dos n´umeros inteirosZos n´umeros invert´ıveis s˜ao±1 com as opera¸c˜oes usuais. Agora, vamos definir elementos invert´ıveis em Z[i] e determinar o conjunto dos elementos invert´ıveis deZ[i].
Defini¸c˜ao 1.4 Um elemento z ∈ Z[i], z 6= 0, ´e dito invert´ıvel se existe 0 6=w ∈Z[i], tal quez.w = 1.
Afirma¸c˜ao: O conjunto (Z[i])∗ ={z|N(z) = 1}={±1, ±i}´e o conjunto dos elementos
invert´ıveis deZ[i].
De fato, se z =a+bi ´e invert´ıvel em Z[i], ent˜ao 1 =N(z.w) =N(z)N(w), da´ı
N(z) = 1 ⇔ a2 +b2 = 1 ⇔ a = ±1, b = 0 ou a = 0, b = ±1, da´ız = ±1,±i. Ent˜ao,
como os quatros possuem inverso temos, (Z[i])∗ = {z| N(z) = 1} = {±1, ±i} ´e o
conjunto dos elementos invert´ıveis de Z[i].
1.1.3
Divisibilidade em
Z[
i
]
De maneira inteiramente an´aloga a divisibilidade em Z podemos definir a divisi-bilidade em Z[i]. Vamos, ent˜ao, `a defini¸c˜ao e algumas propriedades da divisibilidade em
Z[i].
Defini¸c˜ao 1.5 Para z, w ∈Z[i], dizemos que z divide w se existe u∈Z[i], n˜ao-nulo, tal quew=z.u.
Exemplo 1.5 Note que −1|i pois, i= (−1)(−i) e 3 + 4i|25 pois, 25 = (3 + 4i)(3−4i).
Vejamos algumas propriedades da divisibilidade em Z[i] na seguinte proposi¸c˜ao: Proposi¸c˜ao 1.2 Sejam z, w, u∈Z[i]. Ent˜ao,
1. 1|z e z|z;
2. Se z|1, ent˜ao z= 1,−1, i ou −i;
3. Se z|w e w|u, ent˜ao z|u;
4. Se z|w, ent˜ao N(z)|N(w).
Demonstra¸c˜ao:
De fato, como z = 1.z, assim provamos 1. Se z|1, temos que existe v ∈ Z[i] tal que1 = z.v, logo 1 =N(z).N(v), o que significa dizer que z ∈(Z[i])∗, isto ´e,
z= 1,−1, i ou −i, com isso provamos 2. Agora, se z|w e w|u, tem-se que existem v, s∈
Z[i] tais que w = z.v e u = w.s, logo u = z.v.s = (v.s).z, ou seja, z|u. Finalmente, se
z|w, existe v ∈Z[i] tal que w=z.v, logo N(w) =N(z).N(v), ou seja, N(z)|N(w), o que conclui a demonstra¸c˜ao.
1.1.4
Divis˜
ao Euclidiana em
Z
[
i
]
Nesta subse¸c˜ao vamos descrever a chamada divis˜ao euclidiana. Primeiramente, vamos relembrar o conceito de divis˜ao euclidiana,ou divis˜ao com resto, nos n´umeros in-teiros, que ´e uma das quatro opera¸c˜oes que toda crian¸ca aprende na escola, e estenderemos o conceito para os inteiros gaussianos. Sua formula¸c˜ao precisa ´e: dadosa, b∈Z com
b6= 0, existem q, r ∈Z com a=bq+r e 0 ≤r <|b|.
Proposi¸c˜ao 1.3 Dados z, w ∈Z[i] com w6= 0, existem q, r ∈Z[i] com z =wq+r e
0≤N(r)< N(w).
Demonstra¸c˜ao:
Basta dividir z =x+yi, w=a+bi, onde x, y, a, b ∈Z. Ent˜ao,
z w =
x+yi a+bi.
a−bi a−bi =
xa−xbi+yai−ybi2
a2+b2 =
xa+yb a2+b2 +
ya−xb a2+b2 i.
Tomando m e n como os inteiros mais pr´oximos de xa+yb
a2 +b2 e
ya−xb
a2+b2, respectivamente,
temos que :
m− xa+yb a2 +b2
,
n− ya−xb a2+b2
≤ 1 2.
Se q=m+ni, ent˜ao:
r=z−wq=wz w−q
=w
xa+yb
a2+b2 −m+
ya−xb a2+b2 −n
i
,
o que implica,
N(r)≤N(w)
1 2 2 + 1 2 2!
= N(w)
2 < N(w).
1.1.5
Lema de Euclides
Utilizaremos a divis˜ao euclidiana para demonstrar o Lema de Euclides, mas, primeiramente, daremos uma defini¸c˜ao de primo emZ[i].
Defini¸c˜ao 1.6 Dizemos que p ´e um primo em Z[i], quando p n˜ao pode ser escrito como produto de dois inteiros deZ[i] cujas normas s˜ao maiores que 1.
Exemplo 1.6 Verificar que z = 1 +i´e primo em Z[i].
De fato, suponha que existam w, u∈Z[i] tais que 1 +i=w.u, ent˜ao
2 =N(w).N(u). Logo, w ou u tem norma igual a 1. Portanto, z = 1 +i ´e um primo em
Z[i].
todos primos.
O pr´oximo resultado nos aux´ılia na verifica¸c˜ao de primalidade em Z[i].
Proposi¸c˜ao 1.4 Se N(z) ´e primo em Z, ent˜ao z ´e primo em Z[i].
Demonstra¸c˜ao:
Suponha que z n˜ao ´e primo em Z[i]. Ent˜ao, existem w, u ∈ Z[i], w, u 6= 0, tais quez =wu e N(w), N(u)>1. Isto ´e uma contradi¸c˜ao pois, N(z) ´e primo em Z.
Exemplo 1.7 Verificar que 1−i ´e primo de Z[i].
Com efeito, como N(1−i) = 2 e 2´e primo em Z ent˜aoz ´e primo em Z[i].
O pr´oximo resultado, Lema de Euclides, nos garante que se um primo em Z[i] divide um produto de dois inteiros gaussianos, ent˜ao ele divide um dos fatores.
Lema 1.1 (Lema de Euclides) Se p´e um primo em Z[i], coma, b∈Z[i] e p|ab,ent˜ao
p|a ou p|b.
Demonstra¸c˜ao:
Para demonstr´a-lo, vamos fazer sucessivas divis˜oes euclidianas, sendo x0 =a e
x1 =p. Seja xk+2 o resto da divis˜ao euclidiana de xk por xk+1. Temos ent˜ao as divis˜oes:
x0 =q1x1+x2
x1 =q2x2+x3
x2 =q3x3+x4
... xn−2 =qn−1xn−1+xn
xn−1 =qnxn+xn+1
Observe que como xk 6= 0 ⇒ N(xk+1) < N(xk), podemos tomar n tal que
N(xn+1) = 0, ou seja, xn+1 = 0. Logo xn|xn−1. Observe que xn|xk−1 e xn|xk. Logo,
xn|x0 = a e xn|x1 = p. Tomando as j + 1 primeiras equa¸c˜oes e realizando substitui¸c˜oes
adequadas, temos que xj =ajx1+yjx0 =ajp+yja; particularmente xn =anp+yna. Se
p|a ent˜ao o lema est´a demonstrado. Se p n˜ao divide a, ent˜ao, como xn|p, xn|a e
xn = anp +yna, ent˜ao xn ∈ {±1,±i} e temos: xn = anp + yna se, e somente se,
b= (xn)−1(banp+ynab) implicando que p|b, o que conclui a demonstra¸c˜ao.
