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Pesquisa na escola: que espaço é esse? O do conteúdo ou o do pensamento crítico?.

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Academic year: 2017

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PESQUISA NA ESCOLA: QUE ESPAÇO É ESSE?

O DO CONTEÚDO OU O DO PENSAMENTO CRÍTICO?

Maria Otilia Guimarães Ninin* PUC-COGEAE / UNIP-SP / CNSD-SP

RESUMO:Este artigo tem como objetivo discutir o papel da pesqui-sa nas escolas de Ensino Fundamental e Médio, tendo como eixo fundamental a concepção de ensino na perspectiva da pedagogia crítica. Os procedimentos discutidos visam a oferecer ao professor subsídios para o trabalho com a pesquisa em sala de aula, tais que propiciem aos alunos o desenvolvimento de competências e habi-lidades relacionadas aos quatro pilares da educação: aprender a fazer, aprender a ser, aprender a conviver, aprender a aprender. O artigo está organizado da seguinte forma: a Introdução, cujo foco é a apresentação do tema “pesquisa na escola”; das seções Pesquisa: O que é?, Pesquisa: Por que e para que fazer?, Pesquisa: Como fazer?, em que discuto argumentos teóricos que sustentam a atividade de pesquisa em sala de aula; e da seção Algumas Considerações, na qual focalizo limitações e perspectivas para o trabalho do professor com pesquisa na sala de aula.

PALAVRAS-CHAVE:Pesquisa; Etapas da Pesquisa; Mediação

RESEARCH IN THE SCHOOL: WHAT IS THIS SPACE: TO THE CONTENT OR TO THE CRITICAL THOUGHT? ABSTRACT

This article aims to discuss the role of the research in Elementary and High School, considering as fundamental importance the con-ception of education from of the critical pedagogy. The research procedures aim to offer to the teacher a base for his/her work with the research in classroom, to offer the possibility of develop-ment of abilities to students, according the four focus: learning to make, learning to be, learning to live together and learning to

* Professora PUC-COGEAE cursos de extensão universitária; doutora em Lingüística

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learn. The article is organized from the following way: the Introduction, whose focus is the presentation of the subject "research in the school"; the sections "Research: What is it?" "Research: Why does you make one?”, "Research: how do you make one?". In these sections, I discuss theoretical arguments that have supported the research activity in classroom; and "Some Considerations", where I focus limitations and perspectives about teachers’ work when they use research in their classroom.

KEYWORDS:Research; Steps of the Research; Mediation

INTRODUÇÃO

Vale anotar que a persistência, tão freqüente entre nós, de modismos, como o do construtivismo ou da qualidade total, apenas confirma a precariedade em termos de competência, já que o competente se nega, terminantemente, a substituir a proposta própria por coisas vindas apressadamente de fora ou de cima para baixo. Se um dia, educar pela pesquisa virar modismo, será porque não se entendeu nada.

Pedro Demo (1996/2002, p. 15)

Não escolhi Pedro Demo como inspirador das idéias que discu-tirei neste artigo por acaso. Ao escolher como elemento instigador a epí-grafe acima, trago à tona, mais uma vez, a discussão à qual tantos edu-cadores têm se dedicado, que aponta para a fragilidade de práticas educa-tivas inovadoras quando suas bases teóricas não são exaustivamente dis-cutidas. De certo modo, assim é com a pesquisa: uma prática que acom-panha o educador desde longa data e que parece transformar-se nestas últimas décadas, porém, nem sempre de modo fundamentado. Quando isso ocorre, tal prática corre riscos de tornar-se um modismo, tendo seu papel reduzido a um mero pacote de informações.

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A atividade de pesquisa, no entanto, nem sempre cumpre seu papel em relação ao desenvolvimento do pensamento crítico dos alunos e à construção de conhecimentos. Mostra-se muito mais como uma ativi-dade em que os estudantes revelam sua dependência e sua falta de autono-mia em relação à discussão de determinado assunto, visto que se resume a um texto composto de fragmentos de outros textos e/ou de infor-mações obtidas por meio de buscas na internet, quase sempre copiadas e pouco argumentadas pelos estudantes-autores.

