rev bras ortop.2016;51(3):374–377
SOCIEDADE BRASILEIRA DE ORTOPEDIA E TRAUMATOLOGIA
w w w . r b o . o r g . b r
Relato
de
caso
Fratura
de
estresse
no
teto
acetabular
por
motocross:
relato
de
caso
夽
Alexandre
de
Paiva
Luciano
∗e
Nelson
Franco
Filho
DisciplinadeOrtopediaeTraumatologia,FaculdadedeMedicina,UniversidadedeTaubaté,Taubaté,SP,Brasil
informações
sobre
o
artigo
Históricodoartigo:
Recebidoem14demaiode2015
Aceitoem11dejunhode2015
On-lineem14deoutubrode2015
Palavras-chave:
Fraturasdeestresse
Acetábulo
Traumatismosematletas
r
e
s
u
m
o
Umdosprimeirospassosparasereduziremlesões,comoafraturadeestressenoesporte,
éconhecermosenosaprofundarmosnoestudodanaturezaeextensãodessapatologia.
Aseguirapresentamosumrelatodecasodefraturadeestressenotetoacetabularpor
motocross.Casoconsideradoraronaliteraturaconsultada.Descric¸ãodoquadroclínico:
pacientede 27anos; masculino, iniciouseguimentomédicopor dores incaracterísticas
noquadrilesquerdo,concentradasprincipalmentenaregiãoinguinaldoquadrilesquerdo
duranteapráticademotocross.Apósinvestigac¸ãoclínicaeporexamescomplementares,
diagnosticou-sefraturadeestressenotetoacetabular.
©2015SociedadeBrasileiradeOrtopediaeTraumatologia.PublicadoporElsevierEditora
Ltda.Todososdireitosreservados.
Stress
fracture
in
acetabular
roof
due
to
motocross:
case
report
Keywords:
Stressfracture
Acetabulum
Athleticinjuries
a
b
s
t
r
a
c
t
Oneofthefirststepstobetakeninordertoreducesportsinjuriessuchasstressfracturesis
tohavein-depthknowledgeofthenatureandextentofthesepathologicalconditions.We
presentacasereportofastressfractureoftheacetabularroofcausedthroughmotocross.
Thistypeofcaseisconsideredrareintheliterature.Thedescriptionoftheclinicalcaseisas
follows.Thepatientwasa27-year-oldmalewhostartedtohavemedicalfollow-upbecause
ofuncharacteristicpaininhislefthip,whichwasconcentratedmainlyintheinguinalregion
ofthelefthipduringmotocrosspractice.Afterclinicalinvestigationandcomplementary
tests,hewasdiagnosedwithastressfractureoftheacetabularroof.
©2015SociedadeBrasileiradeOrtopediaeTraumatologia.PublishedbyElsevierEditora
Ltda.Allrightsreserved.
夽
TrabalhodesenvolvidonaDisciplinadeOrtopediaeTraumatologia,FaculdadedeMedicina,UniversidadedeTaubaté,Taubaté,SP,
Brasil.
∗ Autorparacorrespondência.
E-mail:paivaortopedia@gmail.com(A.P.Luciano).
http://dx.doi.org/10.1016/j.rbo.2015.06.004
rev bras ortop.2016;51(3):374–377
375
Introduc¸ão
Fraturadeestresseéumasoluc¸ãodecontinuidadeóssea
pro-vocada,entreoutrasrazões,porsobrecargacrônica.1,2Difere
dasfraturastraumáticasemossososteoporóticos.Portanto,
podemosdefinirfraturadeestressecomoumaadaptac¸ão
ina-dequadadoossoemrespostaàscargasmecânicasquelhesão
impostas.3Fissurasmicroscópicasnamorfologiaóssea,sem
umapausanascargasmecânicas esemotempoadequado
paraseureparo,poderãoresultaremumafraturadeestresse.3
Aprimeira descric¸ão clínicadas fraturasde estresse foi
registradapor Breithaupt,um cirurgião militar alemão em
1855,apudArmstrongetal.4
Stechowrelatou,em1897,apudArmstrongetal.,4a
pri-meira confirmac¸ão radiográfica de fratura de estresse em
recrutasmilitares,fraturadeumossometatarsal.O
diagnós-ticopermaneceusomenteentreosmilitaresatéPirkerapud
Armstrongetal.,4 IwamotoeTakeda5relatarem oprimeiro
diagnóstico de fratura de estresse ematletas, umafratura
transversalnadiáfisedofêmur,em1934.