1.1.6
Fatora¸c˜
ao ´
Unica em
Z
[
i
]
A fatora¸c˜ao ´unica ´e uma das propriedades mais usadas em problemas envolvendo n´umeros inteiros. Vamos prov´a-la para os inteiros de Gauss. Primeiramente provaremos que todo inteiroz de Gauss com norma maior do que 1 pode ser escrito como o produto de um ou mais primos emZ[i]. Se N(z) = 2,como 2 ´e primo e a norma ´e multiplicativa, ent˜ao z ´e primo, portanto est´a provado. Considere N(z)>2. Se z ´e primo a fatora¸c˜ao ´e imediata. Sez n˜ao ´e primo, ent˜ao z=ab implicando queN(z) =N(a).N(b), onde
N(a), N(b)>1, e N(a), N(b)< N(z).Podemos supor, por indu¸c˜ao, que seN(x)< N(z),
ent˜ao x ´e fator´avel. Logo, a e b s˜ao fator´aveis, e portanto z o ´e. Para provar que esta fatora¸c˜ao ´e ´unica, basta considerar as duas fatora¸c˜oes p1p2...pn eq1q2...qm.Suponha, por
indu¸c˜ao, p1p2...pn=ξq1q2...qm,sendo ξ um invert´ıvel, implica que a sequˆencia (pi) ´e uma
permuta¸c˜ao (a menos que sejam multiplica¸c˜oes pelos invert´ıveis) da (qi).Se m´ax{n;m}=
1, ent˜ao o resultado ´e imediato. Supondo que ele vale se m´ax{n′;m′}<m´ax{n;m},pelo Lema de Euclides, vemos que para algum i, pn|qi. Sem perda de generalidade, podemos
supor i =m. Como pn e qm s˜ao primos, ent˜ao qm = ξ′pn, onde ξ′ ´e um invert´ıvel. Logo
p1p2...pn = ξq1q2...qm ⇔ p1p2..pn−1 = ξξ′q1q2..qm−1. Por indu¸c˜ao, p1, p2, ..., pn−1 ´e uma
permuta¸c˜ao( a menos que seja multiplica¸c˜oes pelos invert´ıveis) de q1, q2, ..., qm, portanto
a fatora¸c˜ao ´e ´unica. Com isso, provamos a seguinte proposi¸c˜ao:
Proposi¸c˜ao 1.5 Seja z ∈ Z[i], ent˜ao existem z1, z2, ..., zn ∈ Z[i], unicos e primos, tais´ quez =z1.z2...zn.
Exemplo 1.8 Considere as seguintes fatora¸c˜oes
1.1.7
Congruˆ
encias M´
odulo
n
e o Conjunto
Z
nO conceito de congruˆencia de inteiros foi introduzido e estudado por Gauss e ´e utilizado para enfatizar o resto da divis˜ao euclidiana. Est´a se¸c˜ao ser´a ´util pois a linguagem de congruˆencia m´odulon e classes de equivalˆencia ser˜ao utilizadas com muita frequˆencia. Defini¸c˜ao 1.7 (Congruˆencia m´odulo n) Seja n ≥ 2 um inteiro e a, b ∈ Z. Dizemos quea ´e congruente a b m´odulo n se, e somente se, n|(a−b).
Quando a ´e congruente a b m´odulo n escrevemos a ≡b(mod n). Caso contr´ario, escrevemos a6≡b(mod n). A express˜aoa ≡b(mod n) lˆe-se a ´e congruente a b m´odulon.
Exemplo 1.9 Veja as congruˆencias
1. 25≡37(mod 6), pois 25−37 =−12 e 6| −12
2. 136≡22(mod 5), pois 13−22 =−9 e 5 n˜ao divide −9.
A seguir veremos uma propriedade muito interessante da congruˆencia m´odulo n.
Proposi¸c˜ao 1.6 A congruˆencia m´odulo n ´e uma rela¸c˜ao de equivalˆencia emZ. Ou seja, para todoa, b, c∈Z a congruˆencia m´odulo n satisfaz:
1. a ≡a(mod n);
2. Se a≡b(mod n), ent˜ao b≡a(mod n);
3. Se a≡b(mod n) e b ≡c(mod n), ent˜ao a≡c(mod n).
Demonstra¸c˜ao:
Vide Villela (2000).
Veremos agora que o conceito de congruˆencia de inteiros m´odulo n pode ser utilizado para enfatizar o resto da divis˜ao euclidiana porn.
Proposi¸c˜ao 1.7 Seja n ≥2. Ent˜ao a≡b(mod n) se, e somente se, a e b tˆem o mesmo resto na divis˜ao euclidiana por n.
Demonstra¸c˜ao:
Exemplo 1.10 Os n´umeros25e 100deixam resto0na divis˜ao por5,logo25≡100(mod5).
As seguintes propriedades adicionais das congruˆencias s˜ao muito ´uteis nas aplica¸c˜oes do conceito de congruˆencia.
Proposi¸c˜ao 1.8 (Propriedades das congruˆencias) Sejam a, b, c, d∈Z e seja n≥2.
1. se a≡b(mod n) e c≡d(mod n), ent˜ao a+c≡b+d(mod n)
2. se a≡b(mod n) e c≡d(mod n), ent˜ao ac≡bd(mod n)
3. se a≡b(mod n), ent˜ao am≡bm(mod n), para todo m≥1.
Demonstra¸c˜ao:
Vide Villela (2000).
Exemplo 1.11 Qual o resto da divis˜ao de 747 por 9?
Temos 72 = 49≡ 4(mod 9), ent˜ao 73 = 72.7 ≡4.7 = 28 ≡1(mod 9). Portanto,
747 = 73.15+2 = (73)15.72 ≡115.4 = 4(mod 9), ou seja, o resto ´e 4.
Seja n ≥ 2 um inteiro. Pela Proposi¸c˜ao 1.6 a congruˆencia m´odulo n ´e uma rela¸c˜ao de equivalˆencia. A classe de equivalˆencia de um inteiroa na congruˆencia m´odulo
n´e chamada de classe residual m´odulo n ou, simplesmente, classe de res´ıduos m´odulo n.
Assim, escrevemos a classe de res´ıduos m´odulo n da seguinte forma: [a] ={x∈Z/ x≡a(mod n)}={x∈Z/ n|(x−a)}.