Também as ações de muitos professores em relação à atividade de pesquisa resumem-se, ainda, nos dias de hoje, a oferecer aos alunos um roteiro contendo: uma data para entrega do trabalho; a solicitação dos nomes dos alunos integrantes do grupo; a indicação das partes que o trabalho deve conter, como, por exemplo, introdução, objetivo, justi-ficativa, desenvolvimento, bibliografia; a indicação dos conteúdos a serem pesquisados; além de algumas dicas orientadoras, como, por exemplo, “não faça cópia de trechos de livros”, “a entrega do trabalho fora do prazo implica diminuição na nota”, entre outras.

Certamente, atividades de pesquisa assim conduzidas não podem ser consideradas como desencadeadoras do pensamento crítico dos alunos, uma vez que pouco ou nada exploram seus pontos de vista e, menos ainda, propiciam ambientes para que a argumentação seja exercita-da. Nessa perspectiva, a atividade não cria possibilidades para que o pro-fessor exerça seu papel de mediador na construção dos conhecimentos de seus alunos, pois o trabalho final é o que importa, e não seu processo de construção. Transforma-se a pesquisa, dessa maneira, em um instrumen-to avaliativo do tipo exame, o que, segundo Luckesi (2000), é representa-tivo de uma prática avaliativa que não se preocupa com o processo, mas, sim, com o produto realizado pelo aluno, ou seja, uma prática que descon-sidera o papel do aluno como ator e investigador crítico do conhecimen-to, para vê-lo somente como reprodutor dos conhecimentos já estáveis socialmente e que julga secundária a intervenção permanente do profes-sor no processo de desenvolvimento do aluno ao realizar a pesquisa.

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profes-sores subsídios para que propiciem aos seus alunos oportunidades para o desenvolvimento de competências como, por exemplo, ser capaz de dis-cutir, aceitar e fundamentar diferentes pontos de vista, de criticar infor-mações das diversas fontes consultadas, de entender a organização do conhecimento científico, de conviver e interagir em grupo, de utilizar ade-quadamente, com autonomia e independência, recursos tecnológicos nos encaminhamentos dos estudos.

Avançar nesse sentido, no entanto, implica, inicialmente, optar por um significado de pesquisa que seja compatível com a concepção de ensino-aprendizagem que prioriza o papel do aluno como construtor do conhecimento, o papel do professor como mediador nessa construção e o papel da atividade de ensino como instrumento-e-resultado (NEWMAN; HOLZMAN, 1993/2002), o que, na concepção vygotskyana, significa “atividade que, na medida em que se desenrola, transforma a si própria, transformando o próprio contexto e aquele que dela participa”. Nessa pers-pectiva, a seção a seguir conceitua o ato de pesquisar, para, depois, pros-seguir na discussão sobre o papel do aluno, do professor e da atividade.

PESQUISA: O QUE É?

Mais do que o ensino, a aplicação da pesquisa na escola conduz ao domínio das habilidades didáticas renovadoras pela discussão, pela leitura, pela observação, pela coleta de dados para comprovação de conjecturas sobre os fatos pela análise criativa das deduções, conclusões e, sobretudo, pela reconstrução do conhecimento a partir daquilo que os alunos já sabem. Jorge S. Martins (2001, p. 45)

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Pesquisar, na concepção educacional que se preocupa com o desenvolvimento da autonomia do educando, não se esgota ou termina quando este encontra dados relevantes sobre um tema proposto. Ao con-trário, está aí o ponto inicial do processo: dado um tema e os materiais que dizem respeito a ele, como transformar tudo isso em estudos mais apro-fundados, capazes de propiciar aos alunos contextos em que ocorram debates de idéias, em que a criatividade seja aguçada, em que o espaço para perguntar e discutir seja garantido aos alunos?

Nesse sentido, podemos definir “pesquisa escolar” como ativi-dade sistematizada e mediada entre sujeitos, pautada em instrumentos que propiciam a construção do conhecimento e o desenvolvimento da auto-nomia, por meio de ações com características de reflexão crítica1, que prio-rizam descobrir, questionar, analisar, comparar, criticar, avaliar, sintetizar, argumentar, criar.

Ao definir pesquisa dessa maneira, estamos afirmando que essa atividade não é algo para ser realizado apenas pelo aluno. Se ela é, por definição, uma atividade mediada, então é porque dela participam sujeitos e instrumentos mediadores na construção do conhecimento. Nessa direção, vale ressaltar o que afirma Demo (1992, p. 2) sobre pesquisa na escola:

A pesquisa na escola é uma maneira de educar e uma estratégia que facilita a educação (...) e a consideramos uma necessidade da cidadania moderna. (...) Educar pela pesquisa é um enfoque propedêutico, ligado ao desafio de construir a capacidade de reconstruir, na educação básica e superior (...) A pesquisa persegue o conhecimento novo, privilegiando com seu método, o questionamento sistemático crítico e criativo.