Existeumcrescimentoexponencial da práticado
moto-crosspelomundo,comoaumentodonúmerodepraticantes
amadores.Devidoàextremaexigênciafi´sicaefisiolo ´gicaeà
menoraptida˜ofi´sica,ospilotosamadoressofrem
frequente-mentedefadiga.Essafadigamuscularlocalizadapoderesultar
emquedadodesempenhodeac¸o˜esmotorasespeci´ficasda
modalidade,consequentementeafetarodesempenhoe
resul-tarnaslesõesmúsculo-esqueléticas.6
Ascompetic¸õesdemotocrosssãogeralmentefeitasem
pis-tasfechadascomdistânciasquepodemchegara1.500metros.
Essaspistasincorporam característicasnaturaisdoterreno
comquantidadesvariadasdesaltosecurvas.Aquelesalheios
aodesportosupõemfrequentementequeopilotonadamais
fazdoqueconduzirumveículomotorizadoemtornodeum
campo.Porém,motocrossexigemuitofisicamentedos
mem-brossuperioreseglúteos(fig.1).
Aseguirapresentamos umrelato de caso defratura de
estresse notetoacetabulardecorrente da práticade
moto-cross.
Figura1–Biomecânicadomotocross,saltosecurvas.
Descric¸ão
do
quadro
clínico
Pacientede27anos;masculino,pilotoamadordemotocross,
iniciouseguimentomédicopordoresincaracterísticasno
qua-drilesquerdo,concentradaprincipalmentenaregiãoinguinal
duranteapráticadomotocrosshaviaummês,negavauso
crô-nicodemedicamentos,cirurgiaspréviasoudoenc¸ascrônicas
anteriormentediagnosticadas.
Pacientedisputavaprovasamadorasemcircuitofechado
comdistânciasquevariavamentre1.200e2.500metros,
acom-panhadasde saltos frequentes,porém semprecomuso de
equipamentosdeprotec¸ãoindividual.Assessõesde
treina-mento ocorriam três vezes porsemana ecompetic¸ões nos
finsdesemanacomotempodedurac¸ãodaprovaentre
15-30minutos.
Aoexamefísicoadmissionalapresentavapesode70 Kg,
alturade1,75m,IMC=22,87.Semfasciespatológicas.
Examefísicodoquadrilesquerdo:
• Inspec¸ão:notava-seleveclaudicac¸ãoàmarchadopaciente;
sematrofias.
• Palpac¸ão:semdoresàpalpac¸ãodasestruturasóssease
par-tesmolesdasfacesanterior,lateral,posterioremedialdo
quadrilesquerdo;
• Testesdeespeciais:Trendelenburg:negativo;Ludloff:
nega-tivo;Thomas:negativo;Ober:negativo.
• Graudemobilidade:extensão0o-30o,flexão0o-120◦,rotac¸ão
lateral0o-45o,rotac¸ãomedial0o-35◦,abduc¸ão0o-50o,aduc¸ão
0o-30o.
• Exameneurológicodeforc¸a:GrauV:movimentocompleto
contraagravidadeecontragranderesistência.
Paralelamenteforamsolicitadosexamesdeimagem:
radi-ografiasdoquadrilem03/03/2011: semsinaissugestivosde
fratura,semanormalidadesnoângulodeversãoacetabular,
semoutrasdeformidades.Devidoàausênciadeinformac¸ões
complementarespelasradiografias,foisolicitadaressonância
magnéticadoquadril.
Ressonância nuclear magnética (RM) do quadril em
03/03/2011(figs.2AeB).
Discussão
Namodalidademotocrossaindasãoescassasaspublicac¸ões
sobre o estresse fi´sico e fisiolo ´gico que sofrem os pilotos
apo´sumacompetic¸a˜ooficiale/outreinamentotécnico-tático.
Dessaforma,conhecerasvariáveisneuromusculares e
bio-mecânicas dessa modalidade esportiva pode ser um dos
primeirospassosparasereduziremlesões,comoafraturade
estresse.