Exemplo 1.12 Seja n = 2. Dado a ∈ Z, pela divis˜ao euclidiana, existem q e r, unica-mente determinados, tais que a= 2.q+r, com 0≤r≤1. Logo,
[a] =
[0] se, e somente se, a ´e par
[1] se, e somente se, a ´e ´ımpar.
Logo, s´o h´a duas classes distintas m´odulo 2, a saber [0] e [1]. Das propriedades de rela¸c˜ao de equivalˆencia,Z= [0]∪[1], onde [0] = 2.Z={2t/ t∈Z} e
Proposi¸c˜ao 1.9 Seja n≥2. Para cada a∈Z existe um ´unico r ∈Z, com
0 ≤ r ≤ n−1, tal que [a] = [r]. Logo, h´a n classes de res´ıduos m´odulo n distintas, a saber, [0],[1], ...,[n−1], onde [r] =nZ+r e Z= [0]∪[1]∪....∪[n−1].
Demonstra¸c˜ao:
Seja a ∈ Z. Dividindo a por n, existem q, r ∈ Z unicamente determinados, com
0≤r ≤n−1, tais que
a=qn+r.
De a=qn+r, conclu´ımos que a ≡r(mod n), ou seja, [a] = [r],em outras palavras existe talr. Agora, sejamr, s∈Ztais que 0≤r, s≤n−1 e [r] = [s].Vamos mostrar que r=s.
De fato, de−(n−1)≤r, s≤(n−1) e n|(r−s), conclu´ımos que r−s = 0, isto ´e, r=s.
Portanto, r ´e ´unico.
Defini¸c˜ao 1.8 (Conjunto das Classes de Res´ıduos M´odulo n) O conjuntoZn´e cha-mado de conjunto das classes de res´ıduos m´odulo n, ou seja,
Zn={[0],[1], ....,[n−1]}.
Exemplo 1.13 Vejamos para alguns valores de n o conjunto Zn correspondente. 1. Para n = 2, temos Z2 ={[0],[1]};
2. Para n = 3, temos Z3 ={[0],[1],[2]};
3. Para n = 5, temos Z5 ={[0],[1],[2],[3],[4]};
4. Para n = 8, temos Z8 ={[0],[1],[2],[3],[4],[5],[6],[7]}.
Vamos definir emZnas opera¸c˜oes de adi¸c˜ao e multiplica¸c˜ao entre seus elementos.
Defini¸c˜ao 1.9 (Adi¸c˜ao e Multiplica¸c˜ao em Zn) Sejam n≥2 e a, b∈Z. Definimos 1. [a] + [b] = [a+b]
Observamos que essas defini¸c˜oes n˜ao dependem dos representantes das classes de res´ıduos. De fato, pelas propriedades das congruˆencias, temos
a≡a1(mod n) e b≡b1(mod n)⇔
a+b ≡a1+b1(mod n) e a.b≡a1.b1(mod n)⇔
[a+b] = [a1+b1] e [a.b] = [a1.b1]⇔
[a] + [b] = [a1] + [b1] e [a].[b] = [a1].[b1].
Portanto, a adi¸c˜ao e a multiplica¸c˜ao das classes de res´ıduos independem do inteiro que ´e representante da classe.
Vejamos as tabelas das opera¸c˜oes emZ2.
Exemplo 1.14 Tabelas das opera¸c˜oes em Z2
+ [0] [1] [0] [0] [1] [1] [1] [0]
. [0] [1] [0] [0] [0] [1] [0] [1]
Proposi¸c˜ao 1.10 (Propriedades da adi¸c˜ao e multiplica¸c˜ao de Zn) Seja n ≥ 2. A adi¸c˜ao e a multiplica¸c˜ao de Zn tˆem as seguintes propriedades, para quaisquer
[a],[b],[c]∈Zn:
1. (Associativa da adi¸c˜ao) ([a] + [b]) + [c] = [a] + ([b] + [c]);
2. (Comutativa da adi¸c˜ao) [a] + [b] = [b] + [a];
3. (Existˆencia de elemento neutro da adi¸c˜ao) [0]´e o elemento neutro aditivo
[0] + [a] = [a];
4. (Existˆencia do oposto da adi¸c˜ao) O oposto de [a] ´e [−a] tal que [a] + [−a] = [0];
5. (Associativa da multiplica¸c˜ao) ([a].[b]).[c] = [a].([b].[c]);
6. (Comutativa da multiplica¸c˜ao) [a].[b] = [b].[a];
8. (Distributiva da multiplica¸c˜ao) ([a] + [b]).[c] = [a].[c] + [b].[c].
Demonstra¸c˜ao:
Vide Villela (2000).
O pr´oximo resultado nos d´a um crit´erio para determinar se um elemento ´e in-vert´ıvel ou n˜ao em Zn.
Proposi¸c˜ao 1.11 Seja n ≥ 2. Um elemento [a] ∈ Zn ´e invert´ıvel se, e somente se,
mdc(a, n) = 1.
Demonstra¸c˜ao:
Seja [a]∈Zn um elemento invert´ıvel. Ent˜ao, existe [b]∈Zn tal que
[1] = [a][b] = [ab].Logo, ab≡1(mod n),ou seja,n|(ab−1).Portanto, existe q∈Z tal que
ab−1 = qn,isto ´e, a(b) +n(−q) = 1.Da´ı, conclu´ımos que mdc(a, n) = 1. Por outro lado, suponhamos que mdc(a, n) = 1. Ent˜ao, existem x, y ∈ Z tais que ax+ny = 1. Portanto,
[1] = [ax+ny] = [a][x] + [n][y] = [a][x] + [0][y] = [a][x], mostrando que [x] ´e o inverso de
[a].
Exemplo 1.15 Vamos obter o conjunto dos elementos invert´ıveis de Z10.
Para cada i ∈ {0,1, ....,9}, temos mdc(i,10) = 1 se, e somente se, i ∈ {1,3,7,9}. Por-tanto, (Z10)∗ ={[1],[3],[7],[9]}.
Exemplo 1.16 Vamos obter o conjunto dos elementos invert´ıveis de Z11.
Note que se i∈ {1, ....,9,10}, ent˜ao mdc(i,11) = 1. Portanto,
(Z11)∗ ={[1],[2], ....,[10]}=Z11− {[0]}.
Corol´ario 1.1 Todo elemento n˜ao-nulo de Zp, com p primo, ´e invert´ıvel. Demonstra¸c˜ao:
De fato, pela proposi¸c˜ao anterior para cada i ∈ {1,2, ..., p − 1} temos que
mdc(i, p) = 1. Portanto, (Zp)∗ =Zp− {[0]}.
Exemplo 1.17 Em Z3 = {[0],[1],[2]}, os inversos de [1] e [2] s˜ao, respectivamente,
[1]e [2], pois [1]2 = [1] e [2]2 = [1].
1.1.8
Elementos Primos em
Z
[
i
]
Agora vamos caracterizar os primos em Z[i].Pela Proposi¸c˜ao1.4 seN(z) ´e primo emZ,ent˜aoz ´e um primo emZ[i] ( pois sez fatora ent˜aoN(z) fatora). Observe que todo primo z divide N(z), portanto ele deve dividir ao menos um fator primo em Z deN(z).