Essa é a perspectiva adotada neste artigo, ou seja, a de que o ato de pesquisar requer um educador que, exercendo seu papel de mediador, abre novos caminhos para seus alunos em direção à investigação, questio-nando-os e permitindo que questionem, visando a ultrapassar o saber superficial pautado no acúmulo de informações.

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habili-dades envolvidas na ação de pesquisar, quando orientadas permanente-mente pelo professor.

PESQUISA: POR QUE E PARA QUE FAZER?

- Conte-me um pouco sobre as pesquisas em sua escola.

- Ah, são muitas. Todos os professores dão pesquisa para ajudar na nota. Principalmente quando a gente vai mal na prova.

- E aí, o que é que vocês fazem?

- Bom, a gente se reúne, divide o que vai fazer, procura na internet e faz. - Mas... só copiam da internet?

- Mais ou menos. Tem gente que sabe resumir e aí o trabalho fica melhor. Quando cai para mim uma parte que eu consigo entender, até faço o resumo, mas às vezes o texto é difícil e aí a gente copia.

- E pode fazer isso?

- Pode, mas tem que pôr o nome do site na Bibliografia. - Você aprende muito com as pesquisas?

- Acho que sim, porque eu recupero minhas notas. Mas eu gosto mais quando a gente faz trabalhos de fazer mesmo alguma coisa, assim tipo fazer uma experiência, fazer um debate... Isso é me-lhor porque a gente pode falar mais o que a gente pensa. Eu fico intrigado e aí eu quero fazer mesmo.

Aluno de 7a série do Ensino Fundamental (2005)

O depoimento anterior, selecionado entre vários coletados em escola regular de Ensino Fundamental durante a realização de um encontro de formação contínua para professores, revela-nos, de modo intrigante e profundamente sensível, o nível de conscientização de um estudante sobre o significado real da pesquisa em sua vida. Revela-nos, por outro lado, a importância dada por ele ao pensar com mais profun-didade sobre algo, pois, caso isso não ocorresse, não diria “eu fico intri-gado e aí eu quero fazer mesmo”. Revela-nos, também, que existe um “rótulo” cristalizado para a pesquisa, capaz de desvinvulá-la da ação de pensar.

“Fico intrigado...” Nessa linguagem própria do adolescente, não estaria ele nos dizendo que pesquisar e pensar para descobrir, para criar, são atividades opostas? Se perguntarmos aos professores “para que serve a pesquisa”, certamente responderão que, entre outras coisas, “pesquisa serve para ampliar os conhecimentos dos alunos sobre um dado assunto”. Também para os alunos, como vimos, o significado de pesquisar parece ser esse mesmo. Ora, o que acontece, então, durante a caminhada, que faz com que professores critiquem a cópia e a repetição apresentadas pelos alunos, e estes, por sua vez, critiquem o enorme peso com o qual se vêm envolvi-dos ao cumprirem a tarefa de pesquisar?

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apenas com o resultado da pesquisa e não com o processo de pesquisar. Preocupar-se, prioritariamente, com o resultado da pesquisa, ainda que seja para pensar nela como “ampliação dos conhecimentos dos alunos”, implica entendê-la como instrumento-para-resultado (NEWMAN; HOLZMAN, 1993/2002), conceito vygotskyano que significa o uso de um dado instrumento para se obter um fim, sem que o instrumento seja com-preendido ou questionado, em sua concepção, pelo sujeito que o utiliza.

Se considerarmos a pesquisa como esse instrumento oferecido ao aluno, será a mediação do professor aquela que proporcionará tanto a transformação do próprio instrumento – na medida que a pesquisa se modifica e oferece a possibilidade de articulação com outras áreas do conhecimento – quanto a transformação do aluno – que se dá a partir das oportunidades surgidas ao se colocar em prática as ações que definem pesquisar, ou seja: descobrir, questionar, analisar, comparar, criticar, avaliar, sintetizar, argumentar, criar.