Fraturasdeestressetêmsidodescritasemmuitos
espor-tes, tais como atletismo, tênis, basquete, voleibol, futebol,
beisebol.7,8Porém,nãoencontramosnaliteraturapesquisada
fraturasdeestressenotetoacetabulardecorrentedaprática
domotocross,oquecomprovaararidadedocasorelatado.
Osriscosdafraturadeestressesãoinfluenciadosporvários
fatores. São divididos em intrínsecos (sexo, idade, rac¸a, e
376
rev bras ortop.2016;51(3):374–377Figura2–Oaspectoédeimagemlinearhiperintensanas
sequênciasemT2eSTIR,circundadoporáreadeedemade
limitesmaldefinidos,sugere-sefraturadeestressenoteto acetabular.
calc¸adousado,superfíciedetreinamentoetipodeesporte),
biomecânicos(densidademineralósseaegeometriadoosso),
anatômicos(morfologiadopé,discrepânciadocomprimento
dapernaealinhamentodojoelho),hormonais(menarca
atra-sada,distúrbiosmenstruaisecontraceptivos)enutricionais
(deficiênciadecálcioevitaminaD).8
Afraturadeestressegeralmenteocorreemgruposde
pes-soasjovenssubmetidasaatividadesfísicasintensas.Atíbiaé
olocalmaiscomumdeacometimentoematletaserepresenta
50%dototal.Porém,alocalizac¸ãodasfraturasvariaemfunc¸ão
damodalidadeesportivapraticada.8
A radiografiasimples éo método de imagem
primeira-mente usado na maioria dos casos e nos permite avaliar
prováveisanormalidadespormeiodoângulodeversão
ace-tabular,importantenodiagnósticodiferencialnafraturade
estresse.Porémaressonânciamagnética(RM)éummétodo
diagnóstico com sensibilidade comparável e especificidade
superioràcintilografiaparaaavaliac¸ãodafraturadeestresse.
Pode demonstrar fratura em casos em que a radiologia
convencional é considerada normal.9 A RM émais
especí-ficadoqueacintilografiaemdetectarafraturade estresse
doquadrilediferenciá-ladeoutrascausasdedorósseaede
partesmoles,comonecroseavascular,bursitedoiliopsoase
tendinites.9-11
Williams etal.12 mostraramaimportânciada
ressonân-ciamagnética eda cintilografianodiagnósticodas fraturas
de estresse notetoacetabular. Avaliaram178militares
ati-voscom históriade dornoquadril relacionadaàatividade
física com radiografias simples do quadril e da pelve que
foraminterpretadascomonormais.Aressonânciamagnética
eacintilografiaósseamostraramque12dos178pacientes
(6,7%)tinhamachadosdeimagemcompatíveiscomfraturas
deestresseacetabular.Foramidentificadosdoispadrões.Sete
dos12(58%)pacientestiveramfraturasdeestressedoteto
ace-tabular.Nessegrupo,foramidentificadosdoiscasosdefratura
deestressedotetoacetabularbilateral.Ecincodos12(42%)
pacientestiveramfraturasdeestressedacolunaanterior,que
raramenteocorremdeformaisolada,equasesempreocorre
com afraturade estressedoramoinferiordopúbis.12 Isso
comprovouararidadeedificuldadediagnósticadafraturade
estressedotetoacetabular.
Fraturadeestressedoquadrildeveserumaconsiderac¸ão
diagnósticaemqualqueratleta,especialmenteemesportes
queenvolvemimpactoarticularequeapresentemdorno
qua-dril e/ou naporc¸ãoproximal da coxa.Fraturas de estresse
tambémpodemserobservadasnosacroenoramoisquiático,
próximasàinserc¸ãodostendõessemimembranoso,
semiten-dinosoebícepsfemoral.10,11
Nãoencontramosnaliteraturaestudadaumconsensono
tratamentodas fraturasdeestressedotetoacetabular.