Se z dividir ao menos dois n´umeros distintos(absolutamente) x e y primos em Z, como sempre ´e poss´ıvel tomar a, b ∈ Z tal que ax+by = 1, ter´ıamos z|1, um absurdo. Logo, todo primo em Z[i] divide exatamente um primo inteiro positivo (e seu elemento oposto da soma) emZ. Seja esse primo inteiro positivop. Temos 3(trˆes) casos:
1. Se p ´e par, ent˜ao p = 2. Sendo z = a+bi, ent˜ao N(z) = a2 +b2 = 2, ou seja,
z =±1±i,e obtemos os quatro primos 1 +i,1−i,−1 +i e −1−i.
2. Se p ≡ 3(mod 4). Note que x ≡ 0,1,2 ou 3(mod 4), ent˜ao x2 ≡ 0 ou 1(mod 4).
Queremos mostrar que p´e um primo em Z[i]. Suponha que p n˜ao ´e primo de Z[i],
ent˜ao existem z = c+di, w = a+bi ∈ Z[i], com 1 < N(z), N(w) < p2, tais que
p=zw. Como p´e um inteiro primo, devemos ter w=z =c−di, logo p=c2+d2.
Agora, p = c2 +d2 ≡ 0,1 ou 2(mod 4), o que ´e um absurdo, pois por hip´otese
p≡3(mod 4). Portanto, p´e um primo em Z[i].
3. Se p≡1(mod 4).Dado x= 1.2... p−21
, temos que:
x2 ≡1.2...
p−1 2
.1.2...
p−1 2
≡1.2...
p−1 2
.
p+ 1 2
...(p−2).(p−1)≡ 1.(p−1)≡ −1(mod p).
Logo, p|x2+ 1 = (x+i)(x−i).Suponha que p´e um primo de Z[i], ent˜ao peloLema
de Euclides p|(x+i) ou p|(x−i).Da´ı, existem z1, z2 ∈Z[i] tais quex+i=p.z1 ou
x−i =pz2. Mas, ter´ıamos z1 = 1px+ 1pi ouz2 = 1px− 1pi e 1p n˜ao ´e inteiro. Logo, p
n˜ao ´e primo de Z[i], da´ı existem z =a+bi, w=c+di∈Z[i], com
1 < N(z), N(w) < p2, tais que p =wz = (a+bi)(c+di) = (ac−bd) + (bc+ad)i.
Como p ∈Z, ent˜ao bc =−ad, ou seja, a =ce b=−d ou a=−c eb =d, com isso conclu´ımos quew=±z.Logo, comop >0 segue quew=z eN(z) = p(p=a2+b2),
portanto conclu´ımos que z ´e primo e mais z e seu conjugado s˜ao os ´unicos primos em Z[i] que dividem p.
(a) O primo 1 +i e seus produtos pelos invert´ıveis.
(b) Os primos p em Z tal que p≡3(mod 4) e seus produtos pelos invert´ıveis. (c) Para cada primo p em Z tal que p≡1(mod 4), os primosa+bi, a−bi e seus
produtos pelos invert´ıveis, sendo p=a2+b2.
1.1.9
Elementos Irredut´ıveis em
Z
[
i
]
Em Z, os conceitos de elemento irredut´ıvel e elemento primo coincidem, ou seja, um elemento p´e irredut´ıvel se, e somente se, ´e primo. No conjunto Z[i] veremos que os conceitos de primo e irredut´ıvel tamb´em coincidem, isto segue do fato de que em Z[i] a fatora¸c˜ao ´e ´unica.
Defini¸c˜ao 1.10 Um elemento z ∈ Z[i], n˜ao-nulo e n˜ao-invert´ıvel, ´e dito irredut´ıvel quando z =wu com w ou u invert´ıvel em Z[i].
Exemplo 1.18 Verificar que z = 1 +i ´e irredut´ıvel em Z[i].
De fato, escrevendo 1 +i = wu, com w, u ∈ Z[i], temos 2 = N(w)N(u). Logo,
N(w) = 1 ou N(u) = 1 e da´ı conclu´ımos que w ou u ´e invert´ıvel em Z[i]. Portanto,
z= 1 +i´e irredut´ıvel em Z[i].
Observa¸c˜ao 1.4 E facil verificar que os produtos de´ 1 +i pelos invert´ıveis tamb´em s˜ao irredut´ıveis em Z[i].
O pr´oximo resultado mostra que um elemento p ´e primo em Z[i] se, e somente se,p´e irredut´ıvel em Z[i].
Proposi¸c˜ao 1.12 Seja p∈Z[i],com pn˜ao-nulo e n˜ao-invert´ıvel. Ent˜aop´e um elemento primo de Z[i] se, e somente se, p ´e um elemento irredut´ıvel de Z[i].
Demonstra¸c˜ao:
Se p=wu com w, u∈Z[i], ent˜aop|wu e, como p ´e primo, temos quep|w ou p|u.
u=u1...us, com wi e uj elementos irredut´ıveis de Z[i], temos que uma fatora¸c˜ao para ab ´e
ab=w1....wr.u1....us.
Como p|wu, temos que wu = pz, para algum z ∈ Z[i]. Pela unicidade da fatora¸c˜ao de
wu, temos que p = wiv ou p = ujv, com v invert´ıvel, para algum ´ındice i, j. Agora, se
p|wi e wi|w, implica que p|w, por outro lado se p|uj e uj|u, implica que p|u, o que mostra quep ´e primo.
1.2
O conjunto
Z
[
√
−
2]
Defini¸c˜ao 1.11 O conjunto dos inteiros quadr´aticos ´e dado por
Z[√−2] = {a+b√−2| a, b∈Z}={a+b√2i| a, b∈Z onde i2 =−1}.
Dados z =a+b√−2, w =c+d√−2∈Z[√−2], definimos z+w∈Z[√−2] e
z.w∈Z[√−2],por:
1. z+w= (a+b√−2) + (c+d√−2) = (a+c) + (b+d)√−2 2. z.w = (a+b√−2).(c+d√−2) = (ac−2bd) + (ad+bc)√−2.
As opera¸c˜oes de adi¸c˜ao e multiplica¸c˜ao emZ[√−2] tem as seguintes propriedades: Para todo z, w, u∈Z[√−2],temos
1. Associativa da adi¸c˜ao: z+ (w+u) = (z+w) +u;
2. Elemento neutro da adi¸c˜ao: ∃0∈Z[√−2] tal que z+ 0 = 0 +z =z;
3. Elemento oposto da adi¸c˜ao: ∃ −z ∈Z[√−2] tal que z+ (−z) = 0 = (−z) +z; 4. Comutativa da adi¸c˜ao: z+w=w+z;
5. Associativa da multiplica¸c˜ao: z.(w.u) = (z.w).u; 6. Comutativa da multiplica¸c˜ao: z.w =w.z;
8. Elemento neutro da multiplica¸c˜ao: ∃1∈Z[√−2] tal que z.1 = 1.z =z.
Observa¸c˜ao 1.5 Os elementos 0 = 0 + 0.√−2,1 = 1 + 0.√−2 e −a−b√−2 s˜ao ditos, respectivamente, elemento neutro da adi¸c˜ao, elemento neutro da multiplica¸c˜ao e elemento
oposto emZ[√−2].