Nessa direção, a pesquisa abre espaços para que o aluno traba-lhe com suas indagações pessoais e desenvolva opiniões próprias, funda-mentadas, a respeito dos temas pesquisados. A pesquisa é, então, entendi-da como um instrumento problematizador que, quando planejaentendi-da e medi-ada pelo professor, faz do aluno-copiador um aluno-pesquisador.

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Interessante ressaltar uma afirmação de Oliveira et al. (1999, p. 42) sobre os motivos que levam os professores a solicitarem pesquisas de seus alunos: “em primeiro lugar, para complementar conteúdos e, em segundo, para antecipar conteúdos”. Motivos como argumentar, ampliar conhecimentos, aprofundar e enriquecer os conteúdos, criar hábitos de lei-tura são menos apontados por professores. Já motivos como criticar e criar não foram encontrados nos depoimentos dos professores pesquisados.

Para discutirmos por que e para que fazer pesquisa é importante considerar que todas as competências e habilidades que um aluno poderá desenvolver a partir desse trabalho passam, em primeiro lugar, pela inten-cionalidade dos professores e por sua co-responsabilidade em relação ao fazer do aluno e à sua aprendizagem.

Assim, escolher temas para pesquisa que exijam dos estudantes apenas ações de busca sobre um assunto e que não necessitem de inter-venção naquilo que escrevem e/ou copiam não possibilita o desenvolvi-mento da competência de argumentar e criticar o que estudam, como também não possibilita a formação do aluno autônomo e crítico. Por exemplo: pesquisar sobre as obras e a vida de Picasso pode ser uma tare-fa para a qual os alunos apenas exercitam a habilidade de compilar dife-rentes informações sobre o artista, ao passo que pesquisar como e por que alguns artistas contemporâneos produzem obras sob a influência de Picasso pode exigir uma competência dos alunos voltada à comparação e à análise de obras artísticas, situadas social e culturalmente. Ideal seria, ainda, que uma pesquisa com esse propósito desencadeasse discussões sobre o papel da arte na vida humana, o papel da arte da vida do estu-dante-autor, a relevância da arte em nossa cultura...

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conhe-cimentos específicos em relação ao tema tratado. Notem que não digo “com domínio completo do tema tratado”, pois sabemos não ser possí-vel esse domínio, uma vez que o mundo está em constante transformação e os conhecimentos que tínhamos ontem não necessariamente perma-necem os mesmos hoje.

Nas situações escolarizadas, podemos dizer que reside aí o papel do professor. Competências só poderão ser desenvolvidas em “ambientes de aprendizagem”, denominação cunhada por Demo (2004, p. 9), ao considerar a pesquisa uma “proposta formativa essencialmente, e não apenas tática de fazer conhecimento”. Na visão do autor, o “fazer pesquisa” provoca transformações no aluno, em direção à construção da autonomia para pensar. “Na medida que o aluno pesquisador aprende a duvidar, questionar, argumentar, fundamentar, ouvir o outro com atenção e responder, convencer sem vencer, não só faz conhecimento, como principalmente, se forma”. Mas, para aprender tudo isso, é preciso um professor que instigue o aluno a duvidar do que encontra na internet, por exemplo; é preciso um professor que responda perguntas com outras perguntas, que discuta o “como fazer” durante o fazer e não quando tudo já está terminado. Ao término do processo, o que resta é o julgamento do resultado: “a pesquisa está ótima! faltou isso, faltou aquilo na pesquisa! Aqui vocês acertaram, aqui vocês erraram; é preciso apresentar o resultado para os colegas; melhorem, na próxima vez...”.

Essa perspectiva nos leva a discutir procedimentos para se fazer pesquisa em sala de aula, acreditando que as diferentes ações dos profes-sores e de seus alunos no decorrer do processo de pesquisar é que pro-piciam o desenvolvimento das competências discutidas anteriormente. A seção a seguir ocupa-se dessa discussão.

PESQUISA: COMO FAZER?

Não vim aqui, disse eu, para fazer um discurso, mas para conversar. Farei perguntas, vocês também. As nossas respostas darão sentido ao tempo que passaremos juntos aqui. Parei. Houve um silêncio cortado por um deles que falou: - Muito bem, acho que é bom assim. Realmente não gostaríamos que você fizesse um discurso. Tenho já uma primeira pergunta. - Pois não, disse eu. - O que significa mesmo perguntar? (...) Insistimos, porém, em que o centro da questão não está em fazer com a pergunta “o que é perguntar?” um jogo intelectual, mas viver a pergunta, viver a indagação, viver a curiosidade, testemunhá-la ...