Por-tanto,paraessecasoadotamosoprotocolodetratamentopara
amaioriadasfraturasdeestressenosatletas.Afratura
des-critanestecasofoiconsideradacomoamaioriadasfraturasde
estresse;debaixorisco.13,14Essasfraturaspodemsertratadas
comumprotocolodeduasfases.13,14Afase1caracteriza-se
pelocontroledadorpormeiodaprescric¸ãomédicade
anal-gésicos,reduc¸ão ouafastamentodosgestosesportivos que
provocamsintomaseintroduc¸ãodemodalidadesde
fisiotera-pia.Seoindivíduonãoforcapazdedeambularsemsentirdor,
deverápermanecerimobilizado,porexemplo,comumaórtese
estabilizadoraremovívele/ouumpardemuletas.Édesignada
umaatividademodificadaquemantenhaaforc¸aeaforma
física,mascomreduc¸ãodoimpacto.Atividadescomocorridas
napiscina,exercícios elípticos,bicicletalivreeestacionária
podemmanteraforc¸aeaformafísica,antesdareintroduc¸ão
aosexercícioscomimpacto.Exercíciosnaáguae
antigravitaci-onaispodemserusadoscomoumrecursoquegradualmente
reintroduzoorganismonogestoesportivo.13,14
Afase2caracteriza-sepelasmedidasdafase1acrescidas
deumretornogradualaoesporteecomec¸aquandooatleta
está sem dore com mobilidade normal emtorno de 10 a
14 dias do início dos sintomas. O tempo de retorno aos
movimentosdoesportedependedemuitosfatores,incluindo
a severidade e a cronicidadeda lesão eo nível de
morbi-dadefuncionaldoatleta.13,14 Paraestepacienteiniciou-seo
controledadorpormeiodaprescric¸ãomédicade
analgési-cos,do afastamentodomotocross edequalquer atividade
deimpacto,acompanhadodefisioterapia.Areintroduc¸ãoao
rev bras ortop.2016;51(3):374–377
377
porressonânciamagnéticaapós90diasdoiníciodos
sinto-mas,comboaevoluc¸ãoatéreintegrac¸ãocompletaaostreinos
após120diaseretornoàsprovasapós180diasdoiníciodo
tratamento.
Conflitos
de
interesse
Osautoresdeclaramnãohaverconflitosdeinteresse.
r
e
f
e
r
ê
n
c
i
a
s
1. GarrettWEJr,SafranMR,SeaberAV,GlissonRR,RibbeckBM. Biomechanicalcomparisonofstimulatedandnonstimulated skeletalmusclepulledtofailure.AmJSportsMed.
1987;15(5):448–54.
2. O’BrienFJ,TaylorD,CliveLeeT.Theeffectofbone
microstructureontheinitiationandgrowthofmicrocracks. JOrthopRes.2005;23(2):475–80.
3. BurrD,MigromC.Musculoskeletalfatigueandstress fractures.BocaRaton(FL):CRCPress;2001.
4. ArmstrongDW3rd,RueJP,WilckensJH,FrassicaFJ.Stress fractureinjuryinyoungmilitarymenandwomen.Bone. 2004;35(3):806–16.
5. IwamotoJ,TakedaT.Stressfracturesinathletes:review of196cases.JOrthopSci.2003;8(3):273–8.
6.AvelaJ,KyröläinenH,KomiPV.Neuromuscularchangesafter long-lastingmechanicallyandelectricallyelicitedfatigue.Eur JApplPhysiol.2001;85(3-4):317–25.
7.BergerFH,deJongeMC,MaasM.Stressfracturesinthelower extremity,Theimportanceofincreasingawarenessamongst radiologists.EurJRadiol.2007;62(1):16–26.
8.NattivA,PufferJC,CasperJ.Stressfractureriskfactors, incidence,anddistribution:a3yearprospectivestudyin collegiaterunners.MedSciSportsExerc.2000;32Suppl5:S347.
9.StollerDW,MaloneyWT,GlickJM.Thehip.In:StollerDW,
editor.Magneticresonanceimaginginorthopaedics&sports
medicine.SanFrancisco:Lippincott,1997.p.93.202.
10.KneelandJB.MRimagingofsportsinjuriesofthehip.Magn ResonImagingClinNAm.1999;7(1):105–15.
11.ResnickD,KangHS.Pelvisandhip.In:ResnickD,KangHS, editors.Internalderangementofjoints.SanDiego:Saunders; 1997.p.473–554.
12.WilliamsTR,PuckettML,DenisonG,ShinAY,GormanJD. Acetabularstressfracturesinmilitaryenduranceathletes andrecruits:incidenceandMRIandscintigraphicfindings. SkeletalRadiol.2002;31(5):277–81.
13.BodenBP,OsbahrDC,JimenezC.Low-riskstressfractures. AmJSportsMed.2001;29(1):100–11.