Exemplo 1.19 Sejam z = 2−√−2, w= 3 + 2√−2∈Z[√−2], temos que:
z+w= (2−√−2) + (3 + 2√−2) = 5 +√−2
z.w= (2−√−2).(3 + 2√−2) = 10 +√−2.
Defini¸c˜ao 1.12 Dado z = a+b√−2 ∈ Z[√−2], dizemos que z = a −b√−2 ´e o seu conjugado em Z[√−2].
Exemplo 1.20 Sejam z = 5−2√−2, w =−1 + 6√−2∈Z[√−2], temos:
z= 5 + 2√−2 e w=−1−6√−2.
De modo an´alogo a Z[i], podemos verificar que para todo z, w ∈ Z[√−2] tem-se
z.w = z.w. Veremos, agora, algumas propriedades e resultados importantes dos Intei-ros Quadr´aticos. Por quest˜oes did´aticas, dividiremos o que vem a seguir em subse¸c˜oes. Come¸caremos com a defini¸c˜ao de norma.
1.2.1
Norma em Z[
√
−
2]
Defini¸c˜ao 1.13 A fun¸c˜ao N :Z[√−2]→Z+ dada por N(z) =z.z,∀z ∈ Z[√−2], ´e dita
norma em Z[√−2].
Observa¸c˜ao 1.6 Dado z =a+b√−2, temos
N(z) =z.z = (a+b√−2).(a−b√−2) = a2+ 2.b2.
Exemplo 1.21 Dado z =−3 + 2√−2∈Z[√−2], temos
N(z) = N(−3 + 2√−2) = (−3)2+ 2.22 = 17.
Na proposi¸c˜ao a seguir, veremos que a norma ´e multiplicativa em Z[√−2]. Proposi¸c˜ao 1.13 Se z, w∈Z[√−2], ent˜ao N(z.w) = N(z).N(w).
Demonstra¸c˜ao:
1.2.2
Elementos Invert´ıveis em Z[
√
−
2]
No conjunto Z[i] os elementos invert´ıveis s˜ao ±1 e ±i. Agora, vamos definir elementos invert´ıveis em Z[√−2] e determinar o conjunto dos elementos invert´ıveis de
Z[√−2].
Defini¸c˜ao 1.14 Um elemento z ∈Z[√−2], z 6= 0,´e dito invert´ıvel se existe
06=w∈Z[√−2] tal que z.w = 1.
Afirma¸c˜ao: O conjunto (Z[√−2])∗ = {z|N(z) = 1} = {±1} ´e o conjunto dos
elementos invert´ıveis deZ[√−2].
De fato, se z = a +b√−2 ´e invert´ıvel em Z[√−2], ent˜ao 1 = N(z.w) = N(z)N(w) implicando queN(z) = 1 ⇔a2+ 2b2 = 1⇔a =±1, b = 0, da´ız =±1. Ent˜ao, como os dois possuem inverso s˜ao±1 temos, (Z[√−2])∗ ={z|N(z) = 1}={±1}´e o conjunto dos
elementos invert´ıveis deZ[√−2].
1.2.3
Divisibilidade em Z[
√
−
2]
De maneira inteiramente an´aloga a divisibilidade em Z[i] podemos definir a divi-sibilidade emZ[√−2].Vamos, ent˜ao, a defini¸c˜ao e algumas propriedades da divisibilidade em Z[√−2] que s˜ao semelhantes aZ[i].
Defini¸c˜ao 1.15 Para z, w ∈ Z[√−2], dizemos que z divide w se existe u ∈ Z[√−2],
n˜ao-nulo, tal quew=z.u.
Denotaremos que z divide w da seguinte forma: z|w.
Exemplo 1.22 Note que 2−√−2|6 pois, 6 = (2−√−2)(2 +√−2).
Vejamos algumas propriedades da divisibilidade em Z[√−2] na seguinte pro-posi¸c˜ao:
Proposi¸c˜ao 1.14 Sejam z, w, u∈Z[√−2]. Ent˜ao, 1. 1|z e z|z;
2. Se z|1, ent˜ao z= 1 ou −1;
4. Se z|w, ent˜ao N(z)|N(w).
Demonstra¸c˜ao:
De fato, como z = 1.z, assim provamos 1. Se z|1, temos que existe v ∈Z[√−3]
tal que 1 = z.v, logo 1 = N(z).N(v), o que significa dizer que z ∈ (Z[√−3])∗, isto ´e,
z= 1 ou −1,com isso provamos2.Agora, sez|w e w|u,tem-se que existemv, s ∈Z[√−2]
tais que w = z.v e u = w.s, logo u = z.v.s = (v.s).z, ou seja, z|u. Finalmente, se z|w,
existe v ∈ Z[√−2] tal que w =z.v, logo N(w) = N(z).N(v), ou seja, N(z)|N(w), o que conclui a demonstra¸c˜ao.
1.2.4
Divis˜
ao Euclidiana em Z[
√
−
2]
Assim como no conjuntoZ[i],a divis˜ao euclidiana emZ[√−2] funciona da mesma forma. Portanto, emZ[√−2] temos a seguinte formula¸c˜ao para a divis˜ao euclidiana:
Proposi¸c˜ao 1.15 Dados z, w ∈Z[√−2] com w6= 0, existem q, r ∈Z[√−2] com
z=wq+r e 0≤N(r)< N(w).
Demonstra¸c˜ao:
Basta dividir z =x+y√−2, w =a+b√−2, onde x, y, a, b∈Z. Ent˜ao,
z w =
x+y√−2
a+b√−2.
a−b√−2
a−b√−2 =
xa−xb√−2 +ya√−2−yb √−22
a2+ 2b2 =
xa+ 2yb a2+ 2b2+
ya−xb a2+ 2b2
√ −2.
Tomando m e n como os inteiros mais pr´oximos de xa+ 2yb
a2+ 2b2 e
ya−xb
a2+ 2b2,
respec-tivamente, temos que
m− xa+ 2yb a2+ 2b2
,
n− ya−yb a2+ 2b2
≤ 1 2.
Se q=m+n√−2, ent˜ao:
r=z−wq=wz w−q
=w
xa+ 2yb
a2+ 2b2 −m+
ya−yb a2+ 2b2 −n
√
−2
,
o que implica,
N(r)≤N(w)
1 2
2
+ 2.
1 2
2!
= 3
1.2.5
Lema de Euclides
Utilizaremos a divis˜ao euclidiana para demonstrar o Lema de Euclides, mas, primeiramente, daremos uma defini¸c˜ao de primo emZ[√−2].