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Até este momento, nossa discussão encaminhou-se no sentido de explorarmos os conceitos teóricos que possibilitam ao professor com-preender o processo de pesquisa e sua relação com a aprendizagem dos alunos. Esta seção pauta-se em questões de ordem prático-teórica e orien-tará os passos para a realização de uma pesquisa.

Ao entendermos pesquisa como o espaço para a construção do conhecimento novo, pautado no questionamento, que busca o desen-volvimento do sujeito crítico, historicamente situado, o professor não poderá seguir modelos convencionais de trabalho, mas terá de planejar momentos de intervenções precisas e sistematizadas junto aos seus alunos. Isso vai desde a organização dos grupos e orientações sobre como trabalhar coletivamente à condução, passo a passo, do desenvolvimento do trabalho.

Planejar intervenções implica preparar questionamentos para fazer aos alunos, dado que estes, ao desenvolverem suas pesquisas, nem sempre são capazes de abstrair, de maneira crítica, os significados implí-citos que permeiam seus trabalhos. Para questionar o aluno, no entanto, o professor precisa de elementos teóricos que o auxiliem a elaborar pergun-tas capazes de trazer à tona os conhecimentos prévios de cada um sobre o tema proposto e aí está o ponto de partida: que perguntas fazer, em classe, para descobrir o que os alunos já conhecem e o que já são capazes de expressar por meio de saber crítico, em relação ao tema pretendido para pesquisa?

Em outras palavras, quero dizer que assim como o conhe-cimento prévio de um grupo de alunos não é igual ao de outro, também a pesquisa de um grupo não será igual à de outro. Implicações disso nos levam a crer que a pesquisa conduzida nessa perspectiva não resultará em “vários trabalhos entregues ao professor, todos quase iguais ou, o que é pior, iguais, elaborados a partir das mesmas fontes, copiados dos mesmos materiais...”.

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Cabe, neste momento, um lembrete importante sobre materiais encontrados na internet. Sabemos que nem tudo o que está disponível na

web é confiável e sabemos, também, que nossos alunos nem sempre são capazes de julgar a qualidade desses materiais. Assim, temos duas opções interessantes: uma delas refere-se à indicação de sitesoficiais para pesquisa, entre eles, os de universidades. A outra opção, certamente de ordem críti-ca, constitui-se em aceitar os diferentes materiais e ensinar o aluno a com-parar e questionar aqueles que apresentam informações imprecisas e/ou incorretas. O trabalho monográfico dos alunos poderá conter compara-ções e discussões sobre as divergências existentes entre os materiais encontrados sobre o tema.

O terceiro passo a ser dado constitui-se em elaborar textos preli-minaresrelacionados ao foco da pesquisa. Mas também aí o professor não pode estar afastado. Como garantir que os alunos façam uso do gênero científico na elaboração de seus textos? Sabemos que cada ciência tem suas características próprias no que se refere à produção de textos e à ter-minologia utilizada. A linguagem específica, portanto, requer ser ensinada ao aluno. Quero dizer, com isso, que um texto científico é exigente: não permite o uso de julgamentos e juízo de valor; não pode conter opiniões sem que sejam fundamentadas; necessita objetivos explícitos, elaborados a partir de escolhas lingüísticas adequadas2; organiza-se a partir de seções específicas que não podem ser excluídas do texto.

Bagno (1999) orienta a elaboração do projeto, indicando as seções básicas que devem ser produzidas pelos alunos ao longo do traba-lho de pesquisa: escolha de um título sugestivo; elaboração textual do objetivo do trabalho; elaboração textual da justificativa para a realização do trabalho e do estudo do tema; descrição metodológica de todos os pro-cedimentos realizados, desde as discussões sobre as escolhas temáticas às relacionadas à análise de materiais; desenvolvimento do tema; relação das fontes pesquisadas; cronograma indicativo das etapas previstas para o tra-balho.