Defini¸c˜ao 1.16 Dizemos que p´e primo em Z[√−2], quando pn˜ao pode ser escrito como produto de dois inteiros deZ[√−2] cujas normas s˜ao maiores que 1.
Exemplo 1.23 Verificar que z = 0 +√−2´e primo em Z[√−2].
De fato, suponha que existam w, u ∈ Z[√−2] tais que 0 +√−2 = w.u, ent˜ao
2 =N(w).N(u). Logo, w ou u tem norma igual a 1. Portanto, z = 0 +√−2´e um primo em Z[√−2].
Veremos, mais adiante, que os produtos de 0+√−2 pelos elementos de (Z[√−2])∗
s˜ao todos primos.
O pr´oximo resultado nos auxilia na verifica¸c˜ao da primalidade em Z[√−2].
Proposi¸c˜ao 1.16 Se N(z) ´e primo em Z, ent˜ao z ´e primo emZ[√−2].
Demonstra¸c˜ao:
Suponha que z n˜ao ´e primo emZ[√−2].Ent˜ao, existem w, u∈Z[√−2], w, u6= 0,
tais que z =wu e N(w), N(u)>1. Isto ´e uma contradi¸c˜ao pois, N(z) ´e primo em Z.
Exemplo 1.24 Verificar que 3−√−2 ´e primo de Z[√−2].
Com efeito, como N(3 −√−2) = 11 e 11 ´e primo em Z temos z primo em
Z[√−2].
Lema 1.2 (Lema de Euclides) Sep´e um primo emZ[√−2], coma, b∈Z[√−2] e p|ab,
ent˜ao p|a ou p|b.
Demonstra¸c˜ao:
Para demonstr´a-lo, vamos fazer sucessivas divis˜oes euclidianas, sendo x0 =a e
x1 =p. Seja xk+2 o resto da divis˜ao euclidiana de xk por xk+1. Temos ent˜ao as divis˜oes:
x0 =q1x1+x2
x1 =q2x2+x3
x2 =q3x3+x4
... xn−2 =qn−1xn−1+xn
xn−1 =qnxn+xn+1
Observe que como xk 6= 0 ⇒ N(xk+1) < N(xk), podemos tomar n tal que
N(xn+1) = 0, ou seja, xn+1 = 0. Logo xn|xn−1. Observe que xn|xk−1 e xn|xk. Logo,
xn|xn e xn|xn−1, ent˜ao indutivamente, xn|xk,∀k,0≤k ≤n, particularmente
xn|x0 = a e xn|x1 = p. Tomando as j + 1 primeiras equa¸c˜oes e realizando substitui¸c˜oes
adequadas, temos que xj =ajx1+yjx0 =ajp+yja; particularmente xn =anp+yna. Se
p|a ent˜ao o lema est´a demonstrado. Se p n˜ao divide a, ent˜ao, como xn|p, xn|a e
xn=anp+yna, ent˜ao xn∈ {±1} e temos: xn=anp+yna se, e somente se,
b= (xn)−1(banp+ynab) implicando que p|b, o que conclui a demonstra¸c˜ao.
1.2.6
Fatora¸c˜
ao ´
Unica em Z[
√
−
2]
N(a), N(b) > 1, portanto N(a), N(b) < N(z). Podemos supor, por indu¸c˜ao, que se
N(x)< N(z),ent˜aox´e fator´avel. Logo,a e bs˜ao fator´aveis, e portantoz o ´e. Para provar que esta fatora¸c˜ao ´e ´unica, basta considerar as duas fatora¸c˜oes p1p2...pn e q1q2...qm.
Su-ponha, por indu¸c˜ao,p1p2...pn =ξq1q2...qm,sendo ξ uma unidade, implica que a sequˆencia
(pi) ´e uma permuta¸c˜ao( a menos que sejam multiplica¸c˜oes pelos invert´ıveis) da (qi). Se
m´ax{n;m}= 1, ent˜ao o resultado ´e imediato. Supondo que ele vale se
m´ax{n′;m′} < m´ax{n;m}, pelo Lema de Euclides, vemos que para algum i, p
n|qi. Sem
perda de generalidade, podemos supori=m. Comopn e qm s˜ao primos, ent˜ao qm =ξ′pn,
onde ξ′ ´e uma unidade. Logo p
1p2...pn = ξq1q2...qm ⇔ p1p2..pn−1 = ξξ′q1q2..qm−1. Por
indu¸c˜ao, p1, p2, ..., pn−1 ´e uma permuta¸c˜ao( a menos que seja multiplica¸c˜oes pelos
in-vert´ıveis) de q1, q2, ..., qm, portanto a fatora¸c˜ao ´e ´unica. Com isso, provamos a seguinte
proposi¸c˜ao:
Proposi¸c˜ao 1.17 Seja z ∈ Z[√−2], ent˜ao existem z1, z2, ..., zn ∈ Z[
√
−2], unicos e pri-´ mos, tais que z =z1.z2...zn.
Exemplo 1.25 Considere as seguintes fatora¸c˜oes
1. Para z = 3, temos 3 = (1 +√−2)(1−√−2)onde 1 +√−2 e 1−√−2 s˜ao primos; 2. Para z = 11,temos 11 = (3 +√−2)(3−√−2)onde3 +√−2 e 3−√−2s˜ao primos.
1.2.7
Elementos Primos em Z[
√
−
2]
Agora vamos procurar os primos em Z[√−2]. Note que se N(z) ´e primo em Z,
ent˜ao z ´e um primo de Z[√−2] (pois se z fatora ent˜ao N(z) fatora). Observe que todo primo z divide N(z), portanto ele deve dividir ao menos um fator primo em Z deN(z).
Se z dividir ao menos dois n´umeros distintos (absolutamente) x e y primos em Z, como sempre ´e poss´ıvel tomar a, b ∈ Z tal que ax+by = 1, ter´ıamos z|1, um absurdo. Logo, todo primo de Z[√−2] divide exatamente um primo inteiro positivo (e seu oposto da soma) em Z.Seja esse primo inteiro positivo p. Temos 3(trˆes) casos:
1. Se p ´e par, ent˜ao p= 2. Sendo z =a+b√−2, ent˜ao N(z) =a2+ 2b2 = 2, ou seja,
2. Sep≡5 ou 7(mod8).Note quex≡0,1, .., ou 7(mod8), ent˜ao x2 ≡ 0,1 ou 4(mod8).
Queremos mostrar que p ´e um primo em Z[√−2]. Suponha que p n˜ao ´e primo de
Z[√−2], ent˜ao existem z =c+d√−2, w =a+b√−2∈Z[√−2], com
1 < N(z), N(w) < p2, tais que p = zw. Como p ´e um inteiro primo, devemos ter
w=z =c−d√−2, logo p=c2+ 2d2.Agora, p=c2+ 2d2 ≡0,1,2,3 ou 6(mod8),
o que ´e um absurdo, pois por hip´otese p≡5 ou 7(mod 8).Portanto, p´e um primo em Z[√−2].
3. Se p≡ 1 ou 3 mod 4.Dado x= 1.2...(p−1),temos:
x2 ≡1.2...(p−1).1.2...(p−1)≡ −2(mod p).
Logo, p|x2 + 2 = (x+√−2)(x−√−2). Suponha que p ´e um primo de Z[√−2],
ent˜ao pelo Lema de Euclides p|(x+√−2) ou p|(x−√−2). Da´ı, existem
z1, z2 ∈Z[√−2] tais que x+√−2 = p.z1 oux−√−2 =pz2. Mas, ter´ıamos
z1 = 1px+ 1p√−2 ou z2 = 1px− 1p√−2 e 1p n˜ao ´e inteiro. Logo, p n˜ao ´e primo de
Z[√−2], da´ı existem z =a+b√−2, w =c+d√−2∈Z[√−2], com
1< N(z), N(w)< p2,tais quep=wz = (a+bi)(c+di) = (ac−2bd)+(bc+ad)√−2.
Como p ∈Z, ent˜ao bc =−ad, ou seja, a =ce b=−d ou a=−c eb =d, com isso conclu´ımos que w=±z.Logo, como p > 0 segue que w=z e
N(z) = p(p=a2+2b2),portanto conclu´ımos quez ´e primo e maisz e seu conjugado
s˜ao os ´unicos primos em Z[√−2] que dividem p.
Com base no exposto acima, vimos que os ´unicos primos emZ[√−2] s˜ao:
(a) O primo 0 +√−2 e seus produtos pelos invert´ıveis.
(b) Os primosp em Ztal que p≡5 ou 7(mod8) e seus produtos pelos invert´ıveis. (c) Para cada primop em Z tal que p≡1 ou 3(mod8), os primos a+b√−2,
a−b√−2 e seus produtos pelos invert´ıveis, sendo p=a2+ 2b2.
1.2.8
Elementos Irredut´ıveis em
Z[
√
−
2]
Defini¸c˜ao 1.17 Um elemento z ∈ Z[√−2], n˜ao-nulo e n˜ao-invert´ıvel, ´e dito irredut´ıvel quando z =wu com w ou u invert´ıveil em Z[√−2].
Exemplo 1.26 Verificar que z = 0 +√−2´e irredut´ıvel em Z[√−2].
De fato, escrevendo 0 +√−2 =wu, com w, u∈Z[√−2], temos 2 =N(w)N(u).
Logo, N(w) = 1 ou N(u) = 1 e da´ı, concluimos que w ou u ´e invert´ıvel em Z[√−2].
Portanto, z = 0 +√−2´e irredut´ıvel em Z[√−2].
Observa¸c˜ao 1.7 E facil verificar que os produtos de´ 0 +√−2 pelos invert´ıveis tamb´em s˜ao irredut´ıveis em Z[√−2].
O pr´oximo resultado mostra que um elementop´e primo emZ[√−2] se, e somente se,p´e irredut´ıvel em Z[√−2].
Proposi¸c˜ao 1.18 Seja p ∈ Z[√−2], com p n˜ao-nulo e n˜ao-invert´ıvel. Ent˜ao p ´e um elemento primo de Z[√−2] se, e somente se, p´e um elemento irredut´ıvel de Z[√−2].
Demonstra¸c˜ao:
Se p = wu com w, u ∈ Z[√−2], ent˜ao p|wu e, como p ´e primo, temos que
p|w ou p|u. Por outro lado, u|p e w|p. Logo w ou u ´e invert´ıvel, mostrando assim que
p ´e um elemento irredut´ıvel de Z[√−2]. Por outro lado, seja p ∈ Z[√−2] um elemento irredut´ıvel. Ent˜ao p´e n˜ao-nulo e n˜ao-invert´ıvel. Sew, u∈Z[√−2]s˜ao tais que p|wu, es-crevendow=w1...wr e u=u1...us,com wi e uj elementos irredut´ıveis de Z[
√
−2],temos que uma fatora¸c˜ao para ab ´e
ab=w1....wr.u1....us.
Como p|wu, temos que wu = pz, para algum z ∈ Z[√−2]. Pela unicidade da fatora¸c˜ao de wu, temos que p=wiv ou p=ujv, com v invert´ıvel, para algum ´ındice i, j. Agora, se
Cap´ıtulo 2
Reciprocidade Quadr´
atica
Neste cap´ıtulo destacaremos o s´ımbolo de Legendre, o crit´erio de Euler e a Lei de Reciprocidade Quadr´atica de Gauss.
2.1
Res´ıduos quadr´
aticos e n˜
ao-quadr´
aticos
Defini¸c˜ao 2.1 Sejam m um inteiro positivo ea um inteiro commdc(m, a) = 1. Dizemos que a ´e um inteiro res´ıduo quadr´atico (mod m) se existe x ∈Z tal que x2 ≡ a(mod m).
Caso n˜ao exista tal inteiro, dizemos que a ´e um res´ıduo n˜ao-quadr´atico (mod m).
Exemplo 2.1 Res´ıduos quadr´aticos mod 7.
12 ≡1(mod 7) 22 ≡4(mod 7) 32 ≡2(mod 7)
42 ≡2(mod 7) 52 ≡4(mod 7) 62 ≡1(mod 7).
Note que, como (a,7) = 1, a ∈ {1,2,3,4,5,6}, os res´ıduos quadr´aticos (mod 7)
s˜ao 1,2 e 4 e os res´ıduos n˜ao-quadr´aticos s˜ao 3,5 e 6. Podemos escrever tamb´em
RQ7 ={1,2,7} e RN Q7 ={3,5,6}.
2.2
S´ımbolo de Legendre
Defini¸c˜ao 2.2 Seja p um primo ´ımpar e a um inteiro tal que p n˜ao divide a. O s´ımbolo de Legendre
a p
´e definido por:
a p
=
1 se a ´e res´ıduo quadr´atico m´odulo p
Exemplo 2.2
3 11
= 1, pois existe x∈Z tal que x2 ≡3(mod 11); por exemplo,
x= 5 ou 6.
Exemplo 2.3
2 11
= −1, pois n˜ao existe x ∈ Z tal que x2 ≡ 2(mod 11); de fato, se
x≡1,2, ....,10(mod 11), ent˜ao x2 6≡2(mod 11).
2.3
Crit´
erio de Euler
Nesta se¸c˜ao, veremos um resultado importante, que nos ajudar´a a decidirmos se
a´e um res´ıduo quadr´atico ou n˜ao.
Teorema 2.3 (Crit´erio de Euler) Seja pum primo ´ımpar e a um inteiro positivo com
p n˜ao dividindo a. Ent˜ao
a p
≡ap−12 (mod p).
Demonstra¸c˜ao: Suponha a p
= 1, ou seja, a congruˆencia x2 ≡a(mod p) tem solu¸c˜ao: digamos
quex=x0 seja uma solu¸c˜ao, da´ı(x0)2 ≡a(mod p). Pelo teorema de Fermat:
ap−1
≡1(mod p)⇒ap−12 ≡[(x0)2]
p−1
2 ≡(x0)p−1 ≡1(mod p)⇒a
p−1 2 ≡ a p
(mod p).