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Em relação à justificativa para a realização do trabalho, não é tão simples quanto parece. Ela corresponde à relevância que esse trabalho deve ter e relevância significa pensar no papel social que o trabalho exerce na vida do aluno. Por que e para que fazer esse trabalho, com esse tema, com esses elementos, é fator importante para o desenvolvimento do aluno? Assim, um trabalho que focalize apenas um bloco de conhecimen-tos específicos, sem estabelecer relações com as práticas sociais com as quais o aluno está envolvido, não pode ser considerado relevante. Seria apenas para ampliar os conhecimentos específicos do aluno, ou melhor, a quantidade de informações que retém. Justificativas exigem relação entre o conteúdo escolhido para estudo e seu papel no desenvolvimento do educando.

Uma etapa do processo de pesquisa está centrada na leitura dos textos selecionados e na elaboração dos fichamentos. Isso não significa que o texto final do trabalho conterá esses fichamentos, mas, certamente, con-terá a articulação entre eles. Essa tarefa vai desde a ação de destacar palavras-chave do texto e idéias mais relevantes até a elaboração de novo texto que as contenha, construído de modo argumentado, objetivo e claro. Aí também é imprescindível a presença do professor, pois somente ele, seguidor do processo, terá como apontar aos alunos as incoerências e inadequações presentes nos textos elaborados.

Ora! Mas isso não se faz ao final do trabalho, quando o tempo já se encerrou. Isso se faz durante o andamento do trabalho, ou seja, o professor oferece aos alunos momentos intermediários para discussão sobre o material já produzido. Vejamos: esses momentos não são simples orientações sobre o que será feito, mas sobre o que já foi feito até então, o que requer do professor a leitura dos textos já produzidos por seus alunos e não apenas uma olhada. É exatamente nesses momentos que a mediação do professor pode ser eficaz no sentido de gerar conflitos para que os alunos façam novas buscas, sintam-se intrigados com suas próprias con-clusões, duvidem do que já produziram e recorram a novos caminhos. É exatamente nesses momentos que o professor informa os pontos não completamente satisfatórios do trabalho, em relação aos conhecimentos conceituais, procedimentais, atitudinais e factuais3 dos alunos, revelados até então no que já foi desenvolvido.

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etapas concluídas, mas sim etapas em processo. Reelaboração exige apon-tamentos precisos do professor e questionamentos sobre como o aluno poderá aprimorar o trabalho textual. Demo (1996/2002, p. 34) afirma que “o professor deve orientar o aluno permanentemente para: expressar-se de maneira fundamentada, exercitar o questionamento sempre, exercitar a formulação própria, reconstruir autores e teorias, cotidianizar a pes-quisa”.

Uma outra etapa é a dedicada à organização final da pesquisa. Essa também exige orientações permanentes do professor. Nesse momento, é fundamental observar se os alunos envolvidos são capazes de dividir as tarefas de maneira equilibrada, bem como orientar para que cada um se responsabilize por algo, desde os procedimentos que envolvem a digi-tação de textos aos relacionados à ilustração e ao design final. Diferentes competências e habilidades são envolvidas nesse momento e é preciso que o professor ofereça oportunidade para que os alunos coloquem em práti-ca o que sabem fazer.

Também é necessário esclarecer que nem toda pesquisa culmina em trabalho escrito, do tipo monográfico. Seja qual for o produto final escolhido, requer um processo de organização cujo papel do professor é imprescindível.

Como última etapa, podemos considerar a apresentação públicado trabalho de pesquisa. Para que ela ocorra, alguns procedimentos muito importantes para os alunos deverão ser colocados em prática pelo profes-sor, como, por exemplo, a tarefa de combinar critérios avaliativos para esse momento. Isso significa discutir com os alunos como serão avaliados no momento em que estiverem apresentando seu trabalho à classe. Por exemplo: os alunos sabem que não devem usar gíria enquanto apresentam seu trabalho? Poderão utilizá-la? Sabem que precisam explicar e não devem fazer leitura do trabalho? Sabem expor o conteúdo proposto destacando o que é mais relevante? Sabem qual é o papel do texto em uma apresentação em PowerPoint?

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factuais – ser capaz de situar o trabalho no contexto de ensino em que está inserido.

Somente após todas essas etapas é que um trabalho de pesquisa deverá ser avaliado no sentido de atribuir-se a ele uma nota ou um conceito. Ressalto, porém, que essa prática de atribuir nota aos trabalhos de pesquisa nem sempre pode ser considerada adequada, uma vez que pesquisa é aqui considerada um projeto permanente do aluno no decorrer das práticas educativas com as quais está envolvido em sala de aula. Se pensarmos na pesquisa como fator de desenvolvimento do aluno, não se faz necessária a nota, mas torna-se relevante descobrir como o aluno se desenvolve ao longo do trabalho realizado.