Para
a p
= −1, ou seja, a congruˆencia x2 ≡ a(mod p) n˜ao tem solu¸c˜ao. Logo, para
cada 1≤k≤p−1 existe uma ´unica solu¸c˜ao 1≤l ≤p−1 tal que kl≡a(mod p). Como
x2 ≡a(mod p)n˜ao tem solu¸c˜ao, ent˜aok =6 l(k incongruente l(mod p),pois, caso contr´ario
ter´ıamos k2 ≡ a(mod p)(ou l2 ≡ a(mod p)). Agrupando os inteiros 1,2,3, ...., p−1 em
p−1 2
pares (k, l) com
kl≡a(mod p)⇒1.2.3...(p−2)(p−1)≡ap−12 (mod p)⇒(p−1)!≡ −1≡a
p−1 2 ≡ a p
(mod p).
Portanto,
a p
≡ap−12 (mod p).
Exemplo 2.4 Pelo crit´erio de Euler,
5 23
≡511 ≡ −1(mod 23), ent˜ao 5 ´e um res´ıduo
n˜ao-quadr´atico mod 23, da´ı
5 23
=−1.
1. Se a≡b(mod p), ent˜ao a p = b p . 2. a p . b p = ab p . 3. a2 p
= 1.
Demonstra¸c˜ao:
1. se a ≡ b(mod p), ent˜ao x2 ≡ a(mod p) tem sol. ⇔ x2 ≡ b(mod p) tem sol., da´ı,
a p = b p . 2. De a p
≡ap−12 (mod p) e
b p
≡bp−12 (mod p), temos que:
ab p
≡(ab)p−1 2 ≡a
p−1 2 b
p−1 2 ≡ a p b p
(mod p)⇒
a p . b p = ab p . 3. a2 p = a p . a p = 1
Exemplo 2.5 Note que
75 97 =
3.52
97 = 3 97 . 52 97
= 1, pois 103 ≡ 3(mod 97).
Logo,
75 97
= 1.
Teorema 2.5 Se p´e um primo ´ımpar ent˜ao
−1 p =
1 , se p≡1(mod 4) −1 , se p≡ −1(mod 4)
Demonstra¸c˜ao:
Pelo crit´erio de Euler: −1 p
≡(−1)p−12 (mod p). Sep≡1(mod4), ent˜aop−1 =
4k, k ∈ Z. Logo, −1
p
≡ (−1)42k(−1)2k ≡ 1(mod p) ⇒
−1
p
= 1. Se p ≡ −1(mod 4),
ent˜ao p+ 1 = 4k, k∈Z, logo, p−1 = 2(2k−1).
Logo,−1
p
≡(−1)2k−1 ≡ −1(mod p)⇒−1
p
Exemplo 2.6 Note que −5 23 = 5 23 . −1 23
. Pelo crit´erio de Euler,
5 23
≡511≡ −1(mod 23), ent˜ao 5 ´e um res´ıduo n˜ao-quadr´atico (mod 23), da´ı
5 23
=−1. Como 23≡ −1(mod 4), temos que
−1 23
=−1. Portanto,
5 23 . −1 23
= (−1).(−1) = 1, ou seja, −5 ´e um res´ıduo quadr´atico (mod 23).
2.4
Lei de Reciprocidade Quadr´
atica de Gauss
Vamos iniciar esta se¸c˜ao com a demonstra¸c˜ao do seguinte resultado:
Lema 2.1 (Lema de Gauss) Sejapum primo ´ımpar eaum inteiro commdc(a, p) = 1.
Sejaso n´umero dos menores res´ıduos quadr´aticos positivos dos inteirosa,2a,3a, ...,p−1
2 a
que s˜ao maiores que p
2, ent˜ao
a p
= (−1)s. Demonstra¸c˜ao:
Considere os inteirosa,2a,3a, ...,p−1
2 a(∗).Sejamu1, u2, ...., usos maiores res´ıduos
positvos destes inteiros (∗) que s˜ao maiores que p2 e v1, v2, ...., vt os menores res´ıduos po-sitvos destes inteiros(∗) que s˜ao menores que p2. Vamos mostrar que
p−u1, ...., p−us, v1, ...., vt(1) s˜ao exatamente os inteiros a,2a,3a, ...,p−1
2 a(mod p). De fato, dados quaisquer dois
inteiros de(1),nenhum deles s˜ao congruentesmod p(pois, s˜ao menores quep−1). Ou seja,
ui 6≡ uj(mod p) e vi 6≡vj(mod p),∀i 6= j. Digamos que ocorra uma dessas congruˆencias, ter´ıamos ma ≡ na(mod p), onde m e n s˜ao inteiros com 1 ≤ m, n ≤ p−1
2 . Tamb´em se
p−ui 6≡ vj(mod p), caso venha acontecer ter´ıamos p−ma≡na(mod p), o que implica,
m≡ −n(mod p)(imposs´ıvel). Portanto, p−u1, ...., p−us, v1, ...., vt(1) s˜ao os inteiros (∗) em alguma ordem. Portanto,
(p−u1)....(p−us).v1....vt = 1.2...
p−1 2
=
p−1 2
!⇒
(−u1)(−u2)...(−us).v1....vt≡
p−1 2
!(mod p)⇒ (−1)su
1.u2...us.v1.v2...vt≡
p−1 2
Sabemos que u1, u2, ...., us, v1, ...., vt s˜ao os menores res´ıduos positivos de (∗), ent˜ao
u1.u2...us.v1.v2...vt≡a.2a.3a...
p−1 2
a ≡ap−12 .
p−1 2
!(mod p).
Portanto, (−1)s ≡ap−12 (mod p),e pelo crit´erio de Euler, a p
= (−1)s.
Teorema 2.6 Se p´e um primo ´ımpar ent˜ao
2 p =
1 , se p≡ ±1(mod 8) −1 , se p≡ ±3(mod 8)
Demonstra¸c˜ao:
No Lema de Gauss, tome a = 2. Se p≡ 1(mod 4), digamos p= 4k+ 1, temos
p−1
2 = 2k. Como 1≤2j ≤
p−1
2 paraj ≤k e
p−1
2 <2j ≤p−1 parak+ 1≤j ≤2k,
temos
2
p
= (−1)k =
1 , se p≡1(mod 8) −1 , se p≡5(mod 8)
Se p≡3(mod 4), digamos p= 4k+ 3, temos p−1
2 = 2k+ 1.
Para1≤j ≤k temos 1≤2j ≤ p−1
2 e parak+1≤j ≤2k+1 temos
p−1
2 <2j ≤p−1
donde
2
p
= (−1)k+1 =
1 , se p≡3(mod 8) −1 , se p≡7(mod 8)
Portanto, 2 p =
1 , se p≡ ±1(mod 8) −1 , se p≡ ±3(mod 8) Exemplo 2.7 Note que −2
569
= −1 569
. 5692
= 1.1 = 1, logo −2´e um res´ıduo quadr´atico