O Quadro 1 mostra, de modo sintetizado, as etapas de uma pesquisa, com indicações sobre os papéis do professor e do aluno no processo de desenvolvimento do trabalho.

QUADRO 1

ETAPA

Organização do grupo de alunos

Projeto preliminar da pesquisa

PROFESSOR

- em função do objetivo previsto, que tipo de agrupamento seria o ideal?

afinidade?

semelhança/diferença na forma como resolvem situações-problema?

semelhança/diversidade em relação a conhecimentos prévios?

facilidade/dificuldade em relação à interpretação de textos científicos?

diversidade em relação a competên-cias e habilidades?

- explicitar objetivo do trabalho e critério uti-lizado para agrupamento dos alunos (por que esse critério e não outro?).

- questionamentos para ampliar o foco de interesses do aluno;

- contribuição com material escolhido em função dos objetivos, para enriquecimento dos trabalhos;

- orientação em sala de aula, em momento sis-tematizado, sobre como selecionar, comparar e criticar materiais coletados.

ALUNO

- disponibilidade para trabalhos em grupo.

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cont. ETAPA Elaboração de textos preliminares Leitura de textos selecionados Reelaboração de textos produzidos Organização final da pesquisa Apresentação pública da pesquisa PROFESSOR

- leitura e comentário, por escrito.

- orientação sistematizada sobre características do gênero textual adequado (texto científico); - socialização dos materiais;

- questionamentos para instigar o grupo a novas buscas;

- informação sobre pontos insatisfatórios do trabalho, em relação a:Ä veracidade dos conceitos apresentados; argumentação; metodologia; procedimentos; responsabilidade; organização geral. - acompanhamento.

- orientações sistematizadas em função do tipo de produto final desejado:

se vídeo, como produzi-lo? o que deve ser evitado em relação às tomadas de turno dos participantes? qual a duração? é vídeo motivacional? é vídeo para apresentação de conteúdo conceitual? como escolher quem atuará?

se texto monográfico, qual o número de páginas? como ordenar o texto final? como citar autores? qual o papel de trechos opiados?

se dramatização, como garantir que o conteúdo conceitual seja contemplado nos diálogos? como evitar senso comum? como criar e distribuir os papéis?

ALUNO

- elaboração de objetivo e justificativa para o trabalho; - reescrita.

- resumos e fichamentos de textos;

- reescrita, a partir da articulação entre os diferentes textos.

- reescrita, a partir das orientações orais do professor e comentários apresentados nas versões preliminares do trabalho.

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cont.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

O paradoxo do desejo deve-se, na verdade, ao fato de que o objeto desejado deve ser, ao mesmo tempo, conhecido e desconhecido, que é preciso adivinhar os seus contornos, entrever o seu segredo, mas ele deve permanecer escondido e o segredo não deve ser penetrado. Se o papel do professor é fazer com que nasça o desejo de aprender, sua tarefa é “criar o enigma” ou, mais exatamente,fazer do saber um enigma: comentá-lo ou mostrá-lo suficientemente para que se entreveja seu interesse e sua riqueza, mas calar-se a tempo para suscitar a vontade de desvendá-lo. Philiippe Meirieu (1991/1998, p. 91-92)

Ao apontar, no resumo apresentado no início deste artigo, a existência de limitações no trabalho com pesquisa, referia-me às escolas e aos professores que fazem uso desse rico instrumento para manipular os saberes de seus alunos, ou ainda, cercear possibilidades de seu desenvolvi-mento, uma vez que se mantêm nos velhos modelos voltados às cópias e ao acúmulo de conteúdos e conceitos.

A falta de conhecimentos em relação aos meios tecnológicos usados para obtenção de informações também pode ser considerada uma limitação no trabalho com pesquisas, uma vez que esses meios, quando mal-utilizados e mal-orientados, transformam-se em ferramentas mecâni-cas disponibilizadas ao aluno. Em nada fazem crescer e, muito menos, possibilitam a ele articular conhecimentos e questioná-los.

Avançaríamos, portanto, nesse sentido, se nos preocupássemos em formar professores nas escolas capazes de discutir questões éticas relacionadas à pesquisa de seus alunos, no sentido de expor e criticar as práticas pautadas em cópias e fragmentos de diferentes autores. Avan-çaríamos também se provocássemos os educadores para que revisassem suas práticas e nelas inserissem mais e mais momentos de pesquisa real,

ETAPA

Apresentação pública da pesquisa

PROFESSOR

se apresentação oral, como elaborar um arquivo PowerPoint? como usar a lin-guagem na produção textual dos slides? como evitar vícios de linguagem? como dividir as tarefas da apresentação? como ilustrar?

ALUNO

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em que os alunos pudessem trabalhar com suas expectativas, suas dúvidas e sua capacidade criativa e inventiva, em direção à produção de co-nhecimento e não à simples repetição daquele já existente.

Para concluir, retomo os dizeres de Pedro Demo, citado por mim na epígrafe inicial: “Se um dia, educar pela pesquisa virar modismo, será porque não se entendeu nada”. Retomo para afirmar que a postura do educador frente à pesquisa e a tantos outros instrumentos de aprendizagem exige conhecimento consciente e deliberado, além de alto grau de comprometimento em relação ao seu papel de intervenção permanente no desenvolvimento do educando.

REFERÊNCIAS

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DEMO, Pedro.Formação de Formadores Básicos. Brasília: INEP, 1992.

DEMO, Pedro. 1996. Educar pela Pesquisa. 5 ed. Campinas: Autores Associados, 2002.

(Coleção Educação Contemporânea)

FISHER, Alec. 2001. Critical Thinking: an introduction. Cambridge: Cambridge

University Press, 2005.

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Development for School Improvement. Philadelphia: The Falmer Press, 1987.

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MARTINS, Jorge Santos. O trabalho com projeto de pesquisa: do ensino fundamental ao

médio. Campinas: Papirus, 2001.

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NEWMAN, Fred; HOLZMAN, Lois. 1993.Lev Vygotsky – cientista revolucionário. Trad.

Marcos Bagno. São Paulo: Loyola, 2002.

OLIVEIRA, Sônia M.M. et al.Diagnóstico da Pesquisa Escolar, no Ensino de 5a a 8a série do 1o Grau, nas Escolas de Londrina – Paraná. Londrina: Inf. Inf. v. 4, n. 1, p. 37-50, jan./jun. 1999.

ZABALA, Antoni.A prática educativa: como ensinar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.

NOTAS

1

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2

Em relação à redação dos objetivos em um trabalho, uma orientação interessante é a oferecida por Leffa (2003): “Para os objetivos gerais, usam-se geralmente verbos que denotam comportamentos não diretamente observáveis. Entre esses verbos, os seguintes têm sido usados com mais freqüência: saber, compreender, interpretar, aplicar, analisar, integrar, julgar, aceitar, apreciar, criar, etc. Para os objetivos específicos, usam-se verbos de ação, envolvendo comportamentos que podem ser diretamente observados. Entre eles destacam-se: identificar, definir, nomear, relacionar, destacar, afirmar, distinguir, escrever, recitar, selecionar, combinar, localizar, usar, responder, detectar, etc. Verbos que denotam processo - aprender, desenvolver, memorizar, adquirir, etc. - não podem ser usados para elaborar objetivos educacionais; eles não descrevem o resultado da aprendizagem”.

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Os conceitos de conhecimentos factuais, conceituais, procedimentais e atitudinais baseiam-se em Zabala (1995). Conhecimentos factuais correspondem ao conhecimento de fatos, acontecimentos, situações, dados e fenômenos concretos. Conhecimentos conceituais referem-se a conjuntos de fatos, objetos ou símbolos que se organizam a partir de características comuns e articuladas, exigindo abstrações e relações com outros conhecimentos já construídos. Conhecimentos procedimentais estão relacionados ao

saber fazeralgo e o que define sua aprendizagem não é o conhecimento que se tem sobre algo, mas sim o domínio ao transferi-lo para situações práticas. Conhecimentos atitudinais estão relacionados à natureza das atitudes do indivíduo nas diferentes situações a que é exposto em seus contatos grupais; envolvem valores e normas convencionadas no grupo social ao qual o indivíduo pertence.

Recebido:05/04/07

Aprovado: 20/05/08

Contato:

PUC SP Coordenadoria Geral de Especialização, Aperfeiçoamento e Extensão Rua da Consolação, 881

Referências